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Sp1: Um numero para nao esquecerDefinir síndromes consumptivas Emagrecimento é perda de peso. O emagrecimento sempre ocorre quando a entrada de nutrientes no corpo é menor que o gasto e a perda de energia. Flutuações de peso menores que 5% do peso basal são normais durante a vida e, por vezes, ganho ou perda de peso é sinal de saúde. Porém, quando este é involuntário e prejudica o organismo, a perda é considerada patológica e com necessidade de intervenção. Também são possíveis causas de perdas de peso razões psiquiátricas com distúrbio alimentares, como a anorexia nervosa e a bulimia, que, apesar de serem voluntárias, caracterizam um estado psíquico patológico. Emagrecimento involuntário é definido como o estado patológico resultante de absoluta ou relativa deficiência de proteína e energia, sendo a causa mais comum de desnutrição; está associado a aumento de morbidade e mortalidade e, por isso, sempre deve ser combatido. O grau máximo de emagrecimento denomina-se caquexia, caracterizado por síndrome de perda acelerada de musculatura esquelética geralmente associada a processos inflamatórios como câncer, infecções crônicas, como aids, aumento de citocinas circulantes, deterioração do sistema imune e disfunção de órgãos, contribuindo para má evolução, inclusive morte. O termo caquexia origina-se do grego kakos (coisa ruim) e hexus (estado de existir), descrito por Hipócrates referindo-se à síndrome de perda progressiva de peso e inanição entre pacientes que estavam severamente doentes e à morte. Quantitativamente, o emagrecimento involuntário é definido pelo grau e velocidade de acometimento em relação ao peso basal (Tabela I). Porém, outros autores preconizam emagrecimento involuntário por perda do peso basal de > 5% em 6 a 12 meses. Perdas de peso maiores que 1 kg/dia (correspondente a 1 L de água corpórea) sempre correspondem a desidratação, e não à perda de massa muscular ou gordura. Perdas de peso involuntárias > 20% do peso basal são associadas à pronunciada disfunção de órgãos e sistemas e caquexia5. Os termos emagrecimento, desnutrição ou inanição, sarcopenia, massa magra, pobreza, indigência, fome, hipercatabolismo e anabolismo estão associados, porém não são sinônimos. Desnutrição ou inanição é a carência de nutrientes, que pode ser global, acompanhada de emagrecimento e/ou caquexia, ou parcial, referindo-se especificamente a um ou mais nutrientes, podendo ou não ocorrer emagrecimento. DEP (desnutrição energético-protéica ou desnutrição calórico-protéica) é o estado patológico caracterizado por aporte inadequado de energia e proteína. Este estado é a forma mais comum de desnutrição nos pacientes aguda ou cronicamente doentes e nas populações com incapacidades. Sarcopenia é a diminuição da composição corpórea em referência à massa muscular esquelética. Massa magra ou livre de gordura é o conteúdo protéico corpóreo. Cada molécula protéica tem papel na manutenção da homeostase e de componentes corpóreos estruturais, além de atividade metabólica e reparação tissular, que são essenciais para a vida. A maior parte da massa magra corresponde à musculatura esquelética. O restante abrange outras musculaturas, pele, defesas imunes, estruturas de órgãos viscerais etc. É a perda de massa magra, e não de massa gordurosa, que produz DEP e suas complicações (Tabela II). Metabolismo é a somatória de reações químicas necessárias para o funcionamento celular (um processo que requer energia). Metabolismo basal (MB) é a energia necessária para manutenção das funções corpóreas normais, como respiração, circulação e temperatura, e é medido pela taxa de metabolismo basal (TMB) com o indivíduo acordado, deitado e sem atividade física. Hipermetabolismo é a taxa metabólica acima do normal. Catabolismo é a degradação de tecido com quebra de proteína. Hipercatabolismo é o catabolismo sem adaptação metabólica, levando ao balanço nitrogenado negativo, com quebra e diminuição da massa magra, apesar da ingestão de nutrientes. Anabolismo é a formação de novo tecido com síntese protéica. Fisiopatologia e etiologia Fisiopatologicamente, a perda ponderal ocorre como resultado de diminuição do aporte de energia, aumento do gasto energético e perda de energia via urina ou fezes, podendo culminar em caquexia e suas complicações. A diminuição de aporte de energia refere-se a jejum digestivo/celular, como anorexia, dificuldade de mastigação e deglutição, falta de acesso à alimentação e saciedade precoce. O aumento do gasto energético se dá por catabolismo aumentado inadaptado, por liberação de hormônios e cininas inflamatórias e/ou excesso de atividades físicas. O aumento de perdas de energia urinárias e fecais com diminuição da incorporação dos alimentos/água se manifesta por poliúria, vômitos e má absorção. As principais causas de emagrecimento, de acordo com a fisiopatologia, estão listadas na Tabela III. A falta de ingestão alimentar no paciente oncológico pode ser conseqüente a múltiplos fatores, como perda do olfato, hiporexia, incapacidade de alimentar-se por distúrbios da mastigação e deglutição associados à imunodepressão e quimioterápicos, infecção secundária com disgeusia (alteração do sabor), xerostomia e mucosites secundárias, disfagia, náuseas, vômitos, cólicas e distensões abdominais, ascites, má absorção por mucosa careca ou invasão/ressecção tumoral, saciedade precoce por gastroparesia e/ou ação de citocinas inflamatórias no centro da fome, dor crônica, depressão. No entanto, a perda de peso nesses pacientes não pode ser atribuída somente à falta de ingesta. McGeer et al.27, em metanálise com pacientes com câncer submetidos a quimioterapia e nutrição parenteral, demonstraram que a simples realimentação não restabelece o peso basal. A perda ponderal nestes casos está associada ao aumento de consumo de energia com hipercatabolismo e conseqüente depleção de nutrientes, ambos culminando com balanço energético negativo e emagrecimento, podendo evoluir para caquexia. Os estados hipercatabólicos são caracterizados por consumo de massa magra com atrofia muscular de membros e caixa torácica, induzindo fadiga, repouso no leito, predisposição a tromboses, embolias e riscos de escaras, aumento do trabalho respiratório, diminuição da capacidade de tosse, eliminação de secreções pulmonares, déficit de musculatura lisa com retardo do esvaziamento gástrico (gastroparesia) e aumento da saciedade, diminuição do trânsito intestinal e perda da estabilidade de resposta cardiovascular, alteração do sistema imunológico com conseqüente predisposição a infecções (linfopenia e alteração de anticorpos), piorado metabolismo (enzimas, cininas, moléculas de expressão, hormônios e membranas) e piora da reparação tissular. Os mecanismos metabólicos, que tentam preservar a massa magra como um mecanismo de autoproteção como antioxidantes e sinalização celular de síntese protéica, são bloqueados e ultrapassados pela ativação da resposta inflamatória, ou resposta hormonal mal adaptada por estresse físico ou psíquico do hipercatabolismo. O insulto catabólico também induz aumento de hormônios catabólicos (adrenalina e cortisol), diminuição dos hormônios anabólicos (insulina, GH e testosterona), aumento acentuado da conversão de aminoácidos em glicose pelo fígado pela neoglicogênese, rápida quebra de musculatura com utilização de aminoácidos como fonte de energia (sobretudo com consumo do aminoácido glutamina), canalização anormal de nutrientes (produção excessiva acima das necessidades de glicose), falta de cetose, indicando que a gordura não é a maior fonte de caloria e ausência de resposta do catabolismo ao aporte de nutrientes. A ação catabólica induz caquexia muscular ou doença resultante de demanda aumentada de produção de energia, porém ineficiente, levando a produção predominante de calor (perda de energia). A resposta alterada à insulina e a diminuição da lipase dos tecidos adiposos, induzindo hiperglicemia e hipertrigliceridemia, podem também contribuir para a falta de apetite em pacientes oncológicos. Kayacan et al. descrevemque as cininas pró-inflamatórias TNFalfa, IL-1 beta e IL-6, produzidas por tumores e liberadas também em processos inflamatórios, agem independentemente, induzindo proteólise e lipólise no hipermetabolismo via resistência à insulina nesses pacientes. A proteólise se faz predominantemente via ubiquitina- proteossomo induzida pelo PIF – fator indutor de proteólise (proteolysis inducing factor) e TNF-alfa. Vários autores concordam que esta pode ser a via final comum que medeia a degradação protéica na caquexia. O PIF é um proteoglicano espécie-específico de 24 kilodalton que exerce sua ação diretamente na célulaalvo, intensificando a reação de fase aguda associada a IL-6 e IL-8, liberando proteínas de fase aguda, como o VHS e a proteína C reativa, induzindo hipoalbuminemia por síndrome de vazamento por endotelite e aumentando a lipemia via lipólise com consumo do tecido adiposo, além de aumento de expressão de moléculas de adesão. O PIF não é encontrado em grandes queimados, pós-trauma ou sepse ou em pacientes oncológicos que mantenham pesos estáveis. A lipólise se faz pelo LMF (fator de mobilização de lípides - lipid mobilizing factor), uma glicoproteína com 43 kilodalton que atua via AMP cíclico por meio dos receptores beta-adrenérgicos. O processo inflamatório induz a liberação de IL-12 e interferon-gama, que agrava a caquexia e os sintomas sistêmicos como mal-estar e anorexia, podendo causar até 42% de redução da carcaça de tecido adiposo. Todorov et al demonstraram que apenas os pacientes que apresentavam perda de peso também apresentavam níveis urinários detectáveis de LMF. Modelos experimentais sugerem que o consumo desses mediadores pró-inflamatórios seja dirigido predominantemente contra a cadeia pesada da musculatura esquelética. O alvo para a musculatura esquelética traduz perda de massa magra e alterações metabólicas graves (ver Tabela II). Linfomas liberam IL-6 e TNF-alfa e, quando associadas aos outros marcadores de fase aguda, como VHS e proteína C reativa, têm relação direta com caquexia e pior prognóstico. Diversas outras citocinas endógenas, além do TNFalfa, são produzidas em excesso em doenças como câncer de várias origens (pulmão, pâncreas), DPOC e ICC, servindo como fator de crescimento autócrino e indicadores de resposta imune a tumores, por sua capacidade de aumentar o metabolismo basal, induzir anorexia por ação no centro da saciedade no sistema nervoso central, autoperpetuar a liberação de TNF-alfa e outras interleucinas, como IL-1 beta e IL-6, além de ativar a migração de células inflamatórias e expressão de moléculas de adesão. A inflamação nos pacientes portadores de DPOC e ICC pode ser secundária à maior suscetibilidade aos estresses como infecções e inflamações que induzem a hipercatabolismo com perda ponderal e de massa muscular. Esses fatores afetam negativamente a função cardiorrespiratória, piorando a mecânica torácica (musculatura torácica e diafragmática), aumentando o consumo de oxigênio e a remoção de CO2 tecidual, piorando o débito cardiorrespiratório (aumento da demanda cardiorrespiratória) e aumentando o catabolismo protéico, podendo evoluir para posterior caquexia (caquexia cardíaca). Clinicamente, produzem piora de dispnéia, edema, ortopnéia e estertores pulmonares. O processamento de macronutrientes para corrigir a DEP demanda energia e aumento dos trabalhos respiratório e cardíaco, dificultando a reversão da DEP. A perda de peso e a caquexia nesses pacientes podem estar mascaradas pelo edema. Apesar de portadores de HIV comumente apresentarem perda de massa muscular e emagrecimento, diferentemente dos portadores de neoplasia, o gasto de energia total é semelhante ao de um indivíduo normal. A perda de peso lenta e progressiva nesses pacientes se deve à diminuição do aporte de energia por anorexia, mucosites e diarréia, mesmo se acompanhada de diminuição das atividades físicas. Situações de perda rápida de peso sugerem aumento de cininas inflamatórias circulantes e, geralmente, é acompanhado de recrudescimento da doença, ativação e/ou estabelecimento de doença oportunista secundária. Em pacientes com outras doenças crônicas inflamatórias, como tuberculose, endocardite subaguda e artrite reumatóide, também foi encontrado aumento das cininas inflamatórias quando acompanhadas por perda de peso, em especial o TNF-alfa, a ponto de se preconizar, em alguns casos, medicação anti-TNF como arma terapêutica. A febre, quando presente, é fator de intenso aumento do metabolismo e gasto energético. Preconizam que as necessidades nutricionais em infecções podem exceder 50% da manutenção para compensar o balanço negativo nitrogenado. O paciente portador de diabetes mellitus descompensado, particularmente do tipo 1, apresenta emagrecimento pelo paradoxo de fome celular e hiperglicemia, com perdas energéticas induzidas pelo déficit de insulina. Clinicamente, é caracterizado por polifagia (devido ao jejum intracelular), poliúria (devido à glicosúria osmótica) e polidipsia (pela desidratação secundária à poliúria), podendo estar associada a diarréia por alteração da motilidade intestinal por neuropatia e superproliferação bacteriana intraluminal. O paciente apresenta também hipercatabolismo por predisposição às infecções por imunodepressão, dermatites e mucosites. O emagrecimento, nestes pacientes, é preditor de mau controle glicêmico e implica pior prognóstico para órgãos alvo, como aparelho cardiovascular e suas consequentes afecções, como AVC, infarto, insuficiência renal e amaurose, que podem agravar a perda ponderal. As patologias gastrintestinais apresentam causas de emagrecimento múltiplas diretas e indiretas, como mucosites, disgeusia, xerostomia, odinofagia, disfagia, sensação de saciedade, refluxos gastroesofágicos, gastroparesia, distensão e dor abdominal, diarréia disabsortiva e/ou aquosa, fístulas e perfurações cirúrgicas e espontâneas. O hormônio tireoidiano produz hipermetabolismo nos pacientes com hipertireoidismo endógeno ou exógeno (ingesta de hormônio tireoidiano) pelo aumento de termogênese, hipersensibilidade às catecolaminas e degradação muscular, clinicamente representados por astenia, palpitação, tremores distais, sudorese quente, insônia e hiperdefecação. Apesar de os pacientes apresentarem polifagia, geralmente o catabolismo sobrepõe-se e ocorre emagrecimento. No hipertireoidismo apatético em idosos, pode ocorrer emagrecimento sem aumento de apetite. Glicocorticóides, glucagon e catecolaminas antagonizam os efeitos da insulina por serem mediadores liberados de “fuga” (catabolizantes), aumentando o gasto de energia e a liberação de nutrientes com hiperglicemia, proteólise e lipólise. Esses fatos justificam o emagrecimento, a astenia, os tremores, a hipertensão e a sudorese fria encontrados em alguns tumores autônomos produtores desses hormônios, como o feocromocitoma (tumor neuroendócrino produtor de catecolaminas). Os pacientes com síndrome de Addison (hipocortisolismo) emagrecem por vômitos e diarréia e, por vezes, podem apresentar desidratação com tontura, hipotensão ortostática e astenia devido à deficiência de mineralocorticóide concomitante. Os estados de hipercalcemia podem induzir vômitos, distensão abdominal e falta de ingestão alimentar por anorexia e torpor. Porém, esse quadro clínico é mais comum em pacientes oncológicos que em portadores de hiperparatireoidismo. Os hormônios produzidos pelos adipócitos na síndrome metabólica, como a leptina, apresentam relação inversa ao emagrecimento. A colecistocinina, hormônio da saciedade, encontra-se aumentada em pacientes idosos, sendo responsável pela “anorexia fisiológica da idade”. No indivíduo idoso, classificaram as causas de perda de peso em 4 categorias: social (queda do poder econômico por aposentadoria, perda da renda própria ou sustento de familiares), psiquiátrica (demência, depressão), secundária às condições médicas (doença e/ou remédios) e relacionadas à idade (mecânica da deglutição, envelhecimento dos sistemas). Em estudos de idosos institucionalizados, associou IMC < 22 kg/m2 a hipoalbuminemiae queda de vitamina E, e sugeriu que o estresse oxidativo teria papel relevante na fisiopatologia do emagrecimento nesses indivíduos. Robbins preconiza o método mnemônico dos 9 “D” para pesquisa de emagrecimento no idoso, ao qual alguns autores, com humor, sugerem a adição do “10 D” (Tabela IV). Alibhai et al. enfatizam que a causa de emagrecimento no idoso geralmente é múltipla e preconizam o mnemônico MEALS ON WHEELS para pesquisa de emagrecimento no idoso: M: medicações. E: emocional (problemas emocionais). A: anorexia tardive/alcoolismo. L: late-life paranoia (paranóia de incidência tardia). S: swalowing disorders (distúrbio da deglutição). O: oral factors (fatores orais, como dentição em mau estado). N: no money (sem dinheiro). W: wondering and other dementia-related behaviors (esquecimento e outros comportamentos relacionados com demência). H: hipertireoidismo, hipotireoidismo, hiperparatireoidismo, hipoadrenalismo. E: enteric problems (problemas entéricos, má absorção). E: eating problems (distúrbios alimentares, incapacidade de alimentar-se sozinho). L: low salt, low cholesterol diets (dietas com restrição de sal e colesterol). S: social problems, gallstones (problemas sociais: isolamento, incapacidade de obter alimentos favoritos; colecistopatia calculosa). As síndromes metabólicas, como uremia na insuficiência renal, induzem balanço nitrogenado negativo, predominantemente por diminuição do aporte energético, e aumento das perdas, caracterizado clinicamente por anorexia, disgeusia, náuseas, vômitos, diarréia e proteinúria. Um dos mecanismos propostos para anorexia nos urêmicos é o aumento de síntese de serotonina devido a alta carga de triptofano e seu transporte na barreira hematoliquórica5. As alterações psíquicas com emagrecimento são comuns em situações como anorexia nervosa e depressão. · A perda ponderal ocorre predominantemente por falta de ingestão alimentar. Porém, em alguns casos, podem se associar a diarréia por uso de laxativos e anorexia por uso de antidepressivos como a fluoxetina. Clinicamente, os pacientes apresentam, na maioria das vezes, as seguintes características: anorexia nervosa: adolescente feminina com dieta excessiva, auto-imagem não realística, excesso de atividade física, perfeccionismo, amenorréia, dentes precários, arritmia, desidratação e predisposição às infecções. Na depressão: mulher > 40 anos, astenia, pensamentos negativos, apatia, comportamento manipulador (crianças), expectativa não-realística de cuidadores (crianças). Na bulimia: polifagia, vômitos e diarréia (laxativos e diuréticos, hormônios catabolizantes, por vezes escondidos), dentes em mau estado (pelos vômitos), hiperatividade, hábitos alimentares peculiares ou rituais. Bulímicos e depressivos podem apresentar ganho de peso ao invés de emagrecimento dependendo da ingestão alimentar. No paciente idoso, a incidência de anorexia nervosa é denominada de anorexia tardive. Outras psicopatias podem transcorrer com emagrecimento, dependendo da ingestão alimentar, atividade física e medicações, como transtorno bipolar e síndrome de Munchaunsen, distúrbios paranóides e desilusionais, abstinência de neurolépticos e maconha. Pacientes com lesões neurológicas e coma também apresentam profundo estado catabólico, comparável a um grande queimado com área > 50%. Apesar do coma, o catabolismo e a demanda de energias são muito altos, induzidos por inflamação sistêmica e pelo estado neuromiopático. Mesmo com reposição calórica máxima, é difícil manter ou restaurar o peso corpóreo. Diversas drogas podem induzir emagrecimento por mecanismos variados (Tabela V). Drogas ilícitas, como cocaína, assim como o álcool e tabaco (drogas lícitas), provocam anorexia por agirem no centro da saciedade. Outras medicações, como os opiáceos, podem diminuir o apetite, a motilidade intestinal e as secreções digestivas, como os sucos biliar e pancreático, fatores que contribuem para a perda ponderal. As anfetaminas aumentam a resposta adrenérgica, aumentando o metabolismo que se associa à anorexia por ação no hipotálamo. A abstinência de drogas (álcool, neurolépticos como haloperidol, clorpromazina e tioridazina) pode provocar emagrecimento com febre, tremores, alucinações e anorexia por ação do SNC (Tabela V). Sinais de perda ponderal no exame físico Metade dos diagnósticos da causa do emagrecimento é obtida com a história clínica e o exame físico, sem nenhum outro exame subsidiário, ressaltando-se a importância da anamnese. Anamnese São três pontos gerais que norteiam a história sob o ponto de vista global do emagrecimento: 1 Perda de peso: constatação, grau e velocidade. 2 Apetite: diminuição ou aumento. 3 Inflamação: presente ou ausente. Peso É importante lembrar que pacientes emagrecidos por doenças orgânicas tendem a subestimar a perda de peso enquanto os obesos tendem a exagerá-la. Pacientes que mantinham peso estável e passam a perder peso são mais preocupantes que pacientes que vêm apresentando flutuação de peso ao longo do tempo, que podem ser dependentes de ingestão alimentar voluntária e atividade física. Apetite Avalia-se se o paciente emagreceu porque diminuiu a ingestão de alimentos (perda de apetite) ou se, apesar de não ter parado ou até ter aumentado a entrada de nutrientes (aumento do apetite e polifagia), houve gastos e/ou perdas de energia na urina ou fezes superiores ao aporte energético. As doenças com perda ponderal e anorexia correspondem às doenças orgânicas como câncer, infecções e inflamações sistêmicas, como doenças auto-imunes, metabólicas, como uremia, cirrose e síndrome de Addison, doenças crônicas, como ICC e DPOC, além de psicopatias e uso de drogas. Poucas são as causas de emagrecimento com aumento de apetite, sendo, portanto, mais fáceis de serem diagnosticadas, como diabetes mellitus, hipertireoidismo, síndromes de má absorção, feocromocitoma e excesso de atividade física (Tabela III). Tanto as doenças orgânicas como as psicopatias provocam emagrecimento associado à anorexia. Neste tópico, a idade representa fator fundamental no diagnóstico diferencial. A presença de emagrecimento e hiporexia em pessoa jovem do sexo feminino, sem sinais de inflamação na anamnese, sugere fortemente a presença de anorexia nervosa. Por outro lado, história semelhante em paciente com idade acima de 40 anos sugere depressão, hipotireoidismo ou hipertireoidismo apatético. A mesma anamnese em paciente acima de 65 anos sugere alteração da mecânica de deglutição ou menor acesso aos alimentos (distúrbios psíquicos como demência e depressão, ausência ou mau estado de dentes ou dentadura inadequada, lesões orais como candidíase, alteração neurológica/muscular da mastigação pós-AVC ou outras doenças degenerativas, institucionalização ou abandono). Inflamação Após constatar a perda ponderal e a alteração de apetite, checa-se se há ou não inflamação. Seu marcador clínico mais específico é a febre, porém a sua ausência não exclui inflamação. Dentre as causas nãoinflamatórias estão as mecânicas (alterações de mastigação e deglutição), psíquicas (demência, depressão, anorexia nervosa, bulimia), drogas (Tabela V), doenças degenerativas crônicas (dor crônica, ICC, DPOC, diabetes mellitus, tabagismo, etilismo), endócrinas (hipertireoidismo, feocromocitomas, síndrome de Addison, pan-hipopituitarismo, hiperparatireoidismo), metabólicas (diabetes mellitus, uremia, intoxicações exógenas) e excesso de atividade física. Dentre as causas inflamatórias, podem ser citadas câncer, infecções, doenças auto-imunes, doenças intestinais inflamatórias, traumas e seus sintomas e sinais concomitantes de alerta (febre, astenia de evolução rápida e massas palpáveis sugerindo acometimento sistêmico inflamatório da doença, como tumores ou infecções). Antecedentes pessoais, hábitos e vícios · Problemas sociais e econômicos que sugerem alteração de acesso, disponibilidade e mecânica/fisiologia da alimentação e digestão. · Rever medicações, uso de drogas ilícitas, álcool e tabaco (que são causas de emagrecimento e fatores de risco para tumores e doençascrônicas), dieta, comorbidades (DM, ICC, DPOC, cirurgias, enteropatias, verminoses, amebíase, pancreatites, hepatites, internações). Suspeita se de dependência de drogas em indivíduos com postura de isolamento, mau rendimento escolar, agressividade, tremores, conjuntivite, rinite, instabilidade do humor e, por vezes, alucinação, palpitação e dores precordiais de causa desconhecida. Os contactantes e familiares também devem ser questionados a esse respeito, além de se checar as atividades do paciente. · História social como finanças, transporte, suporte social, comportamento sexual, viagens que sugerem riscos para doenças infectocontagiosas. Antecedentes familiares · Cânceres (mama, trato gastrintestinal, pulmão, cólon, próstata), doenças benignas do trato gastrintestinal (gastrite, cólon irritável, diverticulite, pólipos, enteropatias inflamatórias como doença de Chron, e retocolite), depressão e outras doenças psiquiátricas, hipertireoidismo, integridade cognitiva como demência, distúrbio neurológico, status funcional, doenças degenerativas (cardiovasculares, diabetes mellitus, ICC, DPOC, uremia, cirrose). No paciente idoso, Moriguti et al. preconizam história cuidadosa do paciente e de seus cuidadores, além de checagem de sua realidade domiciliar e avaliação socioeconômica global. Exame clínico O exame físico pode ou não confirmar o emagrecimento e o grau de comprometimento sistêmico que a moléstia ocasionou no paciente. Objetivamente, enfoca dados antropométricos, dados vitais, gânglios/massas, tireóide, sistemas e órgãos sintomáticos, exame da visão, boca, dentição e exames neurológicos, além do exame mental, por meio do MMSE (Mini Mental State Examination) e do GDS (Geriatric Depression Scale). O exame físico geral inicia-se com a observação clínica simples do paciente ao se aproximar da sala de atendimento: capacidade de deambular e expressar-se, psiquismo/humor/lucidez, posições antálgicas, fácies típicas, atrofias musculares. Se houver alteração de sensório, fazer MMSE ou GDS. Os dados clínicos mais importantes no exame físico em paciente emagrecido são o peso e a perda de massa magra com atrofia muscular como a musculatura temporal, diâmetro dos membros, em especial as panturrilhas (dando a impressão de que os joelhos aumentaram), costelas e omoplatas “saltadas” no tronco (destaque das “asas” posteriores) e abdome cavo. A carência protéica também pode induzir descamação cutânea, queilite, unhas fracas e quebradiças, cabelo fino (lanugo) e cílios longos (sinal de Pitaluga). Os dados antropométricos (peso, altura, IMC) sempre devem ser feitos a cada consulta, em balança tarada, com o paciente despido ou com a mínima quantidade de roupas. A medida da prega cutânea pode ser feita na parte posterior média do braço usando-se paquímetro, e o perímetro muscular (PM) no ponto médio dos membros (PMMM) por meio da fórmula: PMMM = PM braços (cm) – (! " espessura da prega cutânea tricipital) (cm) Porém, esses métodos são pouco utilizados por necessitarem de experiência do observador e apresentarem fatores de confusão, como a desidratação. Dentre os dados vitais, a pressão arterial e pulsos periféricos devem ser medidos com o paciente na posição deitada e sentada com as pernas abaixadas (para constatar hipotensão ortostática secundária a desidratação, doença cardiovascular ou neuropatia periférica); a freqüência respiratória avalia dispnéia e a temperatura pode acusar a presença de febre (diagnóstico de patologia inflamatória). A constatação de icterícia sugere infiltração hepática do processo ou anemia hemolítica; cianose central com ruídos pulmonares aponta para insuficiência respiratória ou cardiovascular secundária a inflamações pulmonares, como tuberculose, pneumonites e DPOC ou ICC. A anemia pode ser secundária a patologia consumptiva e/ou carencial; as mucosas da cavidade oral e faríngea podem demonstrar xerostomia, infecções secundárias e abscessos dentários; língua careca, aftas juntamente a anemia e parestesias apontam para doença carencial vitamínica e, se associadas à diarréia, sugerem má absorção. Segue-se à palpação dos gânglios, tireóide, pulsos periféricos (palpação e ausculta). O encontro de massas palpáveis sugere tumores e infecções; sinais de estase jugular, pulsos finos, sopros carotídeos, B3, ruídos pulmonares, edemas periféricos e congestão hepática sugerem patologias crônicas graves (ICC, DPOC, DM) e facilitam o diagnóstico de causa do emagrecimento ou doença co-responsável para a perda de peso. A presença de tremores, sudorese quente, taquicardia com ou sem exoftalmo e bócio sugerem hipertireoidismo. No paciente acima de 65 anos, vários autores aconselham exame cuidadoso para dentição, motricidade dos músculos da mastigação e deglutição, exame neurológico e psíquico completo, motricidade e exames oftalmológico e auditivo. Diagnostico e exames complementares O auxílio de poucos exames subsidiários associados à anamnese e ao exame físico é suficiente para apontar o diagnóstico da moléstia em torno de 75% dos casos. De 23 a 26% das doenças caquetizantes não são diagnosticadas em vida, independentemente da extensão da pesquisa laboratorial. Se a anamnese e o exame físico apontam o diagnóstico etiológico, a pesquisa laboratorial deve ser direcionada para a sua constatação precisa e conduta o mais precocemente possível, associada a exames de avaliação da disseminação da doença e suas repercussões laboratoriais. Porém, se a semiologia não permitiu pistas para o diagnóstico, deve-se basear a pesquisa laboratorial em 2 fases: presença ou não de inflamação e avaliação nutricional global. Após avaliação destes testes de “triagem”, direciona-se para a pesquisa etiológica específica. Apesar de nenhum estudo de definição e aplicação escores de exames de triagem para diagnóstico de emagrecimento involuntário de foco desconhecido ter sido validado em população independente, vários trabalhos sugerem um fluxograma para sua pesquisa5,8,10. Nestes, frequentemente se incluem hemograma completo, bioquímica, enzimas hepáticas, função renal, atividade inflamatória, albumina sérica, urina e radiografia de tórax e, por vezes, ECG (eletrocardiograma). Rabinovitz et al. estudando pacientes oncológicos, encontraram alta especificidade (87%) e baixa sensibilidade (17%) na associação de alteração dos níveis de valor de hemossedimentação (VHS) associado a hipoalbuminemia e fosfatase alcalina elevada. Marton et al. em estudo prospectivo com 91 pacientes, relataram que, na triagem laboratorial, a radiografia de tórax foi a mais pedida, apresentando alterações em 41%; 66% dos pacientes apresentavam algum exame positivo; 83% dos pacientes com doença orgânica apresentavam anormalidades nos testes de triagem ou nas radiografias do trato gastrintestinal; 37% dos pacientes apresentaram pelo menos um exame falso-positivo; 25% faleceram em 1 ano e 40% apresentavam prognóstico ruim. Dentre os fatores de mau prognóstico, estavam mau estado nutricional prévio e resultados positivos nos testes de triagem, além de diagnóstico de neoplasia e idade avançada. Nenhum dos pacientes que evoluiu mal apresentava todos os exames normais. Thompson et al.20 sugeriram não solicitar exames laboratoriais em pacientes com emagrecimento portadores de psicopatias e alteração da ingestão, bastando a anamnese e o exame físico para seu diagnóstico. Sahyoun et al. observaram associação de perda de peso com saúde precária, leucocitose, câncer, hipoalbuminemia, anemia e tabagismo. Pacientes com anorexia nervosa e/ou caquexia podem apresentar exames de laboratório sinalizando hipotireoidismo subclínico como defesa do organismo, e que este não deve ser tratado. Habibi et al. citam que exames como tomografia computadorizada podem ser necessários, porém, quando indicados sem suspeita específica, apresentam baixo poder diagnóstico. Complementam que exames de imagem do trato digestivo têm alto poder diagnóstico somente quando acompanhados de sinais e sintomas ou positividade nos testes simples de triagem. Na avaliação nutricional global, incluem-sea pesquisa do grau de perda de massa magra e gordurosa, micronutrientes e suas repercussões sistêmicas. São eles: · Albumina sérica: é a proteína corpórea mais utilizada para avaliação de desnutrição, podendo-se medir também a pré-albumina e a transferrina; · Excreção de creatinina urinária de 24 horas: dosagem indireta da excreção da creatinina muscular esquelética; · Balanço nitrogenado corpóreo e/ou excreção urinária de nitrogênio: balanço entre aporte de nitrogênio oral, parenteral ou enteral e perdas urinárias, fecais ou de outras fontes intestinais (drenos, fístulas); ! metabolismo basal = taxa de metabolismo basal (TMB) x fator estressor x fator de atividade ou pela dosagem de calorimetria indireta; · Calorimetria indireta: técnica de consumo de O2 e produção de CO2 (medidas de consumo de energia) para calcular o gasto de energia de repouso e quociente respiratório. Um litro de O2 consumido corresponde a 3,9 kcal (16,32 kj); 1 L de CO2 produzido gera 1,1 kcal (4 kj).A calorimetria indireta mede com precisão o gasto de energia diária; · Bioimpedância ou impedância bioelétrica: por meio de corrente fraca e posicionando-se eletrodos no dorso das mãos e dos pés, quantifica-se o teor de massa magra, gordura e água corpórea; · Ressonância magnética: por meio de campo magnético, dosa-se o teor de gordura e a musculatura corpórea, é o método mais utilizado durante a fase de recuperação para monitorar a restauração de massa magra versus massa e gordura; · Dosagem de vitaminas e sais minerais: pesquisa de micronutrientes como ferro, zinco, vitaminas (B12, B6) e ácido fólico. Dosagem indireta de vitamina: K pelo tempo de protrombina (fatores K-dependentes), hemograma (carência de ácido fólico, B12, ferro), índice de segmentação neutrofílica (B12); · Função imunológica: contagem de linfócitos (pode estar diminuída) e testes cutâneos comuns, como BCG e outros. A DEP pode proporcionar atrofia das estruturas linfóides do timo com diminuição linfocitária sangüínea e conseqüente queda de imunidade mediada por linfócitos T. Para diagnóstico, avaliação e seguimento de emagrecimento e DEP, Demling et al. preconizam os exames bioquímicos de albumina, pré-albumina, transferrina, contagem total de linfócitos séricos e da dosagem de balanço nitrogenado, peso e análise de bioimpedância (para diferenciar do edema). Propõe-se o Algoritmo 1 para pesquisa diagnóstica de emagrecimento involuntário. Medidas terapeuticas O tratamento do emagrecimento involuntário e a correção da desnutrição/caquexia são multifatoriais e necessitam de estratégia integrada multidisciplinar. Objetivam a maior recuperação possível da função fisiológica adaptada com capacitação física, melhora da função muscular e orgânica e competência imunológica. Requerem um tempo muito maior que o tempo de instalação do processo e está baseado, na prática, em 3 pontos: 1- Definir metas significativas e possíveis: peso, composição corpórea, força, desempenho e status, apetite e qualidade de vida específicos individualmente para cada paciente. 2- Definir medidas de tratamento (multidisciplinar): nutrição, medicação, exercício (dentista, assistência social, fisioterapia, fonaudiologia, enfermagem,médico). 3- Para perdas de peso causadas por doença específica, seguir a terapia prescrita no tratamento da causa de base. Avaliação multidisciplinar 1 Avaliação psicossocioconômica: acesso às necessidades básicas (abrigo, alimentação), tratamento de distúrbios do humor (depressão e compulsão alimentar), distúrbios alimentares (anorexia nervosa e bulimia). Inclusão (sensibilização, orientação, adesão, participação e intervenção) da família no tratamento. Em casos precoces, a anorexia nervosa pode ser tratada com internação hospitalar sob rígida supervisão. Mesmo após aparente cura, pacientes com anorexia nervosa devem manter consultas médicas regulares, pois recidivas são muito frequentes. 2 Avaliação bucal e de deglutição (principalmente idosos, pacientes com distúrbios alimentares tipo anorexia e bulimia, distúrbios neurológicos e doenças com mucosites como tumores, HIV, imunossuprimidos): avaliação de dentista, fonaudiólogo, otorrinolaringologista. 3 Atividade física: leve à moderada diariamente (quando tolerar); se possível, exercício de resistência (peso) para aumentar a musculatura contrapondo-se ao ganho de massa de gordura (efeito anabolizante); ! exercício em excesso induz perda de peso (cálculo individualizado); em idosos, ter cuidado com quedas; além de melhorar a musculatura, prevenir osteoporose e evitar quedas, o exercício, se não for bem orientado, pode também predispor a quedas e causar fraturas. 4 Intervenção nutricional: Apesar do mau aproveitamento de nutrientes durante processos inflamatórios/proliferativos, o aporte nutricional deve ser aumentado na tentativa de manter/ reverter o balanço energético negativo. A dieta deve conter refeições pequenas e freqüentes e ser balanceada para impedir ganho predominante de gordura, se possível, dentro das preferências do paciente. As causas digestivas de intolerância alimentar (anorexia, refluxos gastrintestinais, vômitos, diarréias, mucosites, dumping, empachamentos, distensões abdominais, intolerância medicamentosa, laxativos) devem ser tratadas especificamente com medicações sintomáticas e orientação disciplinar. 4.1 Checagem da ingesta: · Anotar diário dietético; · Comparar alteração de peso e total de calorias consumidas. 4.2 Uso de produtos enterais (sondagens: nasogástrica, nasoenteral, gastrostomia, jejunostomia): · Indicações: ingestão oral insuficiente, doenças neuromusculares, incapacidade de alimentação via oral (cirurgia ou ventilação mecânica invasiva); · Contra-indicações absolutas: obstrução mecânica digestiva; contra-indicações relativas: diarréia, vômitos, fístulas, aspiração (responsável por 40% da mortalidade). 4.3 Considerar nutrição parenteral se prognóstico e qualidade de vida justificarem. Desvantagens: necessita de internação hospitalar ou recursos domiciliares de enfermagem/médico, além de predispor à infecção. 4.4 Cálculo de macro e micronutrientes da dieta: deve ser baseado no cálculo de gasto de energia ou medido diretamente (em pacientes internados, calcular pela calorimetria indireta). 4.4.1 Cálculo do gasto de energia: · Determinar a taxa do metabolismo basal (TMB: 25 kcal/kg (adulto jovem); 20 kcal/kg (idosos), com aumento de 30 a 40% para pacientes doentes); · Determinar o nível de atividade como aumento fracionado da TMB + exercício de resistência como 25 a 50% de aumento; · Estimar o fator estressor (físico e/ou orgânico) por meio de tabelas pré-determinadas. Energia = TMB x fator atividade x fator estressor. 4.4.2 Necessidades de macronutrientes: 55 a 60% de carboidratos, 20 a 25% de gordura, 20 a 25% de proteínas: · Carboidratos: normal = 3,3 kcal/g (máximo tolerável: 7 a 8 g/kg/dia; preferir carboidratos complexos e não açúcares simples; aplicar insulina se glicemia > 250 mg/dL; diminuir o aporte se hiperglicemia severa); · Gordura: normal = 0,2 kcal/g (máximo de 2 g/ kg/dia); · ! proteína: normal = 0,8 g/kg/dia (adulto); 1 a 1,2 g/ kg/dia (idoso). Se albumina sérica de 3,5 a 2,7 g/dL = 1 a 1,5 g/kg/dia (déficit moderado). Se albumina sérica < 2,7 g/dL = 1 a 2,5 g/kg/dia (déficit severo). 4.4.3 Necessidades de micronutrientes: 5 a 10 vezes as necessidades basais/dia até correção do processo catabólico. Os antioxidantes, entre eles a glutationa feita de glutamina e a cisteína, têm grande importância, além de vitaminas C e E e do betacaroteno, associados aos co-fatores enzimáticos como zinco, manganês e cobre (vitamina C = 1 a 2 g; vitamina E = 400 a 1.000 UI; betacaroteno = 50 a 100 mg; cobre = 2 a 3 mg; manganês = 20 a 50 mg; selênio = 100 a 150 mcg; zinco = 5 mg). 4.5 Água: bom aporte de macro e micronutriente com aporte hídrico insuficiente leva a processamento baixo de nutrientes e pode acentuar o grau de desidratação e falência renal.Recomenda-se 1 a 1,5 mL/caloria consumida + reposição adicional das perdas por doença e medicações;30 a 35 mL/kg de peso; mínimo de 1.500 mL/dia. Alibhai et al. preconizam pesquisar 2 referências canadenses validadas para avaliação nutricional no idoso: Mini Nutritional Assessment e Nutrition Screening Initiative, criados pela American Academy of Family Physician associada à American Dietetic Association. 5 Intervenção medicamentosa Não existe suporte científico validado na literatura para a utilização de tratamento medicamentoso de emagrecimento involuntário, limitando-se apenas, na maioria das vezes, a estudos pequenos, sem casos-controle necessários, e com benefícios de pequeno e restrito ganho de peso, sem evidências de melhora na morbidade e na mortalidade ou melhora da qualidade de vida5. A maioria desses agentes induz efeitos colaterais importantes, particularmente em pacientes de alto risco, como idosos, fragilizados e desnutridos, limitando sua utilização. Porém, a terapêutica por meio de suplementação de macro e micronutrientes, sintomáticos quando indicados como analgésicos, ansiolíticos, antidepressivos, antieméticos, antidiarréicos, protetores gástricos e procinéticos (metoclopramida, domperidona) e anabolizantes são sugeridos na literatura na tentativa de melhorar a qualidade de vida. Depressão, independentemente da idade, sempre deve ser tratada, após afastar/tratar tireoidopatia pré-existente. As drogas anabolizantes/orexígenas mais estudadas são glicocorticóides, progesterona, derivados de testosterona, ornitina e derivados canabinóides, como dronabinol, nabilona. 5.1 Glicocorticóides: apesar do seu baixo custo, somente são utilizados para tratamento de doença específica, pois mesmo sendo orexígenos e produzindo sensação de “bem-estar” (euforia), pioram o catabolismo protéico e ósseo e aumentam o risco de infecções. 5.2 Progesterona acetato de megestrol: é associado a discreto ganho de peso e talvez de qualidade de vida em pacientes com HIV e neoplasias, porém aumenta predominantemente a gordura, e não a massa magra, o risco de tromboses e embolia, e retém água, produzindo edema, fatos que limitam sua utilização em idosos. 5.3 Oxoglutarato de ornitina: é uma enzima que catalisa a reação de L-ornitina+2-cetoácidos liberando glutamina, arginina e poliaminas. Tem efeito orexígeno e imunomodulador, principalmente via neutrófilo, e podem produzir discreto aumento de peso e melhora da qualidade de vida e apetite. 5.4 Dronabinol: é um canabinóide (tetrahidrocanabinol) indicado como antiemético e orexígeno. Volicer et al., em estudo randomizado em pacientes com Alzheimer que se recusavam a se alimentar, testaram o dronabinol e a cipro-heptadina (orexígeno anti-histamínico anti-serotoninérgico), constatando efeito orexígeno e antiemético, sem alteração da composição corpórea, porém com efeitos colaterais importantes no SNC (sistema nervoso central) e imunossupressores. 5.5 Hormônio de crescimento (GH): Chu et al. testaram GH recombinante em idosos caquéticos e obtiveram melhora do tempo de caminhada. Porém, sua utilização em outros estudos foi associada ao aumento da mortalidade. 5.6 Testosterona modificada: derivados de testosterona com configuração de 17-alfametil; drogas orais como oxandrolona e 17-beta-éster para administração parenteral foram sugeridos no tratamento da caquexia em aids, grandes queimados e feridas extensas e, mais raramente, idosos. Induzem aumento discreto de peso total e de massa magra, aumento de retenção de nitrogenados, aumento de síntese muscular e aparente melhora da qualidade de vida e do status funcional, porém, apresentam toxicidade hepática e retenção hídrica. Várias drogas anabolizantes estão sendo testadas, como outros androgênicos, orexígenos com terapias anticitocinas, neurotransmissores como monoaminérgicos hipotalâmicos, anticolecistocininas, análogos do neuropeptídeo Y, canabinóides e antileptina com resposta aparentemente promissora. Para o paciente idoso, preconiza-se identificar e tratar a causa específica associada a suporte nutricional. Sempre tratar depressão quando sintomática após afastar tireoidopatias e infeccções ou distúrbios metabólicos. A realimentação pode ser associada às drogas orexígenas no tratamento de má nutrição protéica, apesar de seu uso não estar totalmente comprovado na literatura, pois a avaliação precoce da nutrição e a prevenção de perda de peso durante o estresse e a hospitalização nos idosos são fatores que melhoram o prognóstico. Idoso fragil: definicao Em suas definições iniciais, o conceito de fragilidade era de natureza basicamente funcional, sendo classificados como frágeis aqueles idosos com dependências em variados graus. Classificou como frágeis as pessoas debilitadas, que não podiam sobreviver sem o auxílio de outros. Atualmente, definiram a fragilidade como uma síndrome de declínio espiral de energia, embasada por um tripé de alterações relacionadas com o envelhecimento, composto por sarcopenia, desregulação neuroendócrina e disfunção imunológica. Os idosos portadores desta tríade estariam propensos à redução acentuada da massa muscular e a um estado inflamatório crônico que, se associados a fatores extrínsecos como a incidência de doenças agudas ou crônicas, a imobilidade, a redução da ingestão alimentar e outros, levariam a um ciclo vicioso de redução de energia e aumento da dependência e suscetibilidade a agressores A realização do diagnóstico de fragilidade. Existem diversos instrumentos para o diagnóstico de fragilidade, alguns baseados na detecção da redução de reservas funcionais (p. ex., velocidade de marcha, força muscular), outros baseados na detecção de déficits funcionais e biológicos acumulados. Isto demonstra que ainda não existe consenso para a classificação de um idoso como frágil, e mesmo a diferenciação de diferentes graus de fragilidade. As manifestações da síndrome da fragilidade são perda de peso não intencional, fraqueza muscular, fadiga, redução da velocidade da marcha e redução do nível de atividade física. Idoso fragil: diagnostico Critérios diagnósticos Propuseram uma escala de sete itens, classificando o idoso desde “gravemente frágil” (“completamente dependente de outros para as atividades da vida diária, ou terminalmente enfermo”) a “muito apto” (“robusto, ativo, energético, bem motivado e apto). Os autores postulam que não existe, ainda, um claro mecanismo fisiopatológico comum para a fragilidade, e que a abordagem funcional torna esta condição mais direta e objetivamente detectável e abordável na prática clínica. Outras propostas para critérios diagnósticos receberam boa aceitação nos últimos anos, algumas por sua simplicidade de aplicação na prática diária, outras por visar aspectos de interesse dos serviços onde são empregadas. Os critérios mais frequentemente empregados compondo cinco diferentes critérios, apresentados no Quadro 90.1. Idosos portadores de três ou mais desses critérios são classificados como frágeis, idosos com um ou dois critérios, pré-frágeis, e idosos sem a presença destes critérios, não frágeis. DIAGNÓSTICO: 1. variável dependente: A Síndrome da Fragilidade foi identificada de acordo com os cinco critérios: 1) Perda de peso não intencional; 2) Exaustão avaliada por autorrelato de fadiga; 3) Diminuição da força de preensão manual; 4) Baixo nível de atividade física; e 5) Diminuição da velocidade de caminhada. Perda de peso: foi definida por meio do autorrelato da perda de peso não intencional (≥ 4,5kg ou ≥ 5% do peso corporal no ano anterior), sendo computado como critério de fragilidade os idosos que relataram essa perda. Baixa força muscular: Foi definida pelo teste de força de preensão manual (FPM).
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