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1 MÓDULO II: DISPNEIA, DOR TORÁCICA E EDEMAS ANA CAROLINA SILVA INÁCIO CAIRES, 2021.2 INSUFICIÊNCIA CARDÍACA FISIOLOGIA CARDÍACA O sistema cardiovascular é formado pelos vasos sanguíneos, artérias, veias, capilares e pelo coração. O coração é um órgão muscular, que realiza dois movimentos básicos: sístole (contração) e diástole (relaxamento), de acordo com a despolarização e repolarização de suas cargas elétricas intra e extracelulares, estimuladas por íons como: sódio, potássio, magnésio, cálcio. São conduzidas por um sistema nervoso próprio, capaz de produzir automaticamente seus estímulos elétricos, iniciados por células especializadas que formam o nódulo sinoatrial, localizado na parede posterior do átrio direito. ANATOMIA Sua divisão é conhecida como ápice, base e mais três faces: esternocostal, diafragmática e pulmonar. A base é formada pelos átrios direito e esquerdo. As veias cavas superior e inferior e as veias pulmonares penetram no coração pela base. É também a porção posterior do coração em posição anatômica. O ápice é contralateral a base e tem formato arredondado, formada pela parte inferolateral do ventrículo esquerdo e onde ocorre o batimento apical. Quanto às cavidades do coração, são subdivididas em quatro câmaras: átrios e ventrículos localizados à direita e à esquerda. Entre o átrio e ventrículo temos as valvas atrioventriculares, que impedem o refluxo do sangue, entre os ventrículos e a aorta e tronco pulmonar temos as valvas semilunares. HISTOLOGIA 3 camadas: pericárdio, miocárdio e endocárdio. O pericárdio é uma membrana fibroserosa em forma de bolsa, que recobre e protege o coração e raízes dos grandes vasos. Possui duas membranas: uma composta por tecido fibroso, ou seja, pericárdio fibroso e a membrana interna, chamada de pericárdio seroso e formada por duas lâminas (parietal e visceral). O miocárdio é a camada mais espessa do coração, sendo formado por fibras musculares e tecido conjuntivo fibroso, responsável pela sustentação da musculatura cardíaca. Esse tipo de músculo permite que o coração se contraia e, portanto, impulsione sangue ou o force para o interior dos vasos sanguíneos. A camada interna do coração é chamada de endocárdio, composta por tecido conjuntivo e epitelial, é responsável pela cobertura interna das paredes atriais e ventriculares. 2 MÓDULO II: DISPNEIA, DOR TORÁCICA E EDEMAS ANA CAROLINA SILVA INÁCIO CAIRES, 2021.2 CICLO CARDÍACO São os eventos que ocorrem desde o início de um batimento cardíaco até o seguinte, acontece em duas fases: sístole e diástole, ou seja, contração e relaxamento. O ciclo cardíaco é dividido em 5 etapas, sendo elas: diástole atrial e ventricular, sístole atrial, contração ventricular isovolumétrica, ejeção ventricular e relaxamento ventricular. Entender o ciclo é imaginar o coração como uma bomba que bate o tempo todo para manter o sangue circulando. Cada lado do coração bombeia sangue para um lado diferente, coração direito bombeia o sangue para a circulação pulmonar, onde o sangue será oxigenado; já o coração esquerdo bombeia o sangue para a circulação sistêmica e esse sangue retorna para o coração direito pelas veias cavas (superior e inferior). Para compreender os fenômenos que ocorrem, vamos começar pela sístole ventricular, que é quando os ventrículos estão cheios se sangue e começam a se contrair. A primeira fase da sístole é a contração isovolumétrica e o fluxo sanguíneo propicia o fechamento das valvas atrioventriculares, que impedem o refluxo para os átrios. Nessa fase, as valvas atrioventriculares se encontram fechadas, o sangue fica represado; mesmo assim, os ventrículos continuam a se contrair. Enquanto os ventrículos iniciam a contração, os átrios repolarizam e relaxam. Quando a contração ventricular alcança determinada pressão (no VE=80mmHg), as valvas semilunares se abrem permitindo a passagem do sangue que estava represado no interior dos ventrículos, dando inicio a fase de ejeção cardíaca, mas nem todo sangue do interior dos ventrículos é ejetado durante essa sístole (apenas cerca de 60%) = fração de ejeção cardíaca (é um índice da função cardíaca que ajuda a avaliar a contratilidade cardíaca na clinica), logo temos no final de cada sístole o volume sistólico final (aprox 50mL). As valvas em seguida se fecham, produzindo a 2ª bulha cardíaca. Após isso, os ventrículos começam a relaxar, relaxamento isovolumétrico, 1º fase da diástole cardíaca. E então o átrio que estava recebendo sangue esse tempo (sangue proveniente das veias cavas), faz pressão nas valvas AV e, com isso, elas se abrem e temos o enchimento ventricular. Volume diastólico final aprox 120mL. Cerca de 80% do enchimento ventricular ocorre de forma passiva, durante o relaxamento ventricular. A sístole atrial, portanto, é responsável por apenas 20% do enchimento dos ventrículos. O TUM e TA representam: TUM = 1ª bulha cardíaca, B1, que é o fechamento das valvas atrioventriculares (lembrando que essas valvas servem como mecanismo “antirrefluxo”, impedindo que o sangue retorne do ventrículo para atrio). TA = 2ª bulha, B2, fechamento das valvas semilunares. SISTEMA E REGULAÇÃO Mecanismos compensatórios: starling, SRAA, SNA. A quantidade de sangue que chega a cada batimento no coração é variável, o que chamamos de retorno venoso. O coração se adapta a esse volume que chega. Aqui entra o mecanismo de Frank-Starling, que é a capacidade intrínseca do coração de se adaptar às variações do retorno venoso. Quanto maior for o estiramento do músculo durante o enchimento cardíaco, maior será à força de contração e a quantidade de sangue bombeado pelo corpo. Para entendermos é só associar a uma mola: 3 MÓDULO II: DISPNEIA, DOR TORÁCICA E EDEMAS ANA CAROLINA SILVA INÁCIO CAIRES, 2021.2 Se pegarmos essa mola e esticar, ela solta ela volta para a conformação inicial e posso fazer isso ate um certo limite, pois quanto mais puxarmos mais energia será acumulada e mais rápido voltará, porem se passar desse limite a mola se deforma e não retorna mais. Na cardio, o nome que damos a essa força que estira a mola e acumula energia potencial ate que se solte, que é o estiramento do músculo cardíaco, pré- carga = força que estira as fibras musculares que estavam relaxadas, é o estresse na parede ventricular antes do inicio da contração. A pós-carga, podemos lembrar da contração isovolumétrica quando o ventrículo não possui pressão suficiente para superar a pressão da aorta, essa pressão da aorta que o ventrículo precisa vencer é a pós carga. Tudo que dificulta a ejeção ventricular faz parte da pós-carga. O principal fator é o tônus arteriolar periférico. A vasoconstrição arteriolar aumenta a pós-carga, enquanto a vasodilatação a reduz. SNA e SRAA = Inicialmente, a queda no débito cardíaco é percebida pelos barorreceptores periféricos que estimulam um aumento no tônus adrenérgico. A elevação da noradrenalina, além de seus efeitos cardiotrópicos, estimula diretamente a liberação renal de renina; contudo, o principal estímulo à ativação do sistema SRAA é a hipoperfusão renal, devido à diminuição do sódio filtrado que alcança a mácula densa e à hipodistensão da arteríola aferente glomerular... A angiotensina e a aldosterona, também possuem o efeito de estimular a produção (ou inibir a recaptação) de noradrenalina. DEBITO CARDIACO Debito cardíaco: volume de sangue ejetado por minuto, que depende do numero de batimento do coração por minuto. DC = FC X VS VS (volume sistólico) = VDF – VSF. DC esperado em um adulto sadio de 70kg é de aprox 5L/min. DC= 70x70 = 490 = aprox 500ml = 5L. Logo, quando há o aumento da frequência e/ou do volume sistólico, haverá também a elevação do débito cardíaco.OBS: ASSOCIAÇÃO DA FISIOLOGIA COM ELETRO Onda P = despolarização do átrio, por isso que vemos a contração do átrio. Complexo QRS= despolarização ventricular por isso q logo em seguida temos a contração ventricular. Onda T = repolarização ventricular, quando o V começa a relaxar. INTRODUÇÃO IC Insuficiência Cardíaca (IC) é quando o coração não consegue bombear o sangue de acordo com a demanda tecidual ou só o faz à custa de aumentos na pressão de enchimento (pressão diastólica final), decorrendo num conjunto de sinais e sintomas. EPIDEMIOLOGIA As doenças cardiovasculares são as principais causas de morte no Brasil e no mundo. No Brasil, só perde para o acidente vascular encefálico como maior causa de óbito. A maioria dos casos é devida à perda de massa miocárdica, cursando com dilatação e/ou hipertrofia compensatória do VE. FATORES DE RISCO 4 MÓDULO II: DISPNEIA, DOR TORÁCICA E EDEMAS ANA CAROLINA SILVA INÁCIO CAIRES, 2021.2 CLASSIFICAÇÃO DA IC LADO DO CORAÇÃO AFETADO Insuficiência Cardíaca Esquerda: decorrente da disfunção do “coração esquerdo”, geralmente por Insuficiência Ventricular Esquerda. São exemplos: infarto agudo do miocárdio, cardiopatia hipertensiva (por “sobrecarga” ventricular), miocardiopatia idiopática. Insuficiência Cardíaca Direita: decorrente da disfunção do “coração direito”, geralmente por Insuficiência Ventricular Direita (IVD). São exemplos: cor pulmonale (relacionado à DPOC, obesidade mórbida, pneumopatias, tromboembolismo pulmonar ou hipertensão arterial pulmonar primária), infarto do ventrículo direito e miocardiopatias. Insuficiência Cardíaca Biventricular: há tanto disfunção “esquerda” quanto “direita”. A maioria das cardiopatias que levam à insuficiência cardíaca inicia-se como IVE e posteriormente evolui com comprometimento do VD. Por isso se diz que a causa mais comum de IVD é a própria IVE. FRAÇÃO DE EJEÇÃO A principal terminologia usada historicamente para definir IC baseia-se na FEVE e compreende pacientes com FEVE normal (≥ 50%), denominada IC com fração de ejeção preservada (ICFEp), e aqueles com FEVE reduzida (< 40%), denominados IC com fração de ejeção reduzida (ICFEr). Por outro lado, pacientes com fração de ejeção entre 40 e 49% sempre foram considerados como “zona cinzenta da fração de ejeção” e não recebiam denominação específica. A diferenciação dos pacientes de acordo com a FEVE tem particular importância, uma vez que eles diferem em relação às suas principais etiologias, às comorbidades associadas e, principalmente, à resposta à terapêutica. GRAVIDADE A classificação funcional de acordo com a NYHA continua sendo a classificação usada para descrever e classificar a gravidade dos sintomas. Esta classificação se baseia no grau de tolerância ao exercício e varia desde a ausência de sintomas até a presença de sintomas mesmo em repouso. Ela permite avaliar o paciente clinicamente, auxilia no manejo terapêutico e tem relação com o prognóstico. PROGRESSÃO DA DOENÇA Enquanto a classificação segundo a NYHA valoriza a capacidade para o exercício e a gravidade dos sintomas da doença, a classificação por estágios da IC proposta pela American College of Cardiology/American Heart Association 5 MÓDULO II: DISPNEIA, DOR TORÁCICA E EDEMAS ANA CAROLINA SILVA INÁCIO CAIRES, 2021.2 ACC/AHA8 enfatiza o desenvolvimento e a progressão da doença. Esta classificação inclui desde o paciente com risco de desenvolver IC, cuja abordagem deve ser feita no sentido de prevenir seu desenvolvimento, quanto o paciente em estágio avançado da doença, que requer terapias específicas, como transplante cardíaco e/ou dispositivos de assistência ventricular. ETIOLOGIA FISIOPATOLOGIA A fisiopatologia da insuficiência cardíaca tem correlação com a alteração estrutural cardíaca, alteração genética associada a insuficiência valvar/coronariana, arritmias, alterações pulmonares, alterações eletrocardiográficas. A patologia é diferente nos pacientes com IC com fração de ejeção reduzida, no qual ocorre uma redução da demanda e da musculatura cardíaca através de um circulo vicioso de remodelamento, redução da contratilidade, aumento da hipertrofia, apoptose, fibrose, associados a alterações neuro-hormonais do sistema renina e vasoconstricção mediada por citocinas. Nos pacientes com fração de ejeção preservada, normalmente são pacientes que tem comorbidades, pacietnes mais idosos que tem alteração sistemica, que apresentam um remodelamento estrutural alterado. Em resumo: CORRELAÇÃO DOS PRINCIPAIS FATORES DE RISCO COM FISIOPATOLOGIA: HAS - IVE A HAS é uma doença que cursa com aumento da pós-carga por aumento da resistência vascular periférica, o coração fica sobrecarregado então precisa elevar a pressão produzida através da sístole para vencer a resistência dos vasos. Esse aumento distende os sarcômeros dos cardiomiócitos (alteração na forma e função) e os mecanismos de compensação (starling, SNA, SRAA) já não conseguem dar conta devido ao circulo vicioso de remodelamento (em que há redução da contratilidade + hipertrofia do músculo + apoptose + fibrose...). No caso da HAS, essa hipertrofia é concêntrica, que é quando a parede ventricular tem sua espessura aumentada sem aumentar a cavidade ventricular. Devido ao VE ser o que “mais trabalha”, a sobrecarga ventricular esquerda leva a sua falência, causando um aumento da pressão do enchimento deste ventrículo, o que diminui a eficácia da passagem do sangue do átrio esquerdo (AE) para o VE e causa aumento da 6 MÓDULO II: DISPNEIA, DOR TORÁCICA E EDEMAS ANA CAROLINA SILVA INÁCIO CAIRES, 2021.2 pressão no AE, dificultando o retorno do sangue da circulação pulmonar para o AE, resultando em dispneia aos esforços, dispneia paroxística noturna, ortopneia e tosse seca. A cardiomegalia é reflexo do quanto esse coração vem tentando compensar trabalhando muito, basta lembrarmos como somos na academia: malhamos para músculo crescer, não é mesmo? E o coração é um músculo, então quanto mais ele trabalha, mais cresce. TABAGISMO - IVE O tabaco elimina substancias que são agressoras ao edotélio, que provoca espessamento das artérias cardíacas e, com isso, uma maior vulnerabilidade ao acumulo de gordura, o que leva ao disfunção cardíaca. HISTÓRIA DE IAM O infarto deixa as paredes do coração mal perfundidas, pois a isquemia deixa de irrigar o local e, com isso, causa morte tecidual. IDADE Com o aumento da idade, temos um aumento da rigidez muscular cardíaca. Pois ocorre migração de células musculares lisas vasculares ativadas para dentro da camada íntima dos vasos arteriais, o que aumenta a produção de matriz extracelular. Estimulada pela angiotensina II, ocorre uma alteração na atividade de metaloproteinases de matriz, resultando em maior produção de colágeno e perda de fibras elásticas. Tais alterações resultam em dilatação e calcificação arterial e aumento da espessura da camada íntima, levando à rigidez vascular aumentada. Há também redução da produção de óxido nítrico pelo endotélio com o avançar da idade, resultando em resposta vasodilatadora reduzida em vasos coronarianos e periféricos. As respostas vasodilatadoras a compostos não derivados do endotélio, como aos nitratos, estão preservadas. Em relação ao miocárdio, o envelhecimento leva a mudanças em sua matriz extracelular. Todas essas alterações resultam em perda celular e alteração da função celular no miocárdio. DISLIPIDEMIA Predispõe a formação de trombos pela aterosclerose. IVD POR IVE A principal causa para IC direita é a IVE. A falência do ventrículo direito resulta em e congestão, em que o retorno da circulação sistêmica é dificultado e, com isso, o paciente apresenta edema em membros inferiores, turgência jugular, hepatomegaliae ascite. Essa hepatomegalia dolorosa é devido a distensão aguda da cápsula hepática. APRESENTAÇÃO CLÍNICA O paciente é assintomático durante vários anos, devido aos mecanismos adaptativos que mantêm o débito cardíaco normal ou próximo ao normal (starling, SNA, SRAA. Porém, após período de tempo variável e imprevisível, surgem os primeiros sintomas. SÍNDROME CONGESTIVA PULMONAR: na maioria das vezes, a insuficiência cardíaca se inicia por um comprometimento isolado do VE, que causa um aumento da pressão do enchimento deste ventrículo, o que diminui a eficácia da passagem do sangue do átrio esquerdo (AE) para o VE causa aumento da pressão no AE, dificultando o retorno do sangue da circulação pulmonar para o AE. Como resultado os pulmões se tornam congestos, com acúmulo de líquido intersticial e intra-alveolar. A congestão aumenta o trabalho respiratório e estimula os receptores J pulmonares, provocando a sensação de dispneia. Como as pressões de enchimento inicialmente se elevam durante o esforço, o sintoma clássico inicial é a dispneia aos 7 MÓDULO II: DISPNEIA, DOR TORÁCICA E EDEMAS ANA CAROLINA SILVA INÁCIO CAIRES, 2021.2 esforços. Alguns pacientes com congestão mais acentuada se queixam de dispneia ao decúbito dorsal, a ortopneia. O mecanismo envolve redistribuição de líquido, pelo decúbito, da circulação esplâncnica e dos membros inferiores para a circulação central (é comum a queixa de ser preciso mais de um travesseiro para conseguir dormir). Algumas vezes, o paciente é acordado no meio da madrugada por uma crise de franca dispneia, que melhora após alguns minutos em ortostatismo – é a Dispneia Paroxística Noturna (DPN) – geralmente relacionada à congestão pulmonar grave. Outro sintoma congestivo pode ser a tosse seca, pela congestão da mucosa brônquica. Congestão brônquica mais acentuada pode levar a um quadro semelhante ao broncoespasmo – a “asma cardíaca”. O extremo da congestão pulmonar é o Edema Agudo de Pulmão. Neste caso, o paciente apresenta intensa crise de taquidispneia e ortopneia, associada à insuficiência respiratória, às vezes com cianose central (hipoxemia grave). O paciente pode expectorar um líquido róseo, proveniente do edema alveolar abundante. O exame físico revela estertoração pulmonar audível acima da metade inferior dos hemitórax. Pode haver sibilos difusos (“asma cardíaca”). A radiografia de tórax mostra dilatação vascular nos ápices e infiltrado bilateral em “asa de borboleta” ou “de morcego”. SÍNDROME CONGESTIVA SISTÊMICA: com o avançar da disfunção de VE, há surgimento progressivo de hipertensão arterial pulmonar secundária. Com o tempo, o VD sobrecarregado acaba entrando em falência, instalando-se o quadro da insuficiência biventricular. A própria doença primária também pode acometer diretamente o miocárdio do VD. Neste momento aparece a síndrome de congestão sistêmica, podendo haver melhora da congestão pulmonar, pois chega menos sangue ao pulmão quando o VD está insuficiente. Os sintomas predominantes, nesse caso, serão os incômodos causados pela síndrome edemigênica e de congestão orgânica: edema de membros inferiores, bolsa escrotal, aumento do volume abdominal (ascite), dispneia por derrame pleural, dor abdominal em hipocôndrio direito devido à hepatomegalia congestiva. A congestão da mucosa intestinal pode levar à saciedade precoce, dor abdominal difusa, náuseas, diarreia e, em raros casos, enteropatia perdedora de proteína. A IVD reduz ainda mais o débito cardíaco, explicando o fato comum de haver piora dos sintomas de baixo débito na insuficiência cardíaca biventricular. SÍNDROME DE BAIXO DÉBITO: é mais comum e mais acentuada na IC sistólica. Aparece inicialmente aos esforços, devido à incapacidade do coração em aumentar o débito durante o esforço ou qualquer situação de estresse. Os sintomas se confundem com os de uma síndrome “geral”: fadiga muscular, indisposição, mialgia, cansaço, lipotímia. A maioria dos sintomas é secundária à inadequada perfusão muscular durante o esforço físico. CHOQUE CARDIOGÊNICO: é o extremo da insuficiência cardíaca, manifestação comum nas formas agudas graves (ex.: IAM anterior extenso) ou como fenômeno terminal da forma crônica de ICC. É definido clinicamente pelo estado de choque (hipoperfusão orgânica generalizada), associado à hipotensão grave (PA sistólica < 80 mmHg) que não responde à reposição volêmica. AO EXAME FÍSICO: presença da B3, que é auscultada na fase da desaceleração do enchimento rápido ventricular, é indicativo de insuficiência cardíaca. O sopro regurgitativo em foco mitral com irradiação para axila é causado por insuficiência mitral secundária à dilatação do VE. DIAGNÓSTICO ANAMNESE + EXAME FÍSICO Durante a anamnese se atentar aos fatores de risco apresentados pelo paciente, antecedentes, sintomas, estado geral. No exame físico, atentar ao estado geral, exame do aparelho cardio, pulmonar, abdome, observar sinais de hipovolemia. CRITÉRIOS DE FRAMINGHAM 8 MÓDULO II: DISPNEIA, DOR TORÁCICA E EDEMAS ANA CAROLINA SILVA INÁCIO CAIRES, 2021.2 Para o diagnostico da IC, precisa de pelo menos 2 criterios maiores ou 1 maior e 2 menores. PEPTÍDEOS NATRIURÉTICOS Dentre os diversos biomarcadores estudados em IC, destacam-se os peptídeos natriuréticos BNP e NT- proBNP, cujo papel no diagnóstico de IC está bem estabelecido. Apesar das evidências claramente favoráveis em relação ao BNP e ao NT-proBNP para o diagnóstico de IC, algumas limitações ao seu uso na prática clínica devem ser destacadas, pois estes peptídeos podem elevar-se na presença de anemia, insuficiência renal crônica (IRC) e idade avançada, e apresentar níveis mais baixos na presença de obesidade. Os peptídeos natriuréticos têm demonstrado ainda papel prognóstico em pacientes com IC. Embora não seja possível dispensar os exames de imagem para a confirmação diagnóstica em pacientes que apresentem sinais e sintomas sugestivos de IC, o uso dos peptídeos natriuréticos auxilia de forma considerável na definição do diagnóstico de IC, contribuindo principalmente para excluir o diagnóstico quando este é incerto. ECOCARDIOGRAMA É exame de imagem de escolha para o diagnóstico e o seguimento de pacientes com suspeita de IC. Permite a avaliação da função ventricular sistólica esquerda e direita, da função diastólica, das espessuras parietais, do tamanho das cavidades, da função valvar, da estimativa hemodinâmica não invasiva e das doenças do pericárdio. A ventriculografia radioisotópica pode ser útil em pacientes nos quais a janela ecocardiográfica não é adequada, embora ela tenha perdido grande espaço na prática clínica contemporânea. Outros exames de imagem, como a ressonância magnética e tomografia computadorizada, podem ser usados quando os não invasivos forem inconclusivos, ou para o diagnóstico de miocardiopatias específicas. ELETROCARDIOGRAMA A realização de eletrocardiograma (ECG) de 12 derivações é recomendada na avaliação inicial de todos os pacientes com IC, para avaliar sinais de cardiopatia estrutural como hipertrofia ventricular esquerda, isquemia miocárdica, áreas de fibrose, distúrbios da condução atrioventricular, bradicardia ou taquiarritmias, que podem demandar cuidados e tratamentos específicos. Vários destes aspectos são marcadores prognósticos em muitas cardiopatias, como na chagásica crônica. RX DE TÓRAX A radiografia simples do tórax, por sua simplicidade, rapidez de obtenção e ampla disponibilidade, é recomendada na avaliação inicial dos pacientes com sinais e sintomas de IC, para avaliação de cardiomegalia e congestão pulmonar. Porém, vale ressaltar que a sensibilidade do método é bastante limitada e, ainda, que a disfunção sistólica cardíaca significativa pode ocorrer sem cardiomegaliana radiografia de tórax EXAMES COMPLEMENTARES Laboratoriais: hemograma + eletrólitos + glicemia em jejum + função renal/hepática/tireoidiana + perfil lipídico. Servem não só para avaliar a presença e a gravidade de lesão de outros órgãos-alvo e detectar 9 MÓDULO II: DISPNEIA, DOR TORÁCICA E EDEMAS ANA CAROLINA SILVA INÁCIO CAIRES, 2021.2 comorbidades, mas também para verificar fatores agravantes do quadro clínico. A realização de exames seriados pode ser necessária para monitoração de variáveis de segurança, durante o tratamento da IC. Outros marcadores não utilizados de rotina podem ser úteis na avaliação de pacientes com IC. A dosagem de marcadores de injúria miocárdica, como troponinas T e I (incluindo as de alta sensibilidade), e de marcadores de inflamação e fibrose, como galectina-3 e ST2, pode adicionar informações prognósticas. ALGORÍTMO DIAGNÓSTICO AVALIAÇÃO PROGNÓSTICA TRATAMENTO TRATAMENTO FARMACOLÓGICO INIBIDORES DA ENZIMA CONVERSORA DA ANGIOTENSINA E BLOQUEADORES DOS RECEPTORES DA ANGIOTENSINA II Os IECA constituem um grupo de fármacos com comprovados benefícios na evolução de pacientes com ICFEr, tanto em relação à morbidade, como à mortalidade, além de conferirem melhora na qualidade de vida. Os bloqueadores dos receptores da angiotensina II (BRAs) são alternativa com eficácia comparável aos 10 MÓDULO II: DISPNEIA, DOR TORÁCICA E EDEMAS ANA CAROLINA SILVA INÁCIO CAIRES, 2021.2 IECA e estão indicados em pacientes intolerantes ou com alergia documentada a esta classe de fármacos. O uso concomitante de IECA implica aumento discreto, mas significativo de efeitos adversos. No entanto, a associação do IECA ao BRA deve ser evitada nos pacientes já em uso de antagonista mineralocorticoide pelo risco aumentado de hiperpotassemia e eventos adversos. BETABLOQUEADORES Os BB também são considerados fármacos de primeira linha no tratamento da ICFEr. BB são indicados também em pacientes com disfunção de VE assintomática, além de serem considerados fármacos de escolha para o controle de frequência ventricular em pacientes com ICFEr e FA crônica, embora existam evidências controversas sobre o impacto na redução de re- hospitalizações ou mortalidade cardiovascular neste cenário ANTAGONISTAS DOS RECEPTORES MINERALOCORTICÓIDES Os antagonistas dos receptores mineralocorticoides (espironolactona/eplerenona) estão indicados em pacientes sintomáticos com disfunção sistólica do VE, em classes funcionais II a IV da NYHA, associados ao tratamento padrão, apresentando efeitos contundentes sobre mortalidade e taxas de re-hospitalização. INIBIDORES DA NEPRILISINA E DOS RECEPTORES DA ANGIOTENSINA (SACUBITRIL/VALSARTANA) O sacubitril/valsartana representa uma nova classe terapêutica, que atua simultaneamente no sistema reninaangiotensina-aldosterona (SRAA) e na endopeptidase neutra (inibidor da neprilisina e do receptor da angiotensina − INRA). IVABRADINA A frequência cardíaca (FC) elevada é um marcador de eventos em IC, podendo ser considerada um alvo terapêutico. A ivabradina inibe seletivamente a corrente If no tecido do nó sinoatrial, reduzindo a FC. DIGITÁLICOS DIURÉTICOS DE ALÇA E TIAZÍDICOS Os diuréticos são a classe terapêutica mais largamente utilizada em pacientes com IC para alívio de congestão. Isto se justifica pelo óbvio efeito terapêutico ao provocar diurese e alívio da sobrecarga volêmica. No entanto, não há ECR que tenha demonstrado aumento de sobrevida com uso de diuréticos em pacientes com IC crônica ambulatorial. NITRATO E HIDRALAZINA A associação de nitrato e hidralazina foi a primeira estratégia vasodilatadora que demonstrou efeitos benéficos sobre desfechos clínicos em pacientes com IC. Embora tenha se mostrado inferior ao uso de IECAs,195 estudos posteriores sugeriram que poderiam existir diferenças raciais relacionadas à eficácia dos diferentes vasodilatadores usados no tratamento da IC.
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