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ESP EM RESOLUÇÃO DE CONFLITOS E PROCESSO CIVIL – BÁSICA Disciplina: Arbitragem Docente: Raphael Perucci Discente: Lindenberg Ferreira de Bastos Júnior RESOLUÇÃO DO CASO – N1 A empresa Iluminar Serviços de Engenharia Elétrica Ltda. celebrou contrato de adesão, incluindo cláusula compromissória, com a empresa Morar Bem Empreendimentos S.A., para prestar serviços de engenharia elétrica. Houve descumprimento de algumas cláusulas contratuais pela prestadora de serviços e consequente rescisão unilateral do contrato. A prestadora de serviços ingressou com ação declaratória com pedido subsidiário de perdas e danos, no Poder Judiciário, alegando: a) a rescisão unilateral abusiva; b) a cláusula compromissória deveria ser afastada, pois considerando a condição de hipossuficiência, há caracterização da nulidade contida no Art. 51, inciso VII, do Código de Defesa do Consumidor (CDC). Na contestação, foi alegado: a) em virtude da cláusula compromissória, a nulidade deve ser discutida no juízo arbitral. FONTE: BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso especial n° 1598220/RN 2016/0115824-0. Relator: Ministro Paulo de Tarso Sanseverino, 25 de junho de 2019. Jusbrasil, 2019. Disponível em: https://stj.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/442772919/tutprv-no-recurso-especial-tutprv- no-resp-1598220-rn-2016-0115824-0/decisao-monocratica-442772934. Acesso em: 5 out. 2020. Assim, tomando por base o caso apresentado, quem é competente para a apreciação de nulidade de cláusula compromissória? Forneça embasamento a sua resposta, com base na legislação vigente, do entendimento doutrinário majoritário e jurisprudencial. Qual é o entendimento atual do Supremo Tribunal de Justiça (STJ) sobre a (im)possibilidade de afastar cláusula compromissória, invocando o CDC e o princípio da hipossuficiência? Respostas: 1 ) Quem é competente para a apreciação de nulidade de cláusula compromissória? Forneça embasamento a sua resposta, com base na legislação vigente, do entendimento doutrinário majoritário e jurisprudencial. No caso exposto, não está se tratando de relação de consumo, devendo ser feito o mérito dentro do juízo arbitral. Como Juiz, o entendimento prevalecente na jurisprudência do STF, é que a parte interpretando ser nula a cláusula compromissória, deve arguir tal questão ante a Corte de Conciliação ajustada ao contrato celebrado. Como Árbitro, caso não acolha a nulidade pretendida é que a parte poderá recorrer ao Poder Judiciário, para que possa apurar a nulidade da sentença arbitral fundamentada na nulidade da cláusula compromissória. Solicitando que o mérito da lide passe a ser resolvida pelo Poder Judiciário. A orientação já pacificada do STF, segue o princípio da Kompetenz-Kompetenz (Competência- Competência). Segundo esse princípio, cabe ao juízo arbitral pronunciar-se acerca da validade da cláusula, antes que o juízo estatal possa se manifestar sobre a controvérsia. A Lei de Arbitragem (Lei 9.307/96), surge para sanar os conflitos nos casos que envolvam direitos disponíveis, não pairando dúvidas sobre a devida competência inicial do árbitro nas resoluções de conflito entre as partes sem que haja a participação do Poder Judiciário. Conforme destaca o § único do artigo 8º da mesma lei, não se encontra vez para questionar a competência inicial do árbitro para examinar a arguição de nulidade da cláusula compromissória: “Parágrafo único: Caberá ao árbitro decidir de ofício, ou por provocação das partes, as questões acerca da existência, validade e eficácia da convenção de arbitragem e do contrato que contenha a cláusula compromissória” Sobre esse tema, seguimos o ensinamento do mestre Luiz Antônio Scavone Júnior, que nos clarifica: “O significado do dispositivo, portanto, indica que qualquer alegação de nulidade do contrato ou da cláusula arbitral, diante de sua existência e seguindo o espírito da lei, deve ser dirimida pela arbitragem e não pelo Poder Judiciário. A lei pretendeu, neste sentido, "fechar uma brecha" que permitiria às partes, sempre que alegassem a nulidade da cláusula arbitral ou do contrato, ignorar o pacto de arbitragem e acessar o Poder Judiciário para dirimir o conflito. Em resumo, ainda que o conflito verse sobre a nulidade do próprio contrato ou da cláusula arbitral, a controvérsia deverá ser decidida inicialmente pela arbitragem e não pelo Poder Judiciário, ainda que as partes tenham resilido bilateralmente o contrato e a controvérsia verse sobre o distrato. Este foi o espírito da lei (mens legis).”¹ Somente será demanda a lide para o Poder Judicial, caso o árbitro acolha o pedido e declare a nulidade da cláusula compromissória, assim ele não será mais competente para julgar o pleito e irá classificar que a questão deverá ser julgada pelo Poder Judiciário, como prevê categoricamente o art. 20 da Lei de Arbitragem. “Art. 20. A parte que pretender arguir questões relativas à competência, suspeição ou impedimento do árbitro ou dos árbitros, bem como nulidade, invalidade ou ineficácia da convenção de arbitragem, deverá fazê-lo na primeira oportunidade que tiver de se manifestar, após a instituição da arbitragem. § 1º Acolhida a arguição de suspeição ou impedimento, será o árbitro substituído nos termos do art. 16 desta Lei, reconhecida a incompetência do árbitro ou do tribunal arbitral, bem como a nulidade, invalidade ou ineficácia da convenção de arbitragem, serão as partes remetidas ao órgão do Poder Judiciário competente para julgar a causa. ” Nesse sentido, é o entendimento do Egrégio Superior Tribunal de Justiça, conforme se verifica nas decisões jurisprudenciais adotadas, é de que a alegação de nulidade da cláusula compromissória, se faz necessário ser submetida em primeiro lugar à Jurisdição Arbitral, não podendo, nesse momento, o Poder Judiciário ser provocado para declarar a nulidade da convenção de arbitragem, tendo que ser enviado antes à Corte de Conciliação. Confira-se também os seguintes julgados do E. STJ: “A alegação de invalidade da cláusula arbitral e de incompetência do Juízo Arbitral não pode, com toda a certeza, ter sucesso. É que a matéria relativa a validade da cláusula arbitral deve ser apreciada, primeiramente, pelo próprio árbitro nos termos do artigo 8º da Lei de Arbitragem, sendo ilegal a pretensão da parte de ver declarada a nulidade da convenção de arbitragem pela jurisdição estatal antes da instituição do procedimento arbitral, vindo ao Poder Judicial sustentar defeitos de cláusula livremente pactuada pela qual se comprometeu a aceitar a via arbitral, de modo que inadmissível a prematura judicialização estatal da questão.” (REsp 1355831/SP, Rel. Ministro SIDNEI BENETI, TERCEIRA TURMA, julgado em 19/03/2013, DJe 22/04/2013) A integrante da turma julgadora, Ministra Nancy Andrigh, proferiu voto-vistas acrescentado ao voto do relator: “É ainda de se ressaltar que as questões a respeito da existência, validade e eficácia da convenção arbitral, de qualquer espécie, são matérias a serem apreciadas pelo árbitro, em primeiro lugar, nos termos do art. 8º, parágrafo único, e 20 da Lei nº 9.307/96. Trata-se da kompetenz-kompetenz (competência- competência), um dos princípios basilares da arbitragem, que confere ao árbitro o poder de decidir sobre a sua própria competência, sendo condenável qualquer tentativa, das partes ou do juiz estatal, no sentido de alterar essa realidade. ” Assim sendo, casa haja interesse de alguma das partes em solicitar pedido de declaração de nulidade da cláusula compromissória de arbitragem, esta deve ser questionada inicialmente na corte de conciliação e arbitragem, e, posteriormente, de forma subsidiária, tendo seu pedido não acolhido, é que poderá valer-se do Poder Judiciário para solicitar a declaração de nulidade da sentença arbitral, sendo fundamentado o pedido a nulidade da cláusula compromissória. ¹ - SCAVONE JÚNIOR, Luiz Antonio, Manualde Arbitragem, 4ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2010, p. 87 2) Qual é o entendimento atual do Supremo Tribunal de Justiça (STJ) sobre a (im)possibilidade de afastar cláusula compromissória, invocando o CDC e o princípio da hipossuficiência? De acordo com o entendimento do princípio Kompetenz-Kompetenz (Competência- Competência), não se pode afastar a cláusula compromissória que prevê arbitragem com base em regras do Código de Defesa do consumidor (CDC). Essas são as regras estabelecidas no artigo 8º da Lei 9.307/96, já que que antes de manifestação do Poder Judiciário, cabe ao juízo arbitral tal manifestação sobre a controvérsia. A Ministra Nancy Andrighi em decisão do Recurso Especial nº 1.753.041 se posicionou da seguinte maneira: “O art. 51, VII, do CDC limita-se a vedar a adoção prévia e compulsória da arbitragem, no momento da celebração do contrato, mas não impede que, posteriormente, diante de eventual litígio, havendo consenso entre as partes (em especial a aquiescência do consumidor), seja instaurado o procedimento arbitral.”³ Em seu voto, a Exma. Sra. Relatora Min. Nancy Andrighi expos seu entendimento: Da confrontação dos arts. 51, VII, do CDC e 4º, § 2º, da Lei 9.307/96, pode-se constatar que a suposta incompatibilidade entre os dispositivos legais é meramente aparente, não resistindo à aplicação do princípio da especialidade das normas, a partir do qual, sem grande esforço, pode-se concluir que o art. 4º, § 2º, da Lei de Arbitragem versou apenas acerca de contratos de adesão genéricos, subsistindo, portanto, a aplicação do art. 51, VII, do CDC, às hipóteses em que o contrato, mesmo que de adesão, regule uma relação de consumo. Na realidade, com a promulgação da Lei de Arbitragem, passaram a conviver, em harmonia, três regramentos de diferentes graus de especificidade: i) a regra geral, que obriga a observância da arbitragem quando pactuada pelas partes; ii) a regra específica, aplicável a contratos de adesão genéricos, que restringe a eficácia da cláusula compromissória; e iii) a regra ainda mais específica, incidente sobre contratos sujeitos ao CDC, sejam eles de adesão ou não, impondo a nulidade de cláusula que determine a utilização compulsória de arbitragem, ainda que satisfeitos os requisitos do art. 4º, § 2º, da Lei 9.307/96. (RECURSO ESPECIAL Nº 1.753.041 - GO (2018/0171648-9) RELATORA : MINISTRA NANCY ANDRIGHI)³ Não se pode seguir o caminho da declaração de hipossuficiência para aplicar as regras do CDC para afastar a prevalência da cláusula arbitral. O Ministro Paulo de Tarso Sanseverino do TJRN ainda complementa: "Essa decisão apresenta-se frontalmente contrária à linha jurisprudencial desta Corte Superior, que interpreta a norma extraída do parágrafo único do artigo 8º da Lei de Arbitragem como de caráter obrigatório e vinculante, derrogando-se a jurisdição estatal"⁴ A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ) no sentido da impossibilidade de afastamento do princípio competência-competência foi reafirmada pela Terceira Turma. O STJ parece ter seguido o entendimento já adotado pela Court de Cassation Francesa¹ no sentido de que, para que se respeite o princípio da competência-competência, “deveria o árbitro se pronunciar, primeiro, a respeito da configuração do estado de insolvência suficiente para impedir o acesso à arbitragem”². Assim, ainda de acordo com o Ministro Sanseverino, manifestada hipossuficiência pela parte, não é razão suficiente para afastar os efeitos da cláusula de arbitragem celebrada entre as partes no contrato, válido e eficaz. “Ressalte-se que o contrato, mesmo padronizado, foi pactuado entre duas empresas que atuam no complexo ramo de atividades de exploração energética de gás, não sendo possível o reconhecimento da hipossuficiência de qualquer delas para efeito de aplicação analógica do CDC, embora possa existir uma assimetria entre elas” ⁴ ¹ - FRANÇA. Cour d’appel de Paris. SARL Lola Fleur c. Société Morceau Fleur et al. Paris, 26 de fevereiro de 2013. In: Revue de L’Arbitrage, issue 3, 2013, p. 749-751 ² - FILHO, Clávio Valença. Arbitragem e falência: o mito da inarbitrabilidade superveniente e a legitimidade da massa para o processo arbitral. In: Revista de Direito Empresarial, Sâo Paulo: Revista dos Tribunais, vol. 12, nov./dez., 2015, p. 269-270 ³ - https://www.conjur.com.br/dl/arbitragem-nao-prevalece-consumidor-nao.pdf - acessado em 12/01/2021 ⁴- https://www.stj.jus.br/sites/portalp/Paginas/Comunicacao/Noticias/Regras-do-CDC-nao-podem-ser-usadas-para- afastar-clausula-compromissoria-que-preve- arbitragem.aspx#:~:text=%E2%80%8B%E2%80%8BN%C3%A3o%20%C3%A9%20poss%C3%ADvel,Arbitragem%2C%2 0cabe%20ao%20ju%C3%ADzo%20arbitral – acessado em 11/01/2021 https://www.conjur.com.br/dl/arbitragem-nao-prevalece-consumidor-nao.pdf https://www.stj.jus.br/sites/portalp/Paginas/Comunicacao/Noticias/Regras-do-CDC-nao-podem-ser-usadas-para-afastar-clausula-compromissoria-que-preve-arbitragem.aspx#:~:text=%E2%80%8B%E2%80%8BN%C3%A3o%20%C3%A9%20poss%C3%ADvel,Arbitragem%2C%20cabe%20ao%20ju%C3%ADzo%20arbitral https://www.stj.jus.br/sites/portalp/Paginas/Comunicacao/Noticias/Regras-do-CDC-nao-podem-ser-usadas-para-afastar-clausula-compromissoria-que-preve-arbitragem.aspx#:~:text=%E2%80%8B%E2%80%8BN%C3%A3o%20%C3%A9%20poss%C3%ADvel,Arbitragem%2C%20cabe%20ao%20ju%C3%ADzo%20arbitral https://www.stj.jus.br/sites/portalp/Paginas/Comunicacao/Noticias/Regras-do-CDC-nao-podem-ser-usadas-para-afastar-clausula-compromissoria-que-preve-arbitragem.aspx#:~:text=%E2%80%8B%E2%80%8BN%C3%A3o%20%C3%A9%20poss%C3%ADvel,Arbitragem%2C%20cabe%20ao%20ju%C3%ADzo%20arbitral https://www.stj.jus.br/sites/portalp/Paginas/Comunicacao/Noticias/Regras-do-CDC-nao-podem-ser-usadas-para-afastar-clausula-compromissoria-que-preve-arbitragem.aspx#:~:text=%E2%80%8B%E2%80%8BN%C3%A3o%20%C3%A9%20poss%C3%ADvel,Arbitragem%2C%20cabe%20ao%20ju%C3%ADzo%20arbitral
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