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Regulação da respiração por Aphysio A respiração é um processo rítmico que normalmente ocorre sem o pensamento consciente ou consciência. Nesse aspecto, assemelha-se ao batimento rítmico do coração. Contudo, os músculos esqueléticos, ao contrário do músculo cardíaco auto-excitável, não são capazes de se contrair espontaneamente. Em vez disso, a contração do músculo esquelético precisa ser iniciada pelos neurônios motores somáticos, os quais, por sua vez, são controlados pelo sistema nervoso central. No sistema respiratório, a contração do diafragma e de outros músculos é iniciada por uma rede de neurônios no tronco encefálico, que dispara potenciais de ação espontaneamente. A respiração ocorre automaticamente por toda a vida de uma pessoa, mas também pode ser controlada voluntaria-mente até certo ponto. A presença de interações sinápticas com-plicadas entre neurônios cria os ciclos rítmicos de inspiração e expiração. Esses neurônios são influenciados continuamente por estímulos sensoriais, principalmente a partir de quimiorreceptores que detectam CO2, O2 e H+. O padrão ventilatório depende, em grande parte, dos níveis dessas três substâncias no sangue arterial e no líquido extracelular. O controle neural da respiração é uma das poucas “caixas pretas” que permanece na fisiologia dos sistemas. De todos os modelos postados na página para a explicação dos sistemas fisiológicos, o modelo para o controle neural da respiração é o que mais mudou nos últimos 15 anos. Conhecemos as principais regiões do tronco encefálico que estão envolvidas, mas os detalhes das redes neurais ainda são desconhecidos. A rede neural do tronco encefálico que controla a respiração se comporta como um gerador de padrão central, com atividade rítmica intrínseca, que provavelmente é decorrente de neurônios marca-passo com potenciais de membrana instáveis. As entradas sensoriais derivadas de alterações do CO2 e de outros quimiorreceptores aumenta essa complexidade. Parte do nosso conhecimento de como a ventilação é controlada veio da observação de pacientes com lesão encefálica. Outras informações vieram de experimentos realizados com animais, nos quais as conexões neurais entre as partes principais do tronco encefálico são seccionadas, ou partes do encéfalo são estudadas isoladamente. As pesquisas sobre o controle respiratório exercido pelo SNC são difíceis de serem executadas devido à complexidade das redes neurais e às suas localizações anatômicas. Nos últimos anos, os cientistas melhoraram as técnicas para o estudo desse sistema. Os detalhes que se seguem representam o modelo contemporâneo do controle da ventilação. Embora algumas partes do modelo sejam bem fundamentadas com evidências experimentais, outros aspectos estão ainda sob investigação. Este modelo estabelece que: 1. Os neurônios respiratórios do bulbo controlam músculos inspiratórios e expiratórios. 2. Os neurônios da ponte integram informações sensoriais e interagem com neurônios bulbares para influenciar a ventilação. 3. O padrão rítmico da respiração surge de uma rede do tronco encefálico com neurônios que despolarizam auto-maticamente. 4. A ventilação está sujeita à modulação contínua por vários reflexos associados a quimiorreceptores, mecanorreceptores e por centros encefálicos superiores. A entrada sensorial proveniente dos quimiorreceptores centrais e periféricos modifica a ritmicidade da rede de controle para ajudar a manter a homeostasia dos gases sanguíneos. O dióxido de carbono é o estímulo primário para as mudanças na ventilação. O oxigênio e o pH do plasma desempenham um papel menos importante. Os quimiorreceptores sensíveis ao oxigênio e ao dióxido de carbono estão estrategicamente associados à circulação arterial. Se muito pouco oxigênio estiver presente no sangue arterial destinado ao encéfalo e a outros tecidos, a frequência e a amplitude da respiração aumentam. Se a produção de CO2 pelas células exceder a sua taxa de remoção de CO2 pelos pulmões, a PCO2 arterial aumenta, e a ventilação é intensificada com o objetivo de eliminar o CO2. Esses reflexos homeostáticos operam constantemente, mantendo a PO2 e PCO2 a arterial dentro de uma faixa estreita de normalidade. Os quimiorreceptores periféricos enviam para o SNC informações sensoriais sobre as mudanças na PO2, no pH e na PCO2 plasmática. Os corpos carotídeos nas caróti-das são os quimiorreceptores periféricos primários. Eles estão localizados perto dos barorreceptores, estruturas envolvidas no controle reflexo da pressão arterial. Os quimiorreceptores centrais respondem a alterações na concentração de CO2 no líquido cerebrospinal. Os receptores centrais primários estão na superfície ventral do bulbo, perto dos neurônios envolvidos no controle respiratório. O controlador químico mais importante da ventilação é o dióxido de carbono, percebido tanto pelos quimiorreceptores periféricos quanto pelos quimiorreceptores centrais, localizados no bulbo. Esses receptores ajustam o ritmo respiratório, fornecendo um sinal de entrada contínuo para a rede de controle. Quando a PCO2 arterial aumenta, o CO2 atravessa a barreira hematencefálica e ativa os quimiorreceptores centrais. Esses receptores sinalizam para a rede neural de controle da respiração, provocando um aumento na frequência e na profundidade da ventilação, melhorando, assim, a ventilação alveolar e a remoção de CO2 do sangue. Apesar de dizermos que os quimiorreceptores centrais monitoram o CO2, eles respondem diretamente às mudanças de pH no líquido cerebrospinal (LCS). O dióxido de carbono que se difunde através da barreira hematencefálica é convertido em ácido carbônico, que se dissocia em bicarbonato e em H+. Estudos indicam que o H+ produzido por essa reação inicia o reflexo quimiorreceptor. Observe, no entanto, que as mudanças plasmáticas do pH não costumam influenciar os quimiorreceptores centrais diretamente. Embora a PCO2 plasmática influencie diretamente o LCS, o H+ plasmático atravessa a barreira hematencefálica muito lentamente e, portanto, tem pouco efeito direto sobre os quimiorreceptores centrais. Quando a PCO2 plasmática aumenta, os quimiorreceptores inicialmente respondem fortemente, aumentando a ventilação. No entanto, se a PCO2 permanece elevada durante vários dias, a ventilação cai devido à resposta adaptativa dos quimiorreceptores. A adaptação parece ser devida ao aumento das concentrações de bicarbonatono LCS, que exerce um papel importante na neutralização do H+. O mecanismo pelo qual a concentração do bicarbonato aumenta ainda não está bem esclarecido. Mesmo que a resposta dos quimiorreceptores centrais sofra adaptação em situações em que a PCO2 se encontra cronicamente elevada, a resposta dos quimiorreceptores periféricos à queda da PO2 arterial permanece intacta ao longo do tempo. Em algumas situações, a redução na PO2 torna-se o estímulo químico primário para o aumento da ventilação. Por exemplo, pacientes com doença pulmonar crônica grave, como a DPOC, apresentam hipercapnia e hipóxia crônicas. A sua PCO2 arterial pode aumentar para 50 a 55 mmHg (a faixa normal é entre 35-45), ao passo que a sua PO2 pode cair para 45 a 50 mmHg (a faixa normal é entre 75-100). Uma vez que as concentrações sejam modificadas cronicamente, a resposta dos quimiorreceptores adapta-se à elevada PCO2. A maior parte do estímulo químico para o aumento da ventilação nesta situação se deve à diminuição da PO2, detectada pelos quimiorreceptores do corpo carotídeo. Se é dado muito oxigênio a estes pacientes, eles podem parar de respirar, visto que o seu estímulo químico para a ventilação é eliminado. Os quimiorreceptores centrais respondem a diminuições ou a aumentos da PCO2 arterial. Se a PCO2 alveolar cair, como ocorre durante a hiperventilação, tanto a plasmática quanto a do LCS também cairão. Como consequência, a atividade dos quimiorreceptores centrais diminui, e a rede de controle diminui a frequência da ventilação. Quando a ventilação diminui, o dióxido de carbono começa a acumular-se nos alvéolos e no plasma. Eventualmente, a PCO2 arterial ultrapassa o limiar para disparo dos quimiorreceptores. Neste ponto, os receptores disparam, e a rede de controle aumenta novamente a ventilação. Quando as células especializadas tipo 1 ou células glomais nos corpos carotídeos são ativadas por uma diminuição na PO2 ou no pH ou por um aumento da PCO2, elas desencadeiam um aumento reflexo da ventilação. Na maioria das circunstâncias normais, o oxigênio não é um fator importante na modulação da ventilação. Para que seja visualizada alguma modificação no padrão ventilatório normal, a PO2 arterial deve cair para menos de 60 mmHg an-tes de a ventilação ser estimulada. Esta grande diminuição da PO2 é equivalente a uma subida até uma altitude de 3.000 m. (Para referência, Denver localiza-se a uma altitude de 1.609 m). No entanto, qualquer condição que reduza o pH plasmático ou aumente a PCO2 ativará as células glomais das carótidas e da aorta, aumentando a ventilação. Os detalhes da função das células glomais ainda não são compreendidos, mas o mecanismo básico pelo qual estes quimiorreceptores respondem à baixa quantidade de oxigênio é similar ao mecanismo de liberação da insulina pelas células β-pancreáticas ou da transdução do gosto nos botões gustatórios. Em todos os três exemplos, um estímulo inativa os canais de K+, causando a despolarização da célula receptora. A despolarização abre canais de Ca2+ dependentes de voltagem, e a entrada de Ca2+ provoca a exocitose de neurotransmissores para o neurônio sensorial. Nos corpos carotídeos, os neurotransmissores iniciam potenciais de ação nos neurônios sensoriais, os quais conduzem a atividade elétrica às redes neurais respiratórias no tronco encefálico, sinalizando para que haja um aumento na ventilação. As concentrações arteriais de oxigênio não desempenham um papel na regulação diária da ventilação, uma vez que os quimiorreceptores periféricos respondem apenas a mudanças críticas na PO2 arterial. No entanto, em condições fisiológicas in-comuns, como a grande altitude, e em algumas condições pato-lógicas, como a doença pulmonar obstrutiva crônica (DPOC), a redução da PO2 arterial pode ser suficientemente baixa para ativar os quimiorreceptores periféricos. Processos mentais conscientes ou inconscientes também afetam a atividade respiratória. Os centros superiores no hipotálamo e no cérebro podem alterar a atividade da rede de controle no tronco encefálico para mudar a frequência e a amplitude da ventilação. O controle voluntário da ventilação está incluído nesta categoria. Entretanto, o controle exercido pelos centros superiores não é uma condição para que a ventilação seja mantida. Mesmo que o tronco encefálico acima da ponte seja gravemente lesado, os ciclos respiratórios continuam essencialmente normais. A respiração também pode ser afetada pela estimulação de partes do sistema límbico. Por essa razão, atividades emocionais e autonômicas, como medo e excitação, podem afetar o ritmo e a amplitude da respiração. Em algumas dessas situações, as vias neurais vão diretamente para os neurônios motores somáticos, desviando da rede de controle no tronco encefálico. Embora possamos alterar temporariamente nosso desempenho respiratório, não podemos suprimir os reflexos quimiorreceptores. Prender a respiração é um bom exemplo. Você pode prender a respiração voluntariamente até que a PCO2 se eleve no LCS, ativando o reflexo quimiorreceptor, forçando-o a inspirar. Crianças pequenas que têm acessos de raiva às vezes tentam manipular seus pais ameaçando prender a respiração até morrer. Entretanto, os reflexos quimiorreceptores tornam impossível para a criança pôr em prática essa ameaça. Crianças extremamente decididas podem continuar a segurar a respiração até ficarem azuis e desmaiarem por hipóxia, mas uma vez estando inconscientes, a respiração normal automaticamente retorna. A respiração está intimamente associada à função cardiovascular. Os centros integradores para ambas as funções estão localizados no tronco encefálico, e interneurônios projetam-se entre as duas redes, permitindo a sinalização de um lado para o outro. Os sistemas circulatório, respiratório e renal funcionam em sincronia, a fim de manter a homeostasia dos fluidos e o equilíbrio ácido-básico. Referências ● Tratado de Fisiologia Médica - Guyton - 13ª Edição - 2017 ● Fisiologia - Berne & Levy - 6ª Edição - 2009 ● Fisiologia Humana - Uma Abordagem Integrada - Silverthorn- 7ª Edição - 2017 ● Fisiologia - Margarida Aires - 4ª Edição - 2012 ● Fisiologia Médica - Boron - 2ª Edição - 2015 ● Fisiologia Básica - Rui Curi - 1ª Edição - 2009 ● Fisiologia Médica - Ganong - 24ª Edição - 2014 QUESTÃO DA AULA Paciente chega ao hospital municipal, e exames mostram pCO2=55 mmHg, e pO2=45 mmHg. Médico plantonista se apressapara corrigir a gasometria, e administra alta quantidade de oxigênio neste paciente. Rapidamente, o paciente apresenta parada respiratória, e o médico é avisado que o paciente possui DPOC grave. O oxigênio é imediatamente cessado, em tempo de não causar danos ao paciente. Por que administrar oxigênio causou parada respiratória no paciente? A DPOC é caracterizada por uma obstrução das vias respiratórias e um consequente aumento em sua resistência. O paciente com DPOC necessita de maior pressão para manter o mesmo fluxo de ar, ao ministrar oxigênio para este paciente ele entra em estado de hiperóxia, pois estão adaptados a uma menor disponibilidade de oxigênio e quando expostos a um maior nível do gás, promove uma descompensação deste equilíbrio e a diminuição brusca da concentração de CO2. Em pacientes sem DPOC a administração de oxigênio gera uma hiperinsuflação pulmonar, para o aumento das trocas gasosas, mas no caso do paciente com DPOC que já tem essa hiperinsuflação pulmonar devido a doença causa a parada respiratória. Os quimiorreceptores centrais conseguem se adaptar à situação de hipercapnia crônica dos pacientes com DPOC e não serão mais capazes de promover um aumento na frequência ventilatória desses pacientes, dessa forma, os quimiorreceptores periféricos, que não se adaptam à situação de hipóxia, serão o estímulo principal para a ventilação dos pacientes com DPOC. A administração de oxigênio pode causar parada respiratória nos pacientes com DPOC pois irá promover a desativação do principal estímulo químico para a ventilação dos pacientes, que é a diminuição dos níveis de O2, sem esse estímulo o paciente terá uma parada respiratória porque os quimiorreceptores centrais não irão promover a ventilação pois estão adaptados à hipercapnia e os quimiorreceptores periféricos não irão promover também pois os níveis de O2 estarão elevados devido à administração de oxigênio para o paciente.
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