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Abdome Agudo Inflamatório II

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ABDOME AGUDO INFLAMATÓRIO II 
ANATOMIA E FISIOLOGIA DAS VIAS BILIARES: 
VIAS BILIARES: 
A árvore biliar é composta por ductos que coletam a bile do parênquima 
hepático e a transportam até́ a parte descendente do duodeno. De 
maneira geral, ela é dividida em: intra-hepática e extra-hepática. Os ductos 
intra-hepáticos têm origem nos canalículos biliares maiores, que se reúnem 
e formam os ductos segmentares, os quais se fundem próximo da porta do 
fígado, dando origem aos ductos hepáticos direito e esquerdo. A porção 
extra-hepática é constituída pelos ductos hepáticos direito e esquerdo, pelo 
ducto hepático comum, pelo ducto cístico, pela vesícula biliar e pelo ducto 
colédoco. 
 
ÁRVORE BILIAR INTRA-HEPÁTICA: 
Composta pelos ductos segmentares e setoriais, responsáveis pela 
formação dos ductos hepáticos, sendo que o ducto hepático esquerdo é 
formado pela união dos ductos dos segmentos II e III, e, geralmente, do 
segmento IV também. Já́ o ducto hepático direito é formado pela união 
dos ductos setoriais medial e lateral direitos, os quais são formados por 
ductos segmentares, provenientes dos segmentos VI, VII, V e VIII. 
ÁRVORE BILIAR EXTRA-HEPÁTICA: 
• Ducto cístico: é o ducto responsável por drenar o conteúdo da vesícula 
biliar para o ducto colédoco. Possui de 3 – 4 cm de comprimento, emerge 
do colo da vesícula biliar, se une ao ducto hepático comum e forma o 
ducto colédoco. No geral, essa junção entre o ductos cístico e o hepático 
comum ocorre ao nível da porta hepática. 
• Ductos biliares hepáticos: são os ductos hepáticos direito e esquerdo, que 
emergem do fígado e fundem-se próximo da extremidade direita da porta 
do fígado, formando o ducto hepático comum. O ducto hepático comum 
está localizado à direita da artéria hepática e é anterior à veia porta na 
margem livre do omento menor. 
• Ducto colédoco: formado próximo da porta do fígado pela junção dos 
ductos cístico e hepático comum. No geral, possui de 6 – 8 cm de 
comprimento e tem por volta de 6mm de diâmetro. O colédoco penetra 
junto com os ductos pancreáticos na parede duodenal, formando a 
ampola hepato-pancreática, também conhecida como papila de Vater 
onde está́ situado o esfíncter de Oddi. 
• Trígono cisto-hepático (deCalot): é um espaço triangular formado entre o 
ducto cístico, o ducto hepático comum e a superfície inferior do segmento 
V do fígado. Trata-se de um importante marco anatômico, pois é nesse 
espaço onde passa a artéria cística, próximo a vesícula biliar; o linfonodo 
cístico e os vasos linfáticos que deixam a vesícula; uma ou duas veias císticas 
pequenas; os nervos autônomos que seguem para a vesícula; e um pouco 
de tecido adiposo frouxo. 
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VESÍCULA BILIAR: 
É um divertículo em forma de cantil, com fundo cego, ligado ao ducto 
colédoco por intermédio do ducto cístico, estando, geralmente, preso à 
face inferior do lobo hepático direito por tecido conjuntivo. No adulto, ela 
tem cerca de 7 – 10 cm de 
comprimento e uma capacidade de 
armazenamento de até 50ml. No 
geral, está em uma fossa rasa no 
parênquima hepático, sendo coberta 
pelo peritônio. É descrita como um 
órgão constituído por: fundo, corpo e 
colo, sendo que o colo está́ na 
extremidade medial, perto da porta 
do fígado e quase sempre está preso 
a ele por uma conexão curta coberta 
por peritônio, o mesentério, o qual, no 
geral, contém a artéria cística. Na extremidade lateral, o colo se alarga 
para formar o corpo da vesícula biliar, conhecido também como bolsa de 
Hartmann. 
SECREÇÃO E COMPOSIÇÃO DA BILE: 
A bile formada nos lóbulos hepáticos é secretada para dentro de uma 
complexa rede de canalículos, pequenos dúctulos biliares e ductos biliares 
maiores que se deslocam juntamente com linfáticos e ramos da veia porta 
e da artéria hepática nos tratos portais localizados entre os lóbulos 
hepáticos. Esses ductos biliares inter-lobulares coalescem para formar 
ductos biliares septais maiores que se unem para formar os ductos hepáticos 
direito e esquerdo, os quais, por sua vez, se unem para formar o ducto 
hepático comum. Este último é alcançado pelo ducto cístico da vesícula 
biliar para formar o ducto colédoco (DC), que penetra no duodeno (na 
maioria das vezes, após unir-se ao ducto pancreático principal) pela 
ampola de Vater. 
A bile hepática é um líquido isotônico com uma composição eletrolítica 
semelhante à do plasma. A composição eletrolítica da bile vesicular difere 
daquela da bile hepática, pois a maioria dos ânions inorgânicos, cloreto e 
bicarbonato, já foi removida pela reabsorção por meio do epitélio da 
vesícula. Como resultado da reabsorção da água, a concentração total de 
solutos na bile aumenta de 3 a 4 g/dL na bile hepática para 10 a 15 g/dL na 
bile da vesícula. 
Os principais solutos da bile, por moles percentuais, consistem em ácidos 
biliares (80%), lecitina e traços de outros fosfolipídeos (16%), além de 
colesterol não esterificado (4%). No estado litogênico, o valor do colesterol 
pode alcançar níveis de até 8 a 10%. Outros componentes incluem a 
bilirrubina conjugada, proteínas (todas as imunoglobulinas, a albumina, os 
metabólitos de hormônios e outras proteínas metabolizadas no fígado), 
eletrólitos, muco e, com frequência, medicamentos e seus metabólitos. A 
secreção basal diária total de bile hepática é de cerca de 500 a 600 mL. 
Muitas substâncias captadas ou sintetizadas pelos hepatócitos são 
secretadas nos canalículos biliares. 
A membrana canalicular forma microvilosidades e está associada a 
microfilamentos de actina, microtúbulos e outros elementos contráteis. 
Antes de sua secreção para dentro da bile, muitas substâncias são 
captadas e penetram o hepatócito, enquanto outras, como os 
fosfolipídeos, parte dos ácidos biliares primários e do colesterol, são 
sintetizadas de novo no hepatócito. Três mecanismos são importantes na 
regulação do fluxo da bile: 
1) Transporte ativo dos ácidos biliares dos hepatócitos para dentro dos 
canalículos biliares; 
2) Transporte ativo de outros ânions orgânicos; 
3) Secreção colangiocelular. 
Esta última é um mecanismo mediado pela secretina e depende do AMP 
cíclico, resultando na secreção de um líquido rico em sódio e bicarbonato 
que é lançado nos ductos biliares. A secreção vetorial ativa dos 
componentes biliares do sangue portal para o interior dos canalículos é 
acionada por um conjunto de sistemas de transporte polarizados ao nível 
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dos domínios das membranas plasmáticas basolateral (sinusoidal) e apical 
canalicular do hepatócito. 
Dois sistemas de captação dos sais biliares sinusoidais foram clonados em 
humanos, o cotransportador de Na+/taurocolato (NTCP, de 
Na+/taurocholate cotransporter, SLC10A1) e as proteínas transportadoras 
de ânions orgânicos (OATP, de organic anion transporting proteins), que 
transportam também uma grande variedade de ânions orgânicos 
diferentes dos sais biliares. Foram identificados diversos sistemas de 
transporte canaliculares dependentes de ATP, as denominadas “bombas 
de exportação” (proteínas de transporte de cassetes de ligação de ATP, 
também conhecidas como transportadores ABC), das quais as mais 
importantes são a bomba de exportação de sais biliares (BSEP, ABCB11); a 
bomba de exportação de conjugados aniônicos (MRP2, ABCC2), que 
medeia a excreção canalicular de vários conjugados anfifílicos formados 
pela conjugação da fase II (p. ex., mono e diglucuronídeos de bilirrubina e 
medicamentos); a bomba de exportação de múltiplos fármacos (MDR1, 
ABCB1) para os compostos catiônicos hidrofóbicos; e a bomba de 
exportação de fosfolipídeos (MDR3, ABCB4). 
Dois hemitransportadores ABCG5/G8, funcionando como uma dupla, 
constituem o transportador canalicular de colesterol e de fitosterol. F1C1 
(ATP8B1) é uma aminofosfolipídeo transferase (“flipase”) essencial para a 
manutenção da assimetrialipídica da membrana canalicular. A membrana 
canalicular também contém sistemas de transporte independentes de ATP, 
como a isoforma 2 trocadora de ânions Cl/HCO 3 (AE2, SLC4A2) para a 
secreção canalicular de bicarbonato. 
Para a maioria desses transportadores, foram identificados defeitos 
genéticos associados a várias formas de colestase ou a defeitos da 
excreção biliar. A F1C1 está deficiente na colestase intrahepática familiar 
progressiva tipo 1 (CIFP1) e na colestase intrahepática recorrente benigna 
tipo 1 (CIRB1) e resulta em ablação de todas as outras funções 
transportadoras dependentes de ATP. A BSEP está deficiente na CIFP2 e na 
CIRB2. As mutações de MRP2 (ABCC2) causam a síndrome de Dubin-
Johnson, uma forma hereditária de hiperbilirrubinemia conjugada. Uma 
alteração de MDR3 (ABCB4) resulta em CIFP3. 
Os ABCG5/G8, os hemitransportadores canaliculares para o colesterol e 
outros esteróis neutros, são defeituosos na sitosterolemia. O regulador da 
condutância transmembrana da fibrose cística (CFTR, ABCC7), localizado 
sobre as células epiteliais dos ductos biliares, porém não sobre as 
membranas canaliculares, está alterado na fibrose cística, que está 
associada a um comprometimento da regulação do pH colangiocelular 
durante a formação da bile ductular e à doença hepática colestática 
crônica, resultando ocasionalmente em cirrose biliar. 
PROCESSO DE FORMAÇÃO DOS CÁLCULOS BILIARES 
A vesícula é a sede predominante dos cálculos biliares. A litíase dos canais 
biliares resulta, geralmente, da migração a partir da vesícula. Menos 
frequentemente, os cálculos podem se formar nos próprios canais, quando 
há infecção ou estase biliar. A litíase biliar é condição altamente prevalente 
nos países ocidentais, onde 10 a 15% da população adulta abriga cálculos 
no interior da vesícula. Apresenta elevada prevalência familiar, 
provavelmente por influência genética. Entretanto, os fatores ambientais 
também são responsáveis pela formação dos cálculos. Raramente é 
observada em crianças e adolescentes, sendo mais frequente em mulheres 
a partir da 5ª década de vida, aumentado progressivamente com a idade. 
Os cálculos de colesterol são três vezes mais frequentes na obesidade 
acentuada. 
ORIGEM DOS CÁLCULOS 
A formação dos cálculos biliares acontece em 3 fases principais: 
1. Supersaturação biliar com formação de bile litogênica, entende-se por 
tal bile a que contém excesso de colesterol em relação aos sais biliares 
e fosfolipídios, condição que leva a mudança de estado, antes 
homogêneo, para um sistema bifásico, aparecendo a cristalização do 
colesterol. Na etiopatogenia da litíase do colesterol, que responde por 
90% dos cálculos, admite-se o papel fundamental exercido pelo fígado, 
ao secretá-la. 
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2. Nucleação: é o processo pelo qual os cristais de colesterol 
monoidratado, se formam e aglomeram. Esse processo e facilitado pela 
desidratação, estase e interação de fatores pró-nucleares e 
antinucleantes. O cálcio promove a fusão e aumento dos cristais de 
colesterol, embora ainda não esteja bem definido seu exato papel. 
3. Crescimento do cálculo: aposição dos cristais para formar cálculo. 
Depende muito da estase biliar na vesícula. A hipomotilidade da 
vesícula é um componente importante da formação de cálculos, 
promovendo a permanência dos cristais na vesícula por um tempo 
prolongado e exposição a novos cálculos e o gel de mucina, que age 
como cimento aderindo os cristais. 
O colesterol é uma substância insolúvel e tende a precipitar e formar cristais. 
Além dos cálculos de colesterol, existem também os cálculos pigmentares, 
sendo estes mais raros, representando apenas cerca de 10% dos casos de 
litíase biliar. Os cálculos pigmentares castanhos são maciços e sem formas 
definidas. São os únicos formados fora da vesícula biliar – originados nos 
ductos biliares (coledocolitíase primária). Contém sais de bilirrubina e outras 
substâncias. A litíase pigmentar castanha é mais comum na vigência de 
infecção, bile cronicamente infectada por bactérias, como E. Coli e 
Klebsiella sp, que produzem betaglucuronidase, elevando a atividade desta 
enzima na bile, com consequente desconjugação de quase toda bilirrubina 
direta em bilirrubina indireta. Já os cálculos pigmentares negros, associam-
se predominantemente as doenças hemolíticas, à cirrose, à alimentação 
parenteral prolongada e ao pós-ressecção ileal. Sua patogenia varia com 
as diferentes etiologias. 
A bile é rica em sais biliares e lecitina, substâncias encarregadas de 
solubilizar o colesterol. Em concentrações ideais, as três formam micelas 
mistas, que são solúveis e impedem formação do cálculo. Esse equilíbrio não 
acontece em todos os indivíduos, o que leva a formação da bile 
supersaturada em colesterol – bile litogênica. 
O desenvolvimento da ultrassonografia permitiu o reconhecimento 
frequente da lama biliar no interior da vesícula. A lama biliar é geralmente 
uma mistura de muco, bilirrubinato de cálcio e cristais de colesterol 
monoidratado. Esta é considerada precursora da litíase, embora, nem 
sempre se desenvolvam cálculos macroscópicos. Os cálculos de colesterol 
quase sempre dão radiolucentes por não terem cálcio (não aparecem no 
rx simples de abdome) – apenas 15% são radiopacos (quando tem maior 
concentração de sais de cálcio). 
CÁLCULOS BILIARES 
EPIDEMIOLOGIA E PATOGÊNESE 
Os cálculos biliares são bastante prevalentes na maioria dos países 
ocidentais. A formação de cálculos biliares aumenta após 50 anos de 
idade. Nos EUA, o terceiro National Health and Nutrition Examination Survey 
(NHANES III) revelou uma prevalência global de cálculos biliares de 7,9% nos 
homens e de 16,6% nas mulheres. A prevalência é alta nos mexicanos- 
americanos (8,9% nos homens, 26,7% nas mulheres), intermediária nos 
brancos não hispânicos (8,6% nos homens, 16,6% nas mulheres) e baixa nos 
afro-americanos (5,3% nos homens, 13,9% nas mulheres). Os cálculos biliares 
são formados devido a uma composição anormal da bile. Eles se dividem 
em dois tipos principais: cálculos de colesterol e cálculos pigmentares. Os 
cálculos de colesterol são responsáveis por mais de 90% de todos os cálculos 
nos países ocidentais industrializados. Os cálculos de colesterol costumam 
conter >50% de monoidrato de colesterol mais uma mistura de sais de 
cálcio, pigmentos biliares, proteínas e ácidos graxos. Os cálculos 
pigmentares são constituídos principalmente por bilirrubinato de cálcio; 
contêm <20% de colesterol e são classificados em tipos “pretos” e 
“marrons”, sendo os últimos formados em razão de infecção biliar crônica. 
CÁLCULOS DE COLESTEROL E LAMA BILIAR 
O colesterol é essencialmente insolúvel na água e depende de sua 
dispersão aquosa dentro de micelas ou vesículas, sendo em ambos os casos 
necessária a presença de um segundo lipídeo para solubilizar o colesterol. 
O colesterol e os fosfolipídeos são secretados e lançados na bile como 
vesículas unilamelares formando duas camadas, que são transformadas em 
micelas mistas que consistem em ácidos biliares, fosfolipídeos e colesterol 
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pela ação dos ácidos biliares. Se houver excesso de colesterol em relação 
aos fosfolipídeos e ácidos biliares, observa-se a persistência de vesículas 
instáveis ricas em colesterol, que se agregam em grandes vesículas 
multilamelares a partir das quais ocorre a precipitação dos cristais do 
colesterol. 
Para resumir, a doença com cálculos biliares de colesterol ocorre em função 
de várias alterações, que consistem em: 
1. supersaturação da bile com colesterol; 
2. nucleação do monoidrato de colesterol com subsequente retenção de 
cristais e crescimento do cálculo; 
3. função motora anormal da vesícula biliar com esvaziamento retardado 
e estase. 
CÁLCULOS PIGMENTARES 
Cálculos pigmentares pretos são compostos de bilirrubinato de cálcio puro 
ou de complexos tipo polímeros com cálcio e glicoproteínasmucinas. Eles 
são mais comuns em pacientes com estados hemolíticos crônicos (com 
aumento da bilirrubina conjugada na bile), cirrose hepática, síndrome de 
Gilbert ou fibrose cística. 
Os cálculos de vesícula nos pacientes com doenças ileais, ressecção ileal 
ou bypass ileal geralmente são cálculos pigmentares pretos. A reciclagem 
êntero-hepática da bilirrubina nos estados de doença ileal contribui para 
sua patogênese. Cálculos pigmentares marrons são compostos de sais de 
cálcio de bilirrubina não conjugada com quantidades variáveis de 
colesterol e proteínas. Eles são o resultado da presença de quantidades 
aumentadas de bilirrubina insolúvel não conjugada na bile, a qual se 
precipita e forma cálculos. A desconjugação de um excesso de mono e 
diglicuronatos de bilirrubina solúveis pode ser mediada por β-glicuronidase 
endógena, embora possa ocorrer também por hidrólise espontânea. Às 
vezes, a enzima é produzida também quando a bile é infectada 
cronicamente por bactérias, caso em que esses cálculos são marrons. A 
formação de cálculos pigmentares é frequente na Ásia e costuma estar 
associada a infecções na vesícula e na árvore biliar. 
CÓLICA BILIAR E COLECISTITE AGUDA: FISIOPATOLOGIA, 
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO 
CÓLICA OU LITÍASE RENAL 
A cólica biliar é a manifestação clínica da presença de cálculos (pedras) 
na vesícula. Também conhecida por litíase, é uma condição frequente. 
QUADRO CL ÍNICO 
Cerca de 80% dos portadores de litíase biliar são assintomáticos ou 
oligossintomática, enquanto apenas uma minoria apresenta-se plenamente 
sintomática, consequência da obstrução do canal cístico. Desses sintomas, 
o principal é a dor recidivante, que pode evoluir para quadros de colecistite 
aguda, empiema e perfuração vesicular. Fistula biliar e peritonite são 
possíveis consequências da ruptura do colecisto. O Sinal de Murphy é 
caracterizado pela dor à palpação do hipocôndrio direito durante a 
inspiração, sugerindo a presença de doença da vesícula biliar. 
A dor epigástrica ou no quadrante superior direito, geralmente é 
intermitente. A dor biliar típica e chamada de cólica biliar. A dor é intensa, 
contínua, e, raramente, em cólica, com períodos de exacerbação. A 
localização é em epigástrio, hipocôndrio direito e a região dorsal direita, às 
vezes irradiando-se para a região interescapulovertebral. O início é súbito e 
a intensidade é aumentada rapidamente. 
Entre 10 e 15% dos casos, acontece a passagem de cálculos para o 
colédoco. Esses pacientes, na sua imensa maioria, podem apresentar crises 
dolorosas, icterícia obstrutiva, colangite e/ou pancreatite biliar. A obstrução 
é episódica e transitória do ducto cístico ou infundíbulo por um cálculo, que 
migra e subitamente oclui a via de saída. A contração vigorosa da 
musculatura lisa da vesícula para liberar a via leva a dor biliar. Na maioria 
das vezes, o cálculo sai em algumas horas, seja para a vesícula ou para o 
colédoco. A dor costuma durar de 1 a 3 horas e é recorrente, mas não 
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diária. Pode haver o desaparecimento de cálculos biliares no interior da 
vesícula por migração desses cálculos para o intestino, mesmo sem dor ou 
icterícia e pode ocorrer a dissolução espontânea de cálculos de colesterol. 
DIAGNÓSTICO 
O diagnostico da litíase biliar leva em consideração quadro clínico da 
cólica biliar simples, associada a exames hematológicos geralmente 
normais. Por isso é necessário lançar mão de métodos complementares de 
diagnósticos, sendo os mais importantes os exames radiológicos e 
ultrassonográficos. O primeiro exame de imagem pelo qual iniciamos a 
investigação é a ultrassonografia devido sua alta sensibilidade 
especificidade (95%) para cálculos maiores eu 2mm. Caso não sejam 
observadas alterações na ultrassonografia e a litíase biliar seja a suspeita 
diagnostica do paciente, prossegue-se com a colecistografia oral e prova 
motora, embora o método seja pouco usado atualmente, pode ser útil. 
Muito embora o espessamento da parede da vesícula biliar seja 
considerado um sinal inespecífico, podendo ser encontrado em grande 
número de doenças, na grande maioria das vezes está relacionado à 
presença de litíase biliar. Os cálculos vesiculares apresentam-se na 
ultrassonografia como uma imagem ecogênica produtora de sombra 
acústica posterior, independente de sua constituição bioquímica e 
habitualmente móvel com as variações de decúbito na avaliação da 
vesícula biliar que contém cálculos. Devido a baixa incidência de exames 
falso-negativos e inconclusivos a ultrassonografia também é indicada em 
emergências e em pacientes grávidas. As imagens podem ser prejudicadas 
passar despercebidas nos indivíduos obesos e naqueles com gás sobre a 
área vesicular. Quanto à radiografia simples de abdome, eventualmente 
pode diagnosticar cálculos radiopacos, que não excedem 15% dos casos. 
Na colecistografia oral, quando a vesícula não é identificada, recomenda-
se repetir o exame no dia seguinte com dose dupla de contraste. Se, ainda 
assim, persistir a falha de impregnação, há 95% de chance de existir doença 
vesicular. Devido ao elevado número de erros de diagnóstico com a 
colangiografia venosa, o método quando não é mais usado atualmente. Já 
a colangiopancreatografia retrógrada por via endoscópica (CPRE) constitui 
um meio muito sensível de diagnosticar a litíase ductal e que além de servir 
para fins diagnósticos, serve ainda, principalmente, como medida 
terapêutica. A CPRE é uma técnica que utiliza simultaneamente a 
endoscopia digestiva, procedimento que consiste na utilização de tubos 
flexíveis que permitem a visualização de imagens do tubo digestivo em 
monitores de televisão, e a imagem fluoroscópica para diagnosticar e tratar 
doenças associadas ao sistema biliar e pancreático. Um endoscópio é 
inserido na garganta do paciente, passando pelo esôfago e estomago até 
a primeira parte do intestino delgado. Através desse tubo é injetado um 
contraste para demarcar o ducto biliar e o ducto pancreático nas imagens 
de raio X. Por essas imagens é possível visualizar qualquer estreitamento ou 
bloqueio nos dutos. Embora seja mais invasiva, a principal vantagem é que 
o médico pode retirar o cálculo que está bloqueando a passagem da bile 
ou proceder em outras doenças biliares e pancreáticas. 
TRATAMENTO 
A litíase assintomática não exige tratamento cirúrgico e comumente se 
adota condutas conservadoras como: evitar dietas gordurosas e em 
grande quantidade. Entretanto, há algumas situações em que há 
indicações para colescistectomia profilática, sendo elas vesícula em 
porcelana, pólipos de alto risco – idade superior a 60 anos, maiores que 1 
cm e com crescimento documentado em USG seriada –; cálculos grandes 
(maiores que 3 cm); vesícula com anomalia congênita; anemias 
hemolíticas; portadores de um longo ducto após junção do colédoco e 
ducto pancreático. Cálculos de colesterol radiopacos e com diâmetro 
inferior a 1,5 cm podem ser dissolvidos com uso de medicamentos a base 
de ácido ursodesoxicólico por via oral, durante o período de 2 anos, no 
mínimo. Para tanto, é importante que a vesícula esteja funcionante. Embora 
costume ser eficaz, o tratamento tem alto custo e alta chance de recidiva 
dos cálculos. 
COLECISTITE AGUDA 
A inflamação aguda da parede da vesícula em geral acompanha a 
obstrução do ducto cístico por um cálculo. A resposta inflamatória pode ser 
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induzida por três fatores: (1) inflamação mecânica produzida por pressão e 
distensão intraluminais aumentadas com subsequente isquemia da mucosa 
e da parede da vesícula biliar, (2) inflamação química causada pela 
liberação de lisolecitina (devido à ação da fosfolipase sobre a lecitina na 
bile) e por outros fatores teciduais locais, assim como (3) inflamação 
bacteriana, que pode desempenhar algum papel em 50 a 85% dos 
pacientes com colecistite aguda. Os organismos frequentemente isolados 
por cultura dabile da vesícula nesses pacientes incluem Escherichia coli, 
Klebsiella spp., Streptococcus spp e Clostridium spp. A colecistite aguda 
costuma começar como uma crise de dor biliar que piora 
progressivamente. Cerca de 60 a 70% dos pacientes relatam já haver 
experimentado crises precedentes que regrediram espontaneamente. 
Porém, à medida que o episódio progride, a dor da colecistite aguda torna-
se mais generalizada no quadrante superior direito do abdome. Como 
acontece com a cólica biliar, a dor da colecistite pode irradiar-se para a 
área interescapular, a escápula direita ou o ombro. Os sinais peritoneais de 
inflamação, como o agravamento da dor com a movimentação ou a 
respiração profunda, podem ser evidentes. O paciente apresenta-se 
anorético e, na maioria das vezes, nauseado. Os vômitos são relativamente 
comuns, podendo produzir sintomas e sinais de depleção volêmica vascular 
e extravascular. A icterícia é incomum no início da evolução da colecistite 
aguda, mas pode ocorrer quando as alterações inflamatórias edematosas 
acometem os ductos biliares e linfonodos circundantes. 
Caracteristicamente, a febre é baixa, porém os calafrios ou os arrepios não 
são incomuns. O QSD do abdome apresenta- se quase invariavelmente 
hipersensível à palpação. Uma vesícula biliar tensa e aumentada de volume 
é palpável em 25 a 50% dos pacientes. A respiração profunda ou tosse 
durante a palpação subcostal do QSD costuma produzir aumento da dor e 
parada inspiratória (sinal de Murphy). A descompressão dolorosa com 
hipersensibilidade localizada no QSD é comum, o mesmo ocorrendo com 
distensão abdominal e ruídos intestinais hipoativos em função do íleo 
paralítico, porém em geral faltam sinais peritoneais generalizados e rigidez 
abdominal na ausência de perfuração. 
O diagnóstico de colecistite aguda é feito habitualmente com base em 
uma anamnese característica e um bom exame físico. A tríade de início 
súbito de hipersensibilidade no QSD, febre e leucocitose é altamente 
sugestiva. A leucocitose fica entre 10.000 e 15.000 células por microlitro com 
um desvio para a esquerda na contagem diferencial. A bilirrubina sérica 
torna-se levemente elevada em menos da metade dos pacientes, 
enquanto cerca de 25% evidenciam elevações moderadas das 
aminotransferases séricas (em geral, elevação inferior a 5 vezes). A 
ultrassonografia demonstra a presença de cálculos em 90 a 95% dos casos, 
sendo útil na identificação dos sinais de inflamação da vesícula, como 
espessamento da parede, líquido pericolecístico e dilatação do ducto biliar. 
A cintilografia biliar com radionuclídeo (p. ex., HIDA) poderá confirmar o 
diagnóstico se for vista a imagem do ducto biliar sem a visualização da 
vesícula biliar. 
Cerca de 75% dos pacientes tratados clinicamente obtêm a remissão dos 
sintomas agudos dentro de 2 a 7 dias após a hospitalização. Porém, em 25% 
dos casos, uma complicação da colecistite aguda ocorre apesar do 
tratamento conservador. Nestas circunstâncias, é necessária uma 
intervenção cirúrgica imediata. Dos 75% dos pacientes com colecistite 
aguda que conseguem a remissão dos sintomas, cerca de 25% têm recidiva 
da colecistite dentro de 1 ano, e 60% têm pelo menos um episódio 
recorrente dentro de 6 anos. Diante da história natural da doença, a 
colecistite aguda deve ser tratada preferencialmente com cirurgia precoce 
sempre que possível. A síndrome de Mirizzi é uma complicação rara na qual 
um cálculo biliar fica impactado no ducto cístico ou colo da vesícula biliar, 
causando compressão do colédoco, resultando em obstrução 
coledociana e icterícia. A ultrassonografia mostra cálculo(s) biliar(es) fora 
do ducto hepático. A colangiopancreatografia retrógrada endoscópica 
(CPRE) ou a colangiografia transepática percutânea (CTP) ou a 
colangiopancreatografia por ressonância magnética (CPRM) costumam 
demonstrar a compressão extrínseca característica do colédoco. A cirurgia 
consiste em remover o ducto cístico, a vesícula biliar doente e o cálculo 
impactado. O diagnóstico préoperatório da síndrome de Mirizzi é 
importante para evitar uma lesão do colédoco. 
TRATAMENTO CLÍNICO 
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Apesar de a intervenção cirúrgica continuar sendo a base da terapia da 
colecistite aguda e suas complicações, um período de estabilização intra-
hospitalar pode ser necessário antes da colecistectomia. A ingestão oral 
deve ser eliminada, a aspiração nasogástrica pode estar indicada, e a 
depleção do volume extracelular bem como as anormalidades eletrolíticas 
são corrigidas. Meperidina ou anti-inflamatórios não esteroides (AINEs) são 
utilizados habitualmente para obter analgesia, pois esses fármacos podem 
produzir menos espasmo do esfincter de Oddi do que medicamentos como 
a morfina. A antibioticoterapia intravenosa costuma ser indicada aos 
pacientes com colecistite aguda grave, embora seja possível que a 
infecção bacteriana da bile não tenha ocorrido nos estágios iniciais do 
processo inflamatório. A antibioticoterapia deve ser orientada pelos 
organismos mais comuns que costumam estar presentes: E. coli, Klebsiella 
spp. e Streptococcus spp. Os antibióticos efetivos consistem nas 
ureidopenicilinas, como piperacilina ou mezlocilina, ampicilina sulbactam, 
ciprofloxacina, moxifloxacina e as cefalosporinas de terceira geração. A 
cobertura anaeróbia proporcionada por medicamentos como o 
metronidazol deve ser acrescentada quando se suspeita de colecistite 
gangrenosa ou enfisematosa. Imipenem/meropenem representam 
antibióticos parenterais potentes que proporcionam cobertura contra todo 
o espectro de bactérias que causam colangite ascendente. Entretanto, 
esses fármacos devem ficar reservados às infecções mais graves e 
ameaçadoras quando outros esquemas falharam. As complicações 
pósoperatórias de infecção da ferida, formação de abscesso e sepse são 
reduzidas nos pacientes tratados com antibióticos. 
TRATAMENTO CIRÚRGICO 
O momento ideal da intervenção cirúrgica nos pacientes com colecistite 
aguda depende da estabilização do paciente. A tendência é clara para a 
cirurgia mais precoce, o que se deve em parte às exigências de 
permanências hospitalares mais curtas. A colecistectomia ou 
colecistostomia urgente (emergencial) é provavelmente apropriada na 
maioria dos pacientes nos quais há suspeita ou confirmação de 
complicação da colecistite aguda, como empiema, colecistite 
enfisematosa ou perfuração. Os pacientes com colecistite aguda sem 
complicações devem ser submetidos a colecistectomia laparoscópica 
eletiva precoce, de preferência dentro de 48 a 72 horas após o diagnóstico. 
A taxa de complicações não está aumentada nos pacientes submetidos a 
colecistectomia precoce em comparação com a intervenção mais tardia 
(>6 semanas após o estabelecimento do diagnóstico). A intervenção 
cirúrgica postergada deve ficar reservada provavelmente aos (1) pacientes 
cuja condição médica global impõe um risco inaceitável para a cirurgia 
precoce e (2) pacientes cujo diagnóstico de colecistite aguda é duvidoso. 
Assim, a colecistectomia precoce (dentro de 72 horas) constitui o 
tratamento de escolha para a maioria dos pacientes com colecistite 
aguda. Na maioria dos centros, as taxas de mortalidade para 
colecistectomia emergencial variam de 1 a 3%, enquanto o risco de 
mortalidade para colecistectomia precoce eletiva é de cerca de 0,5% nos 
pacientes com menos de 60 anos. Evidentemente, o risco operatório 
aumenta nas doenças relacionadas com a idade de outros sistemas 
orgânicos e na presença de complicações a longo ou a curto prazo da 
doença vesicular. Os pacientes gravemente doentes ou debilitados com 
colecistite podem ser manejados com colecistostomia e drenagem por 
tubo da vesícula biliar. A colecistectomia eletiva pode então ser realizada 
mais tarde. 
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS: 
1. Medicina Interna de Harrison - [Dennis L.] Kasper... [et al.] 19a edição - 
Porto Alegre - AMGH, 2017 - Volume2. 
2. Goldman - Cecil Medicina, editado por Lee Goldman, Andrew I. Schafer 
[et al.] 25a edição - Rio de Janeiro - Elsevier, 2018.

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