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SOPRO CARDÍACO O sopro cardíaco, um achado comum durante o exame pediátrico de rotina, é a causa mais frequente de encaminhamento da criança ao cardiologista, e em sua maior parte não significa doença cardíaca. Inclusive, o sopro inocente (fisiológico) é um ruído bastante comum em crianças normais, que pode estar acentuado por quadro febril, anemia e, às vezes, por ansiedade. É importante, portanto, fazer a profilaxia cardiológica completa quando há suspeita de defeito cardíaco. Avaliação Clínica do Sopro Cardíaco Geralmente, os sopros são detectados em consultas de rotina, ou durante atendimentos a problemas comuns. Quando o pediatra detecta sopro cardíaco durante uma consulta de rotina em paciente assintomático, é necessário considerar as seguintes possibilidades: ■sopro inocente; ■existência de uma cardiopatia ainda não diagnosticada; ■doença não cardíaca causando a alteração da ausculta. Anamnese ■Primeiros 3 meses de gestação:uso de medicamentos ou drogas, álcool, diabete materno, infecções; ■história do parto: peso e estatura ao nascer, uso de oxigênio, sopro descoberto no berçário; história de malformações extracardíacas; ■recém-nascidos e lactentes: dificuldade para mamar e baixo ganho de peso, taquipnéia, sudorese, irritabilidade; ■história de anemia, hipertireoidismo, outras doenças; ■pré-escolares e adolescentes: cansaço aos exercícios, síncope, hipodesenvolvimento Exame Físico ■Presença de malformações extracardíacas; ■ precórdio abaulado, ou hiperdinâmico, à palpação; cianose, palidez; ■pulsos: diminuídos ou aumentados, diferença de palpação entre membros superiores e inferiores; ■pressão arterial: comparar a pressão de membros superiores e inferiores; ■sinais de insuficiência cardíaca: taquipneia, taquicardia, aumento hepático, edema; ■intensidade do sopro, localização no tórax, localização no ciclo cardíaco, mudança da ausculta com a mudança de decúbito, sopro contínuo, ou diastólico; ■ 2a bulha: intensidade, desdobramento; arritmia, ritmo de galope;estalidos. As crianças maiores devem, inicialmente, ser examinadas em decúbito dorsal e depois sentadas ou de pé, para se observar mudanças nas características do sopro. O sopro inocente em geral diminui ou desaparece com a mudança de decúbito. É importante fazer o exame pediátrico completo da criança, pois o sopro deve ser avaliado dentro do contexto geral do paciente. No exame do tórax, o abaulamento precordial sugere um aumento cardíaco crônico, levando a um aumento no diâmetro ântero posterior da caixa torácica. Outras deformidades torácicas, como pectus carinatum ou pectus excavatum, podem associar-se a sopro funcional, por causa da posição do coração no tórax. Em crianças magras, o ictus cordis e as impulsões cardíacas normalmente são visíveis. Em cardiopatias com repercussão hemodinâmica, observa-se um precórdio hiperdinâmico, com impulsões cardíacas visíveis e o ictus cordis desviado. Na palpação do tórax, a presença de frêmitos e bulhas palpáveis é sempre patológica. TIPOS DE SOPRO 1. Classificar o sopro quanto a sua posição no ciclo cardíaco e definir a característica deste sopro; 2. Definir a localização do sopro nas áreas de ausculta cardíaca; 3.Definir a intensidade do sopro, bem como se há ou não irradiação do mesmo. Classificação do sopro no ciclo cardíaco e características do sopro O sopro cardíaco é classificado em sistólico, diastólico ou contínuo conforme sua posição durante o ciclo cardíaco: o sistólico ocorre entre a 1a e a 2a bulhas cardíacas; o diastólico entre a 2a e a 1a bulhas; o sopro contínuo ocorre ininterruptamente entre estas bulhas. O sopro sistólico é classificado, quanto a sua característica, em ejeção e em regurgitação. O sopro sistólico em ejeção geralmente é mesossistólico e apresenta aspecto em “crescendo e descrescendo”. Nesse tipo de sopro, tanto a 1a quanto a 2a bulhas não são encobertas pelo sopro. Quando patológico, ocorre nas lesões obstrutivas ao fluxo de saída do ventrículo direito (p.ex., estenose pulmonar) ou esquerdo (p.ex., estenose aórtica). O sopro sistólico em regurgitação é em geral holossistólico, iniciando-se junto com a 1a bulha e chegando até a 2a bulha. Este sopro geralmente ocorre nas regurgitações (insuficiência) das valvas mitral ou tricúspide e nos defeitos do septo ventricular (comunicação interventricular – CIV). O sopro diastólico é classificado quanto a sua característica em regurgitação (ou aspiração), em ruflar e de enchimento ventricular. O sopro diastólico em regurgitação inicia-se logo após a 2a bulha e vai diminuindo de intensidade até o meio ou final da diástole. Esse tipo de sopro ocorre na regurgitação das valvas arteriais (aórtica ou pulmonar). O sopro diastólico em ruflar ocorre no final da diástole e tem baixa intensidade, acontecendo nos quadros de estenose das valvas mitral ou tricúspide. O sopro diastólico de enchimento ventricular é um sopro que ocorre no início da diástole, tem curta duração, e acontece em situações em que um grande volume sanguíneo passa através das valvas mitral ou tricúspide, apresentando uma estenose relativa destas valvas. Isso pode ocorrer em situações como comunicação interatrial (estenose relativa da valva tricúspide) ou CIV (estenose relativa da valva mitral). O sopro contínuo tem característica única e ocorre de modo ininterrupto durante o ciclo cardíaco, apresentando, entretanto, períodos de maior intensidade, alternados com períodos de menor intensidade. As bulhas cardíacas geralmente ficam encobertas pelo sopro contínuo. Este sopro é do tipo das comunicações entre as artérias sistêmicas, sendo a persistência do canal arterial, o exemplo mais conhecido. Classificação do sopro conforme a localização Após identificar o sopro cardíaco, deve-se procurar definir a sua localização no tórax da criança e determinar a área de maior ausculta. Durante o exame físico do coração, não se pode esquecer de auscultar todo o tórax, o dorso, o abdome e até a cabeça da criança, para pesquisar a presença de sopros que geralmente decorrem de fístulas arteriovenosas extracardíacas. Intensidade do sopro cardíaco O sopro cardíaco é resultado do aumento da velocidade de fluxo sanguíneo e de maior turbulência desse fluxo. A intensidade do sopro cardíaco reflete a magnitude desta turbulência que, em outras palavras, significa uma diferença de pressão entre duas cavidades ou artérias. A intensidade do sopro pode ser descrita de forma subjetiva e classificada em graus que variam de I a VI. Os graus I e II são sopros de fraca intensidade, sendo que o grau I só é detectado por meio de ausculta muito cuidadosa. Sopros graus III e IV são sopros de intensidade moderada, sendo que o grau IV apresenta frêmito palpável. Sopros graus V e VI são intensos, vêm acompanhados de frêmitos, sendo que o grau VI pode ser audível mesmo sem o estetoscópio. Vale lembrar que a intensidade do sopro também depende de outros fatores, como a espessura da parede torácica e a presença de alterações pulmonares que possam dificultar a detecção auditiva do sopro. Sopro Inocente O sopro cardíaco inocente é a alteração da ausculta que ocorre na ausência de anormalidade anatômica ou funcional do sistema cardiovascular. É um achado frequente, que ocorre em 50 a 70% das crianças, geralmente em idade escolar. São características dos sopros inocentes: ■são mais facilmente audíveis nos estados circulatórios hipercinéticos (febre, anemia); ■são em geral sistólicos e raramente contínuos; ■ nunca são diastólicos; ■têm curta duração e baixa intensidade (graus I a III); ■não se associam a frêmito ou a ruídos acessórios (estalidos, cliques); ■localizam-se em uma área pequena e bem definida, sem irradiação; ■as bulhas são sempre normais; ■associam-se com radiografia de tórax e eletrocardiograma normais. A origem dos sopros inocentes ainda é controversa. Na maioria das vezes, ela é atribuída a fluxos turbulentos, originados em áreas de estreitamento na saída dos ventrículos esquerdo ou direito, ou em áreas de ramificações de artérias e, no caso do zumbido venoso, à turbulência originadano retorno venoso. Esses fluxos turbulentos provavelmente são mais audíveis na criança porque as vias de saída são proporcionalmente mais estreitas e as estruturas cardíacas ficam mais próximas da parede torácica, que é mais delgada em comparação ao adulto. Os sopros inocentes mais frequentes na criança são: vibratório de Still, de ejeção pulmonar, de ramos pulmonares, supraclavicular e zumbido venoso. Sopro vibratório de Still É o sopro inocente mais frequente, detectado em 75 a 85% das crianças em idade escolar, sendo raramente encontrado em lactentes. É mais bem detectado na borda esternal esquerda média ou entre a borda esternal baixa e o apêndice xifóide, na posição supina, e ocorre no começo da sístole. Tem características vibratórias, musicais, de baixa intensidade, e nunca é rude. Pode desaparecer com a pressão do aparelho sobre o tórax, e a intensidade diminui com a posição ereta. O diagnóstico diferencial é com CIV de pequeno diâmetro, miocardiopatia hipertrófica e estenose sub aórtica discreta, cujos sopros são de maior intensidade, não se alteram com a mudança de posição e podem estar associados a frêmito. Sopro de ejeção pulmonar É um sopro sistólico no foco pulmonar, tem uma característica suave à ausculta, de baixa intensidade. Diminui de intensidade com a mudança de decúbito. O diagnóstico diferencial deve ser feito com o sopro sistólico da CIV ou estenose pulmonar, mas a 2a bulha é sempre normal. Sopro de ramos pulmonares Mais frequente no recém-nascido, é um sopro sistólico, mais audível na região supraclavicular esquerda, suave, sem irradiação. É causado pela transição do sangue do tronco pulmonar para os ramos, ainda pouco desenvolvidos. Sopro supraclavicular Também muito comum em crianças, este é um sopro do tipo mesossistólico, que pode ser audível bilateralmente, mais comum à direita, na região logo acima das clavículas, tem baixa intensidade e não provoca frêmito. O diagnóstico diferencial é com a estenose aórtica. Zumbido venoso Causado pelo turbilhonamento da entrada do sangue na confluência das veias jugular interna, inominada e subclávia direita com a veia cava superior. É audível com a colocação do estetoscópio, suavemente, na região da veia jugular externa, e acentua-se com a criança sentada. Tem característica contínua, acentuando-se na diástole, e desaparece pela compressão da jugular. Sopro Patológico É o sopro causado por uma doença cardíaca. Nas cardiopatias congênitas acianóticas, o sopro tem características muito específicas em cada patologia, permitindo, com frequência, o diagnóstico clínico da doença com base exclusivamente nas características desse ruído. Isso, entretanto, não ocorre com as cardiopatias congênitas cianóticas, nas quais existem várias lesões associadas, com uma patofisiologia complexa, dificultando a determinação da origem do sopro. São consideradas características dos sopros patológicos: ■ sopro holossistólico; ■ ocorrência isolada na diástole; sopro contínuo; ■ maior intensidade (grau II ou mais) ou timbre rude; ■ presença de frêmito ■irradiação bem nítida e fixa para outras áreas; ■associação com alterações dos ruídos cardíacos: bulhas, cliques e estalidos; ■podem vir acompanhados de sintomas sugestivos de cardiopatia; ■exames laboratoriais alterados (radiografia de tórax, eletrocardiograma, ecocardiograma). A localização do sopro e a sua irradiação auxiliam no diagnóstico diferencial. Os sopros holossistólicos de regurgitação são sempre sinais de doença cardíaca, podendo ser causados por CIV, insuficiência mitral ou tricúspide. Os sopros de ejeção, com características de crescendo-decrescendo, podem estar associados às estenoses de valvas aórtica ou pulmonar. A irradiação do sopro também é um dado indicativo de cardiopatia; por exemplo, um sopro sistólico de ejeção, nos focos da base, que se transmite bem para o pescoço sugere sopro aórtico; outro, que se transmite bem para a região dorsal sugere sopro pulmonar. Um sopro sistólico no dorso pode ser causado por coarctação de aorta ou estenose de ramo de artéria pulmonar. O sopro sistólico associado à CIV tipo ostium secundum é um sopro mais audível em área pulmonar e é sempre acompanhado do desdobramento fixo da 2a bulha. Os sopros diastólicos são sempre patológicos e decorrem de insuficiência aórtica ou pulmonar, de estenose e de alterações de fluxo nas valvas mitral e tricúspide. Sopro Patológico É o sopro causado por uma doença cardíaca. Nas cardiopatias congênitas acianóticas, o sopro tem características muito específicas em cada patologia, permitindo, com frequência, o diagnóstico clínico da doença com base exclusivamente nas características desse ruído. Isso, entretanto, não ocorre com as cardiopatias congênitas cianóticas, nas quais existem várias lesões associadas, com uma patofisiologia complexa, dificultando a determinação da origem do sopro. São consideradas características dos sopros patológicos: ■ sopro holossistólico; ■ ocorrência isolada na diástole; sopro contínuo; ■ maior intensidade (grau II ou mais) ou timbre rude; ■ presença de frêmito; ■estalidos, sugere persistência de canal arterial, enquanto um sopro contínuo no dorso é sugestivo de fístula arteriovenosa pulmonar. A 2a bulha é muito importante na ausculta da criança. Quando o desdobramento fisiológico da 2a bulha desaparece, deve-se pensar em cardiopatia. Conduta na Criança com Sopro O paciente pediátrico com sopro cardíaco deve ser encaminhado ao especialista nas seguintes situações: ■sopros de intensidade acima do grau III em VI, que torna pouco provável o sopro inocente; ■neonatos com sopro persistente após as primeiras horas de vida; ■crianças com síndromes genéticas ou malformações extracardíacas, por causa do risco aumentado de cardiopatia crianças que apresentam sintomatologia associada, como déficit ponderal, infecções pulmonares de repetição e cansaço aos esforços físicos; ■presença de precórdio hiperdinâmico, arritmia ou alteração nos pulsos; ■alteração na pressão arterial, ou pressão arterial diferente em membros superiores e inferiores; ■cianose ou sinais de insuficiência cardíaca; ■ dúvida diagnóstica.
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