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Daniel V. Rodrigues-M33 1-Descrever a epidemiologia, a carcinogênese e os tipos histológicos do câncer gástrico. a) Epidemiologia O câncer de estômago figura como a quarta causa mais comum de câncer no mundo. Em homens, a incidência, em geral, é duas vezes maior que em mulheres. Apesar de ser a segunda causa de mortalidade por câncer, em ambos os sexos, a tendência temporal mostra um declínio progressivo de sua incidência e mortalidade, especialmente nos países desenvolvidos. Cogita-se que a queda na frequência do CG deve-se em parte ao reconhecimento dos principais fatores de risco, como a infecção pelo Helicobacter pylori e fatores dietéticos e ambientais, como as nitrosaminas e alimentos defumados e salgados. É importante destacar que, em países em desenvolvimento, a incidência persiste elevada, onde são registrados mais de 70% de todos os casos. O câncer gástrico ocupa os segundo e terceiro lugares em frequência, respectivamente em homens e mulheres, nas regiões norte/nordeste do Brasil, e os terceiro a quinto lugares nas regiões centro oeste e sul/sudoeste em homens e mulheres. Fatores que ajudam para o decréscimo de taxas de mortalidade, estão as melhores práticas de conservação de alimentos, incluindo refrigeração, novos hábitos alimentares, o melhor controle da infecção por Helicobacter pylori (H. pylori) e redução do tabagismo. A melhoria nos métodos diagnósticos e terapêuticos também pode ter contribuído para esse fenômeno. Obviamente, quanto mais precoce o diagnóstico, melhor a sobrevida. b) Carcinogênese O tipo intestinal e o tipo difuso são dois os tipos histológicos principais de carcinoma gástrico. Em ambos os tipos, porém, a inflamação crônica desempenha papel iniciador importante. A infecção por H. pylori está claramente associada ao aparecimento de câncer gástrico. Inflamação persistente propicia a instabilidade genética tecidual em função da geração de substâncias mutagênicas como, por exemplo, as espécies reativas de oxigênio. Cepas diferentes de H. pylori variam em relação ao potencial carcinogênico mantendo, porém, uma relação sempre direta entre carcinogenicidade e capacidade de induzir inflamação. Múltiplos genes do H. pylori são responsáveis pela virulência da bactéria, mas a presença em maior ou menor quantidade da proteína CagA (gene A associado à citotoxina), codificada pelo gene bacteriano do mesmo nome, parece exercer papel fundamental na diversidade da patogênese. CagA interfere molecularmente com inúmeras proteínas celulares do hospedeiro como aquelas envolvidas na transdução de sinais da via Ras/MEK/EKR. Aproximadamente 3% dos tumores gástricos são decorrentes de predisposição genética. Cerca de 40% desses casos apresentam mutações germinativas no gene CDH1 que codifica para a proteína E-caderina constituindo a síndrome HDGC (do inglês Hereditary Diffuse Gastric Cancer). Essa molécula é uma proteína transmembrânica que desempenha papel central em processos de adesão e diferenciação celular e na manutenção da arquitetura tecidual. Células epiteliais se conectam umas às outras, primeiramente, pelo contato entre suas moléculas de E-caderinas. O gene CDH1 fornece instruções para a produção de uma proteína chamada caderina epitelial ou caderina-E. Esta proteína é encontrada dentro da membrana que envolve as células epiteliais, que são as células que revestem as superfícies e cavidades do corpo, como o interior das pálpebras e boca Como na maioria dos casos de síndromes hereditárias de tumores, a mucosa gástrica nos portadores de mutações germinativas de CDH1 é normal, até que o segundo alelo desse gene seja inativado somaticamente. O envolvimento de E-caderina na carcinogênese gástrica fica também demonstrado pelo fato de que alterações nesses genes são frequentemente Daniel V. Rodrigues-M33 encontradas em tumores esporádicos difusos do estômago. Outros tumores gástricos hereditários não HDGC conhecidos podem decorrer de alterações germinativas nos genes p53 (síndrome de Li- Fraumeni) e BRCA2 e também de casos de HNPCC. O gene BRCA2 fornece instruções para a produção de uma proteína que atua como supressora de tumor. As proteínas supressoras de tumor ajudam a evitar que as células cresçam e se dividam muito rapidamente ou de forma descontrolada. A proteína BRCA2 está envolvida na reparação de DNA danificado Aproximadamente 15% dos tumores gástricos esporádicos apresentam instabilidade genômica demonstrada por testes de instabilidade de microssatélites. Mutações em genes como AXINe e TCF7L2, que codificam proteínas envolvidas na via de sinalização Wnt, são encontradas exclusivamente em neoplasias gástricas que cursam com MSI. A proteína HER-2 faz parte da família de receptores para o fator de crescimento epitelial com atividade tirosina-quinase. Embora não tenha um ligante próprio, a homo ou heterodimerização de HER-2 com outros receptores da mesma família desencadeia uma cascata de eventos intracelulares que dispara vias relacionadas com a proliferação celular. Em neoplasias malignas gástricas essa proteína está hiperexpressa em percentagens que variam de 13 a 23%, a depender da série analisada, sendo esse achado mais frequente em tumores de histologia intestinal e da junção gastro-esofágica. Amplificação do gene HER-2 e mutação de E-caderina raramente são encontradas no mesmo tumor evidenciando a existência de vias distintas de carcinogênese. HER2 é uma tirosina quinase de membrana e oncogene que é superexpressa e amplificada pelo gene em cerca de 20% dos cânceres de mama. Quando ativado, ele fornece à célula sinais proliferativos e anti-apoptose potentes e é o principal impulsionador do desenvolvimento e progressão do tumor para este subconjunto do câncer de mama Nos últimos anos, a expressão diferencial de microRNAS tem sido pesquisada em uma enorme variedade de tumores. MicroRNAs, como o próprio nome refere, são pequenas moléculas de RNA não codificadoras de proteínas, com aproximadamente 22 nucleotídeos, que impedem a ação de mRNAs específicos, promovendo sua degradação ou impedindo a translação para proteínas. A especificidade de atuação é garantida por simples complementaridade de bases, sendo que um único microRNA é capaz de inibir a ação de vários mRNAs. Em tumores do estômago, muitos microRNAs são detectados diferencialmente nas células tumorais e na mucosa normal. Assim, miR-20a, miR-20b, miR-17, miR-106a, miR-18a entre outros, estão diferencialmente expressos (alguns sub e outros superexpressos) em células malignas e normais nas neoplasias gástricas. Diversos mecanismos genéticos são importantes no câncer gástrico: ativação de oncogene, inativação de gene supressor tumoral e instabilidade de microssatélite do DNA. Por exemplo, a perda da heterozigose do gene APC (polipose adenomatosa colônica) tem sido observada nos tumores gástricos. O produto do gene supressor de tumor p53 regula o ciclo celular na fase de transição G1 /S e provavelmente também funciona no reparo do DNA e na apoptose (morte celular programada). O gene p53 mutado está presente não só no câncer gástrico, mas também nas lesões gástricas précancerosas, sugerindo que a mutação do p53 pode ser um evento precoce na carcinogênese gástrica. Alterações microssatélites do DNA ou instabilidade nas repetições de dinucleotídeos, que eram originalmente identificadas na síndrome do câncer colorretal hereditário não polipoide, também ocorrem frequentemente no carcinoma de estômago esporádico. As mutações genéticas podem se acumular como resultado da instabilidade microssatélite do DNA. Daniel V. Rodrigues-M33 B.1) Carcinogênese por Robbins Os cânceres gástricos são geneticamente heterogêneos, mas determinadas alterações moleculares são comuns. Vamos considerar os primeiros seguidos pelo papel da inflamação crônica induzida pelo H. pylori e a associação de um subconjunto de cânceresgástricos com infecção pelo EBV. → Mutações. Embora a maioria dos cânceres gástricos não seja hereditária, mutações identificadas no câncer gástrico familiar forneceram pistas importantes sobre os mecanismos de carcinogênese nos casos esporádicos. As mutações na linhagem germinativa de CDH1, que codifica a E-caderina, uma proteína que contribui para a aderência intercelular epitelial, estão associadas a cânceres gástricos familiares, geralmente do tipo difuso. Em comparação, mutações no CDH1 estão presentes em cerca de 50% dos tumores gástricos difusos, enquanto a expressão da E-caderina está drasticamente reduzida no restante, muitas vezes devido à metilação do promotor de CDHI. Assim, a perda da função de E-caderina parece ser um critério importante no desenvolvimento do câncer gástrico difuso. Em contraste ao CDH1, os pacientes com PAF que apresentam mutações na linhagem germinativa de genes da polipose adenomatosa coli (PAC) apresentam maior risco de desenvolver o câncer gástrico tipo intestinal. O câncer gástrico esporádico tipo intestinal está associado a diversas anormalidades genéticas, como mutações adquiridas de β-catenina, uma proteína que se liga tanto à E-caderina como à proteína APC; instabilidade de microssatélites; e hipermetilação de genes, incluindo TGFβRII, BAX, IGFRII e p16/INK4a. Mutações de TP53 estão presentes na maioria dos cânceres gástricos esporádicos de ambos os tipos histológicos. → H. pylori. A gastrite crônica, mais comumente causada pela infecção por H. pylori, promove o desenvolvimento e a progressão de cânceres que podem ser induzidos por diversas alterações genéticas (Cap. 6). Como é o caso em muitas formas de inflamação crônica, a gastrite crônica induzida por H. pylori está associada ao aumento da produção de proteínas pró-inflamatórias, como interleucina Iβ (IL-Iβ) e fator de necrose tumoral (TNF). Portanto, não é surpreendente que os polimorfismos de genes, que codificam tais fatores e aumentam a produção dessas citocinas, confiram maior risco de desenvolvimento de câncer gástrico associado à gastrite crônica naqueles com infecção coexistente por H. pylori. c) Tipos histológicos do câncer gástrico São dois os tipos histológicos principais de carcinoma (adenocarcinomas) gástrico, que seria a neoplasia das células do epitélio tubular gástrico. O tipo intestinal e o tipo difuso. A carcinogênese do primeiro (intestinal) mantém as características da maioria dos tumores sólidos de adultos: se processa ao longo de décadas, desencadeando o câncer em pessoas já idosas e produzindo alterações teciduais intermediárias identificadas como metaplasia e displasia. Encontra-se tipicamente no estômago distal, com ulcerações, é frequentemente precedido por lesões pré-malignas O tipo intestinal se caracteriza pela presença de células neoplásicas coesas formando estruturas tubulares e uma massa discreta, ao passo que no tipo difuso as células cancerosas infiltram-se difusamente na parede do estômago. Ao contrário, o tumor do tipo difuso geralmente acomete pessoas mais jovens, pode ser multifocal e na maior parte das vezes não é precedido por metaplasias. Promove um espessamento disseminado do estômago, especialmente na cárdia; esta forma pode se apresentar como linite plástica, que é um estômago não distensível, sem pregas e luz estreitada pela infiltração da parede gástrica pelo tumor. Os cânceres gástricos do tipo difuso abrigam Daniel V. Rodrigues-M33 células produtoras de mucina. Outras condições podem resultar em linite plástica, como linfoma, tuberculose, sífilis e amiloidose. O prognóstico é geralmente pior na forma difusa. As principais características histopatológicas no câncer gástrico compreendem grau de diferenciação, invasão através da parede gástrica, comprometimento de linfonodos e presença ou ausência das células em anel de sinete dentro do próprio tumor. Outras manifestações patológicas compreendem uma massa polipoide, cuja distinção entre um pólipo benigno pode ser difícil. Outras histologias a) Tumor carcinoide gástrico São tumores raros, representam menos de 1% de todos os tumores carcinoides e menos de 2% das neoplasias gástricas. Originados nas células enterocromarfins-like, normalmente são resultados de achado endoscópico incidental. São subdivididos em 3 tipos: tipo I associado à gastrite atrófica, tipo II associado à gastrinoma e tipo III sem condição predisponente ou esporádico. O prognóstico depende do subtipo e extensão da doença. O tratamento varia desde ressecção endoscópica até cirurgia e tratamento medicamentoso. b) Tumores estromais gastrointestinais Representam menos de 5% das neoplasias gástricas. Recentemente, individualizados graças aos avanços das técnicas de imunoistoquímica, é o tumor mesenquimal mais comum do trato gastrointestinal, de origem nas células intersticiais de Cajal (ICC) e com expressão do CD117 em mais de 95% dos casos. Predominante no estômago (60%), também ocorre no intestino delgado (25%), reto (5%), esôfago (2%) e outras localizações. O diagnóstico frequentemente é resultado de achado incidental durante exame de imagem ou cirurgia por outras causas. O prognóstico está relacionado principalmente a duas variáveis: tamanho do tumor e índice mitótico. O tratamento varia desde ressecção cirúrgica até tratamento medicamentoso. c) Linfoma gástrico Linfoma gástrico primário representa 3% das neoplasias gástricas e 10% dos linfomas, mas o estômago é o sítio extranodal mais frequente dos linfomas. O linfoma que se origina em mucosa tem sido chamado de linfoma de células B da zona marginal extranodal, tipo MALT: tumor de tecido linfoide associado à mucosa. Os sintomas podem ser exatamente os mesmos que ocorrem no adenocarcinoma gástrico e o diagnóstico deve ser sempre estabelecido em bases histológicas e imunoistoquímicas. A bactéria H. pylori também tem sido implicada como fator etiológico dessa doença e uma das evidências que suportam essa proposição são relatos de remissão do tumor após tratamento antibiótico específico em alguns casos. O tratamento pode ser quimioterápico, na maioria, radioterápico ou até cirúrgico, a depender da situação. 2- Explicar as apresentações clínicas mais frequentes e os principais linfonodos acometidos no câncer gástrico. a) Apresentações clínicas mais frequentes: Em seus estágios iniciais, o câncer gástrico pode muitas vezes ser assintomático ou provocar apenas sintomas inespecíficos, o que dificulta o diagnóstico precoce. Os sintomas tardios incluem inchaço, disfagia, dor epigástrica ou saciedade precoce. A saciedade precoce ou vômitos podem ser sugestivos de uma obstrução parcial do débito gástrico, embora a dismotilidade gástrica seja capaz de contribuir com os vômitos nos casos não obstrutivos. A dor epigástrica, semelhante a dor da úlcera péptica, ocorre em cerca de um quarto dos pacientes, mas, na maioria dos pacientes com câncer gástrico, a dor não melhora com alimentação ou antiácidos. Uma dor com Daniel V. Rodrigues-M33 irradiação lombar pode sugerir que o tumor tenha atingido o pâncreas. Quando a disfagia está associada a um câncer gástrico, este sintoma é sugestivo de um tumor mais proximal, na junção gastroesofágica ou no fundo gástrico. Os sinais de câncer gástrico incluem sangramento, que pode resultar em anemia produzindo sintomas de fraqueza, fadiga e mal- estar, assim como consequências cardiovasculares e cerebrais de maior gravidade. É raro haver perfuração secundária a um câncer gástrico. O câncer gástrico metastático para o fígado pode causar dor no quadrante superior direito, icterícia e/ou febre. As metástases pulmonares podem causar tosse, soluços e hemoptise. A carcinomatose peritoneal pode ocasionar uma ascite que não responde ao uso de diuréticos. O câncer gástrico também pode dar metástases para os ossos. De modo resumido, o câncer gástrico, geralmente, se apresentacom sintomas pouco específicos e vagos. Dentre os sintomas mais frequentes estão perda de peso, fadiga, anorexia, sensação de plenitude gástrica, epigastralgia, disfagia, náuseas, desconforto abdominal, melena. Nenhum desses sintomas é específico de câncer gástrico, sendo esse um dos motivos do retardo no diagnóstico inicial. b) Principais linfonodos acometidos no câncer gástrico: A linfadenomegalia associada ao câncer gástrico, às vezes, recebe nomenclatura especial: o exame ginecológico pode detectar massas anexiais (tumor de Krukenberg) e o toque retal pode identificar a presença de metástases no fundo de saco (prateleira de Blumer). A disseminação metastática para linfonodos distantes pode ser percebida no exame físico e indicar o estadiamento N da doença. Linfonodomegalia palpável na fossa supraclavicular esquerda (nódulo de Virchow), na região axilar esquerda (nódulo de Irish) e na região periumbilical (nódulo da Sister Mary Joseph) indica estadiamento avançado da doença, mesmo na ausência de outros sinais. 3- Discutir os principais fatores de risco relacionados ao câncer gástrico Os fatores de risco para o desenvolvimento do adenocarcinoma gástrico podem ser divididos entre ambientais e genéticos, assim como condições precursoras. Dieta: Dietas ricas em sal, alimentos defumados ou precariamente conservados, com conteúdo elevado de nitratos, nitritos e aminas secundárias, têm sido associadas a aumento de risco para CG. O consumo habitual desses alimentos causaria a gastrite crónica atrófica e modificações do ambiente gástrico (pH, supercrescimento bacteriano), que favoreceriam a produção de compostos N-nitrosos cujo papel carcinogênico é conhecido fator de risco. Essa conversão seria resultado da ação de bactérias que colonizam estômagos atróficos com hipodoridria. Fatores socioeconômicos: Condições sanitárias e de higiene precárias, superpopulação, desnutrição e conservação inadequada de alimentos são considerados fatores importantes no desenvolvimento do câncer gástrico, uma vez que colaboram para o aporte inadequado de fatores protetores contra a doença. Infecção pelo H. pylori: Estima-se que 50% da população mundial esteja infectada pelo microrganismo e a prevalência da infecção de países em desenvolvimento atinja 70 a 90% da população. A principal hipótese para explicar de que modo o H. pylori predispõe ao câncer gástrico é a indução de uma resposta inflamatória, na qual a interleucina-1β desempenha um papel central. A infecção crônica pelo H. pylori também promove uma gastrite atrófica crônica resultando em acloridria, que, por sua vez, favorece o crescimento bacteriano que pode converter nitratos (componentes alimentares) em nitritos. Estes nitritos, em combinação com fatores genéticos, promovem uma proliferação celular anormal, mutações genéticas e eventualmente câncer. Em um modelo murino de câncer gástrico, a infecção por H. pylori pode desempenhar um papel no recrutamento de células-tronco derivadas da medula óssea que Daniel V. Rodrigues-M33 facilitam a carcinogênese gástrica. Modelos animais recapitulam as características principais de adenocarcinoma gástrico, seja pelo uso de carcinógenos ou por meio de abordagens genéticas. Gastrite crônica atrófica (GCA) e metaplasia intestinal (MI): A gastrite atrófica usualmente começa com um pro· cesso multifocal no estômago distal, que progride continuamente ao longo de 2 a 3 décadas, evoluindo com coalescência dos focos de atrofia, resultando em hipocloridria e finalmente acloridria. Sabe-se que a prevalência da GCA apresenta relação direta com a incidência de CG, frequentemente precedendo seu aparecimento. Estima-se que cerca de 10% dos pacientes com GCA acompanhados por cinco anos desenvolverão câncer gástrico (CG), o que representa um risco de cancerização dez vezes superior ao da população em geral. A metaplasia intestinal representa, portanto, uma etapa intermediária na gênese do CG, em especial a metaplasia intestinal do tipo III com células tipo caliciformes e coloração positiva para sulfomucinas. Indivíduos com MI tipo III têm elevada propensão a desenvolver CG, alertando que a detecção dessa condição é um importante marcador para CG. Estômago operado: Estudos de acompanhamento têm demonstrado que a gastrectomia parcial, especialmente a antrectomia com anastomose à Billroth II, antigamente realizada para o tratamento de doenças benignas do estômago (úlcera péptica), aumenta em 2 a 6 vezes o risco de CG. Nessa condição, a alcalinização do pH gástrico cm virtude do refluxo duodenogástrico acelera o desenvolvimento de GCA, favorecendo o supercrescimento bacteriano e a conversão de nitritos em nitrosaminas carcinogênicas. Recomenda-se controle endoscópico periódico com biópsias múltiplas da boca anastomótica, para detecção de câncer precoce, mesmo sem lesões visíveis ao exame endoscópico, a partir de dez anos após gastrectomias. Anemia perniciosa: Anemia perniciosa, condição clinica associada à gastrite crônica atrófica autoimune, apresenta risco 2 a 6 vezes maior de desenvolvimento do câncer gástrico do tipo intestinal. Esse risco tende a variar, especialmente com a duração da doença 4- Demonstrar os “sinais” de alarme e o exame que se indica para a detecção precoce do câncer gástrico a) Sinais de alarme: A detecção precoce do câncer é uma estratégia para encontrar um tumor em fase inicial e aumentar a chance de tratamento bem sucedido. A detecção pode ser feita por meio da investigação com exames clínicos, laboratoriais, endoscópicos ou radiológicos em pessoas com sinais e sintomas sugestivos da doença (diagnóstico precoce), ou com exames Daniel V. Rodrigues-M33 periódicos em pessoas sem sinais ou sintomas (rastreamento), mas pertencentes a grupos com maior chance de ter a doença. • Massa (tumor) na parte superior do abdômen • Dor na parte superior do abdômen • Perda de peso involuntária e falta de apetite (hiporexia) • Queimação na boca do estômago ou dor abdominal recorrente: principalmente se aparecer depois dos 50 anos de idade • Náuseas e vômitos constantes • Anemia (sangramento crônico) • Sensação de estufamento após os alimentos ou que os “alimentos não descem” • Alterações nas fezes: principalmente fezes escuras ou pretas • Alerta para algumas doenças que podem evoluir para o câncer gástrico, como: Dispepsia e Refluxo; Gastrite; Úlcera gástrica; Esôfago de Barret b) Exame para detecção precoce de câncer gástrico: A pesquisa em massa da população assintomática (mass screening) ou a vigilância de pessoais em risco (survey at risk) pretendem diagnosticar o câncer gástrico em estadiamento precoce potencialmente curável. O mass screening tem relação custo-benefício muito desfavorável na maioria dos países, exceto em regiões de elevada incidência, como Japão, China e Coreia. Nesses países, a maioria das séries de casos de câncer gástrico apresentam de 50 a 80% de carcinomas precoces como resultado direto da aplicação do rastreamento. Em países de baixa incidência como o Brasil, as recomendações para vigilância de CG da Sociedade Americana de Endoscopia podem ser úteis, recomendando a realização de EDA com intervalos de 1 a 2 anos cm pacientes com alto risco, como história de adenoma gástrico, poli pose adenoma tosa familiar (PAF), carcinoma colorretal hereditário não associado à polipose (HNPCC), síndrome de Pcutz-Jeghers, doença de Ménétrier. O exame de endoscopia digestiva alta é o método de escolha no diagnóstico do CG, com sensibilidade de 86 a 98%io. Ela permite a descrição macroscópica da lesão e realização de biópsias da lesão. A acurácia no diagnóstico histológico do tumor varia conforme as amostras coletadas (número, tamanho dos fragmentos e local da biópsia) e de aspectos relacionados ao tumor (tipo macroscópico e histológico, presença de estenose etc.) No grupo de altorisco, devem ser acrescidos indivíduos com gastrectomia parcial prévia por doença péptica ou carcinoma e indivíduos com história familiar de câncer gástrico ou de cólon. As lesões ulceradas gástricas devem ser seguidas com particular insistência por endoscopia com múltiplas biópsias na borda da lesão ulcerada, porque a chance de detecção de um carcinoma associado a úlcera é maior, e dados estatísticos apontam que aproximadamente 25% dos pacientes com CG têm história de úlcera gástrica. Daniel V. Rodrigues-M33 Ps: Além da classificação de câncer gástrico precoce, ainda se tem a classificação de câncer gástrico avançado, denominado: Classificação de Borrmann. Ao qual é visualizado no momento da realização da endoscopia digestiva alta. 5- Distinguir os exames adequados para o estadiamento TNM do câncer gástrico e os fatores prognósticos do câncer gástrico A investigação diagnóstica inicia com a história clínica, avaliação de sintomas, sinais e história familiar. É de extrema importância uma boa avaliação diagnóstica e estadiamento prévio à escolha terapêutica. O estadiamento acurado, considerando a classificação TNM, é o elemento significativamente mais determinante do plano de tratamento adequado e consequentemente forte preditor de sobrevida e recorrência nessa doença. Fazem parte dos exames de estadiamento recomendados: exames de laboratório, endoscopia digestiva alta (EDA), incluindo biópsia, tomografia de abdome e pelve, além de, tomografia ou raios X de tórax. Os marcadores tumorais como CEA e CA19.9 não são úteis no diagnóstico, porém quando inicialmente elevados podem fazer parte das recomendações de seguimento e avaliação de resposta ao tratamento. A EDA é o melhor método para estabelecimento de diagnóstico de câncer gástrico, sendo capaz de identificar a tumoração, localização, extensão, permitindo ainda a obtenção de material histológico para análise patológica. Faz-se o estadiamento por meio da realização da radiografia do tórax, tomografia computadorizada ou ultrassonografia de abdome e pelve. Há de se ressaltar a eventual dificuldade de diagnóstico por endoscopia de uma forma mais agressiva de câncer gástrico, a linite plástica que se caracteriza por infiltração transmural difusa sem ulceração ou tumor vegetante. Nesse caso, a ausência ou dificuldade de distensibilidade do estômago deve chamar a atenção para essa possibilidade diagnóstica. N ão penetra além da muco sa ou submucosa na presença ou não de metástase linfonoda l Daniel V. Rodrigues-M33 A tomografia computadorizada é o método atualmente mais indicado para diagnóstico de doença metastática à distância. Com mudança de paradigma e fortalecimento da indicação de modalidades de tratamento, como a quimioterapia neoadjuvante, se faz necessário o estadiamento pré-operatório adequado. A laparoscopia é um método cirúrgico diagnóstico e terapêutico que vem sendo recomendado, com a intenção de identificar doença metastática oculta, apontado como método mais específico para detecção de implantes peritoneais e, consequentemente, importante na decisão terapêutica específica. A tomografia com emissão de pósitrons (PET/CT), ainda é considerado método experimental no estadiamento do câncer gástrico, e tem mostrado valor na predição de resposta precoce após quimioterapia neoadjuvante. b) Fatores prognósticos do câncer gástrico Em geral, a taxa de sobrevida global do câncer gástrico em 5 anos é inferior a 10%. Os fatores prognósticos incluem localização anatômica e estado nodal. Os tumores gástricos distais sem comprometimento dos linfonodos apresentam melhor prognóstico do que os tumores gástricos proximais com ou sem comprometimento linfonodal. Outros fatores prognósticos compreendem a profundidade de penetração da parede gástrica e a presença de aneuploidia no DNA da célula tumoral. A linite plástica e as lesões infiltrativas apresentam um prognóstico muito pior do que a doença polipoide ou as massas exofíticas. No subgrupo de pacientes japoneses, em sua maioria portadores de câncer gástrico inicial restrito a mucosa e submucosa, a ressecção cirúrgica pode ser curativa e melhorar definitivamente as taxas de sobrevida em 5 anos para mais de 50%. De fato, quando o câncer gástrico inicial está limitado à mucosa, uma alternativa pode ser a ressecção por via endoscópica. 6- Comparar noções da terapêutica do câncer gástrico a) Terapia cirúrgica: A ressecção cirúrgica ainda é a única modalidade terapêutica que isoladamente fornece chance de cura, que é possível em apenas 25% a 30% dos casos. Se o tumor estiver confinado ao estômago distal ou anto, realiza-se uma gastrectomia subtotal com ressecção dos linfonodos na porta hepatis e na cabeça do pâncreas. Em contrapartida, os tumores do estômago proximal e médio, ou quando se trata de linite plástica ou tumor difuso, merecem uma gastrectomia total para obter margem cirúrgica adequada e para remover linfonodos; a pancreatectomia distal e a esplenectomia também podem ser realizadas como parte deste procedimento, o que acarreta taxas de mortalidade e morbidade mais elevadas. Daniel V. Rodrigues-M33 Mesmo se um procedimento de cura não for possível por causa de metástase, a ressecção gástrica limitada pode ser necessária para os pacientes com sangramento excessivo ou obstrução. Se o câncer recorrer no coto gástrico, pode haver necessidade de uma nova ressecção limitada, com intuito paliativo. A maior parte das recorrências em ambos os tipos de câncer gástrico encontra-se no local ou na região do tumor primário. b) Terapia clínica: O câncer gástrico é um dos poucos tumores gastrointestinais que é relativamente responsivo à quimioterapia. Em pacientes com câncer gástrico que se submetem à gastrectomia e à dissecção estendida do linfonodo com intenção curativa, S-1 (fluoropirimidina oral, 80 mg por dia, por 4 semanas seguida por 2 semanas sem, repetindo em ciclos de 6 semanas por 1 ano, começando 6 semanas após a cirurgia), como estratégia adjuvante, melhora significativamente a sobrevida em 3 anos de 70% a 80%. A quimioterapia com combinação de epirrubicina, cisplatina e fluorouracil, administrada antes e após a cirurgia, aumenta significativamente a sobrevida em 5 anos, de 23% a 36%, em pacientes com câncer gastroesofágico ressecável. Da mesma maneira, a combinação de quimioterapia (fluorouracil e leucovorina) com radioterapia após a cirurgia demonstrou melhorar a sobrevida mediana de 27 para 36 meses, em comparação com a cirurgia isoladamente, em pacientes com adenocarcinoma do estômago ou da junção gastroesofágica. c) Métodos gerais: Estão implícitos no tratamento do paciente com câncer gástrico a atenção meticulosa à nutrição (alimentação enteral jejunal ou nutrição parenteral total), a correção das alterações metabólicas que surgem com vômitos ou diarreia, e o tratamento de infecção por aspiração ou peritonite bacteriana espontânea. O tratamento de erradicação do H. pylori reduz o risco para carcinoma gástrico metacrônico em cerca de dois terços. Para manter a permeabilidade do lúmen gástrico, o tratamento endoscópico a laser ou a colocação de prótese ou stent podem ser utilizados de maneira paliativa Referência: Cecil medicina / editado por Lee Goldman, Andrew I. Schafer ; - 24. ed. - Rio de Janeiro: Elsevier, 2014. Clínica Médica - Volume 4 - USP - Martins - 2a. edição – Manole. Hoff, Paulo Marcelo Gehm (ed). Tratado de oncologia. SÃO PAULO: ATHENEU, 2013. Robbins patologia básica/Vinay Kumar, Abul K. Abbas, Jon C. Aster; - 10. ed. - Rio de Janeiro: Elsevier, 2018.
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