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Pérola Guimarães DIARREIA AGUDA CONCEITO: -É a eliminação anormal de fezes amolecidas ou líquidas com uma frequência igual ou maior a três vezes por dia e duração de até 14 dias. OBS: Neonatos e lactentes, em aleitamento materno exclusivo, podem apresentar esse padrão de evacuação sem que seja considerado diarreia aguda. Disenteria: é a diarreia com a presença de sangue e/ou leucócitos nas fezes. Diarreia persistente: quando o quadro diarreico se estende além de 14 dias. ETIOLOGIA: -A diarreia aguda pode ter causas infecciosas e não infecciosas. -Mundialmente, as causas infecciosas apresentam uma maior prevalência e impacto na saúde das crianças, principalmente nas menores de 5 anos. Diarreias agudas de origem não infecciosa: Alergias, intolerâncias e erros alimentares, além de certos medicamentos. Diarreias agudas de origem infecciosa: têm como principais agentes os vírus, as bactérias e os protozoários. -No mundo inteiro, os vírus são os principais causadores das diarreias infecciosas, sendo os mais prevalentes os rotavírus, os calicivírus, os astrovírus e os adenovírus entéricos. Os vírus são altamente infectantes e necessitam de baixa carga viral para causar doença. -Os rotavírus têm ocorrência universal, sendo os principais responsáveis por episódios de diarreia aguda, tanto nos países desenvolvidos como naqueles em desenvolvimento. A infecção por rotavírus é autolimitada, com pico de incidência na faixa etária de 6 a 24 meses. Os astrovírus são menos prevalentes. Apesar de poder ocorrer em adultos e crianças, os lactentes são os mais acometidos. A transmissão é de pessoa a pessoa e geralmente provoca casos de diarreia leve e autolimitada. -As diarreias agudas de causa bacteriana e parasitária são mais prevalentes nos países em desenvolvimento e têm pico de incidência nas estações chuvosas e quentes. -A transmissão da maioria dos patógenos que causam diarreia é fecal-oral, mas pode ocorrer de várias maneiras FISIOPATOLOGIA E QUADRO CLÍNICO: -O pH ácido gástrico, a flora bacteriana normal, o peristaltismo intestinal, as mucinas presentes na camada de muco que reveste a superfície luminal dos enterócitos, fatores antimicrobianos como lisozimas e lactoferrina e o sistema imune entérico compõem a barreira de defesa do sistema digestório potencializado em crianças que usam leite materno exclusivo. Para que ocorra diarreia aguda infecciosa, os microrganismos precisam romper essa barreira e aderir à superfície mucosa, mecanismo este comum a todos os patógenos. Depois da aderência à superfície celular, os microrganismos exercem seus fatores de virulência por meio da produção de enterotoxina, citotoxina e lesão da mucosa intestinal de intensidade variada, podendo até deter- minar em alguns casos infecção generalizada. -Dependendo do fator de virulência do microrganismo, podem ocorrer quatro mecanismos fisiopatológicos de diarreia aguda: mecanismo osmótico, secretor, inflamatório e de alteração da motilidade. -A diarreia osmótica predomina nos quadros virais. O rotavírus causa lesões focais, com infecção das células vilositárias apicais, que concentram as dissacaridases, principalmente a enzima lactase. Com a destruição desses enterócitos e a reposição por células imaturas, há diminuição da atividade enzimática, reduzindo a absorção dos Pérola Guimarães carboidratos, com ênfase na lactose. Os açúcares não absorvidos aumentam a pressão osmótica na luz intestinal, o que determina a maior passagem de água e eletrólitos para o espaço intraluminal para manter o equilíbrio osmótico. Esse tipo de diarreia caracteriza-se pela eliminação de fezes líquidas e volumosas, amareladas, com caráter explosivo e com grande perda hidreletrolítica. Os vômitos são frequentes e precoces, precedendo a diarreia e causando a desidratação, principalmente nos lactentes, faixa etária em que se concentram os quadros mais graves. A febre, geralmente alta, ocorre em aproximadamente metade dos casos. -A diarreia secretora caracteriza-se por perda de grande volume de água e de eletrólitos, por ação de enterotoxinas que estimulam os mediadores da secreção, a adenosina monofosfato cíclico (AMPc), guanosina monofosfato cíclico (GMPc) e o cálcio, levando à diminuição da absorção de água e íons e à secreção ativa pela criptas. -A diarreia inflamatória é causada por patógenos que invadem a mucosa do intestino delgado ou grosso, ocasionando resposta inflamatória local ou sistêmica, dependendo da extensão da injúria. - O quadro clínico caracteriza-se por febre, mal-estar, vômitos, dor abdominal do tipo cólica e diarreia disentérica, com fezes contendo sangue, muco e leucócitos. Os sintomas sistêmicos serão tão mais intensos quanto maior for o potencial invasivo do patógeno. Em algumas situações, os microrganismos podem atingir a circulação sistêmica, afetando órgãos a distância como articulações, fígado, baço e sistema nervoso central. -A principal complicação da diarreia aguda é a desidratação, que nos casos de maior gravidade pode levar a distúrbio hidreletrolítico e acidobásico, choque hipovolêmico e até morte. As crianças menores de 1 ano são as mais vulneráveis. Nas populações mais carentes, a diarreia aguda pode ser um fator determinante ou agravante da desnutrição, que por sua vez aumenta a predisposição à infecção, além de uso prévio recente de antibióticos. DIAGNÓSTICO: -O diagnóstico da diarreia aguda é eminentemente clínico. Por meio de uma história e um exame físico detalhados, é possível levantar hipóteses quanto a determinados agentes etiológicos e orientar as medidas terapêuticas necessárias. Deve constar na anamnese: duração da diarreia, características das fezes, número de evacuações diarreicas por dia, vômitos, febre, diurese (volume, cor e tempo decorrido da última micção), uso de medicamentos, sede, apetite, tipo e quantidade de líquidos e alimentos oferecidos após o início da diarreia, doenças prévias, estado geral, presença de queixas relacionadas a outros sistemas, viagem recente, contato com pessoas com diarreia e ingestão de alimentos suspeitos, além do uso prévio recente de antibióticos. -O exame físico deverá ser completo, incluindo avaliação nutricional, pois a desnutrição é fator de risco para quadros mais graves e evolução para diarreia persistente. É importante lembrar também que a diarreia, principalmente no lactente, pode acompanhar quadros de pneumonia, otite média, infecção do trato urinário, meningite e septicemia bacteriana. -A solicitação de exames laboratoriais não é necessária rotineiramente para o tratamento da diarreia aguda, habitualmente autolimitada, ficando reservada para os casos de evolução atípica, grave ou arrastada, presença de sangue nas fezes, lactentes menores de 4 meses e para os pacientes imunodeprimidos. -O hemograma completo deve ser solicitado para avaliar anemia e padrão leucocitário; ionograma, ureia e creatinina, nos casos com distúrbio hidreletrolítico grave e impacto na função renal. -Nas fezes, pH fecal, substâncias redutoras, leucócitos, hemácias, sangue oculto e coprocultura, ELISA para vírus e pesquisa de toxina para Clostridium são os exames mais frequentemente solicitados. - A ausência de leucócitos fecais não exclui a presença de bactéria invasiva, mas a sua presença indica inflamação e organismos que invadem a mucosa intestinal. -TRATAMENTO E PREVENÇÃO: -Terapia de reidratação oral e dieta Pérola Guimarães -A criança com diarreia aguda sem desidratação pode ser tratada no domicílio. Orienta-se aumentar a oferta de líquidos e após cada evacuação diarreica oferecer a solução de reidratação oral (SRO), de 50 a 100 ml para menores de 2 anos, 100 a 200 ml para crianças de 2 a 10 anos, e, para aquelas acima de 10 anos, o quanto aceitar. -Orientar aos familiares a observação de sinais de desidratação e gravidade. Sucos, refrigerantes, energéticos e outros não substituem a SRO, uma vez quesão hiperosmolares. -Na criança com diarreia e desidratação leve a moderada, realiza-se a reposição com 50 a 100 mL/kg em 3 a 4 horas, oferecendo a SRO em pequenos volumes, com copo, com frequência, de modo supervisionado por profissional de saúde. Em casos de vômitos persistentes, deve-se tentar a administração da SRO por sonda nasogástrica, 20 mL/kg/h, durante 4 a 6 horas. -Durante o período de reidratação, não alimentar a criança, exceto se estiver em aleitamento materno. A criança com diarreia e desidratação grave necessita de hospitalização e hidratação endovenosa para restabelecer rapidamente a perfusão aos órgãos vitais. -Recomenda-se manter a alimentação normal para a idade nos casos sem desidratação e reintroduzi-la de forma gradativa, com refeições frequentes e leves, selecionando alimentos ricos em energia e micronutrientes (grãos, ovos, carnes, frutas e hortaliças), sem a necessidade de diluir o leite ou de substituí-lo por uma fórmula sem lactose. -Os lactentes em aleitamento materno devem continuar a ser amamentados, mesmo durante o período de reidratação. Medicações - Nas crianças que vivem nos países em desenvolvimento, o uso do zinco oral deve ser recomendado na dose de 20 mg por dia, durante 10 dias; e nos lactentes menores de 2 meses, na dose de 10 mg por dia, também durante 10 dias, para o tratamento da diarreia aguda. -Os antieméticos são desnecessários para o tratamento da diarreia aguda e não conferem benefício -Os probióticos podem ser úteis para reduzir a gravidade e a duração da diarreia aguda infecciosa infantil, abreviando em cerca de 1 dia a sua duração, principalmente nas diarreias de etiologia viral. -Os antiperistálticos, como a loperamida, não são recomendados para tratar crianças, pois aumentam a gravidade e as complicações da doença, particularmente em crianças com diarreia invasiva. -A racecadotrila é uma droga antissecretora que inibe a encefalinase intestinal sem reduzir o transito intestinal ou promover o supercrescimento bacteriano. A medicação reduz a duração da diarreia e o volume de fezes. -Os quadros de diarreia aguda em geral são autolimitados e, portanto, o uso racional de antibióticos evita o aparecimento de complicações, bem como de resistência bacteriana, sendo excepcionalmente indicados. -Os antimicrobianos são indicados para os casos mais graves: na diarreia com sangue, nos pacientes imunodeprimidos e em lactentes jovens, menores de 4 meses; PREVENÇÃO DA DIARREIA: -O aleitamento materno exclusivo durante os 6 primeiros meses e após esta idade, acompanhado de alimentação complementar adequada para a idade, o uso de água tratada, de alimentos adequadamente preparados e acondicionados e esgotamento sanitário apropriado previnem a incidência de diarreia. -A vacinação é a melhor maneira de prevenir a infecção por rotavírus. -A imunização contra o sarampo pode reduzir a incidência e a gravidade das doenças diarreicas, por isso, essa vacinação deve ser feita para todos os lactentes na idade recomendada.
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