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80 Re vi sã o: N om e do re vi so r - D ia gr am aç ão : N om e do d ia gr am ad or - d at a Unidade II Unidade II 5 DEFICIÊNCIA VISUAL No Brasil, 6,5 milhões de pessoas têm deficiência visual (DV); destas, 6 milhões apresentam baixa visão e 582 mil são cegas. A OMS aponta que 80% dos casos de deficiência visual poderiam ser evitados se houvesse ações mais efetivas de prevenção e tratamento (BRASIL, 2012). Entre as causas mais comuns de deficiência visual, estão o glaucoma, a retinopatia diabética, a atrofia do nervo óptico e as degenerações relacionadas à idade. Quanto à deficiência infantil, o glaucoma congênito, a retinopatia da prematuridade e a toxoplasmose ocular congênita estão entre as causas principais. A luz sempre foi associada a fatores positivos, como a paz, a inteligência e os momentos felizes; por outro lado, a escuridão sempre esteve associada às trevas, ao sinistro e ao mal. Na era primitiva, acreditava-se que a luz saísse de dentro dos olhos para o ambiente, e como as pessoas cegas não tinham essa luz, possivelmente fossem ligadas às forças malignas. A deficiência visual foi retratada em muitas obras de arte, entre elas a pintura de Pieter Bruegel, conhecida como A Parábola do Cego. Nela se veem cegos com as mãos dadas, em fila, utilizando bengalas para percorrer um caminho. Alguns estudos apontam que o quadro faz referência ao Evangelho de Mateus, capítulo 15, versículo 14: “Deixai-os! São cegos que guiam cegos. Ora, se um cego guia outro cego, ambos cairão em algum barranco” (PASSOS, 2013). Figura 66 - Quadro “A Parábola do Cego”, de Pieter Bruegel Ao longo da história, algumas formas de entender a problemática de deficiência foram construídas, discutidas e modificadas; isso sempre se refletiu na atitude e na postura em relação às pessoas consideradas diferentes ou fora dos padrões de normalidade. Atualmente, existe a preocupação em proporcionar, da melhor forma possível, as condições para que as pessoas com deficiência visual tenham as mesmas oportunidades que as pessoas sem deficiência. 81 Re vi sã o: N om e do re vi so r - D ia gr am aç ão : N om e do d ia gr am ad or - d at a EDUCAÇÃO FÍSICA ADAPTADA 5.1 Conceitos A deficiência visual é definida como a perda total ou parcial da capacidade visual em ambos os olhos, mesmo após correção cirúrgica ou óptica. Essa deficiência leva a pessoa a restrições no desempenho das tarefas rotineiras e habituais. Quando o uso de óculos ou lentes de contato permite à pessoa uma correção óptica adequada, ela não é caracterizada, portanto, como portadora de uma deficiência visual. Além disso, mesmo em caso da perda total da visão em um dos olhos, se a pessoa tiver boa visão remanescente no outro olho, ela não será enquadrada como deficiente visual. Habitualmente, cerca de 80% das informações e estímulos que recebemos são visuais, enquanto os outros 20% provêm de todos os outros sentidos e percepções. Fica claro que a privação desse sentido, especialmente para as pessoas que não aprimoram outras vias sensoriais, trará grandes restrições na mobilidade, na compreensão dos significados e nas interações sociais. O estímulo adequado é fundamental para que esse aluno possa vivenciar atividades motoras, perceptivas e intelectuais e assim participar efetivamente da sociedade em que está inserido. 5.2 Estruturas oculares e funções visuais A avaliação da deficiência visual é realizada com base em algumas funções visuais. Porém, antes de estudarmos essas funções, é importante entendermos como funciona o órgão da visão. 5.2.1 Anatomia do olho O globo ocular possui um diâmetro anteroposterior de 2,5 cm e é composto por três camadas distintas: • Camada externa: fornece a sustentação e a proteção às estruturas oculares. – Esclera: estrutura fibrosa que concede o formato de globo e na qual estão inseridos os músculos oculares. – Córnea: estrutura convexa responsável por direcionar o feixe de luz para a retina. • Camada média: nutre as camadas externas e internas entre as quais está situada. – Coroide: a pressão intraocular pode alterar o fluxo sanguíneo dessa estrutura, que é altamente vascularizada. Devido à sua coloração escura, também é chamada de úvea. – Íris: confere a cor aos olhos e apresenta um orifício central chamado pupila. – Pupila: responsável pelo controle de entrada da luminosidade no olho. 82 Re vi sã o: N om e do re vi so r - D ia gr am aç ão : N om e do d ia gr am ad or - d at a Unidade II – Corpo ciliar: possui vasos sanguíneos responsáveis pela produção e drenagem do humor aquoso. – Humor aquoso ou humor vítreo: irriga a córnea e o cristalino e faz a manutenção da pressão intraocular. Caso ocorra uma mudança na concentração dessa substância, podem ocorrer hipotonia ou hipertensão ocular. • Camada interna: também conhecida como camada nervosa, é extremamente delicada. Por meio dela ocorre a comunicação com o sistema nervoso central através do nervo óptico. – Retina: estrutura delicada, composta por células fotorreceptoras (cones e bastonetes) responsáveis por reagirem à luz e transformá-la em impulso nervoso. É considerada um prolongamento do nervo óptico, pois conduz o impulso até o córtex visual. Os bastonetes são sensíveis ao movimento e à baixa intensidade luminosa, por isso são importantes para uma boa visão noturna, mas não distinguem cores (por esse motivo, em ambientes escuros, identificamos mais facilmente tonalidades acinzentadas). Em contrapartida, os cones precisam de maior quantidade de luz e definem cores e detalhes mais refinados. São três tipos de células cones, e cada uma delas é sensível a um tipo de luz (verde, vermelha ou azul). Caso haja alguma alteração no funcionamento dessas células, a pessoa apresenta dificuldade em distinguir tonalidades das cores básicas, como ocorre no daltonismo. Esclera Coróide Cristalino Pupila Íris Conjuntiva Humor vítreo Disco óptico Corpo ciliar Córnea Retina Mácula (Fóvea) Câmara anterior Nervo óptico Figura 67 - Principais estruturas do olho humano Caso ocorra algum dano estrutural ou funcional de uma dessas partes, há uma alteração nas funções visuais. 5.2.2 Funções visuais • Acuidade visual: é a capacidade de distinguir detalhes por meio da relação entre o tamanho do objeto e a distância em que ele está situado. A avaliação dessa função visual envolve a apresentação de uma sequência de estímulos padronizados, que progressivamente vão diminuindo de tamanho, sendo realizada também a uma distância padronizada. Os testes mais comuns são baseados na Escala de Snellen, no qual são apresentadas figuras distribuídas em um plano. A linha inferior deve ser lida a seis metros de distância, e a linha superior a sessenta metros. Caso a linha superior seja lida apenas a 83 Re vi sã o: N om e do re vi so r - D ia gr am aç ão : N om e do d ia gr am ad or - d at a EDUCAÇÃO FÍSICA ADAPTADA 20 metros, a visão é de 20/60 do normal, ou seja, o que uma pessoa com visão perfeita enxerga a 60 metros, essa pessoa com visão deficiente precisa estar a 20 metros para enxergar. O resultado, portanto, é sempre baseado numa relação entre os valores de distância do objeto e do tamanho do objeto. Figura 68 - Escala de Snellen • Campo visual: é a extensão angular em um espaço no qual um objeto pode ser visto com o olhar fixado à frente, podendo ser monocular ou binocular. O campo de visão total do ser humano é de 180º. Em um campo de visão binocular, os dois olhos visualizam os 120º centrais; os 30º periféricos de cada lado são exclusivos de cada olho (os30º da esquerda, apenas o olho esquerdo pode visualizar, e os 30º da direita, apenas o olho direito pode visualizar). 120° comuns a ambos os olhos 30° específicos OE 30° específicos OD150° OD150° OE Figura 69 - Representação do campo visual • Binocularidade: é a capacidade de realizar a fusão da imagem vinda dos dois olhos em convergência perfeita, proporcionando noção de profundidade e a melhor percepção possível dos objetos no espaço. Quando os olhos não são alinhados, como no caso do estrabismo, a função de binocularidade pode ser prejudicada. 84 Re vi sã o: N om e do re vi so r - D ia gr am aç ão : N om e do d ia gr am ad or - d at a Unidade II Outras funções menos utilizadas para a classificação da deficiência visual também podem ser citadas, entre elas: visão para cores, sensibilidade à luz e sensibilidade ao contraste. Exemplo de aplicação Feche um dos olhos e, com muito cuidado, desça um degrau. Perceba como a noção de profundidade é alterada. Além disso, para algumas situações é realizada a avaliação da visão funcional, que é a capacidade que uma pessoa tem de conviver com a sua limitação visual. Pessoas com a mesma limitação podem apresentar visão funcional diferente. Essa avaliação é realizada por uma equipe multidisciplinar e normalmente é influenciada por diversos estímulos e vivências oferecidos no decorrer da vida. Observação Apesar de não existirem testes padronizados para avaliar a visão funcional, o profissional deve atentar ao aluno na realização de diversas tarefas e assim realizar os ajustes mais adequados de acordo com as necessidades. 5.3 Classificação da deficiência visual A deficiência visual pode ser classificada sob dois aspectos: educacional e esportivo. 5.3.1 Classificação educacional Seguem os tipos de classificação educacional: • Pessoa cega: apresenta, no máximo, uma percepção luminosa que auxilia na orientação e na mobilidade, mas não de maneira irrestrita. Os meios visuais não são suficientes para a aquisição de conhecimentos; por isso, essa pessoa necessita utilizar o sistema braille e outros instrumentos táteis e auditivos no processo de ensino-aprendizagem. • Pessoa com baixa visão (ou visão subnormal): apresenta dificuldade de desempenhar tarefas visuais mesmo com o auxílio de lentes corretivas; entretanto, por meio de recursos compensatórios e adaptações ambientais, pode aprimorar a capacidade de realizar essas tarefas. O braille e o soroban são duas das mais importantes formas de aprendizagem para o aluno com deficiência visual. O sistema braille é utilizado mundialmente para leitura e escrita por pessoas cegas. Foi inventado em 1825 por Louis Braille e representou um marco muito importante para a educação e a inserção social das pessoas com deficiência visual. 85 Re vi sã o: N om e do re vi so r - D ia gr am aç ão : N om e do d ia gr am ad or - d at a EDUCAÇÃO FÍSICA ADAPTADA O sistema braille consiste em 64 símbolos formados a partir da combinação de até seis pontos, dispostos em duas colunas com três pontos cada. Esses seis pontos formam a célula braille (ou cela braille), que é numerada de cima para baixo, da seguinte forma: na coluna da esquerda, ficam os pontos 1, 2 e 3; na coluna da direita, os números 4, 5 e 6. A partir da combinação desses pontos, podem-se obter algarismos, letras e sinais de pontuação. A leitura é realizada da esquerda para a direita, ao toque de uma ou mais digitais ao mesmo tempo. 1 4 2 5 3 6 Figura 70 - Célula braille Figura 71 - Alfabeto braille 86 Re vi sã o: N om e do re vi so r - D ia gr am aç ão : N om e do d ia gr am ad or - d at a Unidade II O soroban é conhecido também como ábaco japonês e serve para a realização de cálculos matemáticos (adição, subtração, multiplicação, divisão, raiz quadrada, raiz cúbica, cálculos decimais, entre outros). A versão japonesa foi adaptada para os deficientes visuais de forma que as contas (bolinhas) não deslizassem livremente pelas hastes e que os pontos de referência fossem em relevo. O uso constante desse instrumento desenvolve a concentração, a atenção, a memória, o cálculo mental e a coordenação motora fina. Atualmente, é considerado fundamental para o desenvolvimento cognitivo e para a formação acadêmica e profissional. Figura 72 - Soroban, instrumento para cálculos matemáticos 5.3.2 Classificação esportiva Na maior parte das modalidades, os atletas com deficiência visual são classificados com base nas três classes descritas a seguir. A avaliação é realizada sempre considerando o melhor olho ou ambos os olhos. • B1: atletas com, no máximo, percepção luminosa. • B2: atletas com campo visual de, no máximo, 5º e acuidade visual de, no máximo, 2/60. • B3: atletas com campo visual entre 5º e 20º e acuidade visual entre 2/60 e 6/60. 5.4 Causas da deficiência visual De uma forma geral, para o profissional de Educação Física, independentemente das causas, as adaptações quanto ao material, ao espaço e à forma de fornecer as informações para o aprendizado serão basicamente as mesmas. Entretanto, eventualmente, dependendo da lesão ocular, pode ser necessário algum cuidado específico ou pode haver alguma contraindicação à atividade física (VAN MUNSTER; ALMEIDA, 2013). A deficiência visual pode ter causa congênita ou adquirida e pode ou não ser progressiva. A seguir estão listadas as principais causas dessa deficiência. • Albinismo: sensibilidade extrema à luz. É causado por deficiência na pigmentação da íris. Pode apresentar nistagmo (curto e rápido movimento involuntário do globo ocular). 87 Re vi sã o: N om e do re vi so r - D ia gr am aç ão : N om e do d ia gr am ad or - d at a EDUCAÇÃO FÍSICA ADAPTADA • Ambliopia: diminuição da acuidade visual (estrabismo ou anisometropia). • Astigmatismo: variações na curvatura da córnea, causando embaçamento e distorção da visão. • Catarata: alteração na transparência do cristalino, tornando-o opaco e causando embaçamento. É possível o implante de uma lente artificial na parte interna da estrutura capsular do cristalino por meio de procedimento cirúrgico. • Degeneração macular: perda da acuidade e aparecimento de um ponto cego central no campo visual. • Descolamento de retina: separação das camadas que compõem essa estrutura, provocada por doenças sistêmicas, inflamações, infecções ou choque mecânico. • Diabetes: podem aparecer complicações após uma década do início da doença. Pode ocasionar retinopatia, neurite óptica e paralisação dos músculos do olho. • Estrabismo: olhos desalinhados, impedindo fusão da imagem e, portanto, prejudicando a função binocular. • Glaucoma: pressão intraocular aumentada que leva a uma diminuição do campo visual, deformação da pupila e diminuição dos movimentos da íris. • Hipermetropia: eixo óptico encurtado e dificuldade em focalizar objetos próximos. • Miopia: eixo óptico alongado e dificuldade para enxergar a distância. • Presbiopia: processo fisiológico do envelhecimento que causa a perda progressiva da capacidade de acomodação do cristalino. Conhecida popularmente como vista cansada. • Processos infecciosos durante a gestação: rubéola, sífilis, entre outras. • Retinoblastoma: tipo de câncer que frequentemente leva à remoção do olho. Costuma-se usar um globo ocular protético. • Retinopatia da prematuridade: desordem caracterizada pela proliferação anormal dos vasos sanguíneos da retina, causada pela alta concentração de oxigênio dentro das incubadoras, podendo ocorrer sangramento e descolamento da retina. • Traumatismos oculares: lesões traumáticas (mecânicasou não mecânicas) que prejudicam as estruturas oculares. A gravidade do trauma e as possíveis sequelas variam de acordo com a extensão da lesão. • Uveíte: inflamação da coroide que pode resultar em sequelas de diferentes gravidades. 88 Re vi sã o: N om e do re vi so r - D ia gr am aç ão : N om e do d ia gr am ad or - d at a Unidade II 5.5 Características 5.5.1 Características físico-motoras O desenvolvimento da criança com deficiência visual sofre algumas interferências importantes em decorrência da privação visual. Como dito anteriormente, aproximadamente 80% dos estímulos que recebemos são visuais, por isso a interação dessa criança com o mundo físico torna-se um processo diferenciado. A visão também contribui para integrar as demais modalidades sensoriais e auxiliar na compreensão das sensações que recebemos dos outros sentidos. O contato com esse mundo físico acontece por meio dos sentidos, e a qualidade dessa percepção está intimamente relacionada ao desenvolvimento das habilidades motoras, que favorecerá a interação da criança com o ambiente à sua volta. Segundo van Munster e Almeida (2013), a responsividade da criança com deficiência visual aos estímulos auditivos e táteis, nos anos iniciais, dá-se em três níveis: • Reação simples: ocorre logo nos primeiros dias de vida e permite inferir que a criança detecta o estímulo. • Reação discriminativa: é observada nos primeiros meses de vida e permite inferir que a criança diferencia os estímulos. • Reações interativas: por depender de uma organização mais complexa, demoram um pouco mais para se desenvolver, mas após alguns meses que a criança apresenta a reação discriminativa, já ocorre uma interação com o estímulo, e ela busca se envolver ou evitar tal estímulo. Considerando a importância dos estímulos nos primeiros anos de vida para o desenvolvimento global da criança, fica claro que quanto antes forem estimulados os outros sentidos da criança com deficiência visual, menor será o impacto da privação visual no seu desenvolvimento. As habilidades de locomoção e manipulação são, sem dúvida, fundamentais para uma melhor interação da criança com o ambiente. Entretanto, a habilidade de engatinhar ou andar não ocorre pelo simples prazer na atividade, mas para alcançar algum objeto, pessoa ou um estímulo qualquer. Dessa forma, fica claro que, se a criança não tiver um estímulo sonoro ou tátil, provavelmente o desenvolvimento dessas habilidades de locomoção ocorrerá mais tardiamente em comparação com as crianças sem a deficiência visual. Aparentemente, crianças com visão subnormal tendem a apresentar mais facilidade na aquisição das habilidades de locomoção porque, mesmo que apresentem apenas a percepção luminosa, este já é um estímulo que auxilia na orientação, na posição da cabeça e do corpo no espaço. Da mesma forma, o equilíbrio e a postura tendem a ser melhores nas pessoas com percepção luminosa, quando comparadas às pessoas com cegueira total. 89 Re vi sã o: N om e do re vi so r - D ia gr am aç ão : N om e do d ia gr am ad or - d at a EDUCAÇÃO FÍSICA ADAPTADA Outro fato interessante é que pessoas com deficiência visual que tiveram algum período de visão apresentam orientação espacial e lateralidade melhores do que as de pessoas com a deficiência congênita (WARREN, 1994). Algumas outras implicações na postura e na marcha podem também ser observadas. Normalmente o aluno cego apresenta uma marcha lenta, com os pés arrastados e afastados e a passada mais curta. Além disso, os ombros ficam retraídos, a cabeça baixa e os braços estáticos. As pessoas com deficiência visual apresentam, ainda, maior risco de terem menor condicionamento físico, força e velocidade, e isso se deve à falta de oportunidades de serem engajadas em um programa de atividade física. A deficiência não é, por si só, a responsável por eventuais atrasos no desenvolvimento físico e motor da criança, e sim a falta de oportunidades e vivências proporcionadas a esta. Observação O encorajamento ou o receio que pessoas com deficiência visual recebem dos familiares para a prática da atividade física e dos esportes estão diretamente relacionados com a qualidade da oferta dessa atividade. 5.5.2 Características psicossociais Especialmente as crianças que não recebem estímulos suficientes podem desenvolver os chamados movimentos estereotipados (ou maneirismos). O termo abrange uma gama de atividades, como balanceio ritmado do tronco e da cabeça, gestos repetitivos com as mãos, toque ou fricção em determinadas partes do corpo, entre outras possibilidades. Aparentemente, esses movimentos surgem como uma necessidade de autoestimulação. Essas estereotipias, quando acontecem com frequência, devem ser motivo de atenção, pois podem interferir negativamente na capacidade de atenção a eventos do ambiente, inibir as interações sociais, além de gerar um empobrecimento das vivências pessoais. Outro fator que pode dificultar o desenvolvimento psicossocial é o medo e a dependência que normalmente surgem em decorrência da superproteção que os cegos experimentam desde muito cedo. Certamente, a postura e a reação dos pais em relação à deficiência influenciam diretamente a autoestima e a aceitação social. 5.6 Atividade física 5.6.1 Estímulos para a aprendizagem do movimento Na Educação Física, a demonstração e a instrução verbal são os meios mais utilizados para fornecer informações ao aprendiz; entretanto, quando nos deparamos com um aluno com deficiência visual, é 90 Re vi sã o: N om e do re vi so r - D ia gr am aç ão : N om e do d ia gr am ad or - d at a Unidade II necessário repensar os estímulos que serão oferecidos a ele para que o processo de ensino-aprendizagem possa ocorrer de forma efetiva. Normalmente, dividimos essas informações em quatro classes: • Auditiva verbal: a descrição verbal do movimento ou de parte dele é realizada pelo professor. • Auditiva não verbal ou sinalética: informações sonoras que facilitam a orientação (palmas, apitos, sinos, entre outros). • Tátil direta: o aluno é auxiliado pelo professor, que o tocará indicando-lhe a maneira de realizar o movimento. • Tátil indireta: o aluno busca informações ao acompanhar o movimento realizado pelo professor ou por um colega, tocando-o durante o exercício. A deficiência não afeta a capacidade de aprendizagem do aluno, mas, sim, como esse aluno irá aprender. Justifica-se, assim, a importância dos estímulos corretos para proporcionar a aprendizagem. Independentemente da experiência motora, um aluno com deficiência congênita assimilará um movimento por meio do esquema sensório-proprioceptivo (memória de movimento); por outro lado, um aluno com a deficiência adquirida provavelmente assimilará esse movimento pela imagem visual (imagem do movimento), mesmo que não o tenha executado, mas somente visto a execução. A partir disso, pode-se afirmar que as formas de ensino-aprendizagem baseadas na percepção tátil devem ser incentivadas, pois dessa forma serão facilitadas, inclusive, a memorização e a assimilação do movimento. Como o aluno com deficiência congênita desconhece as possibilidades gestuais do próprio corpo, somente por meio de diversas vivências articulares e musculares será possível a realização harmoniosa do movimento. Quanto melhor for o feedback oferecido pelo professor, quanto mais precocemente forem oportunizados os estímulos motores para o aluno e quanto maior a consciência do próprio corpo, mais facilitada será a aprendizagem de novos movimentos. A maior parte das instituições que trabalham em favor do desenvolvimento das pessoas com deficiência visual costuma indicar ou ofereceros cursos de Orientação e Mobilidade. Chamamos de orientação o aprendizado para obtenção de informações do ambiente e de mobilidade o controle de movimentos de forma organizada e eficiente. Dessa forma, entende-se que a orientação e a mobilidade são fundamentais para que o aluno com deficiência visual seja o mais autônomo e funcional possível. Provavelmente, o aluno que recebeu os estímulos para a sua orientação e mobilidade deva ter mais facilidade na aquisição de habilidades motoras. Os fatores motivação e encorajamento são também primordiais para um bom resultado na aprendizagem. 91 Re vi sã o: N om e do re vi so r - D ia gr am aç ão : N om e do d ia gr am ad or - d at a EDUCAÇÃO FÍSICA ADAPTADA A participação desses alunos num programa de atividade física pode ser muito benéfica, e eles podem alcançar um alto nível de desempenho nas atividades. Cabe ao profissional de Educação Física realizar uma avaliação inicial completa, conhecer as possibilidades e dificuldades do aluno, bem como o histórico sobre suas experiências motoras, e prescrever atividades seguras, motivadoras e que realmente desenvolvam toda a potencialidade desse aluno. 5.6.2 Adaptações do ambiente Para minimizar a insegurança para a locomoção e o risco de acidente experimentados pelos alunos com deficiência visual, é fundamental que seja realizado um reconhecimento detalhado do espaço onde será oferecida a atividade física. A coleta dessas informações ocorre de forma processual e analítica por meio da exploração repetida do espaço físico. Se o aluno for submetido a situações de risco ou desorientação, especialmente no início do programa, sua motivação poderá ser comprometida, e a tendência é que ele perca a confiança no espaço e no professor (GREGUOL, 2010). O profissional de Educação Física deve detalhar e chamar a atenção para as referências mais importantes para a orientação do aluno não só no ambiente específico da prática (quadra, piscina, sala de ginástica ou de musculação), mas também nos locais de circulação (corredores, vestiários, lanchonetes, arquibancadas etc.). A adaptação é muito importante para o desenvolvimento da autonomia do aluno nesse ambiente. Alguns obstáculos são considerados sem importância para quem enxerga, mas podem significar grande risco para o aluno com deficiência, por exemplo uma porta entreaberta; portas devem estar sempre totalmente abertas ou fechadas para evitar acidentes. Os materiais devem estar dispostos nos seus respectivos lugares, e não espalhados indevidamente pelo ambiente. As marcações em alto-relevo e antiderrapantes podem ser utilizadas nos locais de maior risco, como escadas e corredores. Além disso, as cores contrastantes e a entrada de luminosidade em alguns pontos (janelas e portas) também auxiliam na orientação de alunos com baixa visão. Os estímulos olfativos (presença de uma lanchonete ou cheiro de cloro de piscina) e auditivos (som da sala de ginástica, música ambiente da recepção ou som da sala de musculação) também contribuem para melhorar a orientação e a mobilidade. No caso de aulas de natação ou hidroginástica, as bordas, as raias, as escadas e as barras laterais podem servir como pistas de orientação. No caso de piscinas com profundidades diferentes, deve-se fazer uma marcação para que o aluno conheça a profundidade em cada local. Para as atividades em quadra, as linhas podem ser demarcadas com barbante e fita adesiva para facilitar o entendimento do espaço por parte do aluno. Aliás, em qualquer ambiente que se deseje uma demarcação, o uso do barbante e da fita adesiva é muito útil. 92 Re vi sã o: N om e do re vi so r - D ia gr am aç ão : N om e do d ia gr am ad or - d at a Unidade II Ainda em relação ao espaço, deve ser lembrado que ambientes com som muito alto ou muitas pessoas falando podem interferir negativamente na compreensão do aluno, além de fazer com que ele se sinta desorientado. 5.6.3 Adaptações dos materiais As adaptações para um aluno com baixa visão são diferentes das adaptações para uma criança totalmente cega. O estímulo sonoro é indispensável para o aluno cego; por isso, bolas com guizos dentro são extremamente úteis para esse aluno. Uma forma de adaptação é envolver uma bola comum dentro de um saco plástico ou papel celofane e fita adesiva, que, ao rolar, também emitirá som. Nas cordas, pode-se também prender alguns guizos para que, ao ser movimentada ou tocar o chão, emita sinal audível. A criatividade do professor é fundamental para um melhor aproveitamento do aluno. As adaptações necessárias ao aluno com baixa visão referem-se basicamente aos materiais com cores contrastantes, brilhantes ou que emitem luminosidade. Dessa forma, inclusive, é possível estimular o uso da visão funcional. 5.6.4 Considerações sobre a atividade física A natação é considerada um importante meio para o desenvolvimento e para a aprendizagem motora de crianças com deficiência visual. Entre os inúmeros benefícios, podem ser citados: a melhora do equilíbrio estático e dinâmico, o desenvolvimento da orientação espacial, o ritmo e a coordenação, além do fato de que a imersão do corpo na água potencializa os aspectos sinestésicos, devido à maior resistência da água em relação à resistência do ar; portanto, facilita a percepção do corpo no espaço, favorecendo a aprendizagem motora. Nas fases iniciais de aprendizagem, para que o aluno não se sinta desorientado na piscina, é importante que o professor esteja dentro da água e utilize abundantemente as informações táteis associadas às informações verbais. Figura 73 - Professora auxiliando aluna com deficiência visual por meio do estímulo tátil 93 Re vi sã o: N om e do re vi so r - D ia gr am aç ão : N om e do d ia gr am ad or - d at a EDUCAÇÃO FÍSICA ADAPTADA A estratégia do modelo do relógio também é bastante útil para orientar o aluno dentro da água, mesmo sem tocá-lo. Inicialmente, o profissional de Educação Física deve ensinar ao aluno, por meio de informações táteis, o funcionamento dos ponteiros das horas do relógio, em seguida pode utilizar essas horas como referenciais, por exemplo, solicitando que ele se movimente a 3 horas ou dê algumas braçadas a 9 horas e assim por diante. É importante ressaltar que uma das maiores dificuldades que o aluno cego encontra é a de nadar em linha reta, por isso é fundamental que, antes de iniciar o nado, ele esteja posicionado corretamente e com o corpo alinhado. Uma forma de auxiliá-lo é solicitar que ele una as mãos com os braços estendidos à frente do corpo, e, de acordo com a necessidade de alinhamento corporal, o professor solicita que ele aponte à esquerda ou à direita, até obter a posição desejada. As bordas e as raias também podem ser utilizadas como referência e auxiliam para um nado mais alinhado. Figura 74 - Aluno com deficiência visual utilizando estratégia de orientação Ainda em relação às atividades aquáticas, o professor deve lembrar que, quando está com a cabeça submersa, o aluno deixa de receber as informações auditivas, o que dificulta ainda mais a orientação dele. Greguol (2010) sugere que, para as viradas, são recomendados alguns implementos de segurança, como o acolchoamento nas bordas e cordas elásticas próximas ao nível da água, para que o aluno tenha a informação de que a borda está próxima, propiciando assim mais segurança. 94 Re vi sã o: N om e do re vi so r - D ia gr am aç ão : N om e do d ia gr am ad or - d at a Unidade II Figura 75 - Uso da corda elástica para informar o aluno sobre a proximidade da borda Além das atividades no meio líquido, outras,como musculação, ginástica, recreação, esportes e atividades rítmicas, de uma maneira geral, podem ser adaptadas para o aluno com deficiência visual. Para o ensino das corridas, é comum a utilização de cordas elásticas fixadas de ponto a ponto com uma argola pendurada ou um pedaço de cano de plástico (com a corda passada por dentro) para que o aluno segure e corra em linha reta. A corda estendida auxilia na orientação da corrida, e a argola ou o pedaço de cano evita que o aluno machuque a mão devido ao atrito na corda. Figura 76 - Jovem com deficiência visual realizando corrida com a orientação da corda elástica Atividades no trampolim têm sido muito utilizadas especialmente na melhora do equilíbrio e no controle corporal, além de propiciarem benefícios no desenvolvimento emocional, como coragem, autoconfiança e poder de decisão. As atividades rítmicas são bastante motivadoras e auxiliam no desenvolvimento de equilíbrio, coordenação, lateralidade, noção espaçotemporal, noção corporal e ritmo. 95 Re vi sã o: N om e do re vi so r - D ia gr am aç ão : N om e do d ia gr am ad or - d at a EDUCAÇÃO FÍSICA ADAPTADA Os exercícios realizados na musculação devem ser orientados para o aluno manter uma postura adequada e na correta execução dos movimentos. Os exercícios de resistência e força muscular são muito importantes para a melhora da aptidão física geral desses alunos. Lembrete A informação tátil estimula a propriocepção e a sinestesia, facilitando a aprendizagem do movimento. 5.6.5 Orientações gerais Veja, a seguir, as orientações gerais para as práticas: • realizar uma avaliação para verificar o nível de desempenho motor do aluno, a presença de visão residual e a relação do aluno com a luminosidade (se ela auxilia ou atrapalha); • estimular a autonomia do aluno sempre que possível; • usar formações em roda para dar orientações propicia a sensação de segurança ao aluno; • especialmente nos estágios iniciais de aprendizagem, as informações táteis e sinestésicas são muito importantes; • substituir pistas visuais por informações sonoras variadas (verbais e sinaléticas). As informações verbais devem ser claras e objetivas; • não mudar de lugar enquanto fornece as instruções, pois o aluno pode se sentir desorientado; • utilizar informações táteis, estimulando o aluno a sentir o seu próprio corpo e o corpo do professor na realização dos movimentos; • não chegar ou sair de perto do aluno sem avisar; • saber o nome dos alunos para facilitar a comunicação; • realizar a atividade em ambientes calmos e silenciosos, sem muitas interferências externas; • alunos com albinismo podem preferir trabalhar longe das janelas e dentro de ginásios, por terem uma sensibilidade acentuada à luminosidade; • apresentar ao aluno o seu ambiente de aula, conhecer todos os espaços existentes, percursos, inclinações no terreno e diferenças de piso; 96 Re vi sã o: N om e do re vi so r - D ia gr am aç ão : N om e do d ia gr am ad or - d at a Unidade II • atenção aos obstáculos que possam causar acidentes, se possível, eliminá-los; • fazer com que todos os alunos conheçam as regras de segurança durante as aulas, especialmente na aula inclusiva; • para os alunos com baixa visão ou percepção luminosa, pode haver alguma restrição para a preservação da visão remanescente; • alunos com descolamento de retina devem evitar os movimentos bruscos de balanço da cabeça e esportes de contato; já para alunos com glaucoma, devem ser evitadas as atividades em posições de apoio invertido, pois podem aumentar a pressão intraocular. Para os dois casos, deve-se ainda evitar natação em profundidade e mergulhos, bem como atividades de força de alta intensidade; • ao guiar uma pessoa com deficiência visual, não a segure pelo braço, pois isso traz sensação de insegurança e desconforto. Ofereça o seu braço semiflexionado para que o cego segure em você. Dessa forma, ele perceberá mais facilmente as mudanças de direção. Ainda assim, faça as descrições do percurso que julgar necessárias para a segurança do aluno (por exemplo, se irão subir ou descer um degrau). Na escada, ofereça-lhe o corrimão e, quando for passar por algum espaço estreito, como uma porta, posicione o braço para trás do seu corpo; a pessoa cega irá posicionar-se atrás de você, para que ela não bata no batente da porta. Lembrete O incentivo e a oportunidade à prática de atividades físicas são fundamentais, pois além de auxiliarem num estilo de vida mais saudável, favorecem o desenvolvimento global da pessoa com deficiência visual. Saiba mais O documentário a seguir pode proporcionar uma reflexão a respeito da deficiência visual e suas possibilidades: Janela da alma. Dir. João Jardim e Walter Carvalho, 2001. 73 minutos. 6 DEFICIÊNCIA AUDITIVA Na Antiguidade, acreditava-se que os surdos não tivessem capacidade inteligível, isso porque se dizia que sem a fala não se desenvolvia o pensamento. Aristóteles dizia que a linguagem era o que dava a condição de humano a um indivíduo, e portanto os surdos não eram considerados seres humanos competentes (BELTRAMI; MOURA, 2015). 97 Re vi sã o: N om e do re vi so r - D ia gr am aç ão : N om e do d ia gr am ad or - d at a EDUCAÇÃO FÍSICA ADAPTADA Na Idade Média, a igreja católica acreditava que os surdos não tivessem alma, não pudessem ser considerados imortais nem falar em sacramento. Em muitos países, eles eram jogados ao mar, ou do alto de rochedos, ou, ainda, eram rejeitados e abandonados em praça pública. Durante o período colonial, algumas famílias tinham vergonha de ter gerado um filho fora dos padrões de normalidade impostos pela sociedade e por isso os confinavam dentro de casa (LACERDA, 1998). Em 1856, D. Pedro II fundou o Instituto de Surdos no Rio de Janeiro, que, em 1957, passou a ser chamado de Instituto Nacional de Educação de Surdos (Ines), nome utilizado até hoje. Considerado um dos centros de referência na área de surdez, atualmente é um órgão do Ministério da Educação. Dados do Censo 2010 apontam para um crescimento do número de pessoas com deficiência auditiva. Hoje, são aproximadamente 10 milhões de pessoas com surdez total ou parcial no Brasil (BRASIL, 2016). Figura 77 - Símbolo internacional da surdez 6.1 Conceitos O sistema auditivo está em funcionamento desde o segundo trimestre de gestação, permitindo ao bebê captar os sons do interior do corpo materno e os sons do ambiente antes mesmo do nascimento. Essa experiência sonora é que permite ao bebê reconhecer e se acalmar com a voz da mãe desde o nascimento (CARDOSO, 2013). Com o desenvolvimento da percepção visual por volta dos três meses de vida e com a maturação da audição, um processo de integração entre as modalidades sensoriais é iniciado; esse é o ponto de partida para o processo de formação do conceito dos objetos, o qual é crucial para o aprendizado. Quando a criança é impossibilitada de estabelecer naturalmente uma relação de comunicação com o mundo ouvinte, a perda auditiva acarreta danos para o desenvolvimento global da criança. A deficiência auditiva (ou surdez) é a perda total ou parcial da capacidade de conduzir e/ou perceber os sinais sonoros. Essa perda interfere na recepção e na produção da linguagem. 98 Re vi sã o: N om e do re vi so r - D ia gr am aç ão : N om e do d ia gr am ad or - d at a Unidade II Observação A expressão surdo-mudo é incorreta para se referir à pessoa com deficiência auditiva. Quando a pessoa não ouve, geralmente também não fala, pelo fato de não reproduzir um som que não conhece; ainda assim,quando há resquício de audição, é muito comum o surdo ser oralizado. O desenvolvimento global do indivíduo pode sofrer interferência pela presença da deficiência auditiva. Essa interferência pode ocorrer de maneira bastante variável e geralmente está intimamente ligada aos estímulos proporcionados no decorrer da vida e nas possibilidades de experimentação e vivências oferecidas a ele. 6.2 Estruturas do ouvido e funções auditivas A classificação da deficiência auditiva é realizada sob vários aspectos; entre eles são utilizadas algumas referências anatômicas, e por esse motivo é importante entendermos como funciona o órgão da audição. 6.2.1 Anatomia do ouvido Orelha Canal auditivo Lóbulo da orelha Tímpano Estribo Martelo Bigorna Cóclea Trompa de Eustáquio Nervo auditivo Janela circular Canais semicirculares Figura 78 - Principais estruturas do ouvido humano O ouvido é dividido em três partes, e para cada uma delas existem estruturas responsáveis por funções específicas. Veja a seguir. • Ouvido externo: – Orelha (ou pavilhão auricular): tem a função de captar o som. 99 Re vi sã o: N om e do re vi so r - D ia gr am aç ão : N om e do d ia gr am ad or - d at a EDUCAÇÃO FÍSICA ADAPTADA – Canal auditivo (ou meato acústico): tem a função de produzir cera e proteger as estruturas internas de impurezas. – Tímpano: tem a função de transmitir as vibrações sonoras para o ouvido médio. • Ouvido médio: é uma cavidade cheia de ar. – Martelo, bigorna e estribo: são os três menores ossos do corpo humano e têm a função de transmitir as vibrações sonoras para o ouvido interno. • Ouvido interno – Cóclea: é um canal em forma de espiral, cheio de líquido e responsável por transformar as vibrações sonoras em estímulos elétricos para que possam ser conduzidos adequadamente pelo nervo auditivo ao cérebro. – Aparelho vestibular: são três canais semicirculares cheios de líquidos, dispostos em três posições (anterior, posterior e lateral), representando os três planos do espaço. É responsável por detectar a posição da cabeça em relação ao corpo e ao espaço, contribuindo assim para a manutenção e para o controle do equilíbrio. – Nervo auditivo: responsável por conduzir os estímulos auditivos ao cérebro. O ouvido humano é capaz de perceber vibrações a uma frequência de 20 a 20.000 hertz e a uma intensidade de 0 a 120 decibéis. Quando os sons estão acima de 5.000 hertz e de 130 decibéis, geralmente são desagradáveis e geram dor. 6.2.2 Funções da audição Além da função principal de receber e interpretar os sons, a audição apresenta funções secundárias. Uma delas é o estado de alerta, que diz respeito à capacidade do ser humano de ouvir num campo de 360º, ou seja, o indivíduo não precisa estar de frente para à fonte sonora para ter a capacidade de ouvi-la. Para a pessoa com deficiência auditiva, todas essas informações estão perdidas, e esse fato poderia, inclusive, gerar algumas situações de perigo, por não ouvir, por exemplo, o som de uma buzina ou de um alarme. Outra função é a avaliação de distâncias. Ao ouvir um estímulo sonoro, é possível estimar a distância e a direção aproximadas da fonte. A pessoa surda, portanto, apresenta um prejuízo nessa avaliação de distâncias e de direção baseada no estímulo sonoro. 100 Re vi sã o: N om e do re vi so r - D ia gr am aç ão : N om e do d ia gr am ad or - d at a Unidade II 6.3 Classificação da deficiência auditiva A classificação da deficiência auditiva pode ser realizada sob três aspectos, de acordo com: • a perda auditiva; • o local da lesão; • o momento de ocorrência da deficiência. 6.3.1 De acordo com a perda auditiva A perda auditiva é avaliada por meio de exames audiométricos que verificam o nível de audição medidos em decibéis (dB). A partir dessa avaliação, a deficiência auditiva pode ser classificada de acordo com a sua intensidade. Existem diversos sistemas de classificação de surdez; entretanto, o mais utilizado é o seguinte (CFF, 2013): • Leve: 26 a 40 dB (dificuldade com fala fraca ou distante). • Moderada: 41 a 55 dB (dificuldade em ouvir a fala durante uma conversa). • Acentuada (ou moderadamente severa): 56 a 70 dB (dificuldade para ouvir a fala durante uma conversação em grupo). • Severa: 71 a 90 dB (entende apenas a fala amplificada). • Profunda: maior ou igual a 91 dB (normalmente não entende nem a fala amplificada, depende da leitura labial). • Anacusia: perda total. Normalmente, surdos com perda auditiva leve apresentam dificuldade parcial na percepção da palavra, surdos com deficiência moderada ou acentuada conseguem compreender as palavras somente num tom de voz muito alto, surdos com perda auditiva severa precisarão de métodos alternativos para compreender a palavra e surdos com perda auditiva acima de 90 decibéis não são capazes de perceber a voz. 6.3.2 De acordo com o local da lesão A seguir, os tipos de surdez que podem ocorrer de acordo com o local da lesão: • Surdez condutiva: ocorre quando a deficiência surge em decorrência de uma lesão no ouvido externo ou médio e, portanto, ocorre um distúrbio na capacidade de condução e amplificação do 101 Re vi sã o: N om e do re vi so r - D ia gr am aç ão : N om e do d ia gr am ad or - d at a EDUCAÇÃO FÍSICA ADAPTADA estímulo sonoro. Nesse tipo de surdez, é comum um dano maior para os sons graves e alguma preservação dos sons agudos. Além disso, o uso de aparelhos auditivos pode ser indicado e acarretará grandes benefícios. • Surdez neurossensorial (ou sensorioneural): ocorre quando a deficiência surge em decorrência de uma lesão no ouvido interno. Nesse caso, ocorre a transmissão da informação sonora normalmente, mas há um prejuízo na qualidade do som por danos nas estruturas do ouvido interno ou do nervo auditivo. Geralmente o dano maior se dá para sons agudos, e há alguma preservação dos sons graves. O uso do aparelho auditivo nem sempre é indicado, pois como o prejuízo não ocorre na condução e na amplificação do som, possivelmente não trará benefícios. Nesse tipo de deficiência auditiva, ainda pode haver uma dificuldade no controle do equilíbrio, já que no ouvido interno está localizado o aparelho vestibular. • Surdez mista: ocorre quando há surdez condutiva e neurossensorial simultaneamente. • Surdez central: não há lesão nas estruturas do ouvido, mas um dano no sistema nervoso central. Ocorre um distúrbio de processamento auditivo central, mecanismo que permite a utilização do som como meio de informação; dessa forma, o sistema nervoso não é capaz de processar e compreender as informações vindas do ouvido interno. É o tipo de surdez mais raro. 6.3.3 De acordo com a época em que ocorreu a surdez A seguir, os tipos de surdez de acordo com a época de ocorrência: • Surdez pré-lingual: ocorre quando a surdez surge antes do período de aquisição da linguagem (pode ser, portanto, pré-natal, natal ou pós-natal). A criança, por não ter memória verbal, apresentará maior dificuldade no desenvolvimento da linguagem; além disso, é comum que ela apresente dificuldade na formação de conceitos. Os estímulos baseados em informações visuais e sinestésicas são fundamentais para minimizar essa defasagem. • Surdez pós-lingual: ocorre quando a surdez surge após o período de aquisição da linguagem; dessa forma, a compreensão das informações e a formação dos significados ocorrem mais facilmente. 6.4 Causas da deficiência auditiva A deficiência auditiva pode ter causa congênita ou adquirida. Infelizmente, nem sempre é possível saber a causa exata de uma perda auditiva. As deficiências que ocorrem no período pré-natalpodem ser causadas por má-formação em decorrência de síndromes genéticas, medicamentos ototóxicos ingeridos pela mãe, infecções maternas transmitidas à criança, como sífilis, rubéola, toxoplasmose e citomegalovírus, distúrbios metabólicos e ingestão excessiva de álcool antes e no decorrer da gestação. 102 Re vi sã o: N om e do re vi so r - D ia gr am aç ão : N om e do d ia gr am ad or - d at a Unidade II As deficiências do período natal (ou perinatal) ocorrem no momento do nascimento e podem ser causadas por anóxia, traumatismo no parto, prematuridade ou infecções adquiridas no canal vaginal, como o herpes. Entre as causas pós-natais mais comuns estão o uso de medicamentos ototóxicos, as infecções (bacterianas ou virais) e a exposição excessiva a ruídos. Quanto mais precocemente for realizado o diagnóstico da deficiência auditiva e quanto antes ocorrer a intervenção adequada, melhor será o desenvolvimento da criança. Desde 2010, o teste da orelhinha é obrigatório em todas as maternidades do País, sendo possível o diagnóstico da surdez já no recém-nascido. Entretanto, mesmo quando não é diagnosticada a deficiência nos primeiros dias de vida do bebê, alguns sinais posteriores podem auxiliar no diagnóstico. A ausência de reações a sons altos ou durante brincadeiras infantis, a demora na aquisição da linguagem, a dificuldade de concentração e a desatenção podem fornecer algum indício de deficiência auditiva. Em algumas situações, pais e educadores atribuem à criança uma dificuldade de aprendizagem por comprometimento cognitivo, quando, na realidade, toda a dificuldade da criança surge pelo comprometimento auditivo. 6.5 Características A princípio, a deficiência auditiva não aparenta causar comprometimentos no desenvolvimento do indivíduo, entretanto o impacto da perda da capacidade auditiva pode trazer inúmeros prejuízos ao desenvolvimento motor, cognitivo, afetivo e social caso não sejam oferecidos os estímulos apropriados a essa condição. 6.5.1 Características físico-motoras Em alunos com surdez neurossensorial (lesão na orelha interna), é comum perceber distúrbios em capacidades físicas como equilíbrio, tanto estático como dinâmico, ritmo, coordenação e noção espacial. Alguns alunos, inclusive, podem apresentar a marcha com os pés mais afastados e arrastados para evitar possíveis oscilações e desequilíbrio corporal. Uma boa coordenação motora está intimamente ligada ao equilíbrio; além disso, um equilíbrio prejudicado traz consequências à construção do esquema corporal, pois pode ocorrer a perda da consciência de certas partes do corpo. Durante a execução de um movimento, quanto pior o equilíbrio, menor a eficiência e maior o gasto energético para a realização deste. Isso pode resultar em consequências psicológicas, como ansiedade e insegurança, fatores estes que podem inibir a prática de atividades físicas e esportivas. O atraso no desenvolvimento motor de crianças e adolescentes com surdez neurossensorial provavelmente seja causado pelo prejuízo tanto na quantidade como na qualidade das informações recebidas do aparelho vestibular, dificultando as relações com o ambiente, por exemplo, na noção espaçotemporal. Isso não significa que o aluno surdo sempre apresentará essas dificuldades, mas que, se for oportunizado um programa adequado de atividade física precocemente, todas essas características podem ser atenuadas. 103 Re vi sã o: N om e do re vi so r - D ia gr am aç ão : N om e do d ia gr am ad or - d at a EDUCAÇÃO FÍSICA ADAPTADA Normalmente, alunos com deficiência parcial possuem o desenvolvimento motor mais adequado à faixa etária do que aqueles com deficiência total. Outra característica interessante é que a ausência da fala, observada em grande parte dos alunos surdos, tem como consequência um desenvolvimento respiratório diferenciado, que acarreta uma respiração menos ampla e com uma frequência mais acelerada. É importante ressaltar que a falta de oportunidade para as vivências e experiências motoras é muito mais relevante para qualquer atraso no desenvolvimento do que a deficiência em si. Normalmente, essa falta de oportunidade se dá por isolamento social, superproteção familiar e desinformação sobre a importância dos estímulos para um bom desenvolvimento global desse aluno. Não existe uma fórmula mágica para que esse problema seja resolvido, mas, certamente, a divulgação das informações sobre a importância da prática de atividade física e de estímulos adequados a essa população diminuiria bastante a distância que ainda existe entre as pessoas com deficiência auditiva e as oportunidades de vivenciar práticas corporais, aumentar o acervo motor e ampliar o convívio social. 6.5.2 Características psicossociais As pessoas com deficiência auditiva normalmente têm dificuldades para se adaptar a um ambiente novo, e isso acaba gerando ansiedade e impaciência, principalmente quando não conseguem se fazer entender. Em função disso, algumas preferem o isolamento e demonstram até uma imaturidade no desenvolvimento social. É muito comum que eles se relacionem quase exclusivamente com outras pessoas surdas, especialmente na chamada comunidade surda. Essa comunidade envolve pessoas com deficiência auditiva e ouvintes, que apresentam experiências, valores comuns e uma forma comum de se comunicar entre si. Para a aceitação na comunidade surda, a principal exigência é o conhecimento da língua de sinais. Além disso, todos os participantes defendem ativamente os objetivos e os direitos da comunidade surda. Durante a prática de atividade física, o aluno surdo pode apresentar dificuldade de concentração e falta de atenção no momento da execução das habilidades solicitadas. Isso ocorre porque a principal fonte de alerta é a audição, e, na ausência desta, a visão torna-se essa fonte, assim o aluno explora constantemente o ambiente ao seu redor para verificar qualquer alteração. Para minimizar essa problemática, o ambiente deve ser estável e seguro. Em algumas situações, o aluno pode demonstrar impaciência por não conseguir realizar a atividade proposta pelo professor. Cabe ao professor incentivá-lo sempre que necessário. O profissional de Educação Física não deve se mostrar impaciente diante da dificuldade do aluno para não gerar desmotivação e abandono das práticas. A postura do profissional é fundamental para diminuir toda e qualquer dificuldade nas aulas. Caso o professor conheça a Língua Brasileira de Sinais (Libras), a comunicação certamente será facilitada, e qualquer barreira de compreensão deixará de existir. Em 2002, a Libras foi reconhecida oficialmente como meio legal de comunicação e expressão. Como qualquer outra língua, possui gramática, semântica, características próprias e modifica-se de acordo com as tendências culturais e tecnológicas. 104 Re vi sã o: N om e do re vi so r - D ia gr am aç ão : N om e do d ia gr am ad or - d at a Unidade II Figura 79 - Alfabeto em Libras A Libras não é universal, e em um país grande como o Brasil, é comum existirem diferenças regionais e até mesmo gírias próprias de cada região ou Estado. O estímulo à aprendizagem da leitura labial é uma forma de minimizar o isolamento social e as dificuldades de comunicação, o que poderia favorecer todo o processo de aprendizagem e de inclusão. Apesar de ainda não haver um consenso, atualmente, costuma-se priorizar as formas de comunicação que potencializam as capacidades acadêmicas, sociais e profissionais da pessoa surda. Em outras palavras, o aluno surdo, sempre que necessário, deve fazer uso da Libras, da leitura labial, da escrita ou da fala propriamente dita. O mais importante é que ocorra a comunicaçãode forma que possibilite a inclusão desse aluno em todos os âmbitos da sociedade. 6.6 Atividade física De todas as deficiências explanadas neste livro, a deficiência auditiva é a que menos apresenta restrições quanto ao tipo de atividade física ou esporte. A única adaptação refere-se à comunicação; entretanto, apesar de ser apenas esta, ela é fundamental para a participação efetiva e para a adesão dos alunos surdos ao programa de atividade física e esporte. Para facilitar a compreensão do aluno surdo, é interessante potencializar as informações visuais, como utilizar as demonstrações abundantemente, os vídeos legendados, articular bem as palavras e reforçar o uso das expressões corporais e faciais. 105 Re vi sã o: N om e do re vi so r - D ia gr am aç ão : N om e do d ia gr am ad or - d at a EDUCAÇÃO FÍSICA ADAPTADA Como ocorre dificuldade na formação e na abstração dos conceitos, por não haver memória verbal, para os alunos com surdez pré-lingual a informação visual é muito importante para que os conceitos sejam compreendidos e memorizados. A compreensão das regras de um jogo, por exemplo, será facilitada por meio de uma demonstração prática ou de uma informação visual. Independentemente da atividade física ou esportiva escolhida pelo aluno, é sempre importante que o profissional de Educação Física realize uma avaliação inicial para identificar as possíveis dificuldades relacionadas a equilíbrio, coordenação, ritmo ou qualquer outra capacidade. Para alunos com surdez neurossensorial, o desenvolvimento e a melhora do equilíbrio devem ser prioridades em um programa de exercícios. É uma capacidade possível de ser aperfeiçoada por meio de práticas que envolvam o equilíbrio corporal. Apesar da alteração do controle vestibular, é possível que a dinâmica corporal desse aluno se adapte às informações enviadas especialmente pela visão e pelo sistema proprioceptivo e propicie um ajustamento do equilíbrio postural aos padrões considerados normais. Segundo Azevedo e Samelli (2009), essas estratégias posturais são decorrentes da neuroplasticidade, que possibilita que as funções vestibulares afetadas possam ser compensadas por outros sentidos, atingindo um desenvolvimento de equilíbrio satisfatório. As atividades aquáticas requerem alguns cuidados específicos, por exemplo, a retirada dos aparelhos auditivos e o uso de tampões. Normalmente, em caso de lesão timpânica, a natação é vista com ressalvas pelos médicos, pois pode gerar otites frequentes e comprometer ainda mais a capacidade auditiva. Por outro lado, as atividades aquáticas são uma excelente forma de melhorar a capacidade respiratória e a função ventilatória. Os exercícios de resistência e força muscular contribuem para uma melhora da postura e da marcha, além de colaborar para o desenvolvimento do esquema corporal. As atividades rítmicas são extremamente enriquecedoras, pois desenvolvem a noção de ritmo, equilíbrio e coordenação. Para um melhor aproveitamento dessas atividades, o ideal é que sejam realizadas sobre um piso de madeira e com as caixas acústicas viradas para o piso; dessa forma, será possível ao aluno surdo sentir a vibração e efetivamente participar da atividade proposta, explorando todo o potencial corporal por meio de uma relação real com a música. 6.6.1 Orientações gerais A seguir, as orientações gerais para o professor durante as atividades físicas: • caso o aluno utilize aparelho auditivo, é necessário dar atenção especial a modalidades ou atividades físicas que envolvam contato direto na região da cabeça para que não ocorram lesões; • grande parte dos alunos utiliza-se da leitura labial para auxiliar a comunicação; dessa forma, o professor deve manter-se de frente para o aluno durante as explicações; 106 Re vi sã o: N om e do re vi so r - D ia gr am aç ão : N om e do d ia gr am ad or - d at a Unidade II • utilizar-se de todos os recursos possíveis para comunicar-se com o aluno, procurando certificar-se que ele compreendeu a mensagem; • apesar de não ser indispensável o domínio de Libras, ter conhecimento do alfabeto e de alguns sinais fundamentais facilita muito a comunicação e agiliza os procedimentos de uma aula; • no início da aula, todas as regras da atividade devem ser explicadas e combinadas; durante a aula, as mudanças devem ser evitadas para não causar confusão entre os alunos; • o professor não deve demonstrar impaciência ao não entender o que o aluno diz: deve buscar outros meios para compreendê-lo. Quando o aluno percebe a impaciência do professor, geralmente fica inibido e deixa de expor as suas dúvidas; • alguns alunos com deficiência possuem uma capacidade auditiva residual; é importante que o ambiente da aula não tenha ruídos excessivos para que essa audição residual possa ser estimulada; • não é indicado excluir as informações auditivas em uma aula para alunos com deficiência, apenas acrescentar as informações visuais; • o uso de cartões coloridos e bandeiras pode facilitar a comunicação durante a aula, desde que o significado deles seja explicado previamente; • não é indicado fornecer uma instrução verbal durante a demonstração, pois será mais difícil o aluno manter a atenção nos dois tipos de instrução. Forneça uma informação de cada vez; • quando o professor quiser falar com um aluno que não esteja em frente a ele, deverá tocar em seu ombro levemente ou acenar para indicar que precisa transmitir alguma informação; • para que o aluno faça a leitura labial, articule bem as palavras (não é necessário articular exageradamente) e fale em uma velocidade normal; • durante a explicação ou conversa com o aluno, o professor deve manter o olhar nele, pois, ao desviar o olhar, provavelmente o aluno entenderá que a fala terminou; • como as informações visuais são primordiais, é aconselhado que o profissional de Educação Física esteja em um local claro para que possa ser visto com clareza; • caso exista um intérprete de Libras, o professor deve sempre olhar e dirigir-se ao aluno, e não ao intérprete; além disso, preferencialmente, o intérprete deve estar posicionado ao lado do professor; • quando possível, as turmas devem ser reduzidas para facilitar o atendimento às dúvidas individuais; • mesmo em grupos pequenos, as interações entre os alunos (com ou sem a deficiência) devem ser estimuladas, minimizando o isolamento social geralmente observado entre os surdos; 107 Re vi sã o: N om e do re vi so r - D ia gr am aç ão : N om e do d ia gr am ad or - d at a EDUCAÇÃO FÍSICA ADAPTADA • quando os demais alunos e especialmente o professor demonstram que o aluno surdo é bem-vindo e conseguem manter a motivação durante a participação nas atividades, naturalmente essa interação é facilitada. Como dito anteriormente, as adaptações realizadas para a prática de atividade física e esporte para pessoas com deficiência auditiva são relacionadas às questões de comunicação. Ainda assim, apesar de serem poucas adaptações, elas são fundamentais, pois, caso não haja a possibilidade de comunicação entre o professor e o aluno ou entre o árbitro ou técnico e o atleta, não há motivação à permanência na atividade e não são colhidos os benefícios que a prática esportiva pode proporcionar. 6.7 Surdo-cegueira 6.7.1 Conceitos A surdo-cegueira é uma deficiência caracterizada por danos em dois sentidos, audição e visão, simultaneamente. Entretanto, não é simplesmente a soma das deficiências visual e auditiva, mas é considerada uma deficiência única que normalmente causa grande dificuldade no alcance de objetivos educacionais, vocacionais, de lazer e sociais. 6.7.2 Classificação da surdo-cegueira A classificaçãoé realizada de acordo com a perda auditiva e visual e de acordo com a época em que surgiu a deficiência. De acordo com a perda auditiva e visual: • surdo-cegueira total (ocorre na menor parte dos casos); • surdez profunda com resíduo visual; • surdez moderada ou leve com cegueira; • surdez moderada com resíduo visual. De acordo com a época em que surgiu a deficiência: • Pré-lingual: a pessoa nasce com a deficiência ou adquire antes da aquisição da linguagem. • Pós-lingual: a pessoa já tem uma deficiência sensorial e adquire a outra após a aquisição de uma língua (português ou libras) ou não apresenta nenhuma deficiência e adquire a surdo-cegueira após a aquisição da linguagem. 108 Re vi sã o: N om e do re vi so r - D ia gr am aç ão : N om e do d ia gr am ad or - d at a Unidade II 6.7.3 Causas da surdo-cegueira As causas da surdo-cegueira são variadas, podendo ser pré-natal, perinatal ou pós-natal. Entre as principais causas estão: rubéola congênita, toxoplasmose, meningite, prematuridade e síndromes genéticas, como a síndrome de Usher e síndrome de Charge. 6.7.4 Características da surdo-cegueira Ausência ou diminuição dos estímulos visuais e auditivos comprometem a relação da pessoa com surdo-cegueira com o mundo à sua volta. Consequentemente, os processos de aprendizagem precisam ser altamente adaptados para que se obtenha algum resultado. A privação da visão e da audição normalmente resultam em um menor interesse na exploração do ambiente, proporcional a essa privação. A ausência parcial ou total desses estímulos pode gerar, ainda, movimentos estereotipados das mãos e do corpo, além de balanceios do tronco. Como a aprendizagem por imitação, ou aprendizagem incidental, não ocorre nessa situação, tudo precisa ser ensinado à pessoa surdo-cega (MARTINS; IVANOV, 2009). É comum esse aluno apresentar dificuldade de locomoção e atraso no desenvolvimento neuropsicomotor. A falta da percepção dos sentidos da visão e da audição faz com que a pessoa não saiba o que vai acontecer à sua volta; isso significa que ela tem muita dificuldade de antecipar os fatos, e essa sensação gera insegurança e ansiedade (MARTINS; IVANOV, 2009). Muitas vezes, essas características são refletidas por meio de resistência ao toque, autoagressão e dificuldade na interação social. 6.7.5 Comunicação na surdo-cegueira Como a surdo-cegueira é uma forma de deficiência com defasagens muito específicas, normalmente exige soluções especiais. É possível adquirir ou reestabelecer a comunicação por meio de técnicas específicas. As mais utilizadas são: • Libras tátil: refere-se à Libras adaptada à condição da surdo-cegueira. A pessoa surdo-cega mantém as mãos sobre as mãos do interlocutor; dessa forma, consegue perceber a configuração, os movimentos e a orientação das mãos. É indispensável que ambos saibam Libras. Costuma ser utilizada por pessoas surdas que também adquiriram a deficiência visual. • Alfabeto manual: normalmente, cada letra é representada nas diferentes posições dos dedos e da mão; o interlocutor toca os pontos, como se estivesse digitando. 109 Re vi sã o: N om e do re vi so r - D ia gr am aç ão : N om e do d ia gr am ad or - d at a EDUCAÇÃO FÍSICA ADAPTADA • Tadoma: é também conhecido como método da vibração, pois a pessoa surdo-cega, pelo tato, compreende a fala do seu interlocutor. A mão deve ser posicionada de forma que o polegar encoste no lábio inferior para perceber os movimentos e os outros dedos toquem as cordas vocais do locutor para sentir a vibração. Assim, é possível interpretar os sons emitidos. Costuma ser mais utilizada por pessoas com memória auditiva. • Braille digital: técnica que utiliza, normalmente, o dedo indicador e o médio da pessoa surdo-cega para indicar os pontos utilizados no braille. Figura 80 - Comunicação pelo método Tadoma Fica claro que, independentemente do método utilizado, a comunicação é totalmente baseada no estímulo tátil. 6.7.6 Atividade física Apesar de ser um trabalho extremamente difícil, a prática de atividade física deve ser estimulada. O professor deve realizar uma avaliação inicial e, de acordo com a perda auditiva e visual, deve-se determinar a melhor forma de estimulação para esse aluno. É importante que se consiga estimular ao máximo o sentido que tem alguma função residual. Independentemente de existir alguma função auditiva ou visual, os estímulos táteis são fundamentais para a aprendizagem motora. A atividade física é de grande importância como forma de manutenção ou de melhora da aptidão física, da capacidade funcional, do desenvolvimento global e da interação social. 110 Re vi sã o: N om e do re vi so r - D ia gr am aç ão : N om e do d ia gr am ad or - d at a Unidade II Saiba mais Para conhecer mais sobre a história de duas personagens fundamentais para o avanço dos estudos sobre as deficiências sensoriais, Helen Keller e Anne Sullivan, veja o filme a seguir: O milagre de Anne Sullivan. Dir. Arthur Penn, 1962. 106 minutos. Resumo Nesta unidade, foi abordada a deficiência visual, que, independentemente da causa, exige adaptações no espaço, no material utilizado durante as aulas e na forma de comunicação. É muito importante que o aluno se sinta seguro durante a prática de atividade física e esporte, e, para isso, o profissional de Educação Física tem um papel fundamental. De todas as deficiências abordadas, a deficiência auditiva é a que exige menos adaptação. Entretanto, a adaptação para a comunicação é fundamental. Se não houver comunicação, não haverá aprendizagem, relação aluno-professor nem motivação para as práticas corporais. O professor deve, antes de tudo, certificar-se de que o aluno compreende o que é explicado ou solicitado durante as aulas; caso contrário, além de o aluno não conseguir desempenhar a tarefa, ele se sentirá desmotivado e provavelmente abandonará o programa de atividade física. Mesmo sem ter pleno conhecimento da Libras, é possível manter uma comunicação com o aluno surdo, por gestos comuns, leitura labial ou linguagem escrita. O professor deve demonstrar interesse ao conversar com o aluno e nunca ser impaciente. Exercícios Questão 1. No caso das pessoas com deficiência visual, que se utilizam de artifícios como bolas com guizos, perfumes, bengalas, sinais sonoros e guias, o uso desses artifícios no processo de ensino e treinamento esportivo visa ao desenvolvimento das seguintes habilidades: 111 Re vi sã o: N om e do re vi so r - D ia gr am aç ão : N om e do d ia gr am ad or - d at a EDUCAÇÃO FÍSICA ADAPTADA A) Agilidade e força. B) Orientação e mobilidade. C) Destreza e orientação. D) Equilíbrio e mobilidade. E) Força e equilíbrio. Resposta correta: alternativa B. Análise das alternativas A) Alternativa incorreta. Justificativa: não é esperado o aumento da força e agilidade com o uso dos artifícios sonoros. B) Alternativa correta. Justificativa: o uso dos artifícios sonoros é para a orientação espacial e para a mobilidade das pessoas com deficiência visual em vários locais a fim de que tenham mais independência. C) Alternativa incorreta. Justificativa: não é esperado o aumento da destreza com o uso dos artifícios sonoros. D) Alternativa incorreta. Justificativa: não é esperado o aumento do equilíbrio com o uso dos artifícios sonoros. E) Alternativa incorreta. Justificativa: não é esperado o aumento da força com o uso dos artifícios sonoros. Questão 2. (Prefeitura Municipal de Cachoeirinha 2012, adaptada) Ao longo dos anos, surgiram mitos acerca da Libras.Em relação a isto, analise as afirmativas que seguem: I – A Libras é incapaz de expressar conceitos abstratos. II – A Libras não é universal. III – A Libras deriva da comunicação gestual dos ouvintes. 112 Re vi sã o: N om e do re vi so r - D ia gr am aç ão : N om e do d ia gr am ad or - d at a Unidade II Quais das afirmativas apresentam tais mitos? A) Apenas a I. B) Apenas a II. C) Apenas a III. D) Apenas a II e a III. E) I, II e III. Resolução desta questão na plataforma.
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