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MARIANA MARQUES – T29 INTRODUÇÃO • Consiste em lesão física ao tecido cerebral que, temporária ou permanentemente, incapacita a função cerebral. O diagnóstico é suspeitado clinicamente e confirmado por imagens (tomografia de cabeça). • O principal objetivo do tratamento dos doentes com suspeita de TCE é prevenir a lesão cerebral secundária. • Muitos doentes com lesões cerebrais graves morrem antes de chegar ao hospital. • Aproximadamente 75% dos doentes com trauma cranioencefálico que recebem cuidados médicos podem ser classificados como vítimas de trauma leve, 15% como vítimas de trauma moderado e 10% como vítimas de trauma grave. REVISANDO A ANATOMIA COURO CEBELUDO: • Devido a irrigação abundante, a laceração do couro cabeludo pode levar a perdas sanguíneas significativas, choque hemorrágico e morte. CRÂNIO: • A base do crânio é irregular, possibilitando a ocorrência de lesões quando o cérebro se desloca e desliza no interior do crânio, em decorrência de movimentos de aceleração e desaceleração. MENINGES: • As meninges revestem o cérebro e consistem em três camadas: dura-máter (membrana fibrosa que adere a superfície interna do crânio), aracnóide (membrana não vascularizada) e a pia-máter (membrana muito vascularizada aderida ao tecido nervoso). • Há um espaço entre a dura-máter e a aracnóide, chamado de espaço subdural, no qual correm as artérias meníngeas, podendo ocorrer hemorragias e formação de hematomas em casos de fraturas que podem lacerá-las. • O líquido cefalorraquidiano (LCR) preenche o espaço entre a aracnóide impermeável e a pia-máter (o espaço subaracnóideo), protegendo o cérebro e a medula – quando há hemorragia subaracnóidea pode ocorrer contusão cerebral ou trauma de grandes vasos na base do encéfalo. ENCÉFALO: • O encéfalo é dividido em três regiões: o cérebro (composto pelos hemisférios direito e esquerdo), cerebelo e tronco cerebral. • O cérebro é dividido em quatro lobos cerebrais, com funções específicas: ▪ Lobo frontal: controla funções de execução, as emoções, as funções motoras e, no lado dominante, a expressão da fala (área motora da fala). ▪ Lobo parietal: dirige a função sensorial e a orientação espacial. ▪ Lobo temporal: regula funções da memória. ▪ Lobo occipital: responsável pela visão. • O tronco cerebral é constituído pelo mesencéfalo (responsável pelo estado de alerta), ponte (parte superior também é responsável pelo estado de alerta) e bulbo (comanda os centros cardiorrespiratórios vitais). SISTEMA VENTRICULAR: • Os ventrículos são um sistema de espaços e aquedutos preenchidos por liquido cefalorraquidiano (LCR), localizados no interior do encéfalo. • O LCR é produzido constantemente nos ventrículos e absorvido sobre a superfície do encéfalo. • Quando há presença de sangue no liquido, pode haver prejuízo na reabsorção, gerando aumento na pressão intracraniana. • Quando há presença de edema ou hematomas pode haver desvio ventricular (em condições normais devem ser simétricos). CIRURGIA DO TRAUMA: Trauma Cranioencefálico ; MARIANA MARQUES – T29 REVISANDO A FISIOLOGIA • Os conceitos fisiológicos relacionados ao trauma cranioencefálico incluem a pressão intracraniana, a doutrina de Monro-Kellie e o fluxo sanguíneo cerebral. PRESSÃO INTRACRANIANA: • A pressão intracraniana elevada pode reduzir a perfusão cerebral e causar ou exacerbar a isquemia. Em condições de normalidade em repouso a pressão intracraniana é de aproximadamente 10 mm Hg. → 20 mmHg = anormal e > 40 mmHg = grave. DOUTRINA DE MANRO-KELLIE: • Consiste num sistema compensatório formado por volume venoso, arterial e líquor para proteger o cérebro. • Essa doutrina afirma que o volume total do conteúdo intracraniano deve permanecer constante, já que o crânio é uma caixa rígida não expansível. • O sangue venoso e o LCR podem ser comprimidos para fora do espaço intracraniano dando algum grau de compensação à pressão. FLUXO SANGUÍNEO CEREBRAL (FSC): • A lesão cerebral suficientemente grave para produzir coma pode causar redução importante do FSC durante as primeiras horas após o trauma. • O TCE grave pode prejudicar a autorregulação pressórica de modo que o cérebro fique incapaz de compensar adequadamente as mudanças na pressão de perfusão cerebral (definida como pressão sanguínea arterial média (PAM) menos a pressão intracraniana). • Se a PAM for muito baixa pode ocorrer isquemia e infarto e se a PAM for muito alta pode ocorrer inchaço com aumento da pressão intracraniana. • A lesão secundária pode ocorrer por hipotensão, hipóxia, hipercapnia ou por hipocapnia iatrogênica. • Quando a autorregulação está intacta, o fluxo sanguíneo cerebral se mantém constante para PAM de 50 a 150 mmHg. • Na lesão cerebral moderada a grave, a autorregulação fica comprometida, em que o FSC varia com a PAM. • O cérebro lesado é mais vulnerável a episódios de hipotensão, que causam lesão cerebral secundária. CLASSIFICAÇÃO DAS LESÕES CRÂNIOENCEFÁLICAS • Classificadas quanto à gravidade da lesão e morfologia GRAVIDADE DA LESÃO: • Para avaliação da gravidade utiliza-se uma medida clínica, a Escala de Coma de Glasgow. • Um escore igual ou inferior a 8 indica gravidade, sendo aceito como estado de coma ou trauma cranioencefálico grave, doentes com escore entre 9 a 12 são considerados em trauma moderado e com escore entre 13 e 15 são designados como trauma leve. LESÃO CEREBRAL LEVE: • Glasgow 13-15, sendo necessário colher a história do paciente, excluir lesões sistêmicas (realizar ABCDE), realizar exame neurológico, solicitar investigação radiológica e investigação de álcool/drogas (se necessário). Além disso, solicita-se a avaliação do neurocirurgião, para avaliar a conduta (internar para observação ou dispensar) conforme os achados. LESÃO CEREBRAL MODERADA: • Glasgow 9-12, avalia-se inicialmente da mesma forma que os doentes com lesão leve, diferindo-se que é necessário solicitar tomografia para todos os doentes, obrigatoriedade de internação e observação, reavaliação neurológica e solicitação de uma segunda tomografia. • Se o doente evoluir com melhora dos parâmetros, liberar para casa, se evoluir com piora, tratar como lesão cerebral grave. LESÃO CEREBRAL GRAVE: • Glasgow 3-8, sendo necessária a reanimação do doente, realiza-se exame neurológico e intubação para garantia de via aérea pérvia, reavaliação frequente e deve-se identificar as lesões associadas. Observação: INDICAÇÕES DE TOMOGRAFIA: Glasgow de 9 a 12, Glasgow < 15 duas horas após o trauma, déficit neurológico, fratura exposta de crânio, sinais de fratura de base de crânio, vômitos (> 2 episódios), extremos de idade (crianças e idosos), amnésia retrógrada e cefaleia intensa. MARIANA MARQUES – T29 MORFOLOGIA DA LESÃO: FRATURA DE CRÂNIO: • Ocorrem na calota ou na base do crânio e podem ser lineares ou estreladas e expostas ou fechadas. • Para identificação dessas lesões, geralmente utiliza-se a tomografia computadorizada. • Sinais clínicos: equimose periorbital (sinal do guaxinim), equimose retroauricular (sinal da batalha), rinorréia, otorreia, disfunção do sétimo e oitavo par de nervos cranianos (paralisia facial e perda de audição), hemotímpano e anisocoria pupilar (lesão localiza-se do lado onde há midríase pupilar – dilatação). LESÕES CEREBRAIS DIFUSAS: • Variam de concussões leves (causa distúrbio neurológico não focal transitório incluindo perda de consciência) à lesões hipóxicas isquêmicas graves (devido choque prolongado ou apneia após o trauma). • No início a tomografia pode apresentar normalidade, edema difuso ou hemorragias pontilhadas em todos os hemisférios cerebrais. LESÕES CEREBRAIS FOCAIS: • Lesões cerebrais focais: inclui os hematomas epidurais e subdurais, as contusõese os hematomas intracerebrais. • Hematomas epidurais (extradural): ▪ São raros, em geral, associa-se a fratura na base do crânio (lesão da artéria meníngea média). ▪ Forma de lente biconvexa. ▪ Apresentação clássica do hematoma epidural: o paciente apresenta um intervalo lúcido entre o momento da lesão e a deterioração neurológica. ▪ Pode ser rapidamente fatal, sendo necessário o esvaziamento precoce. • Hematoma subdural: ▪ São mais comuns, ocorrem em 30% dos TCE. ▪ Ocorrem por dilaceração de vasos superficiais pequenos ou laceração cerebral. ▪ Possuem a forma do contorno cerebral, espalhando-se por toda a superfície cerebral. ▪ Possui alta morbidade/mortalidade devido a presença de lesão parenquimatosa concomitante. ▪ Recomenda-se o esvaziamento cirúrgico rápido, principalmente se houver desvio > 5mm das estruturas da linha média. • Contusões e hematoma intracerebral: ▪ Ocorrem em cerca de 20-30% dos TCE. ▪ Geralmente ocorrem nos lobos frontal e temporal, mas podem ocorrer em qualquer parte do cérebro. ▪ Contusões podem evoluir para hematomas em horas ou dias, sendo necessária intervenção cirúrgica. ▪ Doentes com contusão são submetidos a TC repetidas para avaliação de mudança no padrão da contusão nas 24h após TC de crânio inicial. MARIANA MARQUES – T29 TRATAMENTO PRIORITÁRIO • Após a avaliação primária (ABCDE), deve preocupar-se com a redução das chances de lesão secundária. • O objetivo principal dos protocolos de cuidados intensivos é prevenir a lesão secundária em um cérebro já lesado. • Deve-se administrar oxigênio e garantir que o doente tenha uma ventilação e perfusão adequadas e, além disso, fazer monitorização da pressão (pressão sistólica deve ser mantida >90 mmHg). • Realiza-se um exame neurológico dirigido: avaliação do escore na escola de coma de Glasgow, exame das pupilas (isocoria/reflexo fotomotor) e sinais de lateralização (plegia). TRATAMENTO CLÍNICO • O tratamento clínico do trauma cranioencefálico inclui líquidos intravenosos, hiperventilação temporária, manitol, solução salina hipertônica, barbitúricos e anticonvulsivantes. FLUIDOS INTRAVENOSOS: • Consiste em sangue e hemocomponentes que devem ser administrados conforme necessidade para realizar reanimação e reposição volêmica, pois a hipovolemia nesse pacientes é prejudicial. HIPERVENTILAÇÃO: • Age reduzindo a PaC02 e produzindo vasoconstricção cerebral, no entanto, se usada de forma agressiva e prolongada, pode causar isquemia cerebral. • A hiperventilação deve ser usada somente com moderação e quando necessário por tempo limitado. • Se usada de forma correta, a hiperventilação reduz a PIC em doentes que estão deteriorando com hematoma intracraniano em expansão até que a craniotomia de emergência seja realizada. MANITOL: • Usado para reduzir a pressão intracraniana elevada. • Não deve ser administrado a doentes hipotensos pois o manitol não abaixa a PIC em situação de hipotensão, além de ser um diurético osmótico potente, podendo exacerbar a hipotensão e a isquemia cerebral. • Indicado em casos de déficit neurológico agudo (pupila dilatada, hemiparesia ou perda de consciência). SOLUÇÃO SALINA HIPERTÔNICA: • Também é usada para reduzir a PIC elevada. • Diferente do manitol, não age como diurético. • Da mesma forma que o manitol, não possui boa ação em casos de doentes hipovolêmicos. BARBITÚRICOS: • São drogas eficientes na redução da pressão intracraniana refratária. • Não devem ser usadas na presença de hipotensão ou hipovolemia e nem durante a fase aguda de reanimação do trauma. ANTICONVULSIVANTES: • A epilepsia pós-traumática ocorre em cerca de 5% de todos os doentes admitidos no hospital com TCE fechados e em 15% daqueles com TCE graves. • Os três fatores principais ligados à alta incidência de epilepsia tardia são: convulsões que ocorrem durante a primeira semana, hematoma intracraniano e fratura com afundamento de crânio. • Pode controlar as convulsões agudas, porém o uso precoce de anticonvulsivantes não muda a evolução das convulsões pós-traumáticas de longo prazo. • Os anticonvulsivantes podem inibir a recuperação do cérebro, portanto eles só devem ser usados quando necessários. SEDAÇÃO E CURARIZAÇÃO: • Quando um paciente está curarizado ele está muito sedado a ponto de perder até os reflexos, enquanto no sedado esses reflexos estão intactos. • Deve-se fazer o exame neurológico antes da sedação ou curarização prolongada. TRATAMENTO CIRÚRGICO • O tratamento cirúrgico pode ser necessário para lesões de couro cabeludo, fraturas com afundamento de crânio, lesões intracranianas de massa e ferimentos cerebrais penetrantes. LESÕES DE COURO CABELUDO: • É importante limpar a ferida cuidadosamente antes da sutura devido as chances de infecção. • As perdas sanguíneas oriundas de ferimentos de couro cabeludo podem ser abundantes. • O sangramento de couro cabeludo geralmente pode ser controlado aplicando-se pressão direta. • A presença de vazamento de LCR indica que existe laceração da dura-máter associada. • O neurocirurgião deve ser consultado em todos os casos com fratura exposta ou afundamento. MARIANA MARQUES – T29 FRATURAS COM AFUNDAMENTO DE CRÂNIO: • Geralmente deve ser reduzida cirurgicamente se o grau de depressão for maior do que a espessura da calota adjacente ou se estiver exposta e grosseiramente contaminada. LESÕES INTRACRANIANAS DE MASSA: • Estas lesões são tratadas por um neurocirurgião. • Pode ter risco de vida, se tiver expansão rápida. • Craniotomia de controle de dano: transferir para o neurocirurgião (áreas rurais / remotas). FERIMENTOS PENETRANTES: • Deve-se realizar o ABCDE. • A TC de cabeça é fortemente recomendada. • Radiografias simples de crânio podem ser úteis na avaliação da trajetória do projétil, e na presença de grandes corpos estranhos e de ar intracraniano. • Utiliza-se de antibioticoterapia profilática de amplo espectro nos doentes portadores de ferimentos encefálicos penetrantes. • Os objetos que penetram o compartimento intracraniano e estão exteriorizados (flechas, facas ou chaves de fenda) não devem ser retirados até que sejam excluídas possíveis lesões vasculares e que o tratamento neurocirúrgico tenha sido estabelecido. • A mobilização ou a remoção precoce de objetos penetrantes pode levar a lesão vascular fatal ou a hemorragia intracraniana.
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