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UNIVERSIDADE PAULISTA Faculdade de Enfermagem Profa. Dra. Naila A.Oliveira Estudo Dirigido e Material Complementar Exercícios avaliativos de Fisiologia do Sistema Regulador Prezado aluno, as perguntas abaixo são um estudo dirigido que deverá ser entregue em data a ser divulgada na plataforma do Teams da UNIP. Qualquer dúvida estou à disposição por email: naila.oliveira@docente.unip.br Leia o trecho abaixo e responda as seguintes perguntas: 1. “[...] Em 1955 o patologista Thomas Harvey fez a autópsia do corpo de Albert Einstein e depois levou o cérebro para casa, onde o manteve pelas quatro décadas seguintes. De tempos em tempos, distribuía pequenas fatias a cientistas pelo mundo, que investigavam o tecido em busca de explicações para a genialidade de Einstein. Um dos cientistas não encontrou nada de incomum em relação ao número ou ao tamanho de seus neurônios, mas no córtex de associação, responsável pelo conhecimento de alto nível, descobriu um número surpreendentemente grande de um tipo de células [...]. Algumas destas células envolvem os axônios dos neurônios, permitindo que os impulsos nervosos sejam transmitidos em alta velocidade. Mera coincidência? Talvez não. Evidências cada vez maiores sugerem que estas células desempenham um papel muito mais importante do que se imaginava [...]”. (Scientific American, 2004). Responda as questões baseadas no texto. a) A que tipo de células o autor se refere? .................................................................................................................................................................. b) Qual o nome das células que envolvem axônios de neurônios pertencentes ao sistema nervoso central? .................................................................................................................................................................. c) Quais células envolvem axônios pertencentes ao sistema nervoso periférico? .................................................................................................................................................................. d) Como são chamadas as células do sistema nervoso periférico que têm função fagocitária e derivam de precursores trazidos da medula óssea para o sangue? .................................................................................................................................................................. 3. A medula espinal é a única parte do sistema nervoso central que possui uma organização segmentar externa bem UNIVERSIDADE PAULISTA Faculdade de Enfermagem Profa. Dra. Naila A.Oliveira Estudo Dirigido e Material Complementar definida, apresentando em cada segmento basicamente a mesma estrutura. Identifique na figura abaixo as regiões indicadas e cite-as a seguir. FIGURA 4 - Segmento da medula em corte transversal (modificado de MARTIN, 1998) A- .................................................................. B- .................................................................. C- .................................................................. D- .................................................................. E- .................................................................. 4. Ao longo da medula espinal a substância cinzenta possui maior volume entre o quinto segmento cervical e o primeiro torácico e entre o primeiro segmento lombar e o segundo sacral. Explique por que ocorrem estas regiões, chamadas intumescências cervical e lombossacral. ................................................................................................................................................................................... ................................................................................................................................................................................... ................................................................................................................................................................................... ................................................................................................................................................................................... ................................................................................................................................................................................... UNIVERSIDADE PAULISTA Faculdade de Enfermagem Profa. Dra. Naila A.Oliveira Estudo Dirigido e Material Complementar 5. Identifique na figura abaixo as regiões encefálicas indicadas pelas letras. FIGURA 5 - Corte sagital do encéfalo (modificado de BEAR, CONNORS, PARADISO, 2002) A- .................................................................. B- .................................................................. C- .................................................................. D- .................................................................... 6. As seguintes questões estão relacionadas à figura da questão 5. Preencha com as letras correspondentes às da figura. a) Nesta região é liberado o hormônio melatonina. .................................................................................................................................................................. b) Estrutura ovoide responsável, entre outras funções, pela retransmissão de informações sensitivas para o córtex cerebral. UNIVERSIDADE PAULISTA Faculdade de Enfermagem Profa. Dra. Naila A.Oliveira Estudo Dirigido e Material Complementar .................................................................................................................................................................. c) Fazem parte do tronco encefálico. .................................................................................................................................................................. 7. Identifique os lobos do telencéfalo, representados na figura abaixo. FIGURA 6 - Vista lateral do encéfalo (modificado de BEAR, CONNORS, PARADISO, 2002) A- .................................................................. B- .................................................................. C- .................................................................. D- .................................................................. 8. Responda as questões usando as letras correspondentes à figura da questão 7. a) Lobo cortical que apresenta o mapeamento sensitivo do corpo. .................................................................................................................................................................. b) Lobo cortical no qual se encontram as áreas pré-motora e motora primária. .................................................................................................................................................................. UNIVERSIDADE PAULISTA Faculdade de Enfermagem Profa. Dra. Naila A.Oliveira Estudo Dirigido e Material Complementar 9. “[...] Os dois hemisférios cerebrais apresentam profundas diferenças no processamento de informações e desenvolvimento de tarefas cognitivas. Existe uma região formada por fibras nervosas que realiza a comunicação entre eles e sabe-se que moderam, reduzem ou cessam certas atividades do hemisfério direito ou esquerdo. Sua secção leva a frequentes sinais de competição entre os hemisférios. Uma paciente relata: ‘Eu abro a porta do quarto de vestir. Sei o que quero usar. Quando alcanço alguma coisa com a minha mão direita, a esquerda se levanta e pega algo diferente. Se a roupa está na mão esquerda, não posso largá-la. Tenho que chamar minha filha’.” (SPRINGER & DEUTSCH,1998). a) Qual a região descrita no texto que comunica os hemisférios cerebrais? ..................................................................................................................................................................b) Esta mesma região possui quatro porções principais. Cite-as: .................................................................................................................................................................. 10. “[...] Um caso especialmente interessante ocorre com a percepção da fala: o som das palavras não é transmitido apenas acusticamente, também os movimentos dos lábios guardam informações valiosas. Em 2001, a pesquisadora Gemma Calvert, da Universidade de Oxford, observou que, na percepção dos fonemas, tanto a atividade do sistema auditivo quanto do visual é reforçada quando estímulos acústicos e imagens chegam juntos ao cérebro. A visão dos lábios em movimento influencia precocemente o processamento dos sinais sonoros e também as palavras ouvidas agem sobre a análise visual do movimento da boca. O efeito sinérgico de ouvir e ver surge em regiões cerebrais que até então eram consideradas áreas sensoriais isoladas” (Revista Mente e Cérebro, Ano XIV, no 171, maio 2007, págs 65-67). 10.1) O texto acima comenta sobre áreas de processamento visual e auditivo. Em qual lobo do encéfalo localizam-se a área visual primária e a área auditiva primária, respectivamente? a) Frontal-temporal. b) Occipital-temporal. c) Frontal-parietal. d) Parietal-temporal. e) Temporal-parietal. 10.2) “O processamento de sinais sonoros e das palavras ouvidas” faz parte da interpretação da linguagem, que se dá essencialmente na(o): a) área de Wernicke. UNIVERSIDADE PAULISTA Faculdade de Enfermagem Profa. Dra. Naila A.Oliveira Estudo Dirigido e Material Complementar b) giro parahipocampal. c) córtex entorrinal. d) amígdala. e) úncus. 10.3) A área motora da fala: a) é chamada de área de Broca. b) localiza-se no lobo frontal. c) corresponde à área 44 de Brodman. d) tem conexões com a área de Wernicke. e) todas as alternativas estão corretas. 11. “[...] A sra. S., uma sexagenária muito inteligente, sofreu um grave derrame que afetou as porções mais profundas e posteriores de seu hemisfério cerebral direito. Permaneceram perfeitamente preservadas sua inteligência e senso de humor. [...] Às vezes ela se queixa que as porções que lhe servem são pequenas demais, mas isso acontece porque ela só come o que está na metade direita do prato. [...] Um dia apareceu com apenas metade do rosto maquiado e o outro lado absurdamente sem batom e ruge. ‘Olhei no espelho e passei a maquiagem em tudo o que vi’ disse ela. A senhora S. perdeu por completo a ideia de ‘esquerda’.” (SACKS,1997). O autor descreve os sintomas de uma lesão em área responsável pela percepção da imagem corporal, em que o indivíduo negligencia a metade contralateral do corpo. a) Qual é a região do córtex cerebral responsável por essa função? .................................................................................................................................................................. b) Por que ocorre essa contralateralidade em relação a esse tipo de percepção? ................................................................................................................................................................................... ................................................................................................................................................................................... ................................................................................................................................................................................... ................................................................................................................................................................................... ................................................................................................................................................................................... ................................................................................................................................................................................... UNIVERSIDADE PAULISTA Faculdade de Enfermagem Profa. Dra. Naila A.Oliveira Estudo Dirigido e Material Complementar c) A lesão na referida área faz com que o indivíduo negligencie não somente a metade do corpo, mas também metade do ambiente ao seu redor. Esta afirmativa é verdadeira? Comente. ................................................................................................................................................................................... ................................................................................................................................................................................... ................................................................................................................................................................................... ................................................................................................................................................................................... ................................................................................................................................................................................... ................................................................................................................................................................................... 12. “Grupo de neurônios dispersos no tronco encefálico que recebem e enviam impulsos que chegam do córtex cerebral, do hipotálamo, do tálamo, do cerebelo e da medula espinhal; quando desativados podem provocar perda da consciência”. Esta descrição pertence à qual região? ................................................................................................................................................................................... ................................................................................................................................................................................... ................................................................................................................................................................................... ................................................................................................................................................................................... ................................................................................................................................................................................... ................................................................................................................................................................................... ................................................................................................................................................................................... ................................................................................................................................................................................... ................................................................................................................................................................................... ................................................................................................................................................................................... ................................................................................................................................................................................... ................................................................................................................................................................................... 13)A paresia ipsilateral da língua com desvio para o lado da lesão pode estar relacionada com o dano de nervo craniano: a) oculomotor. b) troclear. c) vestíbulo-coclear. d) facial. UNIVERSIDADE PAULISTA Faculdade de Enfermagem Profa. Dra. Naila A.Oliveira Estudo Dirigido e Material Complementar e) hipoglosso. 14) Considere os seguintes elementos do sistema nervoso: I. encéfalo II. nervos cranianos III. medula espinhal IV. nervos raquidianos O sistema nervoso central é constituído por: a) apenas II e III. b) apenas I e II. c) apenas III e IV. d) apenas I e III. e) todas as alternativas. 15) o que afasia e como ela pode ocorrer? 16) O que é epilepsia? Descreva 17) Descreva a doença esclerose lateral amiotrófica. 18) Quais são os principais neurotransmissores vinculados a sensação do prazer? Qual a correção com drogas de abuso? 169 * Departamento de Fisiologia, Universidade Federal de Sergipe (DFS/UFS). ** Departamento de Morfologia. Universidade Federal de Sergipe (DFS/UFS). *** Colegiado de Medicina, Universidade Federal do Vale do São Francisco (CMED/UNIVASF). Caixa Postal 252, CEP 56.306-410, Petro- lina, PE, Brasil. Received Apr 30, 2007; accepted May 25, 2007. Journal of Epilepsy and Clinical Neurophysiology J Epilepsy Clin Neurophysiol 2007; 13(4):169-175 O Papel dos Canais Iônicos nas Epilepsias e Considerações Sobre as Drogas Antiepilépticas – Uma breve revisão Lívia Amorim Porto*, Jullyana de Souza Siqueira**, Luciene Nascimento Seixas***, Jackson Roberto Guedes da Silva Almeida***, Lucindo José Quintans-Júnior* Universidade Federal de Sergipe – DFS/UFS RESUMO Introdução: A epilepsia é um transtorno neurológico que chega a afetar cerca de 1% da população mundial. Muitas formas de epilepsias não conseguem ser tratadas adequadamente com os fármacos atualmente utili- zados na clínica e o desenvolvimento de novas propostas terapêuticas que as tratem, não apenas de forma sintomática, mas em sua gênese, é uma busca constante de novos estudos. Objetivo e Discussão: Nesse sentido, a presente revisão busca fazer um breve levantamento sobre os aspectos científicos mais consisten- tes acerca do papel dos canais iônicos no desenvolvimento das epilepsias, bem como correlacionar com o estudo de drogas antiepilépticas (DAEs) e mostrar as principais características farmacológicas das DAEs mais utilizadas na clínica atualmente. O papel dos canais de Na+ e Ca+2 como alvo de novas DAEs e a par- ticipação de outros receptores nesse processo são igualmente discutidos. Conclusão: A compreensão da fisiopatologia das epilepsias e dos possíveis alvos moleculares para novos fármacos é um dos principais focos para o descobrimento de tratamentos mais eficazes e com menos efeitos adversos. Unitermos: epilepsias, canais iônicos, canais de sódio, drogas antiepilépticas. ABSTRACT Ion channels role in epilepsy and considers of the antiepileptic drugs – a short review Introduction: Current epidemiological studies show a prevalence rate for active epilepsy in 0,5-1% of the population. Many forms of epilepsy are intractable to current therapies and there is a pressing need to develop agents and strategies to not only suppress seizures, but also cure epilepsy. Objective and Discussion: The aim of this review was to the recent advances in the physiology of ion channels and other potential molecu- lar targets, in conjunction with new informations on the genetics of idiopathic epilepsies, and current antiepileptic drugs (AEDs). Marketed AEDs predominantly target voltage-gated cation channels (the α-subunits of voltage gated Na+ channels and also T-type voltage-gated Ca2+ channels) or influence GABA- mediated inhibition. Conclusion: The growing understanding of the pathophysiology of epilepsy and the structural and functional characterization of the molecular targets provide many opportunities to create improved epilepsy therapies. Key words: epilepsy, ion channels, sodium channel, antiepileptic drugs. 170 CONSIDERAÇÕES SOBRE AS EPILEPSIAS A epilepsia é uma das principais desordens neuroló- gicas, com ampla distribuição, chegando a afetar cerca 0,5-1% da população mundial e uma incidência cumulati- va para toda a vida em cerca de 3-4%,1 estimando-se que mais de 50 milhões de pessoas no mundo apresentem algum tipo desse transtorno. Entretanto, pouco progresso tem se obtido na compreensão da fisiopatogenia das crises epilépticas e da classificação das síndromes epilépticas.2 De acordo com a classificação mais atual, as epilep- sias caracterizam-se por alterações crônicas, recorrentes e paroxísticas na função das áreas corticais e subcorticais envolvidas. Desse modo, muitas crises epilépticas mani- festam-se através de alterações sensitivas, emocionais ou cognitivas.3 O evento mais dramático de alguns quadros de epilepsia é a crise epiléptica, estando associada à ati- vidade hipersincrônica e repetitiva de um grupamento neuronal do córtex cerebral e estruturas hipocampais, cuja distribuição anatômica e duração de sua atividade deter- minam a natureza da crise.4 As manifestações das crises epilépticas refletem a fun- ção da área envolvida e muitas formas de epilepsia podem incluir distúrbios de cognição ou consciência, movimen- tos involuntários, automatismos de comportamento ou manifestações autonômicas, sensoriais e psíquicas.5 Um episódio único de crise generalizada pode ocorrer num indivíduo normal, em reação ao estresse fisiológico, privação do sono, efeito do álcool ou drogas ou trauma- tismo craniocefálico. Processos infecciosos, tóxicos ou me- tabólicos podem originar crises epilépticas recidivantes e limitadas, em indivíduos com um limiar reduzido, heredi- tário, sem síndrome epiléptica. Apesar do importante pro- gresso na compreensão das crises epilépticas nas últimas décadas, as bases celulares das epilepsias no homem per- manecem ainda desconhecidas.6 Várias hipóteses propõem-se a explicar a causa da epi- lepsia idiopática, incluindo alterações em vários sistemas de neurotransmissores, como nos da glicina, glutamato e GABA.7 Outros mediadores, como o óxido nítrico, têm sido implicados na fisiopatogênese da epilepsia.8 Sabe-se também da importância do receptor pós-sináptico de glutamato do tipo NMDA (N-metil-D-aspartato), que produz sobre focos epilépticos alterações paroxísticas des- polarizantes, capazes de produzir descargas epilépticas na epileptogênese.9 Mais recentemente, os receptores de glutamato do tipo AMPA (α-amino-3-hidroxi-5-metil- isoxazol) foram identificados como alvo para supressão de crises epilépticas devido a sua habilidade em modular a transmissão glutamatérgica.10 Além disso, a excitabilidade intrínseca do sistema nervoso que é intimamente contro- lada pela abertura ou bloqueio de canais iônicos operados por voltagem e que são regulados pelo influxo de cátions para o interior do neurônio tem papel importante na deflagração das crises.11 Canalopatias Os mecanismos celulares da excitabilidade neuronal e propagação dos sinais elétricos nos neurônios cerebrais são de grande importância funcional e patológica. A par- tir de estudos sobre alterações na permeabilidade de ca- nais iônicos foi possível considerá-los como novos alvos terapêuticos para drogas anti-epilépticas em estudo, tanto os controlados por voltagem como por ligantes.12 Na ver- dade, há uma nova tendência em considerar algumas síndromes epilépticas como canalopatias, principalmente dos canais de Ca+2, Na+, K+ e Cl-. Segundo Rodríguez (2002)13, os canais iônicos impli- cados na epilepsia são classificados de acordo com o estí- mulo que os ativam em: dependentes de voltagem, opera- dos por ligantes, associados à proteína G e associados a segundos mensageiros. Canais de Na+ Os canais de Na+ dependentes de voltagem são um dos principais responsáveis pela rápida despolarizaçãoda membrana neuronal presente amplamente e de forma desordenada nos processos epilépticos14. Mutações nas subunidades a formadora do poro e das subunidades acessórias β dosses canais no SNC foram descobertas em algumas formas de epilepsias, como as mutações nas subunidades α SNC1A e β SNC1B, que causa epilepsia generalizada tais como as convulsões febris.15 Esses canais representam um importante sítio de ligação para várias drogas antiepilépticas (DAEs): hidantoína, carbamazepina, ácido valpróico, lamotrigina entre outras. Estudo realizado por Kaplan e Lacey (1983) mostrou mutações na subunidade SNC2A dos canais de Na+ de- pendentes de voltagem e que estão envolvidas na epilep- sia neonatal familiar benigna. As mutações nesses recep- tores são heterogêneas e várias propriedades desses canais são modificadas, mas todas provocam ganho de função e aumento de corrente de Na+, o que provoca excitabilidade neuronal.16 Canais de Ca+2 As primeiras evidências da possível participação dos canais de Ca+2 dependentes de voltagem nas epilepsias provem da constatação de que reduções acentuadas na concentração extracelular desse íon pode criar atividade epiléptica em tecidos cerebrais como o giro denteado e outras estruturas hipocampais.17,18,19 Contudo, a magnitu- de dessa participação depende de neurônios específicos dessas regiões cerebrais.30 Sabe-se que o aumento agudo do influxo de Ca+2 é importante para manutenção da hiperexcitabilidade reflexa que ocorre em processos Porto LA, Siqueira JS, Seixas LN, et al. 171 convulsivos.2 Além disso, a observação que a ativação de canais de Ca+2 pode induzir alterações na expressão gênica20 sugere uma participação de maneira crônica na epilepsia. Na verdade, essas mudanças crônicas podem ser estruturais21 e/ou induzindo morte celular.2 Atualmente, são descritos seis subtipos de canais de Ca+2 dependentes de voltagem L, N, P, Q, R e T,19 onde pelo menos três desses subtipos (N-, P- e Q-) tem sido im- plicados no controle da liberação de neurotransmissores nas sinapses, como acetilcolina e serotonina, e ainda, o do tipo T tem papel importante nas descargas rítmicas das crises epilépticas generalizadas de ausência.22 Nesse con- texto, os canais de Ca+2 dependentes de voltagem tem pa- pel importante nos processos funcionais do sistema ner- voso.23 Por exemplo, a entrada de Ca+2 pré-sináptica se associa à liberação desses neurotransmissores e à entrada pós-sináptica dos mesmos com a despolarização sustenta- da do neurônio. Trabalho realizado por Naergel et al. (2000) consta- tou que na epilepsia do lobo temporal a redução do Ca+2 intracelular por incremento intracelular da proteína calbidina D-28K, produzida a partir da degranulação intracelular, atua bloqueando a ação do Ca+2 nas vesí- culas sinápticas. Outro estudo importante realizado por Magloczky et al. (1998), mostrou que a depleção da pro- teína calbidin D-28K provoca excitabilidade na região hipocampal do giro denteado, provocando a hiperestimu- lação dos canais de Ca+2 voltagem-dependente (VDCC), permitindo a recorrência de crises epilépticas.24 Outrossim, o bloqueio dos canais de Ca+2 pode pro- duzir vários efeitos no funcionamento neuronal: (a) blo- queio dos canais tipo T (está associado ao tratamento das crises de ausência); (b) bloqueio dos canais tipo L (está associado ao controle de crises parciais); (c) o bloqueio de canais de Ca+2 pode prevenir a liberação de neuro- transmissores excitatórios como o glutamato e (d) o blo- queio desses canais diminui a concentração dos íons Ca+2 no citoplasma neuronal, reduzindo a possibilidade de dano celular excitotóxico. Canais de K+ Outra família de canais iônicos dependentes de volta- gem que tem se mostrado importante nos processos epi- lépticos são os canais de K+. Mais precisamente, o que a literatura já descreveu foi o envolvimento dessas proteí- nas receptoras na modulação da atividade elétrica, no desencadeamento de crises epilépticas e sua importância como alvo de drogas anticonvulsivantes tem sido descri- tos na literatura.25,26 Os canais de K+ dependentes de voltagem participam da repolarização e hiperpolarização da membrana que se- gue as alterações paroxísticas da despolarização, evitando a repetição do potencial de ação. Mutações nos genes res- ponsáveis pela formação dos canais de potássio provocam diminuição da repolarização, gerando uma hiperexcita- bilidade. Um exemplo já descrito dessas alterações é o envolvimento dos canais voltagem-dependentes de potás- sio KCNQ2 e KCNQ3, que quando alterados principal- mente no domínio C-terminal reduz a corrente de potás- sio em 30% a 60% do fluxo normal. A alteração desses canais envolvem a fisiopatogenia da Síndrome da Epilep- sia Autossômica Dominante Benigna Familiar.16 Os canais KNCQ correlacionam-se a correntes do tipo M25 que recebem este nome porque é inibida pela estimu- lação de receptores muscarínicos da acetilcolina. Essas correntes estão envolvidas na regulação da excitabilidade sublimiar dos neurônios e sua responsividade aos sinais de entrada (inputs) sinápticos. Esta regulação da excitabilida- de neuronal provavelmente explica por que uma pequena perda de correntes M é suficiente para causar epilepsia.15 Estudo realizado com um derivado da benzoiltripta- mina, com propriedade anticonvulsivante em roedores, mostrou o envolvimento de canais de K+ do tipo Maxi-K, em células GH3, e que sua ativação pode contribuir com a redução da excitabilidade neuronal e reduzir a capacida- de epileptogênica.26 Canais de Cl– associados a GABA Quanto aos receptores para os principais neurotrans- missores inibitórios, o GABA e a glicina, que exercem seu rápido efeito inibitório através de canais de Cl–, foram des- cobertos recentemente apenas dois genes afetados rela- cionados à epilepsia.27 Mutações da subunidade γ2 do re- ceptor GABAA (GABRG2) foram identificadas na epilep- sia com crises de ausência na infância e convulsões febris generalizadas27. Mutações na subunidade α1 do receptor da glicina causa hiperekplexia ou Doença dos Surdos.28 A Doença dos Surdos é uma enfermidade genética rara ca- racterizada por hipertonia muscular e hiperreflexia em re- cém-nascidos, pela mutação na subunidade α1 do recep- tor da glicina. O diagnóstico é muitas vezes confundido com o de epilepsia. Receptores ionotrópicos glutamatérgicos O desenvolvimento de novos fármacos que são antagonistas dos receptores NMDA e AMPA, como o felbamato e o topiramato, respectivamente, têm mostrado resultados promissores em atenuar a epileptogênese ape- sar de apresentar efeitos adversos desagradáveis que difi- cultam suas indicações clínicas.6 Os receptores NMDA são altamente permeáveis ao Ca+2 e contribuem com um com- ponente lento para o potencial de ação excitatório.29 Essa dependência em relação ao Ca+2 para a liberação das vesículas sinápticas de glutamato proporcionaram a descoberta de novos alvos para as drogas anti-epilépticas, como a gabapentina e o leviracetam. Estudos identifica- O papel dos canais iônicos nas epilepsias ... 172 ram a proteína que a gabapentina se liga, é a subunidade α2-δ do canal de Ca+2, um outro alvo possível é a proteí- na SV2A, ambas envolvidas na liberação de vesícula sinápticas de glutamato.30 Estudo realizado por Ivanov et al. (2004), com ratos Ducky, mostrou que mutações deletérias no gene CACNA2D1 que codifica a proteína α2-δ, promovem maior suscetibilidade para o início das crises epilépti- cas.30 Receptores da acetilcolina Efeitos mutagênicos nos receptores nicotínicos pare- cem estar relacionados com a Epilepsia do Lobo Frontal Autossômica Dominante Noturna. Mutações nos genes CHRNA4 e CHRNB2, cujo efeito altera os aminoácidos dos receptores transmembrana, diminuem a resposta a acetilcolina dependente do cálcio e esse efeito promove a excitabilidade durante o sono, o que pode gerar crises epilépticas.16 CONSIDERAÇÕES GERAIS SOBRE DROGAS ANTIEPILÉPTICAS (DAEs) Uma droga antiepiléptica pode ser definida como uma substância que quando administrada por um determinado período,pode diminuir a incidência ou severidade das crises epilépticas que acometem pacientes portadores de síndrome epilépticas. Nesse sentido, foram várias as pro- postas terapêuticas para o tratamento das epilepsias antes do surgimento das DAEs, tais como: oculosterapia, liga- dura das artérias vertebrais, compressão testicular, trepa- nação, aplicação de ventosas, histerectomia e o uso de pre- parações a base de ervas e extratos animais.31 Apesar da ausência de fatores etiológicos bem com- preendidos ser um limitante no uso da DAEs e da própria terapêutica, os tratamentos clínicos em prática priorizam o controle dos sintomas das crises epilépticas, em detri- mento daqueles que objetivam a supressão da própria epileptogênese.6 A primeira droga utilizada como antiepiléptica eficaz foi o sal de brometo de potássio, introduzido por Locock (1857). Baseado numa premissa totalmente errada de que os pacientes com epilepsia tinham hipersexualidade, o autor usou esse sal e relatou resposta positiva em 14 de 15 mulheres com epilepsia catamenial.32 Atualmente, há um arsenal vasto de DAEs no merca- do e as mesmas agem com certa seletividade no Sistema Nervoso Central (SNC), no entanto, cerca de 30% dos pacientes não conseguem ter um tratamento adequado com esses fármacos.6,33 Desse percentual, cerca de 40% desses pacientes apresentam “farmacorresistência”, o que denota a ineficácia dos medicamentos até então presentes no mercado.34 A despeito desse importante registro, os mecanismos desencadeadores da farmacoresistência são pouco compreendidos.35 As DAEs de primeira geração (fenitoína, carbamazepina, fenobarbital, diazepam e val- proato de sódio) apresentam um número significativo de efeitos adversos (Quadro 1). É verdade que nas duas últimas décadas, com o surgimento das DAEs de segunda (lamotrigina, viga- batrina, tiagabine, topiramato, gabapentina e leviracetam) e de terceira gerações, o tratamento das epilepsias tem apresentado muitos avanços. Contudo, o percentual de pacientes que não tem um controle apropriado continua sem reduções significativas.6 Além disso, um percentual expressivo de pacientes epilépticos sofre mais danos em decorrência do tratamen- to medicamentoso que da própria condição epiléptica.31 Os efeitos adversos das DAEs atuais no tratamento de crian- ças e mulheres grávidas podem causar déficit cognitivo em crianças de até três meses de vida (barbitúricos), micro- cefalia e outras malformações congênitas. Concentrações plasmáticas equivalentes às doses usadas para controlar convulsões em seres humanos, a fenitoína, o fenobarbital, a vigabatrina e o ácido valpróico causam neurodegenera- ção apoptótica no cérebro de ratos em desenvolvimento, provavelmente associada com uma redução de neutrofinas e de proteínas anti-apoptóticas no cérebro.6,36 Estudos atuais que buscam o desenvolvimento de no- vas DAEs de drogas com alto potencial de bloqueio das crises epilépticas, controlando de forma seletiva os diver- sos tipos de epilepsias, e que apresentem baixa toxicidade.29 Contudo, pesquisas mais recentes com possíveis drogas efi- cazes contra as crises estão inseridas em novos conceitos, como drogas que atuem sobre a própria epileptogênese ini- bindo o desenvolvimento e progressão da epilepsia e aban- donando um pouco o enfoque das DAEs tradicionais que agem, de maneira geral, suprimindo a propagação inicial das convulsões tratando, assim, os sintomas.36 Numerosos mecanismos têm sido propostos para ação das DAEs, mas, de maneira geral, atuam principalmente por três mecanismos: (1) limitação dos disparos neuronais repetitivos através do bloqueio de canais iônicos depen- dentes de voltagem, (2) incremento da neurotransmissão inibitória mediada pelo GABA (3) bloqueio da transmis- são glutamatérgica excitatória22 (Quadro 1). Existem ainda fármacos que funcionam como antiepi- lépticos atípicos e são utilizados no tratamento da hiper- tensão, angina e arritmias cardíacas. Atuam bloqueando canais de Ca+2: fenilalquilaminas (verapamil); as diidro- piridinas (nimodipinas) e as benzotiazepinas (diltiazem). DAEs MAIS UTILIZADAS NA CLÍNICA O Quadro 1 mostra propriedades farmacológicas im- portantes das DAEs, tais como possível mecanismo de ação, o espectro de atividade, a farmacocinética e os per- fis de efeitos adversos. Porto LA, Siqueira JS, Seixas LN, et al. 173 Droga Efeitos Adversos Mecanismo de ação Indicação Clínica Barbitúricos (Fenobarbital) Depressão; acidose respiratória; hipotensão; bradicardia; hipotermia; erupção; sonolência; letargia; ataxia. Modulação alostérica de GABAA Convulsões tônico-clônicas generalizadas e parciais Benzodiazepínicos (Diazepam) Sedação, tolerância Aumento da ação de GABA Ausência; convulsões parciais e febris Carbamazepina Sedação, ataxia, retenção hídrica, pode haver graves reações de hipersensibilidade Bloqueio de canais de Na+ dependentes de voltagem Convulsões tônico-clônicas generalizadas, parciais e da epilepsia do lobo temporal Etossuximida Náusea e anorexia Bloqueio de canais de Ca+2 dependentes de voltagem tipo T Convulsões parciais e crises de ausência Felbamato Visão dupla, tontura, náuseas, dor de cabeça, exantema e leucopenia Bloqueio de canais de Na+ dependentes de voltagem e bloqueando os canais de Ca+2 do tipo T Convulsões parciais e generalizadas Gabapentina Sedação leve, náuseas, efeitos no comportamento, distúrbios de movimento, ganho de peso Agonismo GABAérgico Convulsões parciais Hidantoínas (Fenitoína) Sedação e anemia megaloblástica Bloqueio de canais de Na+ dependentes de voltagem Convulsões tônico-clônicas generalizadas e parciais Lamotrigina Rash, diplopia, sedação, síndrome de Stevens-Johnson, necrólise epidérmica tóxica Bloqueio de canais de Na+ dependentes de voltagem e o bloqueio indireto da liberação do glutamato Coadjuvante para convulsões parciais em adultos; síndrome de Lennox- Gastaut; epilepsia generalizada Leviracetam – Mecanismo desconhecido Convulsões parciais e generalizadas Oxicarbazepina Sonolência, fadiga, cefaléia, tontura, ataxia e vômito Mecanismo desconhecido Convulsões parciais Primidona Anemia megaloblástica, interações farmacológicas por indução enzimática Metabolização a barbituratos Convulsões parciais e generalizadas Topiramato Alterações do pensamento, dificuldade de encontrar as palavras, perda de peso, parestesias, nefrolitíase Bloqueio de canais de Na+ dependentes de voltagem e antagonismo do receptor do glutamato Coadjuvante no tratamento de crises parciais em adultos e crianças; epilepsia generalizada Tiagabina nervosismo, tonteiras, perda de peso Inibição seletiva da recaptação de GABA Coadjuvante de crises parciais em adultos Valproatos Hepatotoxicidade, perda de pêlos, mal formações fetais Interfere com a excitação mediada pelo glutamato e bloqueio de canais de Na+ dependentes de voltagem Epilepsias generalizadas idiopáticas, mioclônicas e crises de ausência Vigabatrina Sedação, náuseas, ganho de peso, depressão, psicose, diminuição do campo visual Aumento dos níveis de GABA, pela inibição da GABA transaminase Crises parciais e generalizadas Quadro 1. Principais drogas antiepilépticas utilizadas na clínica, seus mecanismos de ação e indicações. Felbamato O felbamato parece atuar inibindo os canais de Na+ sensíveis a voltagem produzindo uma redu- ção na condutância e, ainda, bloqueando os canais de Ca+2 do tipo T14. É indicado para pacientes com epilepsia gra- ve, refratários a outros tratamentos devido a reações como anemia aplástica e insuficiência hepática.33 Gabapentina Apresenta um mecanismo específico de ação que pode envolver aminoácidos para as células e aumentar a liberação não sináptica de GABA, provavel- mente seu alvo molecular seja a GABAtransaminase. Seus efeitos adversos mais comuns são leves e com freqüência transitórios. Ocasionalmente, ocorre efeitos comportamen- tais e movimentos involuntários, especialmente em crian- ças com encefalopatiasestáticas.37 Lamotrogina O seu mecanismo de ação envolve o bloqueio de canais de Na+ dependentes de voltagem.38 Há o bloqueio indireto da liberação do glutamato. Apresenta um amplo espectro de atividade e um perfil favorável aos efeitos adversos.33 Entretanto, ainda apresenta discinesia, diplopia, fadiga, ataxia e rashes.39 Oxicarbazepina O seu potencial antiepiléptico pa- rece ser dependente do bloqueio de canais de Na+ sensí- veis a voltagem, contudo, a inibição de canais de Ca+2 do tipos T tem sido descrito por alguns autores.22 Tem indica- ção terapêutica nas crises tônico-clônicas e nas crises par- ciais.40 A oxcarbazepina além de um amplo espectro tem baixa toxicidade hepática e é pouco propenso a interação com outras drogas.41 O papel dos canais iônicos nas epilepsias ... 174 Topiramato O mecanismo de ação mais aceito é o de pontencialização da transmissão GABAérgica (GABAA) e a inativação de canais de Na+ sensíveis a voltagem. A participação do sistema glutamatérgico como possível alvo do topiramato também tem sido descrito.14 Os efeitos adversos mais comuns são a perda de peso e disfunções cognitivas.39 Tiagabina O seu mecanismo de ação envolve a ini- bição do transportador de GABA (GAT-1) deste modo reduzindo a recaptação do GABA nos neurônios, poten- cializando a inibição neuronal.39 Apresenta efeitos adver- sos cognitivos leves relacionados à dose e, ainda pode apre- sentar discinesia, sonolência, astenia e tremores.33 Vigabatrina Possui uma estrutura química análoga ao de GABA e atua modulando as sinapses GABAérgicas aumentando significativamente os níveis de GABA. No tratamento com vigabatrina os pacientes comumente apre- sentam sedação, fadiga, ataxia e confusão mental. Rashes são comuns. Agitação pode ocorrer em crianças, contudo, em doses elevadas.39 PERSPECTIVAS NO DESENVOLVIMENTO DE NOVAS DAEs A pesquisa de novas DAEs tem se concentrado na busca de fármacos mais eficazes em bloquear as crises epi- lépticas, com amplos espectros e baixa toxicidade.6 Dro- gas que atenuam a neurotransmissão excitatória, tais como bloqueadores dos receptores glutamatérgicos têm sido pro- postos.14 Entretanto, nenhuma droga existente atualmen- te no mercado tem promovido uma “cura” para epilepsia, apenas atenuam os sintomas promovidos pela condição epiléptica. Desta forma, novos conceitos e direciona- mentos têm sido buscados pelos pesquisadores no desen- volvimento de novas DAEs. Produtos naturais de origem vegetal são uma fonte promissora para obtenção de substâncias com atividade farmacológica relacionada ao SNC.43,44 A biodiversidade e complexidade dos metabólitos secundários existentes nas plantas medicinais, tais como flavonóides, alcalóides, monoterpenos, esteróides e entre outros têm mostrado ati- vidade farmacológica para várias patologias neurológicas, entre elas a epilepsia.44-46 As DAEs atualmente utilizadas na clínica são efetivas e bem toleradas, com eficácia semelhante e perfis de efei- tos adversos superiores quando comparadas a outras dro- gas psicoativas tradicionais. Por outro lado, apesar das limitações e dos efeitos adversos apresentados, as DAEs representam avanços importantes no tratamento dos pa- cientes epilépticos, mas a procura por novas substâncias mais eficazes e menos tóxicas é uma das novas perspecti- vas na busca por uma DAE ideal. REFERÊNCIAS 1. Browne TR, Holmes GL. Epilepsy. New England Journal Medicine. 2001; 344:1145-51. 2. 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A transmissão eletrônica é encontrada no sistema nervoso central dos mamíferos, no coração, no músculo liso e em células epiteliais. Tem como principal vantagem sua velocidade e como principal desvantagem não poder ser modulada ou ter sua eficácia alterada. Já as sinapses neuro-químicas, embora mais lentas, podem ter suas propriedades funcionais e plásticas alteradas, variando sua efi- ciência ao longo do tempo. SINAPSES ELETRÔNICAS Na sinapse eletrônica a corrente elétrica (iônica) flue diretamente do terminal pré-sináptico para o elemento pós-sináptico através de canais de baixa resistência que unem as duas células na região de contato sináptico (gap junction). As sinapses ele- trônicas, em função de suas características morfo- func ionais , apresentam a lgumas d i ferenças características para as sinapses neuro-químicas, que estão expostas no quadro I. Quadro I - Propriedades Características das Sinapses Químicas e Elétricas. Propriedade SinapseElétrica Sinapse Química 1. Tamanho da Fenda Sináptica 3,5 nm 30-50nm 2. Continuidade Citoplasmática entre as células pré e pós sim não 3. Componentes Ultraestruturais típicos Canais iônicos através a sinapse Vesículas pré- sinápticas e Receptores pós- sinápticos 4. Agente da transmissão Corrente Iônica Transmissor Químico 5. Retardo Sináptico Ausente Em geral entre 1 a 5 ms 6. Direção da Transmissão Nos dois sentidos Sentido único Estudos mais recentes revelaram que os canais iônicos da sinapse eletrônica não estão sem- pre abertos, ao contrário, podem ter sua abertura modulada pelo pH intracelular, pelo Ca2+ e até mes- mo por segundo-mensageiros, embora de forma limi- tada. As sinapses eletrônicas são encontradas no coração (discos intercalares), no músculo liso (úte- ro), e no sistema nervoso central (dendritos). Por serem praticamente insensíveis à ação das drogas são refratárias à manipulação farmacológica, não sendo alvo de maior interesse terapêutico. SINAPSES QUÍMICAS Nas sinapses químicas os neurônios pré e pós-sinápticos não entram em contato, estando se- parados por uma fenda sináptica com distância entre 20 e 40 nm. O transmissor químico liberado pelo elemento pré-sináptico tem de se difundir pelo líquido extracelular da fenda até alcançar a membrana pós- sináptica e interagir com seus receptores farmacoló- gicos para dar início à resposta pós-sináptica. As várias etapas envolvidas no processo de transmissão química o tornam mais lento, gerando um retardo sináptico de 1 a 3 ms. Apesar da transmissão química ser um processo mais lento que a eletrônica, apre- senta a vantagem do sinal pré-sináptico poder ser amplificado, permitindo que pequenos terminais pré Rev Bras Anestesiol 1994; 44: 1: 25 - 33 Transmissão Sináptica Luiz Fernando de Oliveira,TSA1 Oliveira LF - Synaptic Transmission Key Words: PHARMACOLOGY: synaptic transmission 1 Livre-Docente em Anestesiologia e Farmacologia pela UFRJ, Prof Titular de Farmacologia - ICB - UFRJ e Prof Adjunto de Anestesiologia - FCM - UFRJ Correspondência para Luiz Fernando de Oliveira Estrada da Gávea 681 Bl. 3 / 304 - S. Conrado 22610-000 Rio de Janeiro - RJ © 1994, Sociedade Brasileira de Anestesiologia Revista Brasileira de Anestesiologia 25 Vol. 44 : Nº 1, Janeiro - Fevereiro, 1994 possam ativar grandes neurônios pós-sinápticos. Dois tipos de mensageiros químicos são encontrados nos terminais pré-sinápticos: a) Neurotransmissor - substância química que ao interagir com seu receptor determina o apare- cimento de um potencial pós-sináptico exci- tatório rápido (PPSE) ou inibitório (PPSI); b) Neuromodulador - substância química que ao interagir com seu receptor altera a liberação de um neurotransmissor ou altera a excitabili- dade pós-sináptica facilitando ou dificultando a ativação do elemento pós-sináptico pelo neurotransmissor. Enquanto os neurotrans- missores são moléculas de pequeno tamanho e peso molecular, em geral aminas ou aminoácidos, os neuromoduladores são em sua maioria peptídos (neuropeptídios). Morfologia da Sinapse Química Identifica-se numa sinapse química 3 ele- mentos básicos: 1- Terminal Pré-Sináptico; 2- Fenda Sináptica e 3- Membrana Pós-Sináptica (Figura 1). O terminal pré-sináptico é caracterizado pela presença das vesículas sinápticas que contém o transmissor e pela presença de regiões especiali- zadas na superfície citoplasmática da membrana, denominadas de ‘‘zonas ativas’’, que se agrupam formando arranjos hexagonais (neurônios centrais) ou em barras (junção mio-neural), na proximidade das quais as vesículas se ligam e se fundem no momento da liberação do transmissor (exocitose). Essas zonas ativas nem sempre estão presentes, como por exemplo nas terminações pós-gangliona- res que inervam o músculo liso. As vesículas sinápti- cas, embora possam ser vistas em todo o terminal, se agrupam em maior númeronas vizinhanças da membrana pré-sináptica. Elas são sintetizadas no corpo celular pelo complexo de Golgi, e transporta- das ao terminal pelo fluxo axoplasmático, onde são montadas.Elas são recicladas inúmeras vezes.Após cada liberação elas são remontadas,carregadas com o neurotransmissor e novamente utilizadas (Fig 1). O elemento pós-sináptico é caracterizado pela presença dos receptores , macromoléculas pro- téicas que atravessam a membrana de lado a lado e com as quais os transmissores interagem, abrindo ou fechando um canal iônico, (alterando a condutância da membrana e conseqüentemente seu potencial elétrico), ou ativando ou inibindo um sistema enzimático (o que leva indiretamente a abertura ou fechamento de canais iônicos ou à secreção ou pro- dução de hormônios). Dependendo do tipo de recep- tor existente na membrana, o mesmo transmissor pode excitar ou inibir, ou mesmo cumprir função apenas moduladora (regulando a sensibilidade da célula a outro(s) neuromediadores). Receptores far- macológicos também são encontrados nos terminais pré-sinápticos onde exercem papel regulador da libe- ração e da taxa de renovação metabólica (turn-over) do transmissor químico. Muitas vezes a membrana pós-sináptica não é plana, mas enrugada, cheia de dobras ou digitações, o que aumenta muito a super- fície de contato, como na membrana da Placa Mo- tora. Fig 1 - A= Sinapse Neuro-Química - a fusão das vesículas contendo o neurotransmissor se faz nas zonas at ivas (Corpos Densos), através acoplamento da vesícula com a proteína (poro) de fusão, que ao se abrir permite a descarga do c onteúdo vesicular na fenda. B= Seqüência de Eventos Sinápticos. OLIVEIRA 26 Revista Brasileira de Anestesiologia Vol. 44 : Nº 1, Janeiro - Fevereiro, 1994 Etapas do Processo da Transmissão Química O processo da neurotransmissão é o elo mais frágil da cadeia de transmissão de informação no tecido nervoso, sendo facilmente alterado por agentes físicos e químicos. Essa maior fragilidade do processo de neurotransmissão, quando comparado com o processo de condução axônica, deve-se a sua complexidade o que o torna o alvo básico da ação das drogas no sistema nervoso. A liberação do neurotransmissor é dispara- da pela chegada de um potencial de ação com con- seqüente despo la r i zação da membrana pré-sináptica, provocando aumento da condutância ao cálcio. O influxo de cálcio para dentro do terminal dispara um aumento na freqüência de fusão das vesículas com a membrana pré (exocitose), acarre- tando maciça liberação do neurotransmissor. Livre na fenda o neurotransmissor tem vá- rios destinos: a) difunde-se para fora e é carreado pela circulação local; b) sofre o ataque de enzimas extracelulares e é biodegradado; c) é recapturado e bombeado de volta para o terminal pré-sináptico para ser reutilizado (captação); d) ou liga-se a receptores farmacológicos pré ou pós-sinápticos dando início a sucessão de eventos que culminam com o apareci- mento de um potencial pós-sináptico excitatório ou inibitório, com alteração do processo de liberação, ou com secreção de um hormônio (Figura 1). Síntese - No caso dos neurotransmissores de pequeno peso molecular como as aminas e ami- noácidos, existe sistema enzimático específico no terminal capaz de sintetizá-los a partir de precur- sores localmente disponíveis (ex: acetilcolina e colino-acetilase). No caso dos peptídios neuromodu- ladores (e eventualmente neurotransmissores), a síntese ocorre no corpo celular dos neurônios onde existe mecanismo específico para a síntese, sendo o mediador transportado até o terminal pelo fluxo axoplasmático. Liberação - A liberação do neurotransmis- sor em condições de repouso é evento causal, raro e fortuito, ocorrendo sempre que uma vesícula se liga à membrana na vizinhança de um zona ativa. Isso inicia o processo de fusão das membranas vesicular e pré-sináptica e leva à liberação do conteúdo vesicu- lar. A presença de neurofilamentos e de actina na vizinhança das zonas ativas e das vesículas, sugere que esses elementos contribuem para a organização das vesículas na proximidade das zonas de liberação e, talvez, também para aproximação das vesículas à membrana no momento da liberação maciça. Du- rante o processo de ativação da sinapse, a despolari- zação do terminal pré-sináptico pela corrente iônica do potencial de ação aumenta a condutância ao cál- cio, acarretando sua entrada no terminal, em grandes quantidades. O Cai+2 então deflagra um grande aumento (> de 100.000 vezes) do processo de fusão (exocitose). Na junção mio-neural, por exemplo, em condições de repouso, é liberada casualmente ao redor de 1 vesícula/segundo contendo um ‘‘quantum’’ de acetilcolina (cerca de 5.000 moléculas), respon- sável pelo aparecimento de um potencial miniatura na placa motora, com cerca de 0,5 mV. Durante a ativação pré-sináptica são liberadas pela ação do cálcio cerca de 150 quanta (vesícula), durante ap- enas 2 ms! Por isso o processo de liberação do neurotransmissor é descontínuo e denominado de quantal. Nos neurônios centrais, com terminais pré- sinápt icos muito menores, quant idades bem menores de neurotransmissor são liberadas ( cerca de 1 a 10 quanta em 1 a 2 ms), gerando potenciais pós-sinápticos também muito menores de cerca de 1 a 5 mV em contraste com o potencial de placa motora que em geral tem ao redor de 70 mV. O mecanismo pelo qual o cálcio favorece a exocitose aumentando sua pro--babilidade de ocorrer não está ainda es- clarecido. Algumas hipóteses sugerem que: a) le- varia à fusão dos filamentos de actina aproximando as vesículas das zonas ativas (onde elas existem); b) ativaria proteína da membrana favorecendo o aparecimento ou abertura de poro de fusão entre a vesícula e a membrana; c) reduziria as cargas nega- tivas da superfície vesicular facilitando sua aproxi- mação e fusão com a membrana. Como a membrana pré-sináptica é de natureza quimioexcitável - eletrônica, conduzindo com atenuação (isto é, não gera potencial regenera- tivo), o potencial de ação ao invadí-la vai sendo atenuado até chegar à região de liberação. Em con- seqüência disso, variações na resistência elétrica da membrana do terminal afetam a amplitude da despo- larização alcançada na membrana pré-sináptica e, por conseqüência, a variação na gCa e no influxo de cálcio essencial para a liberação. Esse fenômeno é importante para a compreensão do mecanismo de inibição pré-sináptica. Qualquer pequena despolari- zação do terminal pré, por aumentar as condutâncias iônicas, aumenta a condutância da membrana (gm) e pela lei de Ohm (Vm = Im/gm) a despolarização pro- vocada por uma dada intensidade de corrente será menor, acarretando menor oscilação do potencial pré-sináptico. menor aumento da gCa, menor influxo de cálcio e menor liberação do neurotransmissor! Embora o processo de exocitose pareça ser TRANSMISSÃO SINÁPTICA Revista Brasileira de Anestesiologia 27 Vol. 44 : Nº 1, Janeiro - Fevereiro, 1994 predominante, existem evidências de que também pode haver liberação direta de neurotransmissor não contido em vesículas, mas dissolvido no citoplasma, através canais semelhantes aos da sinapse ele- trônica. Regulação da Liberação - O processo de liberação depende basicamente de três fatores: a) da taxa de renovação metabólica do transmis- sor (turn over); b) da amplitude e duração da despolarização do terminal; c) da autorregulação do processo pelos receptores pré-sinápticos. A taxa de renovação depende de vários fatores, entre os quais a oferta de precursor, a efi- ciência do processo de captação neuronal, e a dis- ponibilidade de enzimas essenciais à síntese e armazenamento do transmissor. A amplitude e a duração da despolarização do terminal são decisivas para a liberação. Quanto maior for a despolarização ou sua duração, maior será a quantidade liberada. Fatores que interferem com a amplitude ou a duração da despolarização afetarão a liberação, como vimos no item anterior. Receptor farmacológicos da membrana pré- sináptica, autólogos (para o próprio neurotransmis- sor) ouheterólogos (para outro neurotransmissor), regulam a liberação controlando o processo exo- citótico através da interferência com a condutância da membrana (gm), com o influxo de cálcio, ou através a fosforilação de proteínas essenciais ao processo. Por exemplo, no terminal adrenérgico cen- tral e periférico, a liberação da noradrenalina é con- trolada por receptores ß1 que favorecem a liberação, e receptores α2 que inibem a liberação (Figura 2). Captação e Retenção - Os terminais ner- vosos trabalham economicamente, poupando neuro- transmissor. Caso não existisse um mecanismo de poupança, o terminal iria se exaurir rapidamente do transmissor quando fosse estimulado mais rapida- mente. Com o objetivo de poupar o transmissor ex- iste na membrana pré-sináptica sistema enzimático que carreia o transmissor de volta da fenda para o citoplasma (carreadores), onde poderá ser reincor- porado às vesículas e reutilizado. Esse mecanismo é denominado captação neuronal ou tipo I e é possível bloqueá-lo com substâncias específicas, a curto prazo aumentando a quantidade livre do trans- missor na fenda, a médio prazo podendo levar ao esgotamento das reservas intra-neuronais (de- pleção), e a longo prazo até a alterações na sensibili- dade pré e pós-sinápticas. Em alguns terminais e captação não é para o neurohormônio, mas sim para seu metabolito imediato como no caso dos terminais colinérgicos, que possuem captação de alta afini- dade para a colina. Outra modalidade de captação é denominada tipo II e é encontrada em células não- nervosas, como a glia, o hepatócito, a plaqueta etc. Essa captação tipo II está envolvida com a inativação do transmissor. Nas vesículas de armazenamento existe outro mecanismo de concentração contra gradiente denominado de retenção. Esse mecanismo é respon- sável pela concentração, fixação e armazenamento do transmissor dentro das vesículas junto com pro- teína e ATP. Também a retenção pode ser bloqueada por drogas levando a curto prazo a liberação do transmissor no citoplasma e a médio prazo ao esvaz- iamento das vesículas (depleção) e falência da neurotransmissão. Eventos Pós-Sinápticos - Uma vez lib- erado, o neurotransmissor difunde-se no líquido ex- tra-celular da fenda e liga-se aos receptores pós e pré-sinápticos aí existentes. Isso dá início a sucessão de eventos que culminam com o apare- cimento de um potencial pós-sináptico excitatório ou inibitório, a secreção de um hormônio, ou com o aumento ou diminuição da liberação. Os receptores farmacológicos tem duas características comuns: a) são proteínas integrais da membrana que a atravessam de um lado ao outro, a região extra-celular funcionando como receptora, re- Fig 2 - Regulação da liberação no terminal adrenérgico. O processo de liberação do neurohormônio adrenérgico é auto-regulado por receptores α2 e β1. Baixas concentrações extra-celulares do NHA ativam o receptor β1 estimulando a exocitose, enquanto altas concentrações ativam o receptor α2 que inibe o processo de exocitose. OLIVEIRA 28 Revista Brasileira de Anestesiologia Vol. 44 : Nº 1, Janeiro - Fevereiro, 1994 conhece e liga o transmissor; b) desempenham função efetora no elemento pós-sináptico dire- tamente ativando canal iônico, ou indiretamente através segundo mensageiro, o que os diferencia em duas grandes famílias de receptores geneticamente diferentes. A primeira família de receptores, a dos que ativam canal iônico diretamente, consiste de uma única macromolécula que contém várias subuni- dades protéicas que formam o local de recon- hecimento do transmissor e o ionóforo (canal). Nesses receptores a ligação de um transmissor ao local de reconhecimento determina uma alteração de conformação que abre o canal. Como exemplo temos os receptores nicotínico (ACh), AMPA e NMDA (Glu), GABAA, e glicina. Nesses receptores a seqüência intramembrana da proteína é praticamente igual. Esses receptores são assemelhados ao canais iôni- cos voltagem-dependentes e produzem normal- mente respostas sinápticas rápidas que duram milissegundos. Receptores que ativam canal iônico indire- tamente constituem a segunda superfamília, como por exemplo os receptores adrenérgicos, o receptor dopaminérgico, o receptor muscarínico, o receptor da serotonina. Esses receptores ligam-se a uma pro- teína (proteína G) que liga GTP e que promove o acoplamento do receptor a enzimas efetoras, como a adenil-ciclase, guanil-ciclase ou fosfolipases C e A2, que controlam a produção de segundo-mensagei- ros como cAMP, cGMP, DAG/IP3 e PG’s (Figura 3). Estes segundos-mensageiros então interagem ou di- retamente com o canal iônico, ou mais freqüente- mente com uma cinase protéica que controla, através reação de fosforilação, o canal iônico ou proteína reguladora que interage com o canal. Esses recep- tores em geral mediam respostas sinápticas mais lentas que duram segundos ou minutos, ajustando a excitabilidade sináptica. 1. Transmissão por ativação direta de canal iônico- Estes receptores, quando ativados, geram oscilações rápidas (ms) do potencial da membrana sob a forma de uma pequena despolarização (poten- cial pós-sináptico excitatório - PPSE), ou hiperpolari- zação (potencial pós-sináptico inibitório - PPSI). Nas sinapses centrais, ao contrário do que se observa na placa motora ou no músculo liso, os PPSE são de amplitude muito pequena (ao redor de 0,5 mV), menores que o mínimo necessário para atingir o potencial limiar e deflagrar um potencial de ação. A ativação do elemento pós-sináptico vai depender do fenômeno de convergência e somação (espacial e temporal) de vários pequenos PPSE. Os PPSI con- trabalançam os PPSE podendo impedir o elemento pós-sináptico de atingir o limiar, e assim, inibindo-o. Nas células espontaneamente ativas (com atividade marca-passo), os PPSI estabilizam o potencial de repouso controlando a atividade espontânea e a freqüência de disparo. A atividade excitatória dependente deste tipo de re- ceptor, é mediada por receptores ligados a canais seletivos para sódio/potássio (ex: Rec. nicotínico, glutamato - AMPA), ou sódio/cálcio (ex: glutamato - NMDA). Já a atividade inibitória sináptica é mediada por receptores ligados a canal de cloreto (ex: GABAA e glicina). 2 . Transmissão mediada por Segundo-Men - sageiro - Esta segunda família de receptores, geneti- camente distinta da anterior, caracteriza-se pela propriedade de que o reconhecimento do transmissor e a ativação do efetor são mediadas por moléculas diferentes e separadas (ex: receptores adrenérgicos, receptor muscarínico, receptores da serotonina, re- ceptores dopaminérgicos, receptores dos neuropep- tídios). Nesta família a molécula receptora é acoplada à molécula efetora por uma proteína-G (proteína ligada a guanosina-nucleotídio). A ativação do efetor final depende, em geral, da ativação inter- mediária de sistemas enzimáticos (Figura 4). O efetor final é normalmente uma enzima que cataliza a sín- Fig 3 - Receptores que ativam canal iônico diretamente e receptores acoplados à proteína G. A= Receptor acoplado a canal iônico, ativado diretamente pelo neurotransmissor. B= Receptor acoplado a proteína G. A ativação de cinase protéica acarreta fosforilação de canal iônico e sua con - seqüente abertura. TRANSMISSÃO SINÁPTICA Revista Brasileira de Anestesiologia 29 Vol. 44 : Nº 1, Janeiro - Fevereiro, 1994 tese de um segundo-mensageiro (ex: AMPc, IP3, DAG). Três sistemas principais de segundo-men- sageiro podem estar envolvidos nesse tipo de trans- missão: 1- Adenil-Ciclase/AMP cíclico 2- Fosfolipase C/IP3 - DAG (diacil-glicerol) 3- Fosfolipase A2/Ac.Aracdônico (LT - PG) Outros sistemas de segundo-mensageiro já identificados são: a) guanil-ciclase/GMPc; b) NO sintase/NO; c) Sistema tirosino-cinase. Esses sistemas de segundo-mensageiro, na maioria das vezes, agem ativando cinases protéi- cas que comandam reação de fosforilação de um canal iônico, abrindo-o ou fechando-o. Eventual- mente a proteína-G pode interagir diretamente com o canal iônico. Essas respostas são mais lentas que aquelas medidas por receptoresligados diretamente a canal, e por isso em geral não mediam transmissão mas sim modulam a excitabilidade neuronal. Esses mediadores normalmente afetam o limiar de excita- bilidade, a acomodação, a amplitude e a duração do potencial de ação, podendo alterar não só as pro- priedades da membrana pós-sináptica a outro trans- missor, mas também agir em nível pré-sináptico alterando a excitabilidade e o influxo de cálcio, e assim controlar a liberação de outro transmissor. Mais recentemente foi demonstrado que segundo- mensageiros, através a fosforilação de proteínas reguladoras do processo de transcrição do ADN, podem alterar a expressão genética, induzindo al- terações permanentes (plásticas) na célula tais como traço de memória, hiperexcitabilidade etc. Término do Efeito - Dois mecanismos prin- cipais contribuem para o término do efeito dos neuro- transmissores: a metabolização e a captação. A metabolização pode ser neuronal ou ex- traneuronal. Esta pode ocorrer na fenda sináptica ou em local distante. Em alguns casos pode ser extre- mamente rápida e por isso ser o mecanismo funda- mental para determinar a meia-vida do transmissor na fenda (ex: ACh), em outros limitada e lenta (ex: catecolaminas), estando a duração dos eventos re- lacionada com a captação. Principais Mediadores Químicos no SNC Para que uma substância possa ser consid- erada como neurotransmissora ela deve atender quatro critérios: 1- Deve ser sintetizada no neurônio; 2- Deve estar presente no elemento pré-sináptico e ser liberada em quantidades suficientes para exercer seu suposto efeito no elemento pós-sináptico; 3- Quando administrada de forma exógena deve reproduzir os efeitos do transmissor endógeno; 4- Deve existir um mecanismo específico de re- moção da fenda sináptica (captação ou me- tabolismo). Na maioria das sinapses centrais é possível identificar um transmissor, em geral uma molécula de baixo peso molecular, e um co-transmissor, em geral um neuropeptídio com função neuromoduladora (Ta- bela I). Tabela I - Neurotransmissores e Peptídios Neuroativos. I- Neurotransmissores Aceticolina (ACh) - Dopamina (DA) - Noradrenalina (NA) - Serotonina (5-HT) Histamina (H) - Ácido γ Amino-Butírico (GABA) - Glicina - Glutamato II- Peptídios Neuroativos TRH - GRH - Somatostatina - CRH - GHRH - Vasopressina - Ocitocina ACTH - ß Endorfina - Prolactina - LH-GH - Tirotropina - VIP -Colecistocinina sP - Neurotensina - Encefalinas - ANP - CGRP - Neuropeptídio y-Neurocinina A lguns dos pep t íd ios neuroa t i vos preenchem os requisitos que caracterizam um neuro- transmissor, mas as características de sua síntese e de seus efeitos eletrofisiológicos sugerem primordial- mente papel neuromodulador. Na maioria das vezes Fig 4 - Transmissão mediada por receptores acoplados a proteína G. OLIVEIRA 30 Revista Brasileira de Anestesiologia Vol. 44 : Nº 1, Janeiro - Fevereiro, 1994 atuam como co-transmissores, regulando a excita- bilidade pós-sináptica ao transmissor principal (re- sponsável pelo PPSE rápido). Como exemplo podemos citar o VIP e o CGRP nas terminações colinérgicas e a substância P nos aferentes nocicep- tivos glutamatérgicos. Papel Fisiológico dos Principais Sistemas Transmissores I- Glutamato - A grande maioria das sinapses excitatórias no cérebro utiliza glutamato ou aspartato como transmissor. Esses amino-ácidos transmis- sores interagem com dois grandes tipos de recep- tores o NMDA e o AMPA. Este último divide-se em kainato e quisqualato (A e B). O receptor quisqualato B é do tipo ligado a proteína-G e ativa fosfolipase C, enquanto os receptores NMDA e AMPA são ligados diretamente a canal-iônico Na/Ca. Embora seja o mais importante sistema neurotransmissor no SNC, sua fisiologia e farmacologia são ainda em grande parte desconhecidas. Sabe-se que está envolvido na transmissão nociceptiva, na memória, nos processos epilépticos, na manutenção do estado consciente etc. O desenvolvimento de agonistas e antagonistas do glutamato abre novas e promissoras perspectivas para o conhecimento das patologias do SNC e seu tratamento. II- Dopamina - Três sistemas de projeção con- tendo fibras dopaminérgicas já foram identificados: a) mesolímbicofrontal, que conecta o tronco cerebral com áreas do sistema límbico e córtex pré-frontal. Envolvido com as funções afetivo-emocionais e, aparentemente, com a gênese da esquizofrenia; b) nigroestriado, circuito extra-piramidal envolvido no controle do tono muscular. Sua lesão acarreta sín- drome de Parkinson; c) túbero-infundibular, circuito hipotálamo-hipofisário envolvido no controle da se- creção de prolactina e hormônios hipofisários. III- Noradrenalina - Encontrada em circuitos neuronais do tronco cerebral, como no locus co- eruleus, e em projeções tegumento-corticais. En- volvida em mecanismos de controle reticular do sistema simpático, manutenção do estado de alerta, sistema de modulação inibitória retículo-espinhais etc. IV- Serotonina - Encontrada principalmente no tronco cerebral e no sistema límbico (amígdala e hipocampo). Envolvida em comportamento emo- cional, mecanismo do vômito, regulação do estado de sono etc. V- GABA - Principal transmissor inibitório no sistema nervoso central. Os sistemas gabaérgicos são encontrados distribuídos universalmente pelo SNC, mas são particularmente importantes no sistema límbico e na medula espinhal, estando en- volvidos com excitabilidade, ciclo do sono, compor- tamento emocional e reflexos multissinápticos. Esse sistema é o alvo de ação dos benzodiazepínicos, álcool e barbitúricos. VI- Acetilcolina - Encontrada no córtex, nos gânglios da base, no cerebelo e na formação reticu- lar. Circuitos colinérgicos estão envolvidos com o ciclo do sono, controle da motricidade, funções cog- nitivas, e doença de Alzheimer. Neurotransmissão no Sistema Nervoso Autônomo Sistema Para-Simpático - O neurotrans- missor, tanto pré quanto pós-ganglionar é a acetil- colina. Ela interage com dois tipos de receptores, o nicotínico e o muscarínico. Esses receptores não só pertencem a famílias distintas, mas também apre- sentam distribuição e função diferentes. Sub-tipos de receptores colinérgicos já foram identificados, podendo sua classificação e distribuição ser apre- ciada no Quadro II. Sistema Simpático - Tanto no sistema sim- pático quanto no para-simpático o mecanismo de transmissão ganglionar é o mesmo, funcionando a acetilcolina como transmissor entre o elemento pré- ganglionar e o pós-ganglionar. No para-simpático a transmissão ganglionar é mediada por receptor ni- cotínico responsável pelo PPSE rápido, enquanto receptores muscarínicos do tipo M1 mediam PPSE lento que modula a excitabilidade pós-ganglionar. Perifericamente o mediador simpático é a noradrenalina. Liberada pelos terminais adrenérgi- cos ela interage com dois tipos de receptores, o α e o β. Subtipos de receptores já foram caracterizados (Quadro III), embora todos os receptores pertençam à mesma família dos receptores acoplados a proteína G. Na figura 5 pode-se observar esquematicamente como esses receptores interagem com a proteína G. TRANSMISSÃO SINÁPTICA Revista Brasileira de Anestesiologia 31 Vol. 44 : Nº 1, Janeiro - Fevereiro, 1994 Quadro III - Classificação e Distribuição dos Receptores Adrenérgicos. Receptor Agonista Antagonista Tecido resposta Mec.Molecular α1 Ad > Na Prazosin M.liso vasc Contração ↑FLC→ ↑IP3/DAG Fenilefrina ↑Cai Fígado M.liso int Glicogenólise Hiperpolarização Relaxamento ↑gK Coração Arritmias ↓gK α2 Ad > NA Ioimbina Pâncreas ↓Sec.Insulina ↓AC - ↑gK Terminais adrenérgicos ↓Liberação NA ↓gCa M.liso vascular Contração ↑Cai ß1 Iso > Ad = NA Atenolol Coração ↑Inotropismo ↑AC - ↑gCa Dobutamina ↑Vel.Cond.AV Rim Sec.de Renina ß2 Iso > Ad > NA ICI 118551 M.liso Relaxamento ↑AC ↓Cai Fígado Glicogenólise I- Muscarínicos ( Acoplados à proteína G) M1 M2 M3 Localização Neural Cél.Parietais Gástricas Cardíaco Terminações pré-sinápticas Glandular M.liso Endotélio vascular
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