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CENTRO UNIVERSITÁRIO FAVENI BIOQUÍMICA GUARULHOS – SP 2 SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO ........................................................................................................ 4 2 INTRODUÇÃO A BIOQUÍMICA .............................................................................. 5 2.1 O que é a bioquímica .......................................................................................... 5 2.2 Separação de organelas celulares ...................................................................... 6 2.3 Organelas celulares ............................................................................................ 9 2.4 As biomoléculas e a hierarquia na organização molecular das células ............ 13 2.5 Hierarquia na organização molecular das células............................................. 13 3 ÁGUA, pH E TAMPÕES ....................................................................................... 14 3.1 Propriedades da água ....................................................................................... 15 3.2 A relação do pH com a acidez e a alcalinidade ................................................ 18 3.3 O que fazem os tampões e como eles atuam ................................................... 21 4 VISÃO GERAL DO METABOLISMO .................................................................... 24 4.1 Biomoléculas que participam das vias metabólicas .......................................... 25 4.2 Relação energética entre as vias catabólicas e anabólicas .............................. 30 4.3 Vias metabólicas anabólicas e catabólicas ....................................................... 33 4.3.1 Metabolismo de carboidratos ............................................................................ 33 4.3.2 Metabolismo de aminoácidos ........................................................................... 34 5 ÁCIDOS NUCLEICOS E NUCLEOTÍDEOS .......................................................... 36 5.1 Estrutura química do DNA ................................................................................ 36 5.2 Bases nitrogenadas dos ácidos nucleicos ........................................................ 40 5.3 Os ácidos nucleicos DNA e RNA ...................................................................... 42 5.4 O dogma central ............................................................................................... 44 6 AMINOÁCIDOS ..................................................................................................... 45 6.1 Estrutura básica dos aminoácidos .................................................................... 45 6.2 Classificação dos aminoácidos ......................................................................... 48 6.3 A importância dos aminoácidos nos processos metabólicos do organismo ..... 49 7 PROTEÍNAS ......................................................................................................... 50 7.1 Os quatro níveis da estrutura proteica .............................................................. 50 7.2 Quais os tipos de ligações que estão envolvidas na estabilidade das proteínas?...................................................................................................................52 7.3 Estrutura das proteínas de acordo com sua função .......................................... 52 3 7.4 Classificação das proteínas .............................................................................. 53 8 CARBOIDRATOS ................................................................................................. 55 8.1 A estrutura dos monossacarídeos, dissacarídeos e polissacarídeos ................ 56 8.2 As funções que os carboidratos podem desempenhar nas células .................. 57 8.3 Isomeria entre os monossacarídeos e as ligações glicosídicas ........................ 59 9 LIPÍDEOS ............................................................................................................. 61 9.1 O papel dos lipídeos ......................................................................................... 61 9.2 Estrutura, características físico-químicas e as diversas funções dos lipídeos .. 63 10 CATÁLISE ENZIMÁTICA ...................................................................................... 68 10.1 Os componentes de uma reação enzimática .................................................... 68 10.2 Principais mecanismos de catálise das enzimas .............................................. 70 10.3 Os modelos de ligação da enzima ao substrato e os tipos de reações catalisadas..................................................................................................................72 11 BIOENERGÉTICA ................................................................................................. 73 11.1 Principais conceitos relacionados à bioenergética ............................................ 73 11.2 Termodinâmica bioquímica ............................................................................... 74 REFERÊNCIAS ......................................................................................................... 76 4 1 INTRODUÇÃO Prezado aluno! O Grupo Educacional FAVENI, esclarece que o material virtual é semelhante ao da sala de aula presencial. Em uma sala de aula, é raro – quase improvável - um aluno se levantar, interromper a exposição, dirigir-se ao professor e fazer uma pergunta, para que seja esclarecida uma dúvida sobre o tema tratado. O comum é que esse aluno faça a pergunta em voz alta para todos ouvirem e todos ouvirão a resposta. No espaço virtual, é a mesma coisa. Não hesite em perguntar, as perguntas poderão ser direcionadas ao protocolo de atendimento que serão respondidas em tempo hábil. Os cursos à distância exigem do aluno tempo e organização. No caso da nossa disciplina é preciso ter um horário destinado à leitura do texto base e à execução das avaliações propostas. A vantagem é que poderá reservar o dia da semana e a hora que lhe convier para isso. A organização é o quesito indispensável, porque há uma sequência a ser seguida e prazos definidos para as atividades. Bons estudos! 5 2 INTRODUÇÃO A BIOQUÍMICA Nesta seção, você vai identificar as biomoléculas que formam todos os organismos vivos, como elas se organizam para formar estruturas mais complexas, quais as organelas responsáveis pelas diferentes funções dentro de uma célula, e como os cientistas conseguem isolar partes diferentes da célula para estudar suas funções. 2.1 O que é a bioquímica A bioquímica é a ciência em que a química é aplicada ao estudo dos organismos vivos e aos átomos e moléculas que os compõem. Ela forma uma ponte entre a biologia e a química ao estudar como as reações químicas e as estruturas químicas dão origem à vida e aos processos da vida. A bioquímica questiona como as extraordinárias propriedades dos organismos vivos se originaram a partir de milhares de biomoléculas diferentes. Quando essas moléculas são isoladas e examinadas individualmente, elas seguem todas as leis físicas e químicas que descrevem o comportamento da matéria inanimada. Todos os processos que ocorrem nos organismos vivos também seguem todas as leis físicas e químicas. O estudo da bioquímica mostra como o conjunto de moléculas inanimadas que constituem os organismos vivos interage para manter e perpetuar a vida exclusivamente pelas leis físicas e químicas que regem o universo inanimado. A bioquímica é, de forma simplificada, a ciência que estuda a química da vida. (CARVALHO, 2018). Fonte: https://conhecimentocientifico.r7.com/ 62.2 Separação de organelas celulares O estudo da composição da célula é essencial para que se entenda o seu funcionamento. Tudo o que se sabe hoje sobre os mecanismos celulares só foi possível devido ao desenvolvimento e aperfeiçoamento de técnicas laboratoriais e métodos de estudo. Em bioquímica, o método mais comumente utilizado e que mais auxiliou no desenvolvimento dos estudos sobre as partes isoladas das células foi o fracionamento celular. As técnicas foram aperfeiçoadas de forma a permitir a separação das diferentes organelas e macromoléculas sem prejudicar suas funções. Para ter acesso a componentes que ficam dentro de um recipiente, o primeiro passo é abrir o recipiente. Com células e organelas celulares, funciona da mesma maneira. A Figura a seguir apresenta, de maneira simplificada, os passos necessários para o fracionamento das organelas celulares. O primeiro passo para que se possa isolar as organelas celulares é romper a membrana plasmática que as circunda. Isso pode ser feito de algumas formas diferentes: por meio de choque osmótico (normalmente feito com sacarose ou um detergente), vibração de ultrassom, por rompimento mecânico, ou ainda pela combinação de mais de uma técnica. O método escolhido depende do tecido, de tipo celular, e da fração de interesse. A maioria das células de plantas e animais pode ser homogeneizada mecanicamente. A vibração de ultrassom é geralmente usada paralisar células procarióticas. Já o choque osmótico é normalmente o método de escolha paralisar células vulneráveis a estresse osmótico, como os eritrócitos. (CARVALHO, 2018). Todos os processos citados rompem as membranas em fragmentos que rapidamente se fecham novamente formando pequenas vesículas e liberando organelas celulares. Quando bem executados, esses protocolos preservam intactas organelas como o núcleo, as mitocôndrias, lisossomos, peroxissomos e complexo de Golgi. O extrato resultante vai conter uma mistura de organelas celulares de tamanhos, cargas e densidades diferentes. 7 Fonte: Fonte: Adaptada de Nelson e Cox (2014). 8 Após a obtenção do extrato celular que contém as organelas livres, elas devem ser isoladas. A técnica utilizada para este fim é a separação por centrifugação diferencial. Durante este processo o extrato celular é submetido a uma força centrífuga de rotação muito grande para que os componentes celulares se depositem no fundo do tubo. Assim eles são separados por tamanho e densidade. Em geral os compostos maiores se movem mais rápido e são os primeiros a se depositarem no fundo do tubo. Portanto, as velocidades mais baixas de centrifugação conseguem sedimentar componentes grandes, como os núcleos, velocidades pouco maiores sedimentam mitocôndrias, e velocidades altas e maior tempo de centrifugação são capazes de sedimentar primeiro vesículas e depois ribossomos. Neste tipo de centrifugação, portanto, as organelas são separadas apenas se alterando a velocidade de rotação da centrífuga. As frações resultantes deste processo são impuras, o que pode ser resolvido com lavagens (ressuspender o sedimento em um tampão) e repetições da centrifugação. (CARVALHO, 2018). Uma forma de separar as organelas celulares presentes em um extrato de maneira mais precisa é centrifugá-las em um meio com gradiente de densidade. Normalmente é utilizado um gradiente de sacarose. Dentro de um tubo são adicionadas cuidadosamente camadas de soluções de sacarose com diferentes concentrações, começando, no fundo do tubo, pela mais densa. A quantidade de camadas e as densidades utilizadas variam de acordo com o que se quer separar. O extrato celular é então depositado sobre as camadas, e o tubo é centrifugado. Durante a centrifugação, organelas com diferente densidade de flutuação (resultado das proporções diferentes de lipídeos e proteínas presentes em cada uma) migram em direção ao fundo do tubo e param em camadas de sacarose diferentes, com densidade mais próxima da sua. Assim os componentes do extrato ficarão divididos em diferentes camadas dentro do tubo, que podem ser coletadas individualmente. As ultracentrífugas são capazes de chegar a velocidades extremamente altas de rotação, produzindo forças tão altas como 500.000 vezes a gravidade. Isso permite que esta técnica seja também utilizada para separar por tamanho macromoléculas como proteínas e ácidos nucleicos. A determinação dos coeficientes de sedimentação é utilizada em laboratório para ajudar na determinação do tamanho e composição de extratos de macromoléculas obtidos em células. Os estudos de organelas e outros componentes celulares isolados por centrifugação contribuiu muito para a 9 compreensão das funções dos diferentes componentes celulares e também de suas interações. A partir do isolamento de mitocôndrias e cloroplastos, foi descrita a função dessas organelas na conversão de energia em formas úteis para a célula. Mesmo as organelas que não ficam intactas após a separação, podem ser estudadas dessa forma. Por exemplo, as vesículas formadas a partir de fragmento do retículo endoplasmático liso e rugoso puderam ser separadas e analisadas como modelos funcionais desses compartimentos. Ainda, o isolamento de uma organela enriquecida com uma certa enzima é o primeiro passo para a purificação desta enzima. 2.3 Organelas celulares Apesar da grande diversidade e das enormes variações de complexidade entre os organismos vivos, muitas características são comuns a todos eles. Todos extraem energia do meio ambiente, a transformam, armazenam e a utilizam para a sua manutenção. A maior parte dessas reações acontece em uma unidade estrutural básica comum a todos: a célula. (CARVALHO, 2018). A célula é a menor unidade estrutural de um organismo. Ela tanto pode existir como uma unidade funcional independente em organismos unicelulares, quanto como subunidades de organismos multicelulares de diferentes complexidades. Existem dois tipos principais de células: as procarióticas (presente em bactérias) e as eucarióticas (presente em animais e plantas). A principal diferença entre elas é a presença de um núcleo isolando o material genético, e de organelas delimitadas por membranas nas células eucarióticas. Apesar das muitas variações, as células eucarióticas de diferentes organismos compartilham algumas características estruturais, e são responsáveis pelos quatro mecanismos básicos para manutenção da vida, que são: síntese de biomoléculas, tais como carboidratos, lipídios, proteínas e ácidos nucleicos; transporte de substâncias por meio de membranas; produção de energia; eliminação de metabólitos e substâncias tóxicas. Essas funções são realizadas por estruturas que ficam no interior das células e que são denominadas organelas. Todas as células eucarióticas são delimitadas por uma membrana plasmática. Ela é formada por uma dupla camada fluida de 10 fosfolipídios, proteínas e colesterol, e é responsável por controlar o transporte de substancias para o interior ou para o exterior da célula. Além disso, nela existem proteínas que atuam como receptores de sinais, que em resposta a ligantes externos, ativam ou inibem mecanismos celulares. A maioria das plantas superiores possui ainda, no lado de fora da membrana plasmática, uma parede celular composta por celulose e outros polímeros de carboidratos, que serve para conter o inchaço celular quando há acúmulo de água. A membrana plasmática delimita o citoplasma, que é o fluido onde estão as organelas celulares e onde ocorre a maioria das reações bioquímicas. (SANTOS, 2018). Fonte: Vladimir Ischuk / Shutterstock.com Existe dentro das células um sistema dinâmico de membranas responsáveis pela síntese e transporte de substâncias e biomoléculas. Fazem parte deste sistema o retículo endoplasmático, o complexo de Golgi, e envelope nuclear, e vesículaspequenas como os lisossomos e peroxissomos. O retículo endoplasmático (RE) é uma rede tridimensional de túbulos e vesículas interconectadas e conectadas ao envelope nuclear. Existem dois tipos de RE, o rugoso e o liso. O retículo endoplasmático rugoso recebe este nome por ter ribossomos aderidos às suas membranas. Ribossomos são as organelas responsáveis pela tradução do mRNA que sai do núcleo e síntese de proteínas. O retículo endoplasmático rugoso participa da síntese principalmente de proteínas que serão enviadas para o exterior da célula, e é especialmente desenvolvido em células com função secretora. Existem regiões na 11 célula em que o retículo está livre de ribossomos. Esse retículo endoplasmático liso, que é fisicamente contínuo ao rugoso, tem como função sintetizar lipídeos e participar de outros processos importantes, como o metabolismo de compostos tóxicos. O complexo de Golgi é outro sistema de cavidades membranosas presente em quase todas as células eucarióticas. Sua função é o processamento e distribuição de proteínas. As proteínas recém-sintetizadas saem do RE em membranas que se fundem ao lado cis do complexo de Golgi. Dentro do complexo, são modificadas pela adição de sulfato, carboidratos ou porções lipídicas, e são endereçadas aos locais onde atuarão, para onde são direcionadas em vesículas que saem do lado trans do complexo. (SANTOS, 2018). Os lisossomos são vesículas esféricas formadas por membrana, e são encontrados somente em células animais. Eles têm um lúmen ácido que contém enzimas capazes de digerir lipídeos, polissacarídeos, proteínas e ácidos nucleicos. São, portanto, responsáveis pela reciclagem de moléculas complexas dentro da célula. Esses materiais entram no lisossomo e são degradados até suas moléculas mais simples (monossacarídeos, aminoácidos, etc.), que são então liberadas para serem utilizadas em novos componentes celulares ou catabolizadas. Células de plantas não possuem lisossomos, e as organelas com função de digerir moléculas complexas são os vacúolos. Eles ocupam grande parte da célula adulta, e além da função digestiva, são responsáveis também por armazenar substâncias e fornecer suporte físico para as células. Uma outra organela que tem forma de vesícula circundada por membrana é o peroxissomo. Ele possui enzimas oxidativas relacionadas à degradação de peróxido de hidrogênio e radicais livres resultantes da degradação de aminoácidos e gorduras, e que podem ser tóxicos para a célula. O núcleo de uma célula eucariótica é extremamente complexo tanto na sua estrutura quanto na função. Ele é envolto em um envelope nuclear formado por duas camadas de membrana, e se comunica com o citoplasma por meio dos poros nucleares. No interior do núcleo existe o nucléolo, uma região densa que possui muitas cópias de DNA que codificam RNA ribossômico. O núcleo tem duas funções de extrema importância dentro da célula: armazenar a informação genética contida no DNA e regular o metabolismo celular. Dentro dele acontece a replicação do DNA e controle da expressão gênica. 12 Mitocôndrias são organelas celulares presentes geralmente em grande número em células eucarióticas. Elas também são envoltas por duas membranas, a externa lisa e a interna formando invaginações chamadas de cristas. Em seu interior, na matriz, há enzimas e intermediários químicos envolvidos no metabolismo energético. Elas catalisam a oxidação dos nutrientes orgânicos e geram ATP, a principal molécula transportadora de energia das células. Ou seja, são elas que geram a energia utilizada para o funcionamento celular. Uma particularidade das mitocôndrias é o fato de elas armazenarem seu próprio DNA, RNA e ribossomos, que codificam proteínas estruturais da organela. Além disso, elas têm a capacidade de se dividir para formar novas mitocôndrias. As células fotossintetizantes de plantas e algas possuem organelas denominadas cloroplastos. Eles têm função parecida com a das mitocôndrias, com a diferença de que utilizam energia solar em vez de utilizarem energia química proveniente de oxidação. É nelas que a acontece a fotossíntese, processo que utiliza energia solar para produção de ATP. Assim como as mitocôndrias, os cloroplastos possuem seu próprio DNA, RNA e ribossomos, e se dividem para formar novas organelas. As células que possuem cloroplastos possuem também mitocôndrias. Os cloroplastos produzem ATP somente na presença de luz. As mitocôndrias agem independentes da luz, oxidando os carboidratos produzidos após a fotossíntese. O citoesqueleto é formado por uma rede complexa de proteínas e é responsável pela estrutura e organização do citoplasma e pela forma da célula. Os três tipos gerais de filamentos que compõem o citoesqueleto são os filamentos de actina, os microtúbulos e os filamentos intermediários. Filamentos de actina e microtúbulos também estão envolvidos na movimentação das organelas e de toda a célula. (SANTOS, 2018). 13 2.4 As biomoléculas e a hierarquia na organização molecular das células Apesar de existir enorme variabilidade entre os organismos vivos, todos compartilham a mesma composição química básica. Todas as moléculas orgânicas de uma célula têm em sua composição átomos de carbono. O carbono é capaz de estabelecer ligações com átomos de hidrogênio, oxigênio e nitrogênio, e compartilha pares de elétrons com até quatro outros carbonos para formar ligações que são muito estáveis. Átomos de carbono ligados covalentemente podem formar cadeias lineares, ramificadas ou cíclicas, que podem ter ainda ligadas a elas outros grupos de átomos, os grupos funcionais. Dessa forma, o carbono é o principal componente de uma infinidade de compostos. As moléculas que contêm esqueletos carbônicos são chamadas compostos orgânicos, e estão presentes na maioria das biomoléculas que formam os seres vivos. Todas as moléculas orgânicas são sintetizadas a partir dos mesmos compostos químicos simples. Como consequência, os componentes de uma célula são facilmente relacionados, e podem ser classificados em um pequeno número de grupos diferentes. Existem quatro tipos principais de biomoléculas que formam as células: carboidratos, lipídeos, proteínas e ácidos nucleicos. Existem ainda outros compostos que não entram nessas categorias, entretanto, estes quatro grupos de moléculas orgânicas, junto com as macromoléculas formadas por suas ligações, são os responsáveis pela maior parte da massa celular. (CARVALHO, 2018). Fonte: https://www.lifeder.com/biomoleculas/ 2.5 Hierarquia na organização molecular das células Os monômeros, moléculas de organização mais simples das células, são os mesmos em todos os organismos vivos e se combinam para formar estruturas cada 14 vez maiores e mais complexas. Por exemplo, estruturas simples como nucleotídeos se ligam a outros para formar um ácido nucleico, DNA. Este, por sua vez, se condensa e se liga a diversas proteínas para formar os cromossomos. Os cromossomos e diversas outras estruturas estão juntas e interagindo dentro do núcleo celular. (CARVALHO, 2018). Ainda, por mais que os monômeros sejam estruturas simples e sejam necessários em quantidades enormes para formar o próximo nível hierárquico de compostos da célula, alterações em sua estrutura podem ter consequências significativas para a célula e, portanto, para o indivíduo formado por elas. Por exemplo, uma alteração em uma base nitrogenada de um ácido nucleico pode causar alterações no código genético de uma proteína importante, que será traduzida de maneira errada e não funcionará adequadamente, causando doenças. (CARVALHO, 2018). A Figura abaixo ilustra como funciona a hierarquia das biomoléculas dentro de uma célula animal. Hierarquia estrutural na organização molecular das células. Fonte: adaptada de Nelson e Cox (2014 3 ÁGUA, pH E TAMPÕES A águaé o principal constituinte dos organismos vivos e tem diversas funções importantes para a manutenção da vida. Ela está envolvida em praticamente todas as reações químicas da célula e tem ainda a capacidade de influenciar as interações 15 entre as moléculas hidrofóbicas. A dissociação da água serve como base para entendermos os conceitos relacionados ao pH e à sua manutenção por soluções tampão. 3.1 Propriedades da água A água é a substância mais abundante nos organismos vivos, compondo aproximadamente 70% da massa da maioria deles. Todos os aspectos de estrutura e função das células estão adaptados às propriedades físicas e químicas da água. À temperatura e pressão ambiente, ela é um líquido que não apresenta sabor, cheiro e cor. Em temperaturas abaixo de 0 ºC ela solidifi ca, e acima de 100 ºC ela passa para o estado gasoso. A molécula de água é formada por dois átomos de hidrogênio e um de oxigênio. As propriedades especiais que a água apresenta existem devido à maneira como estes átomos se ligam uns aos outros para formar uma molécula, e à maneira como estas moléculas interagem. Os átomos de hidrogênio e de oxigênio estão ligados formando uma estrutura parecida com a de um tetraedro (ângulo de 104,5° entre os dois hidrogênios). O átomo de oxigênio forma uma ligação covalente com cada um dos átomos de hidrogênio, compartilhando com cada um deles um par de elétrons. Há ainda nessa estrutura um par de elétrons que não é compartilhado e que fica próximo ao oxigênio. O resultado dessa distribuição desigual de elétrons é que o átomo de oxigênio possui uma carga negativa parcial, e cada átomo de hidrogênio, uma carga positiva parcial. A água é, portanto, uma molécula polar. As atrações eletrostáticas entre as cargas negativas do átomo de oxigênio de uma molécula com as cargas positivas dos átomos de hidrogênio de outra molécula de água formam interações entre as moléculas, denominadas ligações de hidrogênio. Esse tipo de interação acontece quando um hidrogênio com carga parcial positiva é atraído por um átomo eletronegativo (p. ex., F, O, N). (NELSON; COX, 2014). A natureza polar das moléculas de água e a forma como interagem com outras moléculas de água por ligações de hidrogênio são responsáveis pelas características incomuns da água. Apesar de as ligações de hidrogênio formarem interações relativamente fracas quando comparadas às ligações covalentes, elas ocorrem em grande quantidade na água. Essas ligações de hidrogênio formadas entre as 16 moléculas de água são constantemente rompidas, com novas interações sendo formadas entre outras moléculas. Entretanto, em uma amostra de água na forma líquida, a maioria das moléculas estará sempre interagindo com outras por estas ligações. Isso é o que dá à água a propriedade de coesão, quando as ligações de hidrogênio mantêm as moléculas muito próximas umas das outras. Devido à sua polaridade, a água também tem como propriedade a adesão, que é a capacidade de formar ligações de hidrogênio com outras moléculas polares e não interagir com moléculas apolares. Por exemplo, sobre uma superfície encerada, a água não se distribui igualmente e forma gotículas separadas, pois a cera é apolar. As temperaturas de fusão e ebulição relativamente altas da água também são consequências dessas interações entre moléculas. Elas são resultantes da grande quantidade de energia térmica necessária para romper as ligações de hidrogênio. Além disso, a água possui um alto calor específico, que é a quantidade de calor necessária por unidade de massa para elevar sua temperatura em 1º C. A energia necessária para aumentar a temperatura da água em 1 ºC é de 4,2 joules por grama (ou 1,0 cal/g. °C). A água também apresenta calor de vaporização elevado, o que significa que ela suporta grande quantidade de calor sem que sua temperatura se eleve muito rapidamente. Essas características são importantes para os ecossistemas que vivem na água. Se a água congelasse ou entrasse em ebulição muito rápido, as mudanças no meio ambiente seriam drásticas e, em oceanos ou lagos, todos os organismos que ali habitam morreriam. É também por causa do calor de vaporização elevado que o suor é capaz de resfriar nossos corpos. (NELSON; COX, 2014). Fonte: https://www.stoodi.com.br/ 17 A alta tensão superficial também é uma propriedade da água que é consequência da sua polaridade e das ligações de hidrogênio. As moléculas de água na superfície de um líquido interagem com outras, e essas interações são tão fortes que conseguem suportar até objetos leves sem se desfazer. Alguns insetos conseguem caminhar sobre a água devido a essa tensão superficial. É isso que também faz pequenas quantidades de água permanecerem em gotas sobre uma superfície, em vez de se espalharem em finas camadas. Essas mesmas características dão à água outra de suas propriedades, a capilaridade. Ela permite que a água se mova dentro de raízes e galhos de plantas, e dentro de capilares muito finos. Isso acontece porque quando uma molécula de água se move para dentro das raízes, galhos ou capilares, ela “puxa” as outras que estão ligadas em sequência. Outra característica muito importante da água é a dissolução, a capacidade de dissolver outros compostos polares ou iônicos para formar soluções aquosas. As ligações de hidrogênio não se formam somente entre moléculas de água, mas também com outras moléculas. Os íons negativos de uma substância em solução aquosa atraem as extremidades positivas das moléculas de água vizinhas, assim como os íons positivos atraem as extremidades negativas. Essas interações fazem com que os íons fiquem circundados por moléculas de água ligadas a eles, formando uma solução muito estável. Assim, as forças existentes entre os cátions e ânions do soluto (e que os mantêm associados em redes cristalinas) são substituídas pelas ligações de hidrogênio com a água, ocasionando a dissolução. (CARVALHO, 2018). O comportamento da água ao trocar de estado físico também é incomum. Em geral as substâncias, incluindo a água, tornam-se menos densas quando são aquecidas e mais densas quando são resfriadas. Então, se a água é resfriada, torna- se mais densa e forma gelo. Entretanto, a água é uma das poucas substâncias cujo estado sólido pode flutuar no seu estado líquido. Isso acontece porque ela se torna cada vez mais densa até chegar a 4 °C; depois de atingir 4 °C, torna-se menos densa. Ao congelar, suas moléculas começam a se mover mais devagar, facilitando a formação de ligações de hidrogênio e, eventualmente, se organizam em uma estrutura hexagonal cristalina aberta. Devido a esta estrutura aberta, à medida que as moléculas de água estão sendo separadas, seu volume aumenta cerca de 9%. Portanto, a água é mais densa em estado líquido do que em estado sólido. Em estado gasoso as ligações de hidrogênio são rompidas e a densidade diminui. 18 Representações da molécula de água. A água é representada em modelo de esfera e bastão: os átomos são representados por esferas ligadas por bastões, que representam as ligações covalentes entre os átomos. As linhas tracejadas representam os orbitais não ligantes. A: existe um arranjo quase tetraédrico dos pares de elétrons mais externos da camada ao redor do átomo de oxigênio; os dois átomos de hidrogênio têm cargas parciais positivas localizadas, e o átomo de oxigênio tem carga parcial negativa. B: duas moléculas de H2 O unidas por ligação de hidrogênio (indicada por três linhas) entre o átomo de oxigênio de uma molécula e um átomo de hidrogênio da outra. Fonte: Nelson e Cox (2014). 3.2 A relação do pH com a acidez e a alcalinidade Para entender como se determina o pH de uma substância e qual a sua relação com acidez ou alcalinidade, precisamos primeiro entender alguns cálculos que são utilizados para determinar características de reações químicas.Passado algum tempo do início de uma reação química, ela normalmente chega a um equilíbrio, em que reagentes e produtos são formados na mesma velocidade e se encontram na mesma proporção. (CARVALHO, 2018). A posição de equilíbrio de qualquer reação química é determinada pela sua constante de equilíbrio (Keq). Para a reação genérica A + B ⇋ C + D, a Keq é definida pelas concentrações dos reagentes (A e B) e produtos (C e D) presentes no equilíbrio, conforme a equação: A Keq define a composição de uma mistura em equilíbrio, independente das quantidades iniciais de reagentes e produtos. Ela é fixa e específica para cada reação 19 química a uma determinada temperatura. A reação de ionização da água (H₂O) é representada por H₂O ⇋ H+ + OH− . As moléculas de água se ionizam reversivelmente produzindo um íon hidrogênio (próton H+) e um íon hidroxila (OH−). Portanto, a Keq para a ionização reversível da água é: Em água pura a 25 ºC e 1 atm, a concentração da água é 55,5M, e é constante em relação à concentração de íons H+ e OH-, que é extremamente baixa (aproximadamente 1x10¯⁷M). Assim, essa concentração pode ser substituída na equação: Rearranjada, a equação passa a ser: Kw designa o produto iônico da água a 25 °C. O valor de Keq é conhecido e determinado por medidas de condutividade elétrica da água pura, e é 1,8x10¯¹⁶. Assim, ele pode ser substituído na equação: Dessa forma, o produto [H+][OH-] em soluções aquosas a 25 ºC é sempre igual a 1x10¯¹⁴M². A temperatura precisa ser especificada porque é capaz de alterar a quantidade de íons no meio. Se ela for aumentada, por exemplo, a energia das partículas também aumentará, o que resultará em uma maior quantidade de íons sendo formados. (CARVALHO, 2018). Quando as concentrações de H+ e OH- são iguais, como na água pura, o pH da solução é considerado neutro. Portanto, em pH neutro, as concentrações de H+ e OH- são iguais entre si e são iguais a 1x10¯⁷M, conforme a equação: 20 O produto iônico da água Kw é a base utilizada para determinarmos a escala de pH. Por meio dela podemos identificar a concentração de H+ e, consequentemente, de OH- , em qualquer solução aquosa que tenha no mínimo 1,0M de H+ ou OH- . Devido à dificuldade de trabalharmos com números muito pequenos, tanto para expressarmos concentrações molares como constantes de equilíbrio, os cálculos são feitos em escala logarítmica, em que p(x) = − log x. (CARVALHO, 2018). Portanto, o pH de uma solução é definido pela expressão: pH = − log H+ Para uma solução aquosa neutra a 25 ºC, a concentração de H+ é de 1x10-⁷M, e o pH pode ser definido por: Portanto, soluções neutras, que possuem as mesmas concentrações de H+ e OH- , têm pH = 7. As soluções com pH maior que 7 têm maior concentração de OH- em relação a H+ , e são classificadas como alcalinas ou básicas. Já as soluções que têm concentração de H+ maior que a de OH- são soluções ácidas, e têm pH menor que 7. 21 É importante ressaltar que a escala de pH é logarítmica, e não aritmética. Portanto, quando duas soluções diferem em uma unidade na escala de pH, significa que uma delas tem concentração de H+ 10 vezes maior que a outra. Por exemplo, o suco de limão, que tem pH aproximadamente igual a 2, tem concentração de H+ mil vezes maior que o café preto, que tem pH de aproximadamente 5. (CARVALHO, 2018). Determinar o pH de soluções é um dos procedimentos mais importantes em bioquímica. A maioria das reações biológicas depende de um pH ótimo para acontecer e é extremamente afetada quando este está alterado. Alterações de pH alteram a estrutura e função de macromoléculas. Por exemplo, a atividade catalítica de enzimas é fortemente dependente de pH. Os fluidos biológicos, como sangue e urina, também têm pH ideal, e sua medida é uma prática rotineira em laboratórios de análises clínicas. O pH ideal do sangue é 7,4, e sua medida é importante para diagnosticar patologias. Quando está menor que esse valor, caracteriza uma acidose, condição que é comum em pessoas com diabetes. Quando está aumentado, indica uma condição clínica conhecida por alcalose. . Relação entre as concentrações de H3 O e OH- na escala de pH. Fonte: Robin Atzeni/Shutterstock.com. 3.3 O que fazem os tampões e como eles atuam A maioria dos processos biológicos é muito sensível a variações no pH. As células e organismos precisam manter um pH constante e específico, de 22 aproximadamente 7,0, para manter íntegras as biomoléculas que as compõem. Os responsáveis por essa regulação do pH nos organismos vivos são os tampões biológicos. Tampões também são utilizados em laboratório para manter o pH de soluções que serão utilizadas para análises ou experimentos com material biológico e para estudar reações químicas. (NELSON; COX, 2014). Tampões são soluções aquosas que consistem geralmente em uma mistura de um ácido fraco (doador de prótons H+ ) e sua base conjugada (aceptor de prótons), ou de uma base fraca e seu ácido conjugado. Eles são capazes de resistir a alterações em seu pH quando quantidades pequenas de ácidos ou bases fortes são adicionadas a eles. São os responsáveis por manter o pH constante em uma grande variedade de reações químicas. Isso acontece devido à manutenção de um equilíbrio entre seus dois componentes principais (ácido e base). Os ácidos têm tendência a doar prótons em solução aquosa e formar sua base conjugada, conforme a reação HA ⇋ H+ + A− . Para esta reação, a constante de equilíbrio (Keq) é: Em reações de ionização, as constantes de equilíbrio são também chamadas de constantes de dissociação (Ka). Ácidos mais fortes têm maior tendência a doar prótons ([H+ ] e [A− ] aumentam, [HA] diminui) e, portanto, têm Ka maiores que ácidos fracos. Devido à dificuldade de se trabalhar com números muito pequenos, os valores dos cálculos de Ka são feitos em escala logarítmica, em que p(x) = − log x. Neste caso, pKa é análogo ao pH e é definido pela equação pKa = − log Ka . Portanto, quanto mais forte for um ácido, maior a tendência de doar um próton, e menor o seu pKa. Os ácidos que funcionam como tampão são ácidos fracos, que têm menor tendência a doar prótons. O tamponamento é o resultado de uma reação química reversível que tem quantidades quase iguais de um doador e de seu aceptor de prótons conjugado. Quando H+ ou OH- é adicionado a uma solução tampão, o equilíbrio da reação é desviado para o lado oposto. Ocorre uma variação pequena das concentrações relativas do ácido fraco e de seu ânion e, assim, uma variação também pequena no pH da solução. Dessa forma, o que varia é apenas a relação entre os componentes da solução, e não a soma da sua concentração. (NELSON; COX, 2014). 23 Esse efeito pode ser exemplificado pelo tampão acetato. Ele é composto de ácido acético (H₃ CCOOH) e acetato de sódio (H₃ CCOONa). O acetato de sódio é um sal e, portanto, se dissocia totalmente em água, gerando íons sódio e íons acetato, que é a base conjugada do ácido acético. A reação de dissociação do sal em solução aquosa é a seguinte: A reação de ionização do ácido em solução aquosa é a seguinte: Quando adicionamos a essa solução uma pequena quantidade de um ácido forte, a concentração de H+ aumenta. Como o ânion acetato tem grande afinidade por H+, a reação é desviada no sentido de formação do ácido acético, e o pH do meio praticamente não sofre alteração. Entretanto, se o ácido forte continuar sendo adicionado, chegará o momento em que todo o acetato será consumido e o efeito tampão cessará. Quando uma base forte é adicionada a essa solução, a concentração de íons OH- aumenta. Esses íons são então neutralizados pelos íons H₃O+ liberados na ionização do ácido acético. Com a diminuição dos íons H₃O+ , há o deslocamento da reação no sentido de ionizaçãodo ácido acético, o que causará uma variação de pH muito pequena. Nesse caso também há um limite para adição de base sem alteração significativa do pH. Se mais base for adicionada, a reação será cada vez mais deslocada no sentido de sua ionização, até que todo o ácido seja consumido. (VOET E VOET, 2013). Cada par ácido-base tem uma zona específica e característica de pH na qual ele consegue atuar como tampão. A Figura abaixo representa as curvas de distribuição do ácido acético e do íon acetato. No ponto de encontro das duas curvas, a solução tem concentrações iguais de ácido acético e íon acetato. Seu pH médio é 4,75, e a curva de titulação dessa reação se estende de maneira relativamente pouco inclinada por uma unidade em ambos os lados de seu pH médio. (VOET E VOET, 2013). 24 Essa zona é a região de tamponamento da solução ácido acético-acetato. Se forem adicionadas nessa região pequenas quantidades de H+ ou OH- , o pH da solução será pouco alterado. Em outras palavras, no ponto de encontro das duas curvas, local em que a concentração do doador de prótons se iguala à do aceptor, a capacidade tamponante do sistema é máxima e o pH é igual ao pKa. Se a mesma quantidade de H+ ou OH- fosse adicionada à água pura ou a uma solução não tamponante, a variação de pH seria muito mais significativa. (VOET E VOET, 2013). Curvas de distribuição do ácido acético e do íon acetato. A fração das substâncias presentes na solução é dada pela razão das concentrações de CH3 COOH ou CH3 COO- em relação à concentração total desses dois compostos. A faixa de tamponamento efetivo está indicada pela região sombreada. Fonte: Voet e Voet (2013). 4 VISÃO GERAL DO METABOLISMO O metabolismo compreende uma série de reações químicas que permitem obter, armazenar e utilizar energia para as funções celulares. Essas reações resumem-se, basicamente, ao processamento de biomoléculas, que são degradadas e reconstruídas em diversas reações para que se obtenha um produto final. Nesta seção, você vai aprender a identificar as biomoléculas envolvidas nas rotas metabólicas, a diferenciar e entender as relações energéticas entre as vias 25 metabólicas catabólicas e anabólicas e a reconhecer estas vias por meio do estudo do metabolismo de carboidratos, lipídeos e proteínas. 4.1 Biomoléculas que participam das vias metabólicas Metabolismo é o termo empregado para descrever a interconversão dos compostos químicos presentes no organismo, as vias percorridas pelas moléculas individualmente, suas inter-relações e os mecanismos que regulam o fluxo de metabólitos através dessas vias. Um ser humano adulto de 70 kg necessita de cerca de 8 a 12 MJ (1.920-2.900 kcal) de combustíveis metabólicos por dia, dependendo da atividade física. Essas necessidades energéticas são encontradas em carboidratos (40-60%), lipídeos (principalmente triacilglicerol, 30-40%) e proteínas (10-15%), bem como no álcool. A natureza da alimentação estabelece o padrão básico de metabolismo. Existe uma necessidade de processar os produtos da digestão dos carboidratos, dos lipídeos e das proteínas da alimentação. Esses produtos da digestão consistem principalmente em glicose, ácidos graxos e glicerol e aminoácidos, respectivamente. Todos os produtos da digestão são metabolizados a um produto comum, a acetil-CoA, que é, então, oxidada pelo ciclo do ácido cítrico. Ao mesmo tempo, novas biomoléculas estão sendo formadas em um processo cíclico que coordena todas as atividades do organismo. (CARVALHO, 2018). As unidades monoméricas que formam as biomoléculas das células são moléculas pequenas de cerca de 30 átomos de carbono. Elas geralmente são encontradas livres em solução e têm vários destinos. Muitas dessas moléculas pequenas têm mais de um papel na célula; além de servirem como subunidade de alguma macromolécula, podem também servir como fonte de energia. Todas as moléculas são sintetizadas a partir de um mesmo grupo de compostos simples e são degradadas até ele. Tanto a síntese como a degradação ocorrem por meio de sequências de modificações químicas limitadas que seguem regras bem definidas. Como consequência, os compostos presentes nas células são relacionados entre si e podem ser classificados dentro de um pequeno grupo de famílias distintas. As células contêm quatro famílias principais de moléculas orgânicas pequenas que formam as quatro classes de biomoléculas: os açúcares que formam os carboidratos, os ácidos graxos que formam grande parte dos lipídeos, 26 os aminoácidos que formam as proteínas e os nucleotídeos que formam os ácidos nucleicos. Embora muitos dos compostos presentes nas células não se enquadrem nessas categorias, as quatro famílias de moléculas orgânicas pequenas, juntamente com as biomoléculas formadas por suas ligações em longas cadeias, correspondem a uma grande proporção da massa celular. O que determina a que classe as biomoléculas pertencem são os grupos de outros átomos ligados aos esqueletos de carbono que as compõem, os chamados grupos funcionais. Além dos grupos funcionais, a conformação tridimensional das biomoléculas também é determinante para sua função. (ALBERTS, 2011). Os açúcares mais simples, os monossacarídeos, são compostos que têm a fórmula geral (CH₂ O)n, onde n geralmente é um número entre 3 e 8. Essa fórmula, entretanto, não define completamente a molécula: o mesmo conjunto de carbonos, de hidrogênios e de oxigênios pode ser mantido em uma mesma molécula por meio de ligações covalentes diversas, criando estruturas com formas diferentes. Os açúcares e as biomoléculas formadas a partir deles são denominados carboidratos. Eles existem na forma de cadeia carbônica aberta ou cíclica, e podem estar ligados a grupos hidroxila, ou a um aldeído ou cetona. Os monossacarídeos podem se ligar uns aos outros por ligações glicosídicas, criando estruturas maiores. Essa ligação é formada entre um grupo -OH de um açúcar e um grupo -OH de outro açúcar por uma reação de condensação, que libera uma molécula de água. Os dissacarídeos contêm duas unidades de monossacarídeos; os oligossacarídeos são formados por três a 10 unidades; e os polissacarídeos contêm mais de 10, podendo alcançar centenas de unidades de açúcares em sua estrutura. Dissacarídeos importantes incluem a lactose (galactose + glicose), a sacarose (glicose + frutose) e a maltose (glicose + glicose). Polissacarídeos importantes incluem o glicogênio (proveniente de fontes animais), o amido (fontes vegetais) e a celulose (fonte vegetal); cada um deles é um polímero de glicose. Os carboidratos possuem grande variedade de funções, por exemplo, compor a membrana plasmática para mediar formas de sinalização celular, e são componentes estruturais de células. Entretanto sua principal função é energética. Eles são os principais produtores de energia sob a forma de ATP, e suas ligações são quebradas sempre que as células precisam de energia para reações químicas. Eles também conseguem reservar energia na forma de carboidratos complexos. Nos 27 vegetais, a energia é reservada no amido, um polímero de glicose, e nos animais, em glicogênio, também polímero de glicose com uma estrutura mais compacta e ramificada. Os aminoácidos formam uma classe de moléculas que apresentam uma propriedade comum: possuem um grupo ácido carboxílico e um grupo amino, ambos ligados a um á tomo de carbono denominado carbono α. As cadeias laterais que são ligadas a este carbono determinam a variabilidade química dos aminoácidos. Os aminoácidos se ligam para formar as proteínas, que são cadeias de aminoácidos, ligados cabeça com cauda, enoveladas em uma estrutura tridimensional única para cada proteína. As cadeias de aminoácidos são denominadas polipeptídeos. A ligação covalente entre dois aminoácidos adjacentes em uma cadeia proteica forma um amido e constitui a chamadaligação peptídica. Independentemente de quais sejam os aminoácidos que os formem, os polipeptídios possuem um grupo amino (NH₂) em uma de suas extremidades e um grupo carboxila (COOH) na outra extremidade. Existem 20 tipos de aminoácidos nas proteínas, cada um deles com uma cadeia diferente ligada ao á tomo de carbono α. Todos os organismos possuem proteínas compostas pelos mesmos 20 aminoácidos. As propriedades coletivas das suas cadeias laterais são a base da diversidade de funções das proteínas. (ALBERTS, 2011). As proteínas desempenham inúmeras e importantes funções: participam da estrutura celular (citoesqueleto), regulam a atividade de órgãos (hormônios), participam do processo de defesa do organismo (anticorpos), catalisam reações químicas (enzimas), atuam no transporte de gases (hemoglobina) e são responsáveis pela contração muscular. Proteínas com importância especial nas vias metabólicas são as enzimas. Elas catalisam todas as reações químicas do organismo aumentando a velocidade das reações. Dessa forma, as enzimas comandam todos os eventos metabólicos. Uma molécula de ácido graxo tem duas regiões quimicamente distintas. Uma é formada por uma longa cadeia hidrocarbonada, que é hidrofóbica e não tem muita reatividade química. A outra região é um grupo carboxila (-COOH), que se comporta como um ácido (ácido carboxílico). Esse ácido se ioniza em solução, é hidrofílico e reativo quimicamente. Quase todas as moléculas de ácidos graxos de uma célula estão ligadas covalentemente a outras moléculas por meio de seu grupo ácido 28 carboxílico. Os variados ácidos graxos encontrados nas células diferem entre si somente quanto ao comprimento das suas cadeias hidrocarbonadas e quanto ao número e as posições das ligações duplas carbono-carbono. Os ácidos graxos são armazenados no citoplasma de muitas células na forma de gotículas de moléculas de triacilglicerol, que consiste em três cadeias de ácidos graxos ligadas a uma molécula de glicerol. Quando mobilizadas para fornecer energia, as cadeias de ácidos graxos são liberadas dos triacilgliceróis e degradadas em unidades de dois carbonos. Essas unidades de dois carbonos são idênticas àquelas derivadas da degradação da glicose e entram na mesma via de reações produtoras de energia. Nas células, os triglicerídeos funcionam como uma reserva concentrada de alimento, pois sua degradação produz cerca de seis vezes mais energia utilizável do que a degradação da glicose. Os ácidos graxos e os seus derivados, como os triacilgliceróis, são exemplos de lipídeos. Os lipídeos constituem um grupo heterogêneo de moléculas orgânicas que têm como característica comum a insolubilidade em água (são hidrofóbicos), e a solubilidade em solventes apolares. Caracteristicamente, eles possuem uma longa cadeia hidrocarbonada, como nos ácidos graxos e nos isoprenos, ou então múltiplos anéis aromáticos, como nos esteróis. Os lipídeos têm importante função energética nos organismos. Além disso, fornecem a barreira hidrofóbica que permite a separação dos conteúdos aquosos nas células e podem atuar como vitaminas e hormônios esteroides. (RODWELL, 2017). Já o nucleotídeo é uma molécula formada por um anel que contém um nitrogênio ligado a um açúcar de cinco carbonos (pentose) que, por sua vez, carrega um ou mais grupos fosfato. A pentose pode ser uma ribose (ribonucleotídeos) ou desoxirribose (desoxinucleotídeos). Os anéis contendo nitrogênio são denominados bases. As diferentes bases guardam uma grande semelhança entre si. A citosina (C), a timina (T) e a uracila (U) são chamadas de pirimidinas porque são derivadas do anel das pirimidinas, que tem seis átomos. A guanina (G) e a adenina (A) são compostos das purinas e, portanto, possuem um segundo anel, de cinco membros, ligado ao anel de seis á tomos. A denominação de cada um dos nucleotídeos fundamenta-se na base que eles contêm. Os nucleotídeos podem atuar como carreadores de energia de curto prazo. Mais que qualquer outro carreador de energia, o nucleotídeo trifosfato de adenosina, 29 ou ATP (adenosine triphosphate), é usado para transferir energia em diversas reações químicas. O ATP é formado por reações impelidas pela energia que é liberada na degradação oxidativa dos alimentos. Seus três fosfatos estão ligados em série por meio de duas ligações anidrido fosfórico, que, ao serem rompidas, liberam grandes quantidades de energia útil. O grupo fosfato terminal geralmente é liberado por hidrólise, com frequência transferindo o fosfato para outra molécula e liberando energia para as reações biossintéticas que necessitam de energia. Um papel extremamente importante dos nucleotídeos é o armazenamento e a disponibilização da informação genética. Eles servem como módulos para a construção dos ácidos nucleicos, que são polímeros longos nos quais as subunidades nucleotídicas ficam ligadas covalentemente por meio da formação de uma ligação fosfodiéster entre o grupo fosfato ligado ao açúcar de um nucleotídeo e o grupo hidroxila do açúcar do nucleotídeo seguinte. Existem dois tipos principais de ácidos nucleicos, os quais diferem quanto ao tipo de açúcar fosfato em suas respectivas estruturas. Os nucleotídeos com base no açúcar ribose são os ácidos ribonucleicos, ou RNA. Aqueles que têm como base a desoxirribose são os ácidos desoxirribonucleicos, ou DNA. A sequência linear dos nucleotídeos no DNA e no RNA codifica a informação genética das células. (RODWELL, 2017). Três famílias de biomoléculas. Cada uma delas é um polímero formado por moléculas pequenas (monômeros) ligadas entre si por ligações covalentes. Os lipídeos são a única classe de biomoléculas que não tem uma subunidade comum para todos os seus compostos. Fonte: Alberts et al. (2011, p. 63). 30 4.2 Relação energética entre as vias catabólicas e anabólicas Os organismos vivos gastam energia o tempo todo para desempenhar suas funções. As células estão continuamente se reciclando, degradando macromoléculas e sintetizando outras. Essa dinâmica que ocorre dentro de cada célula constitui o metabolismo. Ele ocorre por meio de uma série de reações catalisadas por enzimas que constituem as vias metabólicas. Cada etapa consecutiva de uma via metabólica produz pequenas alterações, que pode ser a remoção, transferência ou adição de um átomo ou grupo funcional ao substrato. Em uma via metabólica existe um precursor, que é convertido em um produto por meio de uma série de intermediários metabólicos chamados metabólitos. (RODWELL, 2017). O metabolismo exige um grande nível de coordenação das atividades celulares, e tem como funções centrais: 1. obter energia para a célula; 2. converter nutrientes em macromoléculas; 3. construir estruturas celulares a partir de macromoléculas; e 4. degradar macromoléculas. Essas funções podem ser separadas em dois tipos de vias metabólicas: catabólicas e anabólicas. As vias catabólicas (degradação) capturam a energia química obtida da degradação de moléculas ricas em energia, formando trifosfato de adenosina (ATP – molécula que armazena energia). São as vias catabólicas também que convertem moléculas da dieta (ou moléculas nutrientes armazenadas nas células) em compostos menores que são necessários para a síntese de novas moléculas complexas. As vias catabólicas liberam energia, e parte dessa energia é conservada na forma de ATP e de transportadores de elétrons reduzidos (NADH, NADPH e FADH2); o restante é perdido como calor. A geração de energia pela degradação de moléculas complexas, denominada catabolismo, ocorre em três estágios: 1. Hidrólise: primeiramente, moléculas complexas são degradadas até suas unidades monoméricas. Por exemplo, proteínas são degradadas em aminoácidos, polissacarídeos em monossacarídeos e triacilgliceróis em ácidos graxos livres e glicerol. 2. Conversão das unidades monoméricas em intermediáriossimples: no segundo estágio, as unidades monoméricas são degradadas em acetil-coenzima A (CoA) e em uma pequena variedade de moléculas simples. Parte da energia é conservada como ATP, porém essa quantidade é pequena se comparada com a energia produzida durante o terceiro estágio do catabolismo. 31 3. Oxidação da acetil-CoA: o ciclo do ácido cítrico, ou ciclo dos ácidos tricarboxílicos, é a via final comum da oxidação de moléculas combustíveis, que produzem acetil-CoA. A oxidação de acetil-CoA gera grandes quantidades de ATP via fosforilação oxidativa, à medida que os elétrons fluem do NADH e do FADH2 para o oxigênio. As vias anabólicas (biossíntese) ocorrem no sentido oposto às catabólicas, já que utilizam precursores pequenos e simples, como aminoácidos e nucleotídeos, para formar moléculas maiores e mais complexas, como as proteínas e os ácidos nucleicos. As reações anabólicas são endergônicas, isto é, necessitam de fornecimento de energia (NADH, NADPH e FADH₂) produzida pela quebra de ATP, resultando em difosfato de adenosina (ADP) e fosfato inorgânico (Pi). Com frequência, as reações anabólicas envolvem reduções químicas em que o poder redutor é, geralmente, fornecido pelo doador de elétrons NADPH. Algumas vias metabólicas são lineares e outras são ramificadas, gerando múltiplos produtos finais úteis a partir de um único precursor, ou convertendo vários precursores em um único produto. As duas vias, catabólica e anabólica, estão energeticamente relacionadas. Em geral, as vias catabólicas são convergentes (têm como finalidade capturar energia química obtida na degradação de moléculas de energia, formando ATP) e as vias anabólicas são divergentes (suas reações reúnem moléculas pequenas para formação de moléculas complexas). Algumas vias são cíclicas (um composto da via é regenerado em reações que convertem outro composto inicial em produto). (RODWELL, 2017). As vias catabólicas e anabólicas têm uma importante forma de regulação. As enzimas que catalisam tanto a degradação quanto a síntese das biomoléculas complexas estão presentes na maioria das células. Entretanto, não faria sentido elas atuarem simultaneamente (por exemplo, sintetizando e degradando lipídeos). Isso é evitado por um sistema de regulação recíproca das vias anabólica e catabólica. Quando uma via está ativa, a outra está inibida. Embora várias das enzimas que atuam em vias catabólicas e anabólicas que conectam os mesmos produtos finais (por exemplo, glicose-piruvato e piruvato-glicose) sejam compartilhadas em ambas as vias, é importante existirem pontos em que as etapas sejam catalisadas por enzimas diferentes. Caso contrário, se fossem as mesmas enzimas atuando nos dois sentidos, a inibição de uma das vias (para que as duas ações não ocorram ao mesmo tempo) 32 acabaria inibindo a outra também. Esses pontos em que as enzimas diferem são importantes pontos de regulação independentes. Além disso, para que as vias anabólicas e catabólicas sejam irreversíveis, pelo menos uma das reações específicas em cada sentido deve ser termodinamicamente muito mais favorável que sua reação inversa. Outra característica da regulação individual das vias anabólicas e catabólicas é que elas ocorrem em compartimentos diferentes dentro da célula. Por exemplo, o catabolismo de ácidos graxos ocorre na mitocôndria, e sua síntese no citosol. Em compartimentos distintos as concentrações de metabólitos intermediários, enzimas e reguladores podem ser mantidas em diferentes níveis. Como as vias metabólicas são cineticamente controladas pela concentração do substrato, conjuntos separados de intermediários anabólicos e catabólicos também contribuem para o controle das taxas metabólicas. (RODWELL, 2017). A relação energética entre as vias catabólicas e anabólicas. As vias catabólicas liberam energia química na forma de ATP, NADH, NADPH e FADH₂. Esses transportadores de energia são usados em vias anabólicas para converter precursores pequenos em macromoléculas celulares. Fonte: Nelson e Cox (2014, p. 503) 33 4.3 Vias metabólicas anabólicas e catabólicas Existem milhares de reações químicas conhecidas que compõem uma enorme diversidade de vias metabólicas. O padrão básico do metabolismo é estabelecido pela alimentação. Os produtos da digestão de carboidratos, lipídeos e proteínas devem ser processados principalmente em glicose, ácidos graxos e glicerol e aminoácidos, respectivamente, que vão ser usados para formar outras biomoléculas, em um ciclo de rotas anabólicas (síntese) ou catabólicas (degradação). 4.3.1 Metabolismo de carboidratos A glicose é o principal combustível da maioria dos tecidos. Ela é metabolizada a piruvato pela via da glicólise. Os tecidos aeróbios metabolizam o piruvato à acetilCoA, que pode entrar no ciclo do ácido cítrico para oxidação completa a CO2 e H₂O, ligados à formação de ATP no processo de fosforilação oxidativa. A glicólise também pode ocorrer de modo anaeróbio quando o produto final é o lactato. A glicose e seus metabólitos também participam em outros processos – por exemplo, na síntese do glicogênio, no músculo esquelético e no fígado, e na via das pentoses fosfato, uma parte alternativa da via glicolítica. Ela é uma fonte de equivalentes redutores (NADPH) para a síntese de ácidos graxos, e é fonte de ribose para a síntese de nucleotídeos e ácidos nucleicos. Os intermediários trioses-fosfato na glicólise originam a porção glicerol dos triacilgliceróis. O piruvato e os intermediários do ciclo do ácido cítrico fornecem os esqueletos de carbono para a síntese dos aminoácidos não essenciais ou dispensáveis. Já a acetil-CoA é o precursor dos ácidos graxos e do colesterol e, consequentemente, de todos os hormônios esteroides sintetizados no corpo. A gliconeogênese é o processo de síntese da glicose a partir de precursores não carboidratos, como lactato, aminoácidos e glicerol. (NELSON; COX, 2014). A manutenção de uma concentração sanguínea adequada de glicose é essencial para os tecidos em que ela é o principal combustível (o encéfalo) ou o ú nico combustível (as hemácias). A glicose proveniente da digestão dos carboidratos é absorvida pela veia porta do fígado. No fígado, a glicose é captada em quantidades superiores à s necessidades imediatas e é utilizada na síntese de glicogênio 34 (glicogênese). Entre as refeições, o fígado atua para manter o nível da glicemia a partir da degradação do glicogênio (glicogenólise) e para, com o rim, converter os metabólitos não carboidratos, como lactato, glicerol e aminoácidos, em glicose (gliconeogênese). O músculo esquelético utiliza a glicose como fonte de energia tanto de modo aeróbio, formando CO₂, quanto de modo anaeróbio, formando lactato. O músculo esquelético armazena glicogênio como substrato energético para uso durante a contração muscular e sintetiza proteína muscular a partir dos aminoácidos plasmáticos. O músculo responde por cerca de 50% da massa corporal e, consequentemente, representa uma considerável reserva de proteína, que pode ser empregada para suprir aminoácidos para a gliconeogênese em caso de inanição. (NELSON; COX, 2014). Fonte: https://bloga.grupoa.com.br/ 4.3.2 Metabolismo de aminoácidos Os aminoácidos são necessários para a síntese de proteínas. Alguns precisam ser supridos na alimentação (os aminoácidos essenciais ou indispensáveis), uma vez que não podem ser sintetizados pelo organismo. Os restantes são aminoácidos não essenciais ou dispensáveis, que são supridos pela alimentação, mas que também podem ser formados a partir de intermediários metabólicos por transaminação, utilizando o grupamento amino de outros aminoácidos. Após a desaminação, o nitrogênio amino é excretado na forma de ureia, e os esqueletos de carbono que 35 permanecem após a transaminação podem (1) ser oxidados a CO₂ pelociclo do ácido cítrico, (2) ser utilizados na síntese de glicose (gliconeogênese) ou (3) formar corpos cetônicos ou acetil-CoA, que pode ser oxidada ou utilizada na síntese de ácidos graxos. Vários aminoácidos também são precursores de outros compostos, como purinas, pirimidinas, hormônios – como a epinefrina e a tireoxina –, e neurotransmissores. (NELSON; COX, 2014). Os aminoácidos resultantes da digestão das proteínas da dieta são absorvidos pela veia porta do fígado. O fígado desempenha a função de regular a concentração sanguínea desses metabólitos. O músculo esquelético sintetiza proteína muscular a partir dos aminoácidos plasmáticos. O músculo responde por cerca de 50% da massa corporal e, consequentemente, representa uma considerável reserva de proteína, que pode ser empregada para suprir aminoácidos para a gliconeogênese em caso de inanição. Resumo das vias para o catabolismo dos carboidratos, das proteínas e da gordura da alimentação. Todas essas vias levam à produção de acetil-CoA, que é oxidada no ciclo do ácido cítrico, produzindo, por fim, ATP pelo processo de fosforilação oxidativa. Fonte: Rodwell et al. (2017, p. 140) 36 5 ÁCIDOS NUCLEICOS E NUCLEOTÍDEOS Os nucleotídeos formam os ácidos nucleicos, que são moléculas que permitem a todos os organismos vivos transferir informações genéticas de uma geração para outra. Existem dois tipos de ácidos nucleicos: ácido desoxirribonucleico (mais conhecido como DNA) e ácido ribonucleico (mais conhecido como RNA). (CARVALHO, 2018). Nesta seção, você vai aprender a reconhecer a estrutura química de um dos ácidos nucleicos, o DNA; vai conhecer as bases nitrogenadas que compõem os ácidos nucleicos e como elas se organizam nas moléculas; e vai aprender quais são as diferenças entre os dois principais ácidos nucleicos encontrados nas células. 5.1 Estrutura química do DNA Em 1953, Watson e Crick propuseram um modelo tridimensional da estrutura do ácido desoxirribonucleico (DNA), um dos eventos científicos mais importantes do século passado. A dedução da estrutura correta apoiou-se, em grande parte, na dedução da configuração estereoquímica mais favorável compatível com os dados de difração de raios X de Maurice Wilkins e Rosalind Franklin. A descoberta da dupla- hélice revolucionou totalmente a maneira de os geneticistas analisarem seus dados. O gene tornou-se um objeto molecular real sobre o qual os químicos podiam pensar objetivamente, como o faziam a respeito de moléculas menores como o piruvato e o ATP. Além disso, a descoberta da estrutura do DNA também revelou muito de sua natureza. As duas fitas entrelaçadas de estruturas complementares sugeriam que uma fita servia como molde sobre a qual a outra fita era sintetizada. Se essa hipótese fosse verdadeira, então, o problema fundamental da replicação genica, que intrigara os geneticistas por tantos anos, estaria conceitualmente resolvido. (CARVALHO, 2018). A estrutura primária do DNA é a sua sequência de nucleotídeos. Compostos por um grupo fosfato, um açúcar (desoxirribose) e uma base nitrogenada, essas moléculas interagem formando cadeias principais lineares, que são as fitas do DNA. Os resíduos de açúcar de uma cadeia são unidos por ligações fosfodiéster, formando pontes de fosfato entre si. O grupo hidroxila do carbono 3 da pentose do primeiro 37 nucleotídeo se une ao grupo fosfato ligado à hidroxila do carbono 5 da pentose do segundo nucleotídeo por meio dessa ligação. . Ligação 3’5’ fosfodiéster entre os nucleotídeos de uma fita de ácido nucleico. A ligação fosfodiéster (região sombreada) une o carbono 3’ de um açúcar ao carbono 5’ do próximo açúcar na cadeia de açúcar-fosfato de um ácido nucleico. Fonte: Strachan e Read (2013, p. 7). Embora certos genomas virais sejam compostos por DNA de fita simples, o DNA celular da maioria dos organismos forma uma dupla-hélice: duas fitas de DNA são mantidas unidas por ligações de hidrogênio entre as bases nitrogenadas dos nucleotídeos para formar a dupla-fita. (CARVALHO, 2018). As ligações de hidrogênio ocorrem entre as cadeias laterais de pares de bases complementares, lateralmente opostos nas duas fitas da dupla-fita de DNA. Existem quatro bases nitrogenadas mais frequentes no DNA, são elas: adenina (A), timina (T), guanina (G) e citosina (C). Tais bases formam pares de acordo com as regras de Watson-Crick: A pareia com T, enquanto G pareia com C. Em função desse pareamento de bases, a composição de bases do DNA não é aleatória: a quantidade de A equivale à de T, e a quantidade de G equivale à de C. 38 Dupla-hélice de DNA. As duas fitas de DNA se enrolam uma na outra, produzindo um sulco menor e um sulco maior na dupla-hélice. A dupla-hélice apresenta um comprimento de 3,6 nm e um raio de 1 nm por giro. Fonte: Strachan e Read (2013, p. 8). A composição de bases do DNA pode, portanto, ser especificada pela estimativa da porcentagem de GC (a porcentagem de G é igual à porcentagem de C) em sua composição. Por exemplo, uma sequência de DNA com 42% de GC apresenta a seguinte composição de bases: G, 21%; C, 21%; A, 29% e T, 29%. (CARVALHO, 2018). As sequências hidrofílicas de grupos fosfato e desoxirribose ficam no lado de fora da dupla-fita, orientados para a agua circundante. As bases nitrogenadas das duas fitas estão empilhadas dentro da dupla-hélice, com suas estruturas hidrofóbicas em forma de anel e quase planares muito perto umas das outras e perpendiculares ao eixo longitudinal. O pareamento perfeito das duas fitas faz com que elas se curvem uma em torno da outra para produzir um sulco menor e um sulco maior na dupla- hélice; a distância ocupada por um único giro completo da hélice (seu comprimento) mede 3,6 nm. A molécula de DNA pode adotar diferentes tipos de estrutura helicoidal. Em condições fisiológicas, a maior parte do DNA em bactérias ou células eucarióticas adota a forma B, ou seja, uma hélice com giro para a direita (forma uma espiral com 39 sentido horário se afastando do observador) que apresenta 10 pares de bases por giro. As formas mais raras são o DNA A (hélice com giro para a direita apresentando 11 pares de bases por giro) e o DNA Z (hélice com giro para a esquerda apresentando 12 pares de bases por giro). As duas extremidades de uma fita simples de DNA são diferentes. A extremidade 5′ apresenta um resíduo de açúcar no qual o carbono 5′ não está́ ligado a outro resíduo de açúcar. A extremidade 3′ apresenta um resíduo de açúcar cujo carbono 30′ não está́ envolvido em uma ligação fosfodiéster. Portanto, as duas fitas da dupla-hélice de DNA são descritas como antiparalelas uma à outra, visto que a direção 5′ → 3′ de uma das fitas do DNA é oposta à direção de sua fita complementar. (CARVALHO, 2018). Natureza antiparalela da dupla-hélice de DNA. As duas fitas do DNA correm em direções opostas ligando átomos de carbono 3’ dos resíduos de açúcar a átomos de carbono 5’. Fonte: Strachan e Read (2013, p. 8). 40 O código genético está na sequência linear de bases em uma fita de DNA. Devido ao pareamento de bases, as duas fitas da molécula apresentam sequências complementares, portanto a sequência de bases de uma fita de DNA pode ser inferida a partir da sequência da outra fita. É comum descrever sequências de genes escrevendo a sequência de bases de apenas uma fita, na direção 5′ → 3′, que é a direção de síntese de uma nova fita de DNA a partir de uma fita molde. 5.2 Bases nitrogenadas dos ácidos nucleicos A descoberta da dupla-hélice pôs fim, definitivamente, a qualquer controvérsia a respeito de o DNA ser a substância genética fundamental. Mesmo antes da separação das fitas na replicação ser verificada experimentalmente, a principal preocupação dos geneticistas moleculares voltou-se para como a informação genética do DNA atuava para ordenaros aminoácidos durante a síntese proteica. Com todas as cadeias de DNA capazes de formar dupla-hélice, a essência de sua especificidade genética deveria residir nas sequências lineares de seus quatro nucleotídeos componentes. Assim, entendidas como entidades que contém a informação, as moléculas de DNA passaram a ser consideradas como palavras muito longas compostas a partir de um alfabeto de quatro letras (A, G, C e T). Mesmo com apenas quatro letras, o número de sequências de DNA possíveis (4ᴺ, em que N é o número de letras na sequência) é muito, muito grande, mesmo para as menores moléculas de DNA; pode existir um número praticamente infinito de mensagens genéticas diferentes. DNA e RNA possuem estruturas muito similares. Ambos são grandes polímeros formados por sequências de nucleotídeos e compostos por três unidades principais: um açúcar (desoxirribose ou ribose), um grupo fosfato e uma base nitrogenada. Enquanto os grupos açúcar e fosfato alternam em sequência e formam a espinha dorsal da estrutura do ácido nucleico, as bases nitrogenadas, que ficam presas a cada resíduo de açúcar, podem diferir em cada um dos nucleotídeos adjacentes. A sequência de bases identifica o ácido nucleico e determina a sua função. Portanto, é a sequência delas que determina o que cada segmento de DNA ou RNA vai codificar. (NELSON; COX, 2014). As bases nitrogenadas são derivadas de dois compostos relacionados: a pirimidina e a purina. Tanto as bases nitrogenadas quanto os açúcares dos 41 nucleotídeos são compostos heterocíclicos (compostos que têm um anel do qual fazem parte pelo menos dois tipos diferentes de átomos). A base de um nucleotídeo é ligada covalentemente (no N-1 das pirimidinas e no N-9 das purinas) por uma ligação N-b-glicosídica ao carbono 19 da pentose, e o fosfato é esterificado no carbono 59. A ligação N-b-glicosídica é formada pela remoção dos elementos de agua (um grupo hidroxila da pentose e o hidrogênio da base), como na formação da ligação O- glicosídica. As duas moléculas, DNA e RNA, contêm duas bases púricas principais, adenina (A) e guanina (G), as quais possuem dois anéis interligados, e duas pirimídicas, que possuem um anel simples. Tanto no DNA quanto no RNA, uma das pirimidinas é a citosina (C), mas a segunda pirimidina não é a mesma nos dois: é a timina (T) no DNA e a uracila (U) no RNA. Apenas raramente a timina é encontrada no RNA ou a uracila no DNA. Nos ácidos nucleicos, cada base é ligada ao carbono 1 do açúcar, sendo que um açúcar contendo uma base ligada é chamado de nucleosídeo. Um nucleosídeo contendo um grupo fosfato ligado aos carbonos 5 ou 3 do açúcar constitui a unidade básica de repetição de uma fita de DNA, sendo denominada de nucleotídeo. Existem muitas outras bases nitrogenadas encontradas na natureza, e essas moléculas podem ser encontradas incorporadas em outros compostos. Por exemplo, anéis de pirimidina são encontrados em tiamina (vitamina B1) e barbitúricos, bem como em nucleotídeos. (NELSON; COX, 2014). Purinas e pirimidinas. Quatro bases nitrogenadas (A, C, G e T) ocorrem no DNA, e quatro bases nitrogenadas (A, C, G e U) ocorrem no RNA. A e G são purinas; C, T e U são pirimidinas. Fonte: Nelson e Cox (2014, p. 282). 42 5.3 Os ácidos nucleicos DNA e RNA O DNA é a molécula que contém a informação para o sequenciamento dos aminoácidos de uma proteína. Entretanto, ele não é a única molécula de ácido nucleico necessária para a síntese proteica. Experimentos demonstraram que a síntese proteica ocorria em locais da célula onde não havia DNA, o que excluía a possibilidade de um papel direto do DNA neste processo. Em todas as células eucarióticas, a síntese de proteínas ocorre no citoplasma, que está separado do DNA cromossômico pela membrana nuclear. (NELSON; COX, 2014). Portanto, pelo menos em células eucarióticas, uma segunda molécula portadora de informações que obtém sua especificidade genética a partir do DNA precisava existir. Essa molécula seria então transportada para o citoplasma para atuar como molde na síntese proteica. Desde o início, as atenções concentraram-se sobre uma segunda classe de ácidos nucleicos, ainda funcionalmente obscura, o RNA. Torbjörn Caspersson e Jean Brachet haviam demonstrado que o RNA se localizava basicamente no citoplasma; e foi fácil imaginar fitas simples de DNA atuando como moldes para cadeias complementares de RNA, quando não estavam servindo como molde para as fitas complementares de DNA. A análise da estrutura do RNA revela como ele pode ser sintetizado a partir de uma molécula de DNA. Quimicamente, eles são muito semelhantes. O RNA também é uma molécula longa e não ramificada, que contém quatro tipos de nucleotídeos unidos por ligações fosfodiéster 3′5′. Duas diferenças em seus grupos químicos distinguem o RNA do DNA. A primeira é uma discreta modificação no componente açúcar. O açúcar do DNA é a desoxirribose, enquanto o RNA contém ribose, idêntica à desoxirribose exceto pela presença de um grupo OH (hidroxila) extra no carbono 2. A segunda diferença é que o RNA contém a pirimidina uracila, extremamente similar à timina, no lugar da timina do DNA. Apesar dessas diferenças, entretanto, os polirribonucleotídeos podem formar hélices complementares como a dupla- -hélice do DNA. Nem o grupo hidroxila adicional, nem a ausência do grupo metila – encontrado na timina, mas ausente na uracila – afetam a capacidade do RNA de formar estruturas dupla-hélice, mantidas pelo pareamento de bases. 43 Estrutura química do RNA. (A) O RNA contém o açúcar ribose, o qual difere da desoxirribose, o açúcar utilizado no DNA, pela presença de um agrupamento –OH adicional. (B) O RNA contém a base uracila, a qual difere da timina, a base equivalente no DNA, pela ausência de um grupo –CH3 . (C) Um pequeno fragmento de RNA. A ligação química fosfodiéster entre nucleotídeos no RNA é a mesma que ocorre no DNA. Fonte: Alberts et al. (2011, p. 302) Outra diferença em relação ao DNA é que, uma vez que a molécula de RNA é uma fita simples complementar a apenas uma ou duas fitas de um gene, seu conteúdo de guanina não é necessariamente igual ao seu conteúdo de citosina, assim como o seu teor de adenina não é necessariamente igual ao seu teor de uracila. Ainda, a molécula de RNA pode ser hidrolisada por bases em 2′,3′-diésteres cíclicos de mononucleotídeos, compostos que não podem ser formados a partir do DNA tratado com bases (álcalis) devido à ausência do grupo 2′-hidroxila. A labilidade alcalina do RNA é útil tanto para o diagnóstico quanto para a análise. (NELSON; COX, 2014). Ao contrário do DNA, o RNA é normalmente encontrado como uma molécula de fita simples. Caso o RNA forme hélices de dupla-fita, é provável que essas duplas- fitas sejam compostas por duas partes da mesma molécula de RNA de fita simples. Apesar dessas diferenças químicas serem pequenas, o DNA e o RNA diferem drasticamente em termos de estrutura geral. Por ocorrerem nas células em forma de fita simples, as cadeias de RNA podem dobrar-se sob diversas formas, similarmente 44 ao que ocorre com uma cadeia de polipeptídeos que estrutura a conformação final de uma proteína. A capacidade de dobrar-se em formas tridimensionais complexas permite que algumas moléculas de RNA desempenhem funções estruturais e catalíticas. As moléculas citoplasmáticas de RNA que funcionam como modelos para a síntese de proteínas (i.e., que transferem informação genética do DNA para uma maquinaria sintetizadora de proteínas) são designadas mRNAs. Muitas outras moléculas de RNA citoplasmáticas abundantes (RNAs ribossomais; rRNAs) têm funções estruturais que contribuem para a formação e a função dos ribossomos (a maquinaria organelar para a síntese de proteínas), ou funcionam como moléculas adaptadoras (RNAs de transferência; tRNAs) para a tradução da informação
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