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A LITERATURA COMO ACONTECIMENTO Weslley Barbosa © José Weslley Barbosa de Lima Revisão, preparação e edição: Everton Avelino Diagramação, edição digital e visual: Thiago Almeida Capa: Weslley Barbosa A BIROSCA DO MEROVEU – EDITORA, SEBO E CAFÉ – omeroveu@gmail.com www.meroveu.com.br Dados internacionais de catalogação na publicação (CIP) (Câmara brasileira do livro, SP, Brasil) LIMA, José Weslley Barbosa A literatura como acontecimento [livro eletrônico] / Weslley Barbosa. -- 1. ed. -- Campina Grande, PB : A Birosca do Meroveu - Editora, Sebo e Café, 2022. PDF. Bibliografia. ISBN: 978-65-997133-3-0 1. Ensaios brasileiros 2. Literatura – Estudo e ensino 3. Teoria literária - Estudo ensino I. Título. 22-118290 CDD-801.07 http://www.meroveu.com.br/ DOS DIREITOS DO AUTOR Por decisão do autor, este livro, em sua versão digital, não é um produto comercializável e pode ser livremente distribuído e acessado, sendo obrigatória apenas a citação do nome do autor e da origem da obra, em caso de o leitor se valer dela para trabalhos escolares ou acadêmicos, citação em livros, jornais, revistas etc. Não é permitida, sob qualquer hipótese, a adaptação, modificação, reescrita ou supressão de partes do texto, muito menos sua venda por terceiros, ou inclusão, em forma de coletânea, na íntegra ou em parte, em material comercializável. A apropriação indevida de obra intelectual, assumindo a autoria ou não reconhecendo a fonte é tida como plágio, de acordo com a Lei nº 9.610, de 19 de fevereiro de 1998. Para Juliana, Letícia e Heitor SUMÁRIO DOS DIREITOS DO AUTOR 4 ADVERTÊNCIA 7 APRESENTAÇÃO 8 INTRODUÇÃO 17 CONCEITOS BASILARES 26 LITERATURA E EXPRESSÃO 31 A ARTE DA PALAVRA 41 LITERATURA E HISTORICIDADE 49 LITERATURA E INTUIÇÃO CRIATIVA 59 A BUSCA PELO BELO 78 PALAVRAS FINAIS 89 BIBLIOGRAFIA 93 SOBRE O AUTOR 98 7 ADVERTÊNCIA Os parágrafos deste ensaio são numerados (exceto na apresentação, na introdução e nas palavras finais). Produzindo o texto, constantemente me deparei com a necessidade de fazer menções às minhas próprias ideias, algo confuso quando ainda não se tem noção, no momento de produção, da página em que determinado trecho ocupará no livro. A solução que encontrei foi a numeração e creio que ela atendeu satisfatoriamente ao meu objetivo. 8 APRESENTAÇÃO Este ensaio surge com um objetivo modesto, porém necessário: apresentar a minha contribuição para a sondagem da natureza da literatura. Se é bem verdade que muito papel já foi gasto com tal objetivo e muitas palestras, simpósios e congressos já se realizaram buscando este mesmo fim, é fato também que tal preocupação está cada dia mais relegada a um segundo (terceiro, quarto?) plano, embora esteja longe de se esgotar, principalmente diante da enxurrada de novos textos, expressões e temas que as últimas décadas presenciaram. O fato é que ainda há muito o que dizer e, principalmente no Brasil, a carência de materiais 9 nesse sentido é notável. As grandes obras ou já estão esgotadas (e sem qualquer previsão ou esperança de reedição) ou, nos casos raros em que ainda é possível encontrá-las nas livrarias, refletem preocupações e discussões de algumas décadas atrás. Se é fato que no âmbito acadêmico tais discussões não estão mais na “crista da onda”, que outras preocupações entraram com mais força no centro das atenções dos pesquisadores, é fato também que o estudante ainda sente a necessidade de encontrar materiais que lhe deem um norte a seguir em suas próprias sondagens. E a questão é bem esta mesmo: um norte. Este livro é antes de tudo uma provocação, um convite à reflexão, ao estudo, ao aprofundamento. O leitor perceberá a minha preocupação de não apenas apresentar a minha visão sobre cada questão aqui discutida, mas também de indicar possíveis caminhos de aprofundamento. Entendo 10 que aquele que decide buscar o conhecimento adequado sobre todos os temas e aspectos ligados à problemática da literatura está assumindo não apenas a necessidade de uma atitude (o simples estudo), mas o imperativo de um processo (o primeiro passo será apenas o início de uma longa trajetória). Quando aqui me colocar a respeito de qualquer aspecto, estarei sempre procedendo com base naquilo que foi colhido da leitura de grandes mestres e mestras sobre os quais tenho me debruçado desde o início de minha trajetória. Embora não me negue a expressar muitas vezes um posicionamento particular sobre determinado ponto (ainda que discordante da opinião majoritária), não posso negar que esta obra é principalmente uma organização sucinta de toda uma rica tradição de estudos literários e estéticos. E, já que mencionei minha trajetória, talvez seja apropriado resumi-la aqui, para que o leitor tenha uma noção das minhas bases teóricas. 11 Minhas pesquisas sobre a literatura se iniciaram assim que ingressei no ensino superior, na Licenciatura Plena em Letras – Língua Portuguesa (UFCG, 2006 – 2010). Nos primeiros anos, minha formação foi bastante teórica, colhendo dos grandes manuais de Teoria Literária os aspectos metafísicos e historiográficos a respeito do tema. Foi uma época de muito questionamento a respeito do que é literatura, de sua função, sua divisão em gêneros e subgêneros (bem como toda a teoria a respeito das peculiaridades intrínsecas a cada um deles). Nesse período, ocorreu minha filiação à Estilística (método de abordagem que ainda hoje inspira muitos dos meus procedimentos quando do estudo cotextual de uma obra), bem como nasceu o interesse pela literatura paraibana, que mais tarde resultou no meu livro Ensaios de poesia paraibana (2014). Num segundo momento, a partir do final da graduação, mas principalmente após ingressar no 12 Programa de Pós-Graduação em Linguagem e Ensino da UFCG, para o mestrado em Literatura e Ensino (2012 – 2014), minhas preocupações se voltaram para o leitor e a recepção do texto literário. Foi o momento de entrar em contato com a Estética da Recepção e as teorias sobre leitura e ensino de literatura. A princípio, o choque de perspectivas foi grande e obviamente fui encontrando aos poucos o ponto de contato possível entre as duas abordagens para que o meu pensamento a respeito do acontecimento literário não se convertesse num posicionamento caótico que entendesse a literatura como algo dividido em dois momentos que fossem totalmente separados e independentes um do outro (a produção e a leitura). Precisava, certamente, relacionar tudo numa mesma direção, a fim de justificar a própria necessidade de cada uma das preocupações. Após concluir o mestrado, fui entrando em contato com todo um universo de leituras que ainda mais abriram meus horizontes e, posso 13 dizer, foram fundamentais para que a minha noção de um todo que envolve a literatura, da produção à leitura, se formasse: foi o momento de conhecer a Filosofia da Arte, a Estética, a Hermenêutica, a Sociologia da Arte, a Crítica Biográfica, o Marxismo etc. Obviamente, não posso deixar de reconhecer que a própria prática de produção e ensino da literatura me proporcionou um olhar sobre a vinculação de fato daquilo que eu ia lendo com o que se dava no âmbito real, pragmático. Toda essa gama de olhares e minha tendência de conciliar as contribuições que recebo das minhas leituras foi instigando as reflexões que hoje reúno neste ensaio. A literatura como acontecimento parte do pressuposto de que a literatura não surge do nada nem acaba com a publicação do texto. Acima de tudo, é algo como um processo que se espraia emvários momentos, em vários contextos (cada um com suas particularidades) e sempre coloca em 14 relação pelo menos dois sujeitos: um autor e um leitor. Argumentarei, nas páginas que seguem, sobre a necessidade de se pensar o texto não como um produto acabado, mas verdadeiramente como uma semente (pois se origina de algo, mas por sua vez é a própria origem de outra coisa). Tudo isso está ligado e sem essa íntima relação a arte, e consequentemente a literatura, não seria possível. Como toda obra que se pretende introdutória ao estudo de algum objeto, este texto se exime da tentação de aprofundamento (ainda que por vezes me pareça necessário). Às vezes, querer abordar tudo e a tudo explicar pode suprir muito mais as necessidades e o rigor de método do autor do que do leitor, prejudicando a fluidez do texto e trazendo, para um livro introdutório, aquilo que só caberia numa obra de maior fôlego. Por isso, sempre que julgue necessário o aprofundamento a respeito de algum assunto (e isso ocorre em vários pontos do ensaio), sugiro leituras por meio de notas de rodapé. Claro que 15 tais sugestões se ligam à minha própria trajetória de estudos e muitas outras coisas podem ser buscadas. Há sempre um mundo a se descobrir a respeito de cada tema. Se há vantagens em sermos indivíduos do século XXI, esta é uma delas. Também evito colocar citações diretas no corpo do texto, como é praticado em modelos acadêmicos de publicação (dissertações, teses, artigos científicos etc.). Inspirando-me numa vasta tradição ensaística, deixo por vezes as referências subentendidas, levando em conta que esta obra indica ao término do texto as leituras que lhe serviram de base. O leitor perceberá que este texto tem bem a proposta de ser acessível, de rápida leitura e rápida compreensão. O meu esforço aqui foi sempre ir até o ponto em que não se ultrapassa o nível da reflexão introdutória. O mais que não for possível, é que a natureza do objeto não permite simplificar tanto. 16 Aceito com esta publicação não apenas o desafio de posicionar-me a respeito de tema tão amplo, polêmico, multifacetado, mas também a possibilidade de receber críticas e o prazer de contar com sugestões e apontamentos que poderão aperfeiçoar o meu olhar a respeito da literatura e o meu trabalho com toda a gama de textos que ela engloba. Este ensaio, como a própria literatura, apenas começa sua história com a publicação. O resto é por conta de vocês! Campina Grande, julho de 2022. Weslley Barbosa 17 INTRODUÇÃO Opinar a respeito da natureza da arte e, por conseguinte, da literatura não é tarefa pacífica. A qualquer momento pode surgir (e surgirá!) um novo texto que extrapolará qualquer compreensão anteriormente apresentada sobre a questão. Quando se faz isso num livro, então, é grande a possibilidade de ver contrariadas, no dia seguinte ao da publicação (com o agravante de que já não é possível refazer), as reflexões desenvolvidas ao longo de anos. Nesse sentido, cabe sempre um pacto entre o estudioso e o leitor: é preciso ter-se em mente que um conceito é fruto das reflexões de alguém e que pode variar de autor para autor (ou, num 18 mesmo autor, ao longo do tempo). Não trabalhamos com definições acabadas em arte, ou pelo menos não devemos ser tão ingênuos a ponto de imaginar que elas são possíveis. Os conceitos são importantes, são essenciais mesmo quando se pensa na necessidade humana de refletir a respeito do que nos cerca, mas nunca são absolutos. Lembro de Terry Eagleton1, argumentando que não é possível afirmar que a literatura seja ficção por ser possível encontrar obras que contrariam essa vinculação ficcional. Em seguida, o mesmo autor alega ser mais apropriado falar na literatura como o conjunto de obras que apresentam uma utilização peculiar da linguagem. Ora, não precisa procurar muito para nos depararmos com o poema Veneza: com ou sem bienal, de José Paulo Paes ou o Poema do beco, de Manuel Bandeira, que não parecem, a menos 1 (EAGLETON, 2019, p. 1 – 3). 19 que se force muito o conceito, proceder numa utilização especial da linguagem. Obviamente, pode-se argumentar que tais textos são exceções e que, de um modo geral, a literatura possui sim uma utilização especial da linguagem. Mas é obvio também que os partidários da posição de que a ficção é inerente ao acontecimento literário (entre os quais me coloco) podem também alegar que a ausência de ficção é uma exceção. Logo, nem uma nem outra posição estão anuladas, simplesmente porque a literatura é inalcançável a colocações absolutas. O fato é que muito se equivocaria aquele que procurasse explicar a arte a partir de um único aspecto. Ficção, linguagem especial, belas letras, textos criativos ou para deleite... nada disso abarca de modo satisfatório o acontecimento literário e, por isso, não se pode ser tão reducionista. Parece mais adequado tentar-se abarcar várias possibilidades e é isso que procuro fazer aqui. 20 A necessidade de apresentar respostas, de opinar, de analisar para deste processo se retirar ocorrências gerais, tudo isso (cuja importância não pode jamais ser negada) não implica a delimitação de fronteiras precisas. As fronteiras ou limites precisos2, felizmente, não existem na arte, que, como um rio caudaloso, sempre nos apresenta como única margem possível a terceira, como aquela do conto de Guimarães Rosa. Étienne Gilson3 afirmou a respeito da tarefa de filosofar sobre a arte que, ao afirmar-se o que a arte é, nega-se tudo o que ela não é. Embora sua discussão a respeito da essência das coisas e do objeto artístico seja bastante lúcida, tenho pensado diferente do grande filósofo. Penso que sempre que afirmamos algo a respeito da arte nunca devemos esperar ter conseguido delimitar o 2 “quando o poeta diz: lata / pode estar querendo dizer o incontível” (Gilberto Gil, Metáfora). 3 (GILSON, 2010). 21 que ela não é, mas apenas o que ela costuma rejeitar na maioria dos casos. Sempre aparecerá um texto que vai em direção oposta. Portanto, tendo em vista que os limites não estão na arte, mas nas interpretações que ela suscita, o que resta é aceitarmo-nos como portadores não de verdades, mas de possibilidades de entrada nas discussões a respeito dela. Como tudo que vem do ser humano, a literatura é também matéria de interesse, de curiosidade, de reflexão e de comentários de nossa parte. A quantidade de grupos de discussão, perfis em redes sociais, comentários os mais diversos nas mais diferentes plataformas digitais mostra (na internet, que é atualmente, para o bem e para o mal, um retrato perfeito das mais naturais inclinações humanas) que não nos contentamos apenas com o fruir a arte: queremos submetê-la a uma opinião, queremos sondar os seus “porquês”, os seus “comos”, as suas motivações. Deixar de 22 perguntar-se a respeito de sua natureza é negar nossa própria postura natural diante de qualquer objeto. Aceito aqui o desafio de lançar mais um olhar à questão. Espero que este ensaio possa auxiliar nos primeiros contatos do estudante de letras e do interessado em geral com o acontecimento literário, que possa esclarecer alguns pontos, inspirar indagações, reflexões. Antes de concluir e passarmos, enfim, às colocações específicas a respeito do acontecimento literário, é necessário que eu situe o termo literatura dentro de toda uma discussão a respeito dos limites que ele possui. Como nosso objetivo no próprio corpo do texto é sondar a natureza da literatura dentro de uma determinada compreensão a respeito do que tal palavra representa, é necessário que primeiro tratemos dessa palavra. 23 Durante muito tempo, o termo literatura foi relacionado às diversas áreas de conhecimento produzidaspelo homem, desde as ciências até a filosofia. Além disso, o termo também costuma ser usado, até mesmo nos dias atuais, para se referir à bibliografia produzida a respeito de determinado assunto, ou seja, o conjunto de obras de certa área do conhecimento: literatura jurídica, literatura médica etc.4. Cabe destacar, ainda, que litteratura (que remonta ao latim) tinha, nas origens de sua utilização, o mesmo sentido de grammatiké, seu correlato grego. Logo, originariamente literatura significava o ensino das Letras e da escrita em geral5, não tendo nada a ver com a arte produzida 4 A respeito das várias aplicações do termo, sugiro a leitura de Wellek e Warren (1976), Veríssimo (2001), Moisés (2012) e Aguiar e Silva (2018). 5 (TAVARES, 2002, p. 21). 24 por meio de palavras, conforme adotado atualmente. A partir do século XVIII passa-se gradualmente ao conceito de literatura hoje adotado pela maioria dos manuais e meio que já bastante difundido no senso comum, referindo-se às manifestações escritas com finalidade estética, ou seja, aos textos escritos com objetivos artísticos, dedicados à fruição, ao deleite. Quando aqui aparecer o termo literatura, é em tal acepção que ele deve ser entendido. Por isso e por tudo o que ainda será afirmado, o leitor certamente perceberá que tal conceito é amplo e poderá acolher uma grande variedade de obras. Nesse sentido, fica excluída aqui a noção de valor, não porque eu a julgue irrelevante, mas por acreditar que tal discussão foge aos objetivos de um texto que é antes de tudo uma reflexão sobre a natureza do acontecimento literário e, portanto, inscreve-se mais nos campos 25 da Teoria da Literatura e da Filosofia da Literatura do que no da Crítica Literária. 26 CONCEITOS BASILARES § 1º A literatura é a expressão verbal e historicamente situada de uma intuição criativa, voltada para o belo. É sobre tal conceito que me apoiarei para desenvolver todas as considerações presentes neste ensaio. Cada um dos títulos que o dividem trata particularmente de uma das noções que compõem nosso conceito: expressão, linguagem verbal, vinculação histórica, intuição criativa e propensão para o belo. § 2º O motivo de eu iniciar minhas colocações apresentando o conceito numa frase- síntese é bem claro: quero que o estudante já comece sabendo em que tipo de solo está pisando. Não é o meu objetivo complicar a trajetória 27 daquele que a mim confiou o direcionamento do seu estudo. De um modo geral, o modelo atual de produção é bem distinto: recusa-se a apresentação de conceitos sob o pretexto da impossibilidade de eles serem universais, conforme apontei na introdução. Coloco-me em posição distinta porque creio ser bem mais proveitoso começar uma viagem sabendo-se o destino final do que se perguntando sobre o porquê de viajar. O conceito inspira os caminhos a buscar, enfatiza pontos de vista e até mesmo alerta para a necessidade de reflexão a respeito da sua validade. § 3º Meu conceito busca abarcar alguns pontos fundamentais da produção literária: o que se expressa, como se expressa, de que lugar se expressa e com que objetivos se expressa. Como todo conceito, é provável que mereça revisões e críticas, mas nem por isso sua importância se anula. Temos aí um norte que guiará as opiniões aqui colocadas e poderá mostrar aos leitores os limites da minha abordagem. 28 § 4º Ao longo deste ensaio, o leitor encontrará constantemente a expressão acontecimento literário6, que adoto sempre que quero me referir a algo que vai além do texto em si, mas que ainda é inerente à literatura. Trata-se do estar no mundo da literatura, que é concebida, mas nunca acabada e, por isso mesmo, sempre ressignificada num processo que não deve ser ignorado em detrimento do texto puro e simples. É, dessa forma, algo que percebo como uma 6 É comum utilizar-se, nos estudos literários, a expressão “fenômeno literário” quando se pretende levar em consideração algo mais na natureza da literatura que o texto em si. Foi, durante certo tempo, o termo que também utilizei. Porém, atualmente não o tenho adotado pois percebo que muitas vezes ele aparece sem muito critério (ora tratando do texto, ora de suas características, ora da relação entre texto e leitura etc.). Outra possibilidade é a escolhida por Castagnino (1970), que adotou a expressão “fato literário”. Para os contornos que aqui eu pretendo dar à questão, pareceu-me mais apropriado utilizar um termo próprio, até porque a expressão “fenômeno” traz em si uma conotação um tanto “sobrenatural”, que não é o que eu pretendo inspirar com minhas colocações, e o termo “fato”, por sua vez, faz pensar em algo acabado, pronto, já dado. “Acontecimento” remete, ao mesmo tempo, ao ser e ao estar da literatura, sua natureza e sua relação com pelo menos um momento histórico, sua vinculação com o tempo. Eis aí a abordagem que é mais coerente com minhas reflexões. 29 trindade una, englobando a produção da obra em si, o texto dela resultante e a sua recepção (leitura), de forma indissociável. Não dá para pensar no autor sem observar o texto que produzirá nem a expectativa que tem de encontrar leitores para esse texto; não dá para pensar no texto como elemento isolado, sem imaginar os contextos históricos de sua produção ou recepção; não dá para pensar na recepção, senão numa relação constante com o texto e o contexto de sua produção. § 5º Quando se falar em leitura7 neste texto, não se entenda jamais como uma situação ideal, seguindo um modelo esperado de leitor ou de recepção. A leitura aqui contemplada é plural: diz respeito a possibilidades, não a uma determinada expectativa. Perceba-se que, como 7 Obviamente, temos aí uma simplificação. Como se verá ao longo do texto, considero como literatura também os textos orais. Portanto, onde se lê “leitura” e “leitor(es)” deve-se considerar, como possibilidades, também “audição” e “ouvinte(s)”. 30 irei argumentar no momento próprio, o acontecimento literário pressupõe o contato de várias subjetividades com o texto, em momentos distintos e com interesses distintos. É nisso que pensamos ao tratar de leitura, leitores e recepção. § 6º Outra noção que merece explicação é a de tempo. Quando ela aqui aparecer não será em referência a um dos elementos da narrativa (como o narrador, o espaço etc.), pois este estudo não procede, em nenhum momento, na sondagem de questões particulares dos gêneros literários. “Tempo”, neste texto, tem a ver com questões extrínsecas, contextuais, históricas e se relaciona indistintamente tanto à prosa quanto à poesia e ao teatro. 31 LITERATURA E EXPRESSÃO § 7º O termo expressão utilizado no § 1º deve aqui ser entendido de forma ampla. A arte necessariamente surge da intenção de comunicação despertada numa consciência. Trata- se, portanto, de suprir uma necessidade básica de se fazer ouvir, de comunicar-se. § 8º Logo, enquanto fruto inconteste da capacidade humana de linguagem, que é interativa e cultural8, a literatura não deixa de repercutir: i) 8 A quantidade de estudos à disposição do interessado em sondar a problemática da linguagem é enorme. Não poderei dar uma noção completa da bibliografia já produzida, nem mesmo dos livros que possuo em minha biblioteca. Deixarei como indicações três obras introdutórias, a partir das quais o estudante poderá seguir seus próprios caminhos: i) LYONS, John. Lingua(gem) e linguística: uma introdução. Rio de Janeiro: LTC, 2013; ii) FIORIN, José Luiz (org.). 32 os anseios individuais, a necessidade de exteriorizar o que se sente, de encontrar a cumplicidade de uma consciência ouvinte/leitora; ii) o complexo sociocultural no qual o autor está inserido, pois parece impossível a expressão de conteúdos puramente subjetivos, semqualquer interferência exterior. § 9º Porém, contiguamente à necessidade de se fazer ouvir vem o interesse por escutar. Está aí a outra face da capacidade de linguagem. A intenção comunicativa de que falamos não pode realizar-se senão tendo em vista alguém com quem nos comunicaremos. Não se fala para ninguém, não se escreve sem a ideia de um leitor (ainda que num diário, escreve-se ou para que o próprio autor possa ler no futuro ou na expectativa de que um dia alguém desvende os segredos ali contidos). A Introdução à linguística: I. objetos teóricos 6. ed. São Paulo: Contexto, 2019; iii) MARTELOTTA, Mário Eduardo et al. Manual de linguística. 2. ed. São Paulo: Contexto, 2020. 33 literatura é expressão porque ela é fruto de uma necessidade de interação. § 10 O impulso criativo é também um impulso da consciência que quer gritar ao mundo suas impressões a respeito de algo, que quer compartilhar com alguém os seus sentimentos e anseios. É o grito incontido de quem precisa ter voz, é o chamado ao diálogo ou à ação, é a ânsia pelo contato, o desejo de aceitação ou a expectativa do choque. § 11 Expressar-se é também (ou principalmente) um ato de coragem. É aceitar o risco de expor sua subjetividade, de mostrar suas fraquezas e temores. É apresentar sua face para o beijo acolhedor ou o tapa de ódio. Nunca é um grito para o vazio, é um chamado à comunhão ou ao debate. § 12 Assim sendo, como todo texto, a literatura serve de elo, de contato, entre duas subjetividades: a de quem produz/comunica e a de 34 quem exerce o papel de destinatário daquela informação. § 13 Pelo que ficou dito no § 12, percebe- se que o texto literário carrega em si o status de “ponto de encontro”. É provável que ninguém vá a um romance, um conto, um poema, buscando apenas as palavras. O grande foco nunca é o texto, não costumamos pensar nele quando abrimos um livro, por mais que saibamos ou imaginemos que aquele texto é envolvente, elegante, chamativo, intrigante. Abrimos um livro de literatura em busca de vivências, de experiências, de humanidade (ainda que aceitemos a possibilidade de aquelas vivências serem fruto de uma “invenção”, mas justamente por serem invenção apoiada, inspirada, ocasionada por sentimentos bem reais e bem humanos). Como ponto de encontro, o texto é aquele lugar privilegiado onde duas consciências interagem, dialogam, doam-se, completam-se, apaixonam-se, disputam, combatem. 35 § 14 Perceba-se: foi dito no § 13 que num texto literário duas consciências “doam-se”, colocando não apenas o autor, mas também os leitores como sujeitos ativos do acontecimento literário. A verdade é que um bom autor reveste sim o seu texto de uma criatividade muitas vezes inebriante, mas isso de nada adiantaria sem o outro lado da história. O texto não termina quando o autor o coloca no papel. Ali apenas começa a sua história, que se completa um pouco mais a cada nova leitura. § 15 Quando da leitura da obra literária, as consciências do autor e do leitor meio que ocupam o mesmo lugar, num diálogo. Daí porque a literatura é tão encantadora: nela encontramos as repercussões daquilo que sentimos, daquilo que sofremos, daquilo que ansiamos. O texto literário é tão intenso porque ao lê-lo não estamos apenas decodificando palavras, estamos dialogando. Ali experimentamos novas vidas, ali relembramos 36 experiências, ali nos assustamos com a possibilidade do futuro. § 16 O encanto do acontecimento literário está no fato de que ele nunca é expressão a esmo e, muito mais: ele nunca expressa nada que não seja humanamente possível9 e que irá encontrar repercussão em outras consciências. Mais à frente (§ 50 e seguintes) será possível entender que a literatura é fruto de uma intuição e, por isso, resulta de um impulso natural que, no fim, desperta um novo e intenso impulso natural (nas mentes dos leitores). Isso é vida! § 17 Os leitores são, portanto, não apenas receptores de informações e, por conseguinte, sua 9 Certamente há de se ter a compreensão de que mesmo um texto de ficção científica reflete as expectativas do ser humano em relação ao futuro, à vida em outros planetas, a outras possibilidades de real amparados nos avanços científicos. Mesmo a literatura fantástica ou de horror, expressando o sobrenatural, reflete nossos medos, nossas crenças, nossos fantasmas interiores. Tudo isso é bem humano! 37 tarefa não é apenas interpretar os sentidos colocados numa obra. O ato da recepção do texto literário10, tal qual o compreendemos, é sempre uma coparticipação na criação de significados para um texto literário. § 18 Portanto, o fato de a literatura ser fruto de uma “expressão” não quer dizer que sua natureza anula o diálogo e a interação11. Pelo contrário, pela própria exigência mesmo de um interlocutor, o caráter expressivo do texto literário aponta para o contato inevitável do autor com os leitores durante a efetivação do acontecimento literário. 10 A respeito da importância da recepção para a constituição do acontecimento literário, indico o estudo da Estética da Recepção, tendo como ponto de partida a leitura dos vários textos presentes em Lima (2002). 11 A leitura de Candido (2006) pode auxiliar na compreensão da literatura a partir do seu caráter dialógico, que ele chama de “sistema simbólico de comunicação inter- humana” (p. 31). 38 § 19 Os leitores, sujeitos ativos de todo esse processo, tomam conhecimento do universo sugerido pela obra (fruto do impulso criativo do autor, fruto de sua intuição) e, a partir daí, agregam-lhe significados. Dá-se, por meio do texto um encontro de subjetividades: i) aquela que inspirou o texto e que, por assim dizer, está dentro dele, de forma latente; ii) aquela que frui o texto, no momento da leitura, trazendo também, para esse momento de recepção, todo um complexo de sentimentos, experiências, ideologias, expectativas etc. § 20 É óbvio que esse processo pode colocar em jogo não apenas um contato amistoso, integrado, harmonioso, prazeroso entre essas duas subjetividades. Como processo histórico e ideológico, o acontecimento literário pode resultar em crise, crítica, desconstrução, repulsa, negação etc. Da mesma forma que não se escreve um texto senão de um lugar ideológico, também não se lê um texto desvinculado desse caráter (nos 39 parágrafos destinados a tratar de literatura e historicidade - § 35 a 49 - voltarei a tratar disso). § 21 Porém, é necessário estar atento a uma verdade inquestionável: se o texto literário inspira várias leituras, é bem verdade que ele não inspira todas. O leitor, por mais que esteja inserido nesse diálogo de subjetividades, não pode deixar de observar o texto. Suas colocações, suas interpretações devem partir do que verdadeiramente foi expresso pelo autor. É em relação a isso que o leitor deve se colocar, nunca baseando-se em “achismos” ou inferências falsas. Enfim, é necessário não cair no perigo da superinterpretação12. § 22 O texto literário é um objeto palpável que representa, para contemplação do público, aquilo que se passou na mente do artista no momento de criação. Ali está o seu olhar, a sua visão de mundo, sua intuição a respeito de algo e 12 Cf. Aguiar e Silva (2018, p. 35 e 36). 40 as conclusões que tirou daquilo. É nisso tudo que o leitor deve basear-se para construir sua interpretação, ainda que traga, também, toda uma série de elementos de sua própria experiência para agregar ao processo interpretativo. § 23 Em momento oportuno (§ 50 e seguintes), voltarei a tratar da expressão literária no que diz respeito ao objeto dessa expressão. Agora, é chegado o momento de abordar a forma como o artista se expressa quando decide produzir literatura. De um modo geral, a noção de expressão podeser aplicada a todas as artes. A especificidade da expressão literária não está na comunicação de sentimentos ou na interação que daí resulta. Tem-se aqui uma forma particular plasmar sentimentos e impressões: a palavra. É dela que tratarei abaixo. 41 A ARTE DA PALAVRA § 24 Foi dito no § 1º que a literatura é expressão, mas expressão verbal. Entende-se por verbal o tipo de linguagem que se expressa por meio de palavras, orais e/ou escritas. § 25 Se a expressão em si é inerente ao próprio caráter humano e se, conforme apontado no § 7º, a arte de um modo geral é expressiva, faltava indicar o que necessariamente diferenciava a literatura das demais formas de produção humana no que diz respeito ao seu meio de expressão. § 26 A diferença da literatura para as demais artes está no fato de que ela se utiliza das palavras como forma de expressão, assim como o 42 que torna a pintura única são as cores, o que constitui a matéria prima do músico é o som, o que faz o expectador tomar conhecimento da dança são os movimentos do corpo do dançarino. § 27 O escritor literário é, portanto, aquele indivíduo que escolhe expressar sua intuição criativa por meio de textos, assentes sob a forma de gêneros literários13. Cada um à sua maneira, com sua organização e ponto de vista próprio, expressando também sempre um modo específico de intuição, os gêneros são um molde que o artista utiliza para orientar sua produção e, ao mesmo tempo, são as searas férteis em que ele cultivará novas formas de expressão. § 28 Uma obra literária é consequentemente um artefato linguístico e, como 13 Uma discussão a respeito dos gêneros literários escapa aos objetivos deste ensaio. Pretendo discuti-la a fundo em obra posterior. Por enquanto, para o estudante interessado, indico a leitura de Tavares (2002), Coutinho (2008), Samuel (2011), Moisés (2012), Hamburger (2013), Aguiar e Silva (2018), Todorov (2018). 43 tal, carrega em si todo o potencial significativo, estilístico, sonoro, morfológico, sintático que a língua na qual foi produzida possui (inclusive, a própria busca por explorar esse potencial significativo é condição para que o texto alcance o belo, conforme abordarei a partir do § 88). § 29 Muitos estudiosos já se voltaram para a linguagem literária a fim de sondar suas especificidades14. Não cabendo aqui explorar a fundo tais aspectos, lembro que o texto literário é sempre assente numa determinada língua (pois a linguagem verbal não é possível de outra forma), elevando ao grau máximo as suas possibilidades expressivas. É sempre por meio da literatura que uma língua logra alcançar alguns dos patamares 14 Para uma revisão do debate a respeito da natureza da literatura, indico as seguintes leituras: Castagnino (1969), Wellek e Warren (1976), Veríssimo (2001), Tavares (2002), Amora (2006), Samuel (2011), Moisés (2012), Hamburger (2013), Pound (2013), Aguiar e Silva (2018), Todorov (2018 – principalmente o primeiro capítulo) e Eagleton (2019). 44 mais ricos de plurissignificação e da metaforização. § 30 De tudo isso resulta a não submissão à clareza, à transparência na expressão das ideias. O texto literário por vezes é ambíguo, opaco, insubordinado sintaticamente, repleto de metáforas. Obras que serviriam de exemplo para tais afirmações são abundantes em qualquer literatura, pelo menos as ocidentais. § 31 Na literatura, a escolha das palavras não obedece a critérios de clareza e informatividade, mas é sempre diretamente ligada ao objetivo estético, lúdico. § 32 Em O ser e o tempo da poesia, Alfredo Bosi15 afirma que, no poema, força-se o signo para o reino do som. Parafraseando o mestre, eu diria que na literatura em geral força-se o signo para o reino do improvável. Dentro de uma 15 BOSI, Alfredo. O ser e o tempo da poesia. São Paulo: Companhia das Letras, 2000. 45 obra literária uma palavra, um sintagma, uma imagem sempre podem ter significados variados, inesperados. O termo “memória”, ao aparecer no romance de Machado de Assis (Memórias póstumas de Brás Cubas), adquire um novo matiz, supera expectativas, ganha contornos inusitados. A palavra “pedra”, quando no poema de Drummond (No meio do caminho tinha uma pedra) é ressignificada, abunda em possibilidades interpretativas. § 33 Retomando o que foi exposto no § 24, chamo atenção para o fato de que, sendo a literatura uma expressão verbal, ela se constitui como uma materialização da capacidade linguística por meio de textos tanto orais quanto escritos. § 34 Portanto, considero as manifestações orais como partes do conjunto que forma a literatura. Assim, ao lado de contos, romances, crônicas, poemas impressos, roteiros teatrais etc., 46 estão os mitos, as lendas, as parlendas, a poesia oral... Tais manifestações comungam de várias das características que exploro ao longo deste ensaio16 e seria pouco criterioso exclui-las do âmbito da literatura apenas levando em conta sua não impressão no papel. Já em termos de abordagem crítica, parece adequado concordar com Massaud Moisés17, quando ele afirma que o exercício da crítica pressupõe a contemplação do texto impresso (ainda que seja o próprio pesquisador quem tome a iniciativa de verter para o papel o texto que até então apenas circulava oralmente). § 35 O fato é que, oral ou escrita, a linguagem literária se reveste de peculiaridades. Cada estudioso vai aplicar a tais peculiaridades um determinado conceito: linguagem portadora de metáforas polivalentes (MOISÉS, 2012), de 16 Embora, também, possuam suas determinações próprias, que implicam e exigem posturas específicas por parte daqueles que pretendem estudá-las. Sobre tais especificidades, sugiro a leitura de Candido (2006). 17 (2012, p. 6). 47 literariedade (JAKOBSON apud EICHENBAUM, 2013), de significantes parciais (ALONSO, 1966) ... Independentemente do termo utilizado, fica clara essa peculiaridade, que faz com que a linguagem seja o primeiro aspecto que salta os olhos na leitura de um romance, de um conto e principalmente da poesia. Dificilmente passam despercebidos os textos de Guimarães Rosa, de Clarice Lispector, de Manuel de Barros, de Augusto dos Anjos, de Machado de Assis. Cada um ao seu modo, uns de forma mais intensa, outros de modo mais comedido, todos apresentam um tratamento particular em relação à linguagem. § 36 Se a linguagem literária tem na metáfora o seu núcleo18, se ela é “carregada de significados”19, se nela chama atenção “o valor significativo e expressivo dos termos”20, temos aí a justificativa do título desta seção. Estamos diante 18 Moisés (1982). 19 Pound (2013). 20 Tavares (2002). 48 da arte da palavra, a arte que faz do verbo seu aliado para a reconstrução da realidade. 49 LITERATURA E HISTORICIDADE § 37 A literatura é expressão verbal historicamente situada. Por isso, o acontecimento literário tem uma vinculação indiscutível com o tempo e a sociedade21. Não existe obra isolada desses dois fatores22, assim como a própria leitura 21 Sobre a relação da literatura com a sociedade, com o tempo, com as ideologias há muitos trabalhos importantes à disposição. Indico principalmente a leitura de Candido (2006), mas também pode ser relevante a consulta de Bosi (2000, op. cit.). Embora trate especificamente do gênero poético, o livro de Bosi é de uma sensibilidade ímpar na consideração do caráter sempre socialmente vinculado da literatura. E muito influenciou a abordagem que ponho em prática neste ensaio. 22 Nem sempre isso salta aos olhos. Em alguns casos tal caráter só é percebido quando refletimos melhor a respeito do texto. Como exemplo, cito o poema Namorados, de Manuel Bandeira. Num tom coloquial o poeta parece simplesmente abordar, com muita sensibilidade uma cena cotidianade um jovem casal. Mas a liberdade do texto, a 50 não pode alhear-se deles. Tempo cronológico, história, cultura e ideologias são aspectos (contextuais) essenciais da relação dos elementos linguísticos da obra literária (cotextuais) com o mundo palpável, real. Desconsiderá-los é correr o risco de não entender uma obra em sua totalidade, é privar-se de estar atento às referências que uma obra faz ou de compreender as ideias que motivaram sua produção. § 38 A produção do texto literário é um ato historicamente vinculado e o texto carrega em si as marcas dessa vinculação. A recepção desse mesmo texto se constitui num novo ato histórico, que o ressignifica, o enriquece e o expande. Se um texto nunca é vazio de sentidos e de riqueza estética e estilística antes da leitura, é bem própria escolha do tema e a forma como é realizado evidenciam a vinculação do autor ao período literário conhecido como Modernismo. Às vezes a o momento histórico e a sociedade não são o tema, mas a inspiração ou, ainda, o elemento influenciador do estilo, que muitas vezes só é percebido num segundo momento, já de reflexão a respeito da leitura. 51 verdade que após ela (ou as várias leituras) aquele texto ganha um pouco mais de riqueza, pois foi ressignificado num novo contexto, contemplado sob um olhar diferente daquele que tivera o seu autor, expandido pelas nuances de um novo momento histórico. § 39 Um estudo sério a respeito da literatura não pode deixar de mencionar essa vinculação, ainda que não possua como objetivo a sondagem detalhada de tal relação. Este ensaio não é nem pretenderia ser uma Sociologia da Arte ou uma Crítica Política, mas ao assumir a tarefa de apontar os principais aspectos que entram em jogo para a existência do acontecimento literário, eu não poderia me esquivar da necessidade (e mesmo da obrigação) de observar o quanto a arte em geral e a literatura bebem dos elementos contextuais. § 40 A relação da literatura com a historicidade passa, inevitavelmente, pelo tempo. Enfatizo o termo “tempo” para referir-me aos 52 contextos historicamente situados em que cada texto é concebido e lido, que nunca são iguais, porque sempre recebem a influência do período em que se estabelecem23. A escolha tem também outra razão: a relação da obra literária com o tempo é tão forte que chega a ser conflitiva, de modo que o acontecimento literário pode colocar em jogo até quatro tempos distintos (de uma vez!). § 41 Pense num leitor contemporâneo de Dom Casmurro, de Machado de Assis. Ao tomar o livro para leitura ele se insere num acontecimento literário que de pronto coloca em evidência dois tempos históricos e bem reais: o de produção da obra e o de recepção. São tempos diferentes, mas também sociedades diferentes que se relacionam naquele momento. Pode haver um choque, pode haver o estranhamento, pode haver a cumplicidade, mas a diferença estará sempre 23 Talvez seja interessante, para entender a importância da historicidade na constituição do acontecimento literário, a leitura de Castagnino (1970). 53 latente. Porém, não é tudo: o próprio texto possui um tempo interno, como qualquer obra. Esse tempo interno menciona dias, anos, institui referências históricas de um passado anterior ao da escrita do texto... Perceba-se: temos um escritor produzindo uma obra na República Velha, ambientando seu livro no Segundo Império e sendo lido no século XXI. Mas é claro que não é só isso. Há ainda a sucessão das várias leituras da obra ao longo do tempo, os diferentes impactos que causou, as mudanças de opiniões (que refletem mudanças sociais) ... É provável que tudo isso venha à tona, principalmente num livro que já entrou para o imaginário cultural do país: certamente nosso leitor hipotético sabe da grande dúvida (traiu ou não?) antes mesmo de abrir o livro. Essa sucessividade de momentos e recepções inegavelmente contribui para a história do texto. § 42 São quatro tempos em relação (em harmonia ou em choque), mas poderiam ser três, dois (às vezes o contexto de produção é o mesmo 54 da recepção, então não há nem a disparidade temporal nem uma sucessão de recepções). Não importa agora sondar tais questões quantitativas quando nosso objetivo é perceber que literatura (e arte) não seria nada se não trouxesse em si, em tudo o que a envolve desde a gênese até a leitura (complexo que chamo aqui de acontecimento literário) as repercussões da relação do homem com o tempo. Ela careceria de verdade. § 43 História também é cultura e ideologia (desde aquilo que motiva as relações humanas até o que determina a própria narrativa da história). Quando um texto nasce, não flutua sobre as nuvens ou descansa sob uma redoma: ele nasce num mundo que pulsa com a variedade cultural, social, política, ideológica, religiosa. O autor se filia, ao seu modo, a cada um desses aspectos. Ele tem (ou não) uma religião, uma visão do que é a cultura, uma filiação política, um conjunto de ideologias, um lugar social... A obra traz tudo isso em si, mas não paramos por aqui. 55 Sendo fruto de uma vinculação cultural e ideológica, o acontecimento literário é palco de afirmações e de disputas. § 44 O autor pretende muitas vezes não apenas se fazer ouvir, mas convencer, inspirar, afrontar. Se daí para o panfleto é um passo (e a arte perde muito quando é usada como pretexto para o puro panfleto), a verdade é que a boa literatura, logrando aliar a riqueza da forma com a força do conteúdo, irá sim, ao passo em que encanta, diverte, distrai, trazer em si as marcas dessas relações, com aquilo que tem de agregamento e disputa. § 45 Parece mesmo que toda grande obra é política. É assim de Jorge Amado a Itamar Vieira Júnior, passando por Chico Buarque, por Drummond. Mas não nos enganemos: isso não é produto da contemporaneidade. Sempre foi assim! Homero (e sua tomada de partido em prol dos gregos na Ilíada - o “Catálogo das Naus” é um 56 grande canto sobre o poderio militar e político) e Victor Hugo (com seu monumental manifesto que é Os Miseráveis) são exemplos perfeitos. § 46 Mas, assim como acontece com o tempo, que se liga não apenas à produção, mas também à recepção das obras, a cultura e as ideologias também estão presentes em cada leitor. § 47 E, se no § 40 evidenciei que o acontecimento literário pode colocar em relação ou conflito até quatro tempos distintos, é importante destacar que o mesmo pode ser dito da cultura. Pode haver uma cultura do autor, uma do leitor, uma interna da obra e todo o complexo de diferentes culturas das várias possíveis recepções que somaram à obra visões de mundo, significados etc. ao longo do tempo. Pense no poema I-Juca- Pirama, de Gonçalves Dias. Tal poema remete a uma cultura (que lhe “habita” internamente), mas que não é evidentemente a mesma do seu autor. Um leitor do interior do Nordeste brasileiro do 57 século XXI possui uma cultura distinta das duas já mencionadas e a história do texto desde a sua produção, há mais de 170 anos (que também integra o seu acontecimento literário, porque o texto sempre é ressignificado a cada leitura), evidencia a enorme quantidade de diferentes culturas que com ele já se relacionaram. § 48 A história do texto literário vai se adensando e enriquecendo à medida em que novas leituras vão sendo feitas ao longo do tempo, cada uma delas trazendo para a recepção as marcas do seu contexto. § 49 É por isso que obras são esquecidas, autores são “sepultados”, tendências estéticas surgem e desaparecem. Quando já não são aceitas como portadoras das mensagens que precisam ser ditas, as obras e as estéticas são relegadas ao ostracismo, novos autores são exaltados, novas obras passam a figurar entre as mais comentadas, estudadas, recomendadas. Mas, comonada é 58 eterno, ou mesmo como a história humana parece ser antes um grande ciclo do que um contínuo, não é incomum que tendências ressurjam, que autores sejam “ressuscitados”, que obras voltem a ser lidas e estudadas. Sobre isso, ninguém tem controle, apenas segue-se a marcha do tempo. 59 LITERATURA E INTUIÇÃO CRIATIVA § 50 O texto literário é fruto de uma intuição criativa. Não basta, para tratar do acontecimento literário, associá-lo à expressão verbal ou à historicidade. O cientista, o jornalista, o historiador, todos eles se utilizam de palavras e, claro, em sua atuação profissional não se desvinculam de uma época nem de uma cultura. Porém, o escritor literário não produz o mesmo tipo de texto que o jornalista, o cientista, ou o historiador. Há na literatura uma postura diferente diante dos objetos e é sobre tal postura que pretendo tratar nos próximos parágrafos. 60 § 51 É na noção de intuição24 que reside o cerne do fazer literário. Ao intuir a respeito de determinada coisa, o ser humano submete aquele objeto do mundo real ou realizável aos imperativos de sua consciência. A intuição independe de conhecimento teórico ou racional, tratando-se de uma faculdade subjetiva e inata de nossa espécie. 24 A noção de intuição como fator fundamental do acontecimento literário foi explorada por Tavares (2002) e Amora (2006). Indico também a leitura de ALONSO, Dámaso. Poesía española: ensayo de métodos y limites estilísticos. Madrid: Gredos, 1966, que embora seja uma obra específica sobre o texto poético, muito pode esclarecer a respeito da intuição não apenas do autor, mas também do leitor para a consolidação do acontecimento literário. Em termos mais gerais, o livro de Croce (2008), tratando da arte como um todo, também aborda a questão. Já para uma noção mais ampla de intuição, extrapolando o campo estético e já dentro de uma perspectiva que sonda os componentes do pensamento e do conhecimento humano, indico STEINER, Rudolf. Intuitive thinking as a spiritual path. Hudson: Anthroposophic, 1995. Para um passeio rápido, porém panorâmico, das discussões acerca da intuição ao longo da história da filosofia, recomendo a leitura do verbete específico em ABBAGNANO, Nicola. Dicionário de filosofia. 6. Ed. São Paulo: Martins Fontes, 2012. Vale ressaltar que, embora minha compreensão a respeito da intuição artística tenha como base esses e outros textos, ela assume aqui contornos bem específicos e, em certa medida, originais. 61 § 52 O olhar intuitivo para o mundo é o olhar básico, primordial, essencial, não-mediado que estabelece uma relação subjetiva do indivíduo com aquilo que é contemplado. O mesmo dizemos dos sentimentos: também intuímos a respeito daquilo que sentimos e o resultado dessa intuição nem é nem precisa ser igual ao olhar especializado, como o do psicólogo, o do cientista etc. § 53 Porém, se é verdade que a intuição pura e simples é natural e está presente, potencialmente, em todos os seres humanos, não há que se negar dois aspectos muito importantes na consideração da questão: i) não intuímos de forma semelhante - a experiência com o real, com o fato, o objeto, o sentimento é sempre única, como únicas são as personalidades; ii) em se tratando de arte, o processo de intuição vai além da pura impressão. Isso porque, partindo da contemplação, o olhar do artista se reveste de uma 62 intuição criativa, e a presença de tal adjetivo já demonstra uma postura diferente a ser adotada. § 54 Com a intuição criativa é estabelecido um complexo de relações que passa pela contemplação, pela assimilação, pela pressuposição, pela idealização, pela avaliação e pela conclusão. § 55 O ato de contemplar o objeto ou experimentar o sentimento é o primeiro passo da produção literária. É ele que desperta o artista para a necessidade de expressão, é ele o ponto inaugurador do acontecimento literário. Perceba- se: aqui tenho me referido mais especificamente a “objetos” e “sentimentos”, mas a verdade é que a intuição pode partir de uma ideia. Isso não anula o processo: contemplar a ideia, o impulso cognitivo que veio à mente é, também, uma forma de iniciar a intuição criativa. § 56 A assimilação pressupõe o início da reflexão a respeito do objeto. O ato de produção 63 literária nunca se esgota na simples observação ou no simples experimentar de um sentimento qualquer. É aqui que o escritor “traz” a realidade para o convívio de sua mente. Mais à frente, irei argumentar que a literatura nunca é a realidade e é na assimilação que se inicia esse processo de conversão da realidade em algo distinto. O objeto contemplado passa, agora, na mente do artista, pelo confronto com a subjetividade e os elementos de caráter histórico (como o tempo e a ideologia, que citei anteriormente). § 57 Com a pressuposição inicia-se o processo de levantar-se conjecturas a respeito do objeto contemplado. Aqui a subjetividade do autor começa a trabalhar de modo mais intenso, trazendo contribuições importantes não apenas para a significação do objeto que será despertada na mente, mas principalmente para o confronto que o indivíduo fará dos seus sentimentos com o objeto. Que tipo de sentimentos aquilo desperta? Quais ideias são trazidas à mente? E por quê? 64 Nesta etapa os aspectos históricos e ideológicos que tinham entrado em cena na assimilação começam a influenciar o artista na compreensão que dará e nas afinidades que terá em relação ao que é contemplado. Também é nesta etapa que a intuição artística começa verdadeiramente a ganhar contornos diferenciados em relação à intuição natural presente em todos. § 58 A idealização é a gênese da ficção. É aqui que o acontecimento literário se volta para o campo das possibilidades e o escritor começa a desprender-se dos contornos reais do objeto contemplado e a analisá-lo a partir dos contornos subjetivos que sua mente lhe foi dando desde o início do processo. Trata-se, pois, de colocar em evidência o processo imaginativo, a criatividade. § 59 Na avaliação o autor reflete sobre o produto dos processos anteriormente realizados. É aqui que a ideia, já formada, passa pelo confronto com a consciência crítica do autor. Aqui, avaliar 65 não passa, obviamente, pela atribuição de critérios quantitativos, mas sim pela autocrítica e pela análise. § 60 Na conclusão o processo intuitivo enfim se completa. É neste ponto que o autor já se prepara para sair do campo da intuição pura e simples e partir para o campo da expressão. Dando por finalizada a contemplação e retirando dela todo um jogo de relações e significados, o escritor se sente pronto para devolver ao mundo palpável aquilo que dele colheu. Sua contemplação não se dera sem propósito, pois desencadeou um processo que estabeleceu uma nova existência, distinta daquilo que foi contemplado: a ideia intuída, que resultará na obra expressa. § 61 Do momento em que observamos a coisa ou experimentamos o sentimento até o exato ponto em que concluímos algo a seu respeito, tudo pode se dar de maneira muito rápida (e não necessariamente linear), mas sempre estabelece 66 fortíssimos impulsos emocionais em nossa consciência. Da observação de uma bela paisagem ou da experiência do amor ou do medo, podem resultar inúmeras impressões, todas elas estabelecidas a partir de uma atitude intuitiva. § 62 Assim, um texto literário é sempre repleto de subjetivismo, de sentimentos e de visões do real, posto que é o resultado (e a expressão) de uma intuição. § 63 Todavia, ao observar esse resultado, esse texto, veremos que aquele objeto que fora observado e intuído jamais será o mesmo. Submetido ao processo de idealização, o objeto ou sentimento agora não mais tem o aspecto de antes, mas aquele aspecto que lhe deu o autor. Trata-seda coisa não como ela é, mas como poderia ser, conforme já nos ensinava Aristóteles25. 25 Aqui me refiro à questão da mimese aristotélica (ARISTÓTELES, 2017) e sua particularidade de ser não a cópia do real, mas a representação do real, de criar uma 67 § 64 Ou seja, a literatura tem como base a realidade, mas nunca é a realidade. Por isso que a ficção é possível. Diante da pergunta: “o Poema tirado de uma notícia de jornal, de Manuel Bandeira é literatura?” a única resposta possível é que sim, pois ele não é uma notícia de jornal. Ele até pode ter se baseado em notícias reais, como já foi provado por estudiosos, mas ele não é a notícia. Sua organização (em versos), seu ritmo, o lugar que ocupa (um livro de poesia), tudo isso denuncia que o texto apresenta uma possibilidade de real, mas não é o real. Sua gênese não está no fato, mas na intuição do artista a respeito do fato. § 65 Talvez agora seja possível entender porque eu argumentei no § 50 que o texto produzido pelo escritor literário é diferente daquele produzido pelo jornalista, o cientista ou o historiador: em todos estes casos o ponto de outra realidade, possível, em que seres agentes desempenham ações inspiradas no mundo real (LIMA, 2003; HAMBURGER, 2013). 68 partida é o objeto real, é lá que o olhar do escritor está ancorado. Além disso, o real não é apenas o ponto de partida: o produto das reflexões e informações ali contidas também direciona o leitor para o mesmo real que originou o texto. Na literatura o ponto de partida não é o real, mas a intuição, e aquilo que estará no texto nunca será também o real em si, mas um real transfigurado, reconstruído, ressignificado. § 66 Argumentei na seção anterior (§ 37 até 49) que o texto literário é fruto não apenas dos sentimentos do artista, mas também da historicidade, sendo por ela influenciado a partir principalmente de dois elementos básicos: o tempo e a ideologia. Tais elementos obviamente têm sua influência direta no processo intuitivo, principalmente nas etapas de assimilação e pressuposição. É por isso que o resultado desse processo, plasmado no texto, reflete sempre uma 69 visão de mundo26 do autor, ou seja, seu modo pessoal de interpretar o mundo e as relações humanas. § 67 Daí também resulta que, sendo a literatura fruto de um processo intuitivo e trazendo em si uma visão de mundo, ela não pode englobar todo o real. Temos aqui não apenas uma limitação, mas principalmente uma escolha. Pense num fotógrafo: ele não capta com sua câmera toda a realidade que o cerca, mas apenas aquela(s) cena(s), aquela(s) pessoa(s), aquele(s) acontecimento(s) que lhe parecem interessantes, intrigantes, marcantes, ou seja, dignos de eternizarem-se. O mesmo se dá com o escritor: sua sensibilidade se volta para um recorte do real e, consequentemente, o seu texto jamais poderá ultrapassar os limites desse olhar sensível. 26 Massaud Moisés (2004 e 2012) discute com muita propriedade a relação entre a visão de mundo (cosmovisão; mundividência) e a literatura. Tal discussão extrapola os objetivos deste ensaio. 70 § 68 A visão de mundo, pode-se concluir, é sempre um recorte possível, uma janela aberta que mostra apenas a parte do mundo exterior que cabe nas suas dimensões. O conjunto das obras literárias é como uma série de janelas numa parede de um casarão: cada uma mostra um ponto de vista, nenhuma mostra tudo, mas todas nos ajudam a entender melhor o que é o mundo. § 69 Até o momento, tenho enfatizado um dos aspectos que formam o binômio que dá nome a esta seção: intuição criativa. Já tratei demasiado da intuição e sabemos como ela se dá e que dela não resulta o real, mas uma possibilidade do real. A essa possibilidade chamei de ficção. Agora resta refletir sobre tal termo. § 70 O resultado do fazer literário é a ficção, porque esse fazer se apoia numa intuição, mas numa intuição criativa! O escritor literário “cria” uma realidade possível, inspirada no mundo real, mas nunca igual a ele, uma realidade 71 paralela. Sem esse passo decisivo não haveria literatura, mas apenas uma reflexão comum (senão um devaneio diante da emoção muitas vezes exagerada que toma o artista). § 71 Logo, essa realidade possível, também chamada de pararrealidade,27 é um ambiente inspirado em nosso mundo real, mas diferente dele, porque, em última análise, ele não é o nosso mundo, mas uma possibilidade acerca de como ele poderia ser28, uma reconstrução do mundo, operada no interior da consciência do artista e externada por meio do texto literário. Tal é o grau de perícia e beleza conferido pelos bons artistas que, verdadeiramente, passamos a considerar os textos lidos como verdadeiros, de tal modo que, por meio deles, rimos, nos 27 (MOISÉS, 2012, P. 11). Há autores que falam numa “supra-realidade” (TAVARES, 2002), termo com o qual não concordo. 28 (ARISTÓTELES, 2017, p. 95). 72 emocionamos, nos revoltamos, refletimos... É como se estabelecêssemos um pacto com o autor, aceitando tomar sua obra como uma extensão do mundo palpável, como a confissão de algo real. Ou mais: como a confissão de algo nosso, ou pelo menos acontecendo ao nosso redor. § 72 Porém, para que a minha posição fique clara, é necessário que eu explique duas coisas fundamentais a respeito do termo ficção antes de seguir adiante. § 73 Em primeiro lugar, ao tratar da ficção como inerente à literatura, estou aqui englobando tanto a prosa de ficção propriamente dita, quanto a poesia e o teatro29. Isso quer dizer 29 Há discussões a respeito de o teatro ser parte da literatura ou ser uma arte autônoma. Embora modernamente se agregue poesia, prosa e teatro sob o mesmo rótulo de literatura, a verdade é que o texto teatral, como o roteiro de cinema, tem propósitos diferentes. O acontecimento literário se dá num processo que começa com a intuição artística e termina com a recepção, ou seja a leitura (mas também audição, em caso de literatura oral) e interpretação da obra. O teatro, como o cinema, funciona de modo diferente. O acontecimento teatral envolve no meio do caminho entre 73 que toda obra que se pretende literária cria ficção30. Mesmo um poema lírico subjetivo e confessional, mesmo um romance histórico ou biográfico terá ficção (caso contrário não serão nem poema nem romance, ou seja, não serão literatura). Mesmo nesses casos o autor parte do sentimento real, do fato histórico ou da vida de alguém, mas só logrará êxito na escolha do nome que dá aos seus textos (poema ou romance) se de intuição e recepção todo um complexo de relações que lhe é próprio (ensaios, escolha do elenco, figurino, montagem do cenário, encenação em si etc.). Todavia, é fato que o texto teatral isolado (por mais que isolá-lo seja podar um pouco de sua natureza) pode ser lido perfeitamente como um romance, um conto... É, sem dúvidas, um tema complexo e, embora esteja chamando a atenção do leitor para tal fato, pretendo aqui apenas despertar a reflexão. Não é meu objetivo aqui, conforme já mencionado antes, tocar na problemática dos gêneros literários. Portanto, seguindo a prática majoritária, mencionei o teatro como parte das manifestações literárias. 30 Käte Hamburger (2013) apresenta uma discussão interessante a respeito da relação da literatura com a ficção partindo da diferenciação entre a narrativa épica (terceira pessoa) e a narrativa em primeira pessoa e o gênero lírico. Tal distinção, embora relevante para a reflexão a respeito da natureza da literatura, não será contemplada aqui. 74 sua intuição resultar um texto em alguma medida criativo, ficcional. O fato é que um dado personagem histórico, quando no texto, está preso ao ponto de vista do autor (é a imagem da janela, que utilizei acima). Só nos será dado à contemplação aquilo que o autor vê(ou quer ver). Tal personagem não pode agir de tal ou tal modo, não tem liberdade alguma, além daquela que o texto lhe dá (ou lhe impõe)31. § 74 No caso do poema lírico, a carga subjetiva colocada no momento da intuição a respeito do sentimento, da angústia, da paixão, da vivência é tão forte que o objeto que gerou a reflexão é muitas vezes exagerado, envolto numa aura mística, exaltado, desfigurado (expresso como belo ou feio ao extremo), enfim, o sentimento é real (como, de fato, todo ponto de 31 Chamo atenção para as considerações de Wellek e Warren (1976, p. 27): “uma personagem de romance é diferente de uma figura histórica ou de uma figura do mundo real. É formada meramente pelas frases que a descrevem ou pelas que foram postas na sua boca pelo autor”. 75 partida em literatura tem alguma ancoragem no real), mas a obra que dele resulta é bem diferente. Não é o sentimento, é sua recriação. O poeta toma a realidade para dentro de si, submete-a a todas as etapas da intuição acima mencionadas e a devolve para contemplação, mas aí ela já não é a mesma. Portanto, tanto quanto a prosa, a poesia é também ficção! § 75 No caso do romance histórico ou biográfico, creio ser presumível que o próprio olhar subjetivo cria um ponto de vista específico para o que é narrado, dá àquele fato ou vida real contornos bem particulares, indissociáveis da consciência que criou a obra. Os sertões não é a Guerra de Canudos, embora (ou justamente por isso) Euclides da Cunha tenha presenciado os fatos de perto, assim como a Batalha de Waterloo nOs miseráveis não é a batalha em si, bem como Inconfidências mineiras, de Sonia Sant’anna não é a vida dos inconfidentes. Tudo isso é a criação de mundos possíveis, ou seja, ficção. 76 § 76 Em segundo lugar, quando falo em ficção, não estou anulando a possibilidade de o real servir de base para a obra, muito menos de esta ser verossímil, possuir uma verdade interna, como já ficou claro anteriormente. Ficção não necessariamente é mentira, ou negação do real. Como já foi dito, “o oposto da ficção não é a verdade, mas o fato”32. § 77 Ao instaurar a ficção, o escritor literário não se nega a dialogar com o mundo real, a trazer para o texto os reflexos dos seus embates, das suas incoerências, daquilo que possui de encantador e de repulsivo. Ele não se nega a refletir no seu texto sentimentos bem humanos, esses mesmos sentimentos que repercutirão em nós, quando da leitura, e nos conduzirão à emoção, ao choro, ao riso, à revolta. O que ocorre é 32 (WELLEK; WARREN, 1976, p. 37). Obviamente, como já demonstrei anteriormente, tenho conhecimento da posição de Eagleton (2019) a respeito da inutilidade da distinção entre “ficção” e “fato”. Não me filio à mesma posição, contudo. 77 que o escritor se propõe a não ficar preso ao fato, a não se subordinar aos seus limites, mas ir além, trabalhar com possibilidades, explorar vários matizes. É aí que reside o cerne da problemática da ficção. 78 A BUSCA PELO BELO § 78 A literatura pode conseguir muito. Pode induzir o outro à reflexão, pode proporcionar um momento de distração e lazer, pode emocionar, revoltar, incomodar, conscientizar e ensinar. Ela pode ser o elo de comunicação entre o autor e os seus leitores. Ela pode tornar-se um documento histórico, um panfleto para determinada atuação social, o ponto de partida para acionarmos memórias há muito perdidas. Enfim, pode ser tudo isso e muito mais, mas é bom que se tenha em mente que, quando surge, a única e originária finalidade do texto literário é comunicar uma intuição a respeito de algo, mas 79 comunicar de forma interessante, de modo a encantar, emocionar, distrair33... § 79 Quando se propõe a produzir um texto de cunho artístico, o escritor, muito mais que ensinar, criar uma teoria ou fazer história, pretende escrever um texto agradável, encantador, que sirva à fruição, ao deleite, ao entretenimento. É óbvio que não se exclui do processo de produção o objetivo de convencer, de despertar a reflexão, de inspirar atitudes. Porém, se o objetivo fosse apenas esse, poder-se-ia escrever um tratad0, um texto didático, uma reportagem etc. § 80 Está claro que a literatura surge de um objetivo a mais. O escritor literário busca, acima de qualquer coisa, produzir arte e, para isso, ele pretende fundamentalmente comunicar-se através do belo. 33 “Despertar no leitor o tipo especial de prazer, que é o sentimento estético” (COUTINHO, 2008, p. 23) 80 § 81 Neste ponto do ensaio, eu acabo entrando, pela própria natureza das questões aqui desenvolvidas, numa discussão a respeito da função da literatura. Muitos estudos já se debruçaram sobre tal problemática, alguns dos quais são citados nas referências bibliográficas deste texto. Embora minhas colocações conduzam inevitavelmente para a compreensão de que a principal função da literatura é servir à fruição (e toda a argumentação que venho construindo se insere justamente neste posicionamento da arte como produção principalmente estética e não necessariamente útil), é bem verdade aquilo que nos afirmam Wellek e Warren (1976) e Gilson (2010) sobre toda boa arte conseguir harmonizar o “doce” e o “útil” (conceitos já presentes em HORÁCIO, 2005), o esteticamente agradável e o pragmaticamente situado34. 34 Embora não se possa deixar de notar que há opiniões bem contrárias, como a de Croce (2008). 81 § 82 O fato é que, embora possam (e mesmo devam ser úteis) a literatura e a arte em geral partem prioritariamente da intenção de serem fruídas, de instituírem um ponto mágico de contato entre a consciência que se confessa ou mostra sua visão particular da realidade e a consciência que será tomada pela beleza daquela obra, que inspirará o contato com uma nova experiência. Perceba-se que minha opinião é de que a utilidade vem como consequência do logro artístico, não como meta35. § 83 Tendo em vista tais colocações, dentro dos limites deste ensaio, considero que belo36 é aquilo que agrada37, que prende a 35 O próprio Gilson (2010) trata disso, ao diferenciar a beleza de objetos de utilidade prática e a beleza da obra de arte. 36 É grande a discussão a respeito do belo, seus limites, suas especificidades. Como foge aos objetivos aqui estipulados discorrer detalhadamente a respeito de tal problemática, preferi apresentar um conceito suficientemente adequado aos meus objetivos, sem entrar em questões como gosto, utilidade, moralidade, ou categorias estéticas. Porém, fica o 82 atenção daquele que contempla o objeto e, em consequência disso, serve à fruição. § 84 Embora tenha afirmado no § 83 que “belo é o que agrada”, estou ciente de que nem tudo o que agrada a um indivíduo agradará a outro. Trata-se de um conceito em si mesmo subjetivo, de modo que um texto certamente encontrará os aplausos de uns e a resistência de outros (isso por vezes aconteceu na literatura e na arte em geral). Além disso, nem sempre o que agrada à crítica agrada ao público, e vice-versa. Mas nada disso anula a validade do conceito, posto convite à pesquisa sobre o tema: para um contato inicial com a questão, sugiro a leitura de Tavares (2002), principalmente os capítulos iniciais. Em seguida, numa abordagem mais específica, pois filiado à filosofia da arte, sugiro a leitura de Gilson (2010), bem como o estudo introdutório de Rosenfield (2006). Num terceiro momento creio que já se esteja no ponto de conhecer obras mais específicas, como Longino (2005) e Horácio (2020), assim como as obras de Nunes (2016) e Croce (2008). Tal percurso já dará ao estudante uma visão bastante abrangente da problemática do belo (embora introdutória, em última análise, posto que não citei aqui as obras de um Herder, de um Hegel...). 37 (NUNES, 2016; GILSON, 2010).83 que sendo o belo uma busca constante do autor e uma característica que será percebida pelo leitor (conforme argumentarei no § 87), ele faz parte do acontecimento literário, ainda que nem sempre seja alcançado da maneira desejada pelos leitores, em todos os textos que se pretendem literários. Passemos, pois, à sondagem mais detalhada do belo. § 85 A característica do belo que mais me é cara, dentre aquelas que têm sido destacadas pelos estudiosos do tema, é a harmonia. De acordo com tal princípio, algo é belo quando é bem formado, bem proporcionado, quando agrada pelos seus sons, por suas cores, por suas formas. Simetria e proporcionalidade são palavras-chave nesse sentido. Se por um lado tal conceito parece ser aplicável muito mais às artes plásticas, à música e às artes do espaço, não cremos ser inadequado associá-lo a uma manifestação particular como a literatura. 84 § 86 A verdade inquestionável é que formas harmônicas são satisfatórias, tanto quando fruídas imediatamente pelos olhos ou os ouvidos, como quando são submetidas a um processo mais profundo, ou seja, intuídas pela mente, como acontece com o texto literário (aqui falamos do ponto de vista do leitor e isso já deixa claro algo fundamental, que discutiremos no próximo parágrafo). § 87 O belo está presente no acontecimento literário tanto no que diz respeito à produção (enquanto busca, por parte do escritor) quanto no que se relaciona com a recepção (a fruição, por parte dos leitores). É essa fruição, essa satisfação do leitor que o escritor busca despertar com o seu texto e, por isso, todos os demais elementos do processo criativo (a intuição e a expressão) são etapas de um movimento “maior”, que conduz inquestionavelmente ao belo. 85 § 88 Mas, afinal, como se dá essa harmonia que estabelece o belo dentro do texto literário? Creio que isso passa, primeiramente, pelos processos básicos de produção de qualquer texto. O texto harmônico e, portanto, belo, é aquele que não contradiz o critério da coesão, é aquele texto agradável à leitura, que não abusa de repetições enfadonhas nem de utilizações que prejudicam sua sonoridade (cacofonia, por exemplo). É um texto que possui uma boa organização dos sintagmas, dos parágrafos, dos versos, das estrofes. Que organiza adequadamente suas imagens, suas metáforas, sua sonoridade. Que não exagera, nem deixa faltar nada... Se a escrita elegante chama atenção até mesmo em textos técnicos, sua ocorrência num texto literário é fundamental para o encantamento que a obra produzirá nos leitores. § 89 Mas há que se atentar para um fato: assim como o conceito de verossimilhança é aplicado a uma verdade interna da obra, o 86 conceito de harmonia também deve sujeitar-se às especificidades de cada texto. O texto literário pode ter uma coesão própria, que no seu caso específico lhe é adequada. Pode ter repetições, desde que elas contribuam para os sentidos ali colocados. E assim por diante, de modo a estabelecer-se que nenhum critério estético ou linguístico deve anteceder o texto. É apenas em relação à verdade da obra que se instauram os critérios que lhe devemos aplicar. § 90 Porém, não se esgota na harmonia o belo artístico e, consequentemente, o literário. O belo também anseia pelo grandioso. Um texto literário sempre aspira ao máximo de expressividade, de inovação, de beleza. Obviamente, é comum encontrarmos exemplos de malogro, mas eu trato aqui da motivação artística, não do sucesso em si. O texto literário “volta-se” para o belo, conforme nosso conceito, mas apenas os bons textos logram alcançá-lo. A grandiosidade de que falo salta aos olhos na elaboração de 87 metáforas e no recurso aos demais tropos, na atenção à sonoridade, no cuidado com o léxico, com a forma, com o título... Não basta ser harmônico, busca-se o extraordinário, aquele texto que arrancará aplausos do público ao ouvi-lo ou suspiros dos leitores ao lê-lo no recolhimento de um quarto ou biblioteca. § 91 Na busca do belo, o artista obviamente há de submeter a realidade à sua própria visão de mundo (a partir do processo de intuição, conforme já destaquei), intentando expressar aquilo que mais se aproxime dessa visão, enriquecida de uma força criativa (que resulta na ficção, como também já foi apontado). § 92 Pelo que ficou dito, talvez o leitor já tenha percebido que o resultado do processo de produção da obra literária, tendo muito de intencionalidade, de escolha, de trabalho com as palavras, traz em si, obviamente, a marca da autoria. É por isso que cada texto literário, ainda 88 que tratando de tema já explorado, é único. É por isso que a literatura é sempre uma possibilidade de inovação. § 93 Ao intuir o objeto, o artista busca expressar tal intuição por meio de palavras, mas ao ter o objetivo de agradar, de despertar o encanto e a fruição, ele inegavelmente faz escolhas, de modo que o mundo ficcional, a pararrealidade que dali resulta, é toda particular, diz muito de sua subjetividade38. 38 “Atrás da obra de arte, sentimos sempre a presença do homem que a produziu” (GILSON, 2010, p. 33). 89 PALAVRAS FINAIS Ao longo deste ensaio, estabeleci uma compreensão da literatura bastante ampla. Se reconheço, por um lado, a importância do texto como expressão da visão particular do artista a respeito da realidade, se acredito na intuição artística como fundamental para a existência da arte, se defendo o texto como objeto de fruição portador de uma utilização especial dos recursos linguísticos, por outro lado não deixo de reconhecer a importância da recepção para que a obra siga tendo vida, para que ela seja ressignificada, para que encontre sua própria razão de ser, que é o diálogo com os leitores. 90 Por isso, a escolha por utilizar, além dos termos referentes ao texto em si, à obra, um termo mais abrangente (acontecimento literário), que englobasse cada um dos aspectos que, a meu ver, são fundamentais para a existência da literatura. Porque, de fato, nunca é só o texto. Considerar o acontecimento literário como um grande diálogo de subjetividades (e destas com o texto e o contexto) é fundamental para a compreensão da própria riqueza que envolve esta arte. Parti de um conceito (A literatura é a expressão verbal e historicamente situada de uma intuição criativa, voltada para o belo) e todo o percurso aqui empreendido buscou explicar cada termo que o compõe. Por isso mesmo, limitei-me: também não pude tratar de vários outros aspectos relevantes para o acontecimento literário, simplesmente pelo fato de não se relacionarem ao conceito aqui adotado e, por isso, não ajudarem a 91 responder à pergunta básica: que é literatura? Tais considerações, portanto, ficam para futuros estudos. Mas, creio que consegui alcançar os objetivos delimitados desde o princípio: apresentar possibilidades, suscitar reflexões e inspirar a sondagem da questão. Acredito que ao fim do percurso fica a certeza de que toda essa discussão não necessariamente precisa responder à referida pergunta, mas mostrar sua importância. Sigamos perguntando e aceitando o desafio de dar respostas. A verdade é que o trabalho não é inútil: talvez uma característica inerente não só ao acontecimento literário, mas à arte como um todo, seja essa necessidade de falar a seu respeito, de se perguntar sobre os motivos de suas especificidades, sobre suas motivações, seus limites. Parece que tal postura acompanha a arte desde seus primórdios e meio que faz parte da 92 própria relação do ser humano com sua produção artística. De certo modo, talvez a própria produção artística seja, no fundo, um conjunto de tentativas de responder o que é a arte. Parece que cada artista sempre se propõe a dara sua resposta. Por isso, somente observando o todo é que se pode ter uma noção da real abrangência da arte. Se todas essas perguntas e colocações servirem de estímulo para alguém, se elas despertarem as consciências dos estudantes que se debruçarem sobre este livro para essa necessidade de convivência com o texto literário, se delas algum ensinamento puder ser retirado, eu terei a certeza de que cheguei onde pretendia! 93 BIBLIOGRAFIA Observação: ao longo deste ensaio, citei algumas obras que serviram de norte para a fundamentação de muitas das ideias presentes aqui. Apenas esses livros fundamentais aparecerão na lista abaixo. Livros citados, mas relevantes apenas para alguns aspectos discutidos no texto foram indicados nas notas de rodapé ao longo de todo o livro. AGUIAR E SILVA, Victor Manuel de. Teoria da literatura. 8. ed. Coimbra: Almedina, 2018. AMORA, Antônio Soares. Introdução à teoria da literatura. 13. ed. São Paulo: Cultrix, 2006. ARISTÓTELES. Poética. 2. ed. São Paulo: Ed. 34, 2017. 94 CANDIDO, Antonio. Literatura e sociedade. 9. ed. Rio de Janeiro: Ouro sobre Azul, 2006. CASTAGNINO, Raúl. Que é literatura? São Paulo: Mestre Jou, 1969. ______. Tempo e expressão literária. São Paulo: Mestre Jou, 1970. COUTINHO, Afrânio. Notas de teoria literária. Petrópolis: Vozes, 2008. CROCE, Benedetto. Breviário de estética. Lisboa: 70, 2008. EAGLETON, Terry. Teoria da literatura: uma introdução. 7. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2019. EICHENBAUM, Boris. A teoria do método formal. In: TODOROV, Tzvetan. Teoria da literatura: textos dos formalistas russos. São Paulo: Unesp, 2013. p. 31 – 82. 95 GILSON, Étienne. Introdução às artes do belo: o que é filosofar sobre a arte?. São Paulo: É Realizações, 2010. HAMBURGER, Käte. A lógica da criação literária. 2. ed. São Paulo: Perspectiva, 2013. HORÁCIO. Arte poética. In: ARISTÓTELES; HORÁCIO; LONGINO. A poética clássica. 12. ed. São Paulo: Cultrix, 2005. p. 53 – 68. LIMA, Luiz Costa (coord.). A literatura e o leitor: textos de estética da recepção. 2. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2002. ______. Mímesis e modernidade: formas das sombras. 2.ed. São Paulo: Paz e Terra, 2003. LONGINO. Do sublime. In: ARISTÓTELES; HORÁCIO; LONGINO. A poética clássica. 12. ed. São Paulo: Cultrix, 2005. p. 69 – 114. MOISÉS, Massaud. Literatura: mundo e forma. São Paulo: Cultrix, 1982. 96 ______. Dicionário de termos literários. São Paulo: Cultrix, 2004. ______. A criação literária: poesia e prosa. São Paulo: Cultrix, 2012. NUNES, Benedito. Introdução à filosofia da arte. São Paulo: Loyola, 2016. PORTELLA, Eduardo et al. Teoria literária. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1979. POUND, Ezra. ABC da literatura. 12. ed. São Paulo: Cultrix, 2013. ROSENFIELD, Kathrin H. Estética. 2. reimp. Rio de Janeiro: Zahar, 2006. SAMUEL, Rogel. Novo manual de teoria literária. 6. ed. Petrópolis: Vozes, 2011. SOUZA, Roberto Acízelo de. Teoria da literatura: trajetória, fundamentos, problemas. São Paulo: É Realizações, 2018. 97 TAVARES, Hênio. Teoria literária. 12. ed. Belo Horizonte: Itatiaia, 2002. TODOROV, Tzvetan. Teoria da literatura: textos dos formalistas russos. São Paulo: Unesp, 2013. ______. Os gêneros do discurso. São Paulo: Unesp, 2018. VERÍSSIMO, José. Que é literatura? In: ______. Que é literatura?: e outros ensaios. São Paulo: Landy, 2001. p. 23 – 35. WELLEK, René; WARREN, Austin. Teoria da literatura. 4. ed. Lisboa: Europa-América, 1976. 98 SOBRE O AUTOR Weslley Barbosa é graduado em Letras – Língua Portuguesa (UFCG, 2010) e mestre em Linguagem e Ensino (UFCG, 2014). Professor de Língua Portuguesa e Literatura, poeta e crítico literário, tem publicados os seguintes livros: Suspiros mal-ditos (poesia, 2010), Ensaios de poesia paraibana (crítica literária, 2014) e As nuances do mel (poesia, 2016). 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