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1 Júlia Morbeck – @med.morbeck Insuficiência Cardíaca em Adultos ↠ Insuficiência cardíaca (IC) é uma síndrome clínica complexa, na qual o coração é incapaz de bombear sangue de forma a atender às necessidades metabólicas tissulares, ou pode fazê-lo somente com elevadas pressões de enchimento. Tal síndrome pode ser causada por alterações estruturais ou funcionais cardíacas e caracteriza-se por sinais e sintomas típicos, que resultam da redução no débito cardíaco e/ou das elevadas pressões de enchimento no repouso ou no esforço (DIRETRIZ, 2018). ↠ O termo “insuficiência cardíaca crônica” reflete a natureza progressiva e persistente da doença, enquanto o termo “insuficiência cardíaca aguda” fica reservado para alterações rápidas ou graduais de sinais e sintomas resultando em necessidade de terapia urgente (DIRETRIZ, 2018). CLASSIFICAÇÃO DA IC DE ACORDO COM A FRAÇÃO DE EJEÇÃO ↠ A IC pode ser determinada de acordo com a fração de ejeção (preservada, intermediária e reduzida), a gravidade dos sintomas (classificação funcional da New York Heart Association − NYHA) e o tempo e progressão da doença (diferentes estágios) (DIRETRIZ, 2018). ↠ A principal terminologia usada historicamente para definir IC baseia-se na FEVE (DIRETRIZ, 2018). CLASSIFICAÇÃO DE ACORDO COM A FRAÇÃO DE EJEÇÃO IC com fração de ejeção reduzida FEVE < 40% IC com fração de ejeção intermediária FEVE = 40 A 49% IC com fração de ejeção preservada FEVE ≥ 50% CLASSIFICAÇÃO DE ACORDO COM A CAPACIDADE FUNCIONAL ↠ Os pacientes devem ser classificados de acordo com a sua capacidade funcional, utilizando a classificação da New York Heart Association (NYHA). Essa classificação auxilia na definição terapêutica e na avaliação da resposta ao tratamento, contribuindo para otimizar o manejo clínico. CLASSIFICAÇÃO FUNCIONAL CLASSE NYHA DESCRIÇÃO I Sem limitações para realização de atividade física. Atividades habituais não causam dispneia, cansaço, palpitações. II Discreta limitação para realização de atividade física. Atividades habituais causam dispneia, cansaço, palpitações. III Importante limitação para realização de atividade física. Atividades de intensidades inferiores causam dispneia, cansaço, palpitações. IV Limitações para realização de qualquer atividade física. Sintomas de IC em repouso. DIAGNÓSTICO DE INSUFICIÊNCIA CARDÍACA ↠ A IC é uma síndrome complexa, com alteração da função cardíaca, o que resulta em sintomas e sinais de baixo débito cardíaco e/ou congestão pulmonar ou sistêmica, em repouso ou aos esforços (DIRETRIZ, 2018). ↠ Uma história clínica e um exame físico detalhados devem ser feitos em todos os pacientes em busca dos principais sinais e sintomas de IC (DIRETRIZ, 2018). No entanto, em pacientes crônicos, a detecção de sinais clínicos de congestão pode estar esmaecida ou ausente, por processos adaptativos e pela grande adaptação do sistema linfático em lidar com congestão. Assim, os sinais clínicos de congestão podem ser pouco sensíveis e também pouco específicos. Sobressaem-se, no entanto, sinais como terceira bulha e sintoma como ortopneia como mais específicos para o diagnóstico de IC (DIRETRIZ, 2018). ANAMNESE E EXAME FÍSICO 2 Júlia Morbeck – @med.morbeck Anamnese ↠ Correta identificação e caracterização dos principais sintomas. ↠ A história clínica detalhada inclui antecedentes pessoais, epidemiológicos, familiares, início e progressão dos sintomas (SOCESP, 4ª ed.). Sinais e Sintomas Dispneia ↠ Na linguagem leiga, a dispneia recebe a designação de cansaço, canseira, falta de ar, fôlego curto, fadiga ou respiração difícil (PORTO, 8ª ed.). ↠ A dispneia em paciente com uma cardiopatia indica congestão pulmonar (PORTO, 8ª ed.). ↠ A dispneia da insuficiência ventricular esquerda apresenta características quanto ao tempo de duração, evolução, relação com esforço e posição adotada pelo paciente (PORTO, 8ª ed.). ↠ A análise da sua relação com esforços deve levar em conta as atividades habitualmente exercidas pelo paciente. Deste modo, um trabalhador braçal entende por exercício pesado “algo” diferente do que é entendido por uma pessoa de vida sedentária. Uma anamnese adequada esclarece essas particularidades (PORTO, 8ª ed.). ↠ A dispneia de esforço é o tipo mais comum na insuficiência ventricular esquerda; conforme sua denominação, aparece quando o paciente executa esforço físico, sendo classificada em dispneia aos grandes, médios e pequenos esforços. A diferença fundamental entre a dispneia de esforço de uma pessoa normal e a de um cardiopata está no grau de atividade física necessário para produzir a dificuldade respiratória (PORTO, 8ª ed.). Assim, quando um cardiopata relata dispneia aos grandes esforços, significa que passou a ter dificuldade respiratória ao executar uma atividade que anteriormente realizava sem qualquer desconforto. Por exemplo, subir escadas que antes era feito sem dificuldade passa a provocar falta de ar; além disso, não é capaz de andar depressa ou caminhar em uma rampa, executar trabalho costumeiro ou praticar um esporte para o qual estava treinado (PORTO, 8ª ed.). A dispneia aos médios esforços surge durante a realização de exercícios físicos de intensidade mediana, tais como andar em local plano a passo normal ou subir alguns degraus, mesmo devagar (PORTO, 8ª ed.). A dispneia aos pequenos esforços ocorre durante a prática de exercícios físicos de pequena magnitude, como tomar banho, trocar de roupa, mudar de posição na cama. Às vezes, a dispneia aparece mesmo sem o indivíduo realizar exercícios físicos, bastando para desencadeá-la apenas o ato de falar (PORTO, 8ª ed.). A evolução da dispneia de esforço da insuficiência ventricular esquerda caracteriza-se por ser de rápida progressão, passando dos grandes aos pequenos esforços em curto período de tempo (PORTO, 8ª ed.). ↠ A dispneia de decúbito surge quando o paciente se põe na posição deitada. Para minorá-la, o paciente eleva a cabeça e o tórax, usando dois ou mais travesseiros; às vezes, inconscientemente, adota a posição semissentada ao dormir. Em fase mais avançada, quando a dispneia se torna muito intensa, o paciente é forçado a sentar-se na beira do leito (ortopneia), com as pernas para fora, quase sempre fletindo a cabeça para frente e segurando com as mãos as bordas do colchão, para ajudar o trabalho da musculatura acessória da respiração (PORTO, 8ª ed.). ↠ A causa da dispneia de decúbito é o aumento da congestão pulmonar pelo maior afluxo de sangue proveniente dos membros inferiores e do leito esplâncnico, nesta posição. Este tipo de dispneia aparece tão logo o paciente se deita, o que a diferencia da dispneia paroxística noturna (PORTO, 8ª ed.). Tosse ↠ A tosse é um sintoma frequente na insuficiência ventricular esquerda, constituindo um mecanismo de valor na manutenção da permeabilidade da árvore traqueobrônquica nos casos em que houver aumento de secreções (PORTO, 8ª ed.). ↠ A tosse da insuficiência ventricular esquerda é seca e mais intensa à noite, podendo ser muito incômoda. Sua causa é a congestão pulmonar; por isso, ela quase sempre está associada à dispneia (PORTO, 8ª ed.). Alterações do sono ↠ A insônia é um sintoma frequente nos pacientes com insuficiência ventricular esquerda (PORTO, 8ª ed.). 3 Júlia Morbeck – @med.morbeck Na insuficiência cardíaca grave, a insônia é acompanhada de excitação e obnubilação, alternando-se com períodos de sonolência e prostração. A causa é a estase sanguínea encefálica, com edema cerebral e hipertensão do líquido cefalorraquidiano, além de anoxia dos neurônios cerebrais, relacionada com a diminuição do fluxo sanguíneo cerebral (PORTO, 8ª ed.). ↠ Sono inquieto e pesadelos também podem ser observados na insuficiência ventricular esquerda (PORTO, 8ª ed.).Cianose ↠ Cianose significa coloração azulada da pele e das mucosas, em razão do aumento da hemoglobina reduzida no sangue capilar, chegando a 5 g por 100 m.. A quantidade normal de hemoglobina reduzida é de 2,6 g por 100 m (PORTO, 8ª ed.). ↠ A cianose central é a mais frequente, podendo ocorrer em decorrência do distúrbio na perfusão, ocasionada pela insuficiência ventricular direita grave (PORTO, 8ª ed.). Edema ↠ O edema é o resultado do aumento do líquido intersticial, proveniente do plasma sanguíneo (PORTO, 8ª ed.). ↠ Quando sua origem é cardíaca, encontram-se outros sinais de insuficiência ventricular direita, ou seja, ingurgitamento das jugulares, refluxo hepatojugular e hepatomegalia (PORTO, 8ª ed.). Astenia ↠ A astenia é uma sensação de fraqueza generalizada (PORTO, 8ª ed.). ↠ Nos pacientes com insuficiência cardíaca, a astenia relaciona-se principalmente com a diminuição do débito cardíaco e com oxigenação insuficiente dos músculos esqueléticos (PORTO, 8ª ed.). Sintomas Gastrointestinais (dor no quadrante superior direito, anorexia, saciedade precoce, ascite) ↠ O paciente pode apresentar um quadro de desnutrição devido a uma má absorção intestinal devido a uma congesto venosa no trato digestivo. ↠ Esses sintomas também estão relacionados a um quadro de hepatomegalia congestiva relacionada a insuficiência de câmaras direita. Sintomas Neurológicos (desorientação, distúrbios de humor e personalidade, alterações de sono-vigília) ↠ Esses sintomas estão relacionados ao baixo DC que gera uma má perfusão cerebral. Exame Físico ↠ É preciso se atentar a sinais alterados no paciente que falam a favor da fisiopatologia da IC. ECTOSCOPIA E SINAIS VITAIS ➢ Estado geral: avaliar o estado nutricional, peso corporal e aparência geral do paciente (varia com a gravidade do quadro). ➢ Buscar sinais de baixo DC, hiperatividade adrenérgica e vasoconstrição periférica: pele fria, sudorese, palidez cutânea, cianose de extremidades. ➢ Pulso: avaliar frequência, ritmo e qualidade. ➢ Pressão Arterial (PA): avaliar a pressão sistólica, diastólica e a pressão de pulso. A pressão de pulso pode ser calculada pela diferença entre a PA sistólica e a diastólica. Nos casos avançados de IC, essa pressão de pulso diminui muito. ➢ Frequência Respiratória (FR): em pacientes com queixas de dispneia ao repouso, teremos um aumento da FR (taquipneia). AVALIAÇÃO DAS VEIAS JUGULARES ↠ Essa veia jugular apresenta um ingurgitamento com o paciente inclinado em 45º, devido a um aumento da pressão venosa central. ↠ É um sinal de hipertensão venosa sistêmica, relacionado com a IC com comprometimento de câmaras direitas e congestão circulatória. 4 Júlia Morbeck – @med.morbeck IMPORTANTE: Essa hipertensão venosa sistêmica pode gerar edema, ascite, hepatomegalia. AUSCULTA PULMONAR ↠ Buscar crepitações pulmonares. Acontece em casos de IC de lado esquerdo e essa ausculta alterada indica a presença de líquido no interior dos alvéolos pulmonares. EXAME DO PRECÓRDIO ↠ Ictus cardíaco palpável abaixo do 5º espaço intercostal e à esquerda da linha hemiclavicular, devido à dilatação do VE. Portanto, ocorre dilatação desse ictus para baixo e mais lateralizado nos pacientes com IC (normalmente ele fica entre o 3º e o 4º EI). OUTRAS CARACTERÍSTICAS COMUNS: hipofonese de B1 (devido a uma perda da força contrátil de VE), presença de B3 e sopros cardíacos (decorrente de anormalidades valvares e comunicação das câmaras). ABDOME E EXTREMIDADES ↠ Fazer o exame em busca de ascite, hepatomegalia, icterícia e a presença de edema em membros inferiores. Insuficiência Cardíaca em Criança ↠ A síndrome clínica da IC resulta de uma incapacidade do coração em dispor de um retorno venoso adequado e/ou de proporcionar um DC e uma perfusão sistêmica capazes de manter a demanda metabólica (TRATADO DE PEDIATRIA, 4ª ed.). ↠ O quadro clínico na criança pode variar desde assintomático até o choque cardiogênico (TRATADO DE PEDIATRIA, 4ª ed.). ↠ Na maioria das vezes, a IC na criança é causada por cardiopatias congênitas, mas, em muitas situações, cardiopatias adquiridas podem acometer crianças em qualquer faixa etária e comprometer o desempenho cardíaco (TRATADO DE PEDIATRIA, 4ª ed.). Entre as cardiopatias congênitas, os defeitos septais com grande shunt esquerda-direita (p.ex., comunicação interventricular, defeito do septo atrioventricular, persistência do canal arterial), as cardiopatias obstrutivas do lado esquerdo (estenose aórtica, coarctação de aorta), as cardiopatias complexas (p.ex., ventrículo único), além das valvopatias congênitas, são as principais causas de IC na criança. Esse grupo de cardiopatias em geral se apresenta clinicamente no período neonatal e ao longo do 1º ano de vida (TRATADO DE PEDIATRIA, 4ª ed.). Por outro lado, as cardiopatias adquiridas, como as miocardites, as cardiomiopatias (dilatada, restritiva e hipertrófica) e as valvopatias adquiridas (doença reumática), geralmente se apresentam em uma idade mais avançada (pré-escolar e escolar) (TRATADO DE PEDIATRIA, 4ª ed.). CLASSIFICAÇÃO FUNCIONAL ↠ A classificação a seguir é da New York Heart Association (NYHA) modificada para crianças: (EMERGÊNCIAS EM PEDIATRIA, 3ª ed.). ➢ Classe 1: sem limitações para atividades habituais. Capaz de acompanhar crianças da mesma idade em atividades físicas escolares regulares. ➢ Classe 2: limitações leves a atividades físicas. Confortável no repouso, apresentando palpitações, taquicardia e cansaço quando realiza atividades físicas próprias para a idade, com moderado grau de dificuldade. Capaz de realizar atividades físicas escolares, porém não sendo capaz de acompanhar crianças da mesma faixa etária nessas atividades. Dificuldade de ganho de peso pode estar presente. ➢ Classe 3: limitações severas a atividades físicas. Incapacidade de realizar atividades habituais sem apresentar dispneia, taquicardia e cansaço. Não é capaz de realizar atividades físicas escolares 5 Júlia Morbeck – @med.morbeck regulares. Dificuldade de ganho de peso pode estar presente. ➢ Classe 4: incapacidade em executar qualquer atividade física sem desconforto. Sintomas em repouso com piora relacionada ao esforço físico. Dificuldade de ganho de peso evidente. CLASSIFICAÇÃO CLÍNICA ➢ Sistólica: sintomas de baixo débito sistêmico, com diminuição da fração de ejeção do VE. ➢ Diastólica: alterações no relaxamento do VE, com sintomas de congestão pulmonar e efusões serosas. ➢ Aguda: clinicamente, manifesta-se por instalação rápida com sinais e sintomas evidentes. ➢ Crônica: início mais lento, com melhor adaptação do organismo e sintomas mais bem tolerados. MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS ↠ O quadro clínico depende da faixa etária e os sintomas são menos específicos quanto menor a idade do paciente: (EMERGÊNCIAS EM PEDIATRIA, 3ª ed.). ➢ perda de peso, sudorese, palidez cutânea, astenia; ➢ edema de membros inferiores (MMII), ascite, derrame pleural, anasarca; ➢ taquicardia, pulsos finos, enchimento capilar aumentado, estase jugular; ➢ taquidispneia; ➢ vômitos e hemorragia digestiva alta (HDA); ➢ hepatomegalia; ➢ oligúria/anúria; ➢ agitação/sonolência; ➢ convulsões. ↠ Em recém-nascidos e lactentes, os sintomas são primariamente respiratórios e de dificuldade de alimentação, e nas crianças maiores os sintomas estão mais relacionados a intolerância às atividades físicas (TRATADO DE PEDIATRIA, 4ª ed.). ↠ Em lactentes, uma característica muito importante a ser observada é o padrão de alimentação. O aumento do tempo da mamada com redução do volume ingerido, associado a vômitos frequentes, irritabilidade e sudorese excessiva durante as mamadas, é frequente e acarreta uma redução do ganho ponderal e desnutrição (TRATADO DE PEDIATRIA, 4ª ed.).Referências CONSOLIM-COLOMBO et. al. Tratado de Cardiologia SOCESP, 4ª edição – Barueri – São Paulo: Manole, 2019. PORTO, CELMO C.; PORTO, ARNALDO L.. Semiologia Médica. 8ª edição. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2021. ROHDE et. al. Diretriz Brasileira de Insuficiência Cardíaca Crônica e Aguda. Arquivo Brasileiro de Cardiologia, 2018. BURNS et. al. Tratado de Pediatria: Sociedade Brasileira de Pediatria, 4ª ed. – Barueri, SP: Manole, 2017. LA TORRE et. al. Emergências em Pediatria: protocolos da Santa Casa, 2ª ed. – Barueri, SP: Manole, 2013.
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