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Autor: Prof. José Humberto Ataulo Nunes Colaborador as: Profa. Angela Maria Pizzo Profa. Christiane Mazur Doi Qualidade e Indicadores em Processos Logísticos Professor conteudista: José Humberto Ataulo Nunes Doutor e mestre em Comércio Internacional pela Universidade de São Paulo com pesquisas sobre a internacionalização das empresas brasileiras e sobre a integração financeira na América do Sul com utilização do sistema de moeda local (SML). Pós-graduado em Formação de Professores EAD pela Universidade Paulista (UNIP) e bacharel em Ciências Econômicas pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Ex-coordenador pedagógico do curso de Logística da UNIP, é professor titular nas áreas de Logística, Finanças e Economia nos cursos de Gestão Financeira e Administração de Empresas. Tem 22 anos de experiência em gestão empresarial em organizações multinacionais nas áreas de administração, operações e logística, como Basf, AkzoNobel, Arinos Química e Cromos Tintas. © Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta obra pode ser reproduzida ou transmitida por qualquer forma e/ou quaisquer meios (eletrônico, incluindo fotocópia e gravação) ou arquivada em qualquer sistema ou banco de dados sem permissão escrita da Universidade Paulista. Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) N972q Nunes, José Humberto Ataulo. Qualidade e Indicadores em Processos Logísticos / José Humberto Ataulo Nunes. – São Paulo: Editora Sol, 2022. 144 p., il. Nota: este volume está publicado nos Cadernos de Estudos e Pesquisas da UNIP, Série Didática, ISSN 1517-9230. 1. Qualidade. 2. Ferramentas. 3. Indicadores. I. Título. CDU 658.76 U516.14 – 22 Prof. Dr. João Carlos Di Genio Reitor Profa. Sandra Miessa Reitora em Exercício Profa. Dra. Marilia Ancona Lopez Vice-Reitora de Graduação Profa. Dra. Marina Ancona Lopez Soligo Vice-Reitora de Pós-Graduação e Pesquisa Profa. Dra. Claudia Meucci Andreatini Vice-Reitora de Administração Prof. Dr. Paschoal Laercio Armonia Vice-Reitor de Extensão Prof. Fábio Romeu de Carvalho Vice-Reitor de Planejamento e Finanças Profa. Melânia Dalla Torre Vice-Reitora de Unidades do Interior Unip Interativa Profa. Elisabete Brihy Prof. Marcelo Vannini Prof. Dr. Luiz Felipe Scabar Prof. Ivan Daliberto Frugoli Material Didático Comissão editorial: Profa. Dra. Christiane Mazur Doi Profa. Dra. Angélica L. Carlini Profa. Dra. Ronilda Ribeiro Apoio: Profa. Cláudia Regina Baptista Profa. Deise Alcantara Carreiro Projeto gráfico: Prof. Alexandre Ponzetto Revisão: Andressa Picosque Jaci Albuquerque Sumário Qualidade e Indicadores em Processos Logísticos APRESENTAÇÃO ......................................................................................................................................................9 INTRODUÇÃO ........................................................................................................................................................ 10 Unidade I 1 O QUE É QUALIDADE ...................................................................................................................................... 13 1.1 Origem e evolução da qualidade ................................................................................................... 14 1.2 Agenda ESG e a proposta de valor ................................................................................................ 16 1.3 Gurus da qualidade ............................................................................................................................. 18 1.4 Conceitos de qualidade...................................................................................................................... 19 1.5 Eras da qualidade ................................................................................................................................. 20 1.5.1 Inspeção ...................................................................................................................................................... 22 1.5.2 Controle estatístico ................................................................................................................................ 23 1.5.3 Garantia da qualidade .......................................................................................................................... 23 1.5.4 Controle de Qualidade Total (TQC) ................................................................................................... 24 1.6 Abordagens ............................................................................................................................................. 25 1.7 Atributos da qualidade ....................................................................................................................... 26 2 MATURIDADE E GESTÃO ............................................................................................................................... 27 2.1 Ambiente regulatório: especificações dos produtos e serviços ......................................... 30 2.2 Ambiente regulatório: defesa do consumidor .......................................................................... 33 2.3 Qualidade e logística ........................................................................................................................... 34 2.3.1 Logística de abastecimento ou suprimento ................................................................................. 35 2.3.2 Logística de produção ........................................................................................................................... 36 2.3.3 Logística de distribuição ...................................................................................................................... 36 2.4 Custos da qualidade ............................................................................................................................ 38 Unidade II 3 FERRAMENTAS BÁSICAS .............................................................................................................................. 48 3.1 Fluxogramas ........................................................................................................................................... 48 3.1.1 Diagrama de blocos ............................................................................................................................... 49 3.1.2 Fluxograma Ansi ...................................................................................................................................... 50 3.1.3 Fluxograma funcional ........................................................................................................................... 51 3.2 5W2H......................................................................................................................................................... 52 3.3 Método 5S ............................................................................................................................................... 53 3.4 Matriz de gravidade, urgência e tendência (GUT)................................................................... 54 3.5 Kaizen e melhoria contínua ............................................................................................................. 55 4 FERRAMENTAS DE INOVAÇÃO ................................................................................................................... 57 4.1 Brainstorming ........................................................................................................................................ 57 4.2 Análise Swot ........................................................................................................................................... 58 4.3 Benchmarking ........................................................................................................................................ 60 4.4 Ferramentas de análise e controle ................................................................................................61 4.4.1 Gráficos de controle de processos ................................................................................................... 62 4.4.2 Diagrama de Ishikawa (causa e efeito) .......................................................................................... 62 4.4.3 Diagrama de dispersão ......................................................................................................................... 63 4.4.4 Estratificação ............................................................................................................................................ 64 4.4.5 Lista de verificação ................................................................................................................................. 64 4.4.6 Diagrama de Pareto ............................................................................................................................... 65 4.4.7 Histograma ................................................................................................................................................ 66 4.5 Ciclo PDCA de melhoria contínua ................................................................................................. 67 4.6 Controle estatístico de processos (CEP) ...................................................................................... 69 4.7 Metodologia de análise e solução de problemas (Masp) ..................................................... 70 4.8 Ferramentas eletrônicas e digitais ................................................................................................. 71 4.8.1 Reclamações dos clientes .................................................................................................................... 72 4.8.2 Pesquisas de satisfação ........................................................................................................................ 74 4.8.3 Canais eletrônicos .................................................................................................................................. 75 4.9 Balanced scorecard (BSC) .................................................................................................................. 79 4.9.1 Mapa estratégico .................................................................................................................................... 81 Unidade III 5 QUALIDADE EM PRODUTOS E SERVIÇOS ............................................................................................... 89 5.1 Características dos serviços .............................................................................................................. 90 5.2 Integração entre produtos e serviços ........................................................................................... 91 6 NORMAS ISO E SERVIÇOS ............................................................................................................................ 92 6.1 Qualidade nas pequenas e médias empresas (PMEs) ............................................................. 93 6.2 Gestão da qualidade nas PMEs ....................................................................................................... 95 6.3 Liderança e qualidade de gestão .................................................................................................... 96 6.4 Qualidade ambiental ........................................................................................................................... 97 6.4.1 Sistema de gestão ambiental: norma brasileira (NBR) ISO 14001...................................... 98 Unidade IV 7 INDICADORES OPERACIONAIS .................................................................................................................105 7.1 Especificações dos indicadores .....................................................................................................105 7.2 Indicadores de processos: eficiência, eficácia e flexibilidade ...........................................106 7.3 Indicadores de satisfação dos clientes ......................................................................................109 7.4 Indicadores de gestão e desempenho ........................................................................................109 7.5 Indicadores de desempenho interno ..........................................................................................112 7.6 Indicadores de desempenho externo .........................................................................................113 8 NORMALIZAÇÃO E QUALIDADE ...............................................................................................................114 8.1 Classificação das normas internacionais ..................................................................................115 8.2 Sistemas de gestão da qualidade (SGQ)....................................................................................117 8.2.1 Objetivos e benefícios .........................................................................................................................118 8.3 A norma ISO 9001 ..............................................................................................................................119 8.4 Implantação da ISO 9001:2015 ....................................................................................................122 8.4.1 Certificações internacionais ISO 9001 ........................................................................................ 123 8.4.2 Acreditação............................................................................................................................................. 123 9 APRESENTAÇÃO Prezado(a) aluno(a), Bem-vindo(a) a esta disciplina, em que iremos compreender bem o que é qualidade hoje, com o objetivo de demonstrar a relevância do tema para as empresas e mercados que pensam os negócios a partir de benefícios e percepções que geram nos clientes, tanto na produção quanto nos serviços, na expectativa de que os conhecimentos colaborem com o seu desenvolvimento profissional. Quando falamos em qualidade, pensamos, como consumidores, em produtos modernos e eficazes com aplicação e uso garantido, mas nem sempre nos damos conta de que, para chegarem ao nosso alcance, existe uma vasta e complexa rede de empresas que os produzem e distribuem. Nosso objetivo é demonstrar como os procedimentos de qualidade se desenvolvem até alcançar os consumidores. Para isso, dividimos este livro de forma a permitir a você formar uma base sólida dos aspectos da qualidade e indicadores no contexto atual por meio de aplicações reais. Hoje, diversos mercados, áreas e indústrias são regulamentados, como os de alimentos embalados, brinquedos e produtos farmacêuticos, o que torna necessário que as empresas meçam e avaliem a qualidade para que esteja em conformidade com as normas legais e os padrões técnicos regulamentares. Contudo, na medida em que os produtos se tornam cada vez mais complexos e específicos, os requisitos de conformidade e qualidade começam a se sobrepor e se conectar, e mesmo o atendimento às regras mais exigentes não garante que os clientes irão escolher as empresas que atuam conforme os regulamentos e normas. As empresas, neste sentido, devem considerar que possuir uma política de qualidade moderna e ajustada aos padrões desenvolvidos não é apenas uma fonte de custos com aspectos regulatórios obrigatórios, mas apresenta um grande espaço para expandir os negócios de acordo com os padrões que os clientes desejam. Isso acontece quando as empresas integram a qualidade à cultura e à estratégia empresarial. Em um mercado competitivo e cada vez mais digitalizado, as empresas buscam se diferenciar através de soluções inovadoras para crescer de forma sustentável, entregando resultados de qualidade em um contexto em que as experiências dos consumidores estão condicionadas a uma cadeia de suprimentos e distribuição. Para sua qualificação profissional,vamos desenvolver a capacidade de avaliar e agir por meio da elaboração e utilização dos indicadores de desempenho logísticos ajustados ao modelo de negócios de cada setor. Com indicadores de qualidade, a gestão poderá atuar com maior eficiência e agilidade no cumprimento das metas setoriais, bem como colaborar no alcance dos resultados de forma efetiva. Esperamos que esta seja uma leitura proveitosa e interessante para o seu desenvolvimento. Vamos juntos e bons estudos. 10 INTRODUÇÃO Falar em qualidade é um fato comum na vida moderna, baseada em relações de consumo. Várias interpretações são atribuídas ao conceito, especialmente quando adquirimos algum produto ou serviço e o consideramos de bom padrão e utilidade dentro das nossas expectativas, remetendo principalmente as suas funções físicas. A base deste livro é a qualidade total desenvolvida no contexto empresarial, e de forma específica as atividades logísticas, que abrangem a movimentação de produtos e informações pertinentes entre as instalações de suprimentos, produção, distribuição e vendas em qualquer lugar do mundo por meio de processos operacionais, buscando oferecer soluções aos consumidores com eficiência e qualidade. Qualidade e logística andam juntas nas empresas e representam pilares estratégicos de sustentabilidade que precisam ser corretamente controlados e gerenciados através de indicadores de desempenho operacional ágeis e precisos, de forma a suportar a gestão e a execução das funções de maneira produtiva, entregando bons resultados. Estes desafios são grandes se considerarmos a dimensão atual dos mercados internacionais, a disseminação do comércio eletrônico e os diversos padrões de renda e consumo da população. Esses parâmetros estão interligados por diversas configurações entre a localização das instalações de produção e as de venda, que exigem gestão atenta e detalhada em função da necessidade de coordenar operações através de uma extensa cadeia de prestadores de serviços e pessoas. Figura 1 Disponível em: https://bityli.com/JXlpocZ. Acesso em: 22 jul. 2022. Nos últimos anos, porém, vemos que as atribuições centrais de mercado têm mudado, surgindo novas demandas da sociedade que afetam os serviços logísticos, como as questões ambientais e de responsabilidade social. Com essas novas exigências, as aplicações iniciais de qualidade se deslocam das características físicas para um produto em si que represente as empresas de forma mais ampla, com 11 reflexos na condução dos negócios, na gestão estratégica, na política comercial, na respeitabilidade da marca, nos serviços e na fidelização de clientes. Com isso em mente, este livro-texto contém quatro unidades. Na unidade I vamos conhecer os conceitos e as aplicações atuais da gestão da qualidade no ambiente empresarial e a evolução dos aspectos industriais para integração com os setores de serviços, e como a qualidade pode ser gerenciada de forma a impulsionar negócios e entregar experiências de valor aos clientes. Na unidade II abordaremos as tradicionais ferramentas da qualidade, que permitem aos gestores e operadores dos processos controlar suas tarefas de forma objetiva e prática, de modo a melhorar continuamente as atividades e obter resultados com base na qualidade total. Na unidade III, nosso foco será estudar as diferenças entre produtos e serviços e sua integração, assim como a implementação de gestão da qualidade especificamente em empresas de pequeno e médio porte. Por fim, na unidade IV consolidamos todas as ações e vamos ver como elaborar os indicadores de gestão que melhor se aplicam à empresa e seu modelo de negócio, através de uma série de parâmetros gerenciais de desempenho que dão suporte à liderança empresarial e apoiam a tomada de decisões. Finalizamos estudando os preceitos da normalização empresarial, com destaque para a implantação do sistema de gestão de qualidade por meio da norma ISO 9001 e como a certificação pode mudar a imagem da empresa no mercado. Ao final do livro-texto, ainda divulgamos em um Apêndice um glossário de qualidade que apresenta conceitos e definições dos principais temas abordados neste livro, e que esperamos que seja fonte de consultas para novos aprendizados desse tema atual e relevante para todos. 13 QUALIDADE E INDICADORES EM PROCESSOS LOGÍSTICOS Unidade I 1 O QUE É QUALIDADE Hoje, quando falamos em qualidade, partimos da premissa de que são os clientes que atribuem este valor às empresas com base nos seus produtos e serviços. Entendemos que esse conceito vai além dos atributos físicos do bem vendido (ser bonito, resistente, durável) e inclui experiências com outros aspectos, como canais de atendimento, satisfação pessoal, procedimentos financeiros e outros. Para isso, é necessário que as empresas saibam quem são seus clientes e o que desejam, de modo a resolver os seus problemas (SILVA, 2002). As experiências de consumo dos clientes são formadas a partir das suas percepções individuais, que podem ser afetadas por diversos aspectos, como ambiente, preço, atendimento, rapidez, entrega, acesso e tantos outros que as empresas precisam conhecer para demonstrar a qualidade ao consumidor. Vejamos na tabela 1 os principais pontos de percepção dos clientes com base nos papéis que exercem no consumo. Tabela 1 – Fator de qualidade por tipo de cliente Fator de qualidade Comprador Usuário Pagante Aparência X X Pontualidade X Confiabilidade X X Desempenho X Utilidade X Custo X Durabilidade X Adaptado de: Harrington (1997). Podemos notar que os pontos de percepção são mais contundentes quando os clientes assumem o papel de usuário final dos produtos e serviços, ou seja, quando têm uma experiência pessoal, que varia conforme o produto ou serviço adquirido. Como podemos concluir, são muitos os aspectos variáveis relacionados às percepções dos clientes, e as empresas precisam identificá-los e aplicá-los nos produtos através de ações de planejamento, execução, controle e correção baseadas em pesquisas de mercado, formulação de estratégias, treinamento, comunicação e melhorias dos processos (SILVA, 2002). 14 Unidade I 1.1 Origem e evolução da qualidade Na literatura empresarial, o tema da qualidade é um assunto tradicional que evoluiu com o tempo a partir das condições físicas de manufatura industrial. Hoje, é discutido em vários segmentos e abrange aspectos inerentes a todo o ambiente empresarial e social, com especial destaque para a prestação de serviços e as necessidades dos mercados. Atualmente, a importância da gestão da qualidade e dos processos vem da busca constante por competitividade e padrões de excelência, que obriga as empresas a garantir que seus produtos e serviços ofereçam a melhor experiência ao consumidor e sejam produzidos em conformidade com padrões técnicos eficientes e sustentáveis por meio de projetos de certificação internacional. Observação Clientes podem ser classificados em individuais (que consomem o que compram) e intermediários (que revendem o que compram). Como desempenham funções diferenciadas em relação ao modelo de negócios dos produtos ou serviços consumido a seguir as empresas precisam conhecer a segmentação do mercado. Para os serviços logísticos, envolvidos na execução de atividades intermediárias entre os locais de produção e os locais de vendas, a qualidade é uma questão de sobrevivência e não configura mais um diferencial, dado que já está incorporada ao mercado. Quem não respeita suas premissas não consegue se manter nos negócios. Na perspectiva dos gestores de todas as áreas das empresas, para atingir os resultados necessários conforme o plano estratégico e os requisitos de qualidade e para manter a sustentabilidade financeira futura, é preciso alcançar a melhor relação entre custos e benefícios. Isso é possível através do uso eficiente dos recursos disponíveis com um plano de ação integrada. Vamos conhecer um pouco da história do que hoje chamamos de qualidade. A partir do períodoque conhecemos como a Revolução Industrial inglesa, que teve início no século XVIII, o trabalho e a estrutura social foram reorganizados através do modelo econômico baseado nas indústrias. Cresceram o número de empresas e o consumo popular, ainda em seu estágio inicial, com o aumento da oferta dos produtos para a população trabalhadora (COSTA NETO; CANUTO, 2010). 15 QUALIDADE E INDICADORES EM PROCESSOS LOGÍSTICOS Figura 2 – Revolução Industrial inglesa Disponível em: https://bityli.com/eAScnpJ. Acesso em: 26 jul. 2022. Com a ampliação das quantidades produzidas nesse modelo inovador, observou-se que parte do volume confeccionado apresentava erros de fabricação. Esses produtos com falhas precisavam ser separados dos lotes de boa qualidade e retornar aos processos ou serem descartados. A expansão das indústrias manufatureiras pelo mundo mudou os objetivos das empresas, que começaram a se adaptar a uma nova estrutura organizacional com foco nos processos de produção. Esse modelo previa a compra de máquinas para produzir grandes lotes de produtos padronizados sem muitas preocupações com a qualidade final. A partir desta situação, as indústrias começaram a identificar a necessidade de efetuar um controle corretivo através da inspeção de qualidade, desenvolvendo métodos de averiguação, separação e descarte dos lotes que não atendessem às especificações esperadas (COSTA NETO; CANUTO, 2010). Com a introdução dos inspetores de processos na década de 1920, começa a fase do controle de qualidade (CQ), com maior ênfase na redução dos defeitos e descarte de produtos falhos. Cresce nessa fase a preocupação com temas como custos e produtividade. Entre as décadas de 1960 e 1980, nota-se um grande progresso dos conceitos e aplicações práticas com o crescimento das empresas japonesas, que desenvolveram novos processos de cunho fabril, principalmente no que concerne à questão da qualidade. Identificou-se uma alteração no foco do tema, que evoluiu com a exigência de produtos melhores por parte dos consumidores, levando os procedimentos de qualidade a deixar os aspectos relativos à inspeção dos processos para elaborar os conceitos de melhoria contínua do CQ e de qualidade total. Em 1987 a International Organization for Standardization (ISO) criou na Europa a norma da ISO 9000 – regulamentada no Brasil pela Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT) –, representando um marco para os assuntos relativos à gestão da qualidade que se disseminou nos mercados internacionais. 16 Unidade I Na década de 1990, com a abertura dos mercados pela globalização e o aumento da concorrência, o tema da qualidade ganha relevância estratégica, e sua abordagem se resume em novas premissas: • o foco dos processos e produtos são os clientes, que avaliam se suas necessidades e expectativas estão sendo atendidas; • a satisfação é conseguida durante a vida útil do produto, e não apenas na aquisição; • a avaliação final dos clientes considera outros requisitos para proporcionar o máximo de satisfação. Após esta fase, as indústrias notaram que a qualidade pode ser um diferencial competitivo de mercado, aumentando sua participação ao adotar avaliações técnicas, melhorar processos e gerar inovação e excelência (SILVA, 2002). Para Marshall Junior et al. (2012), a abordagem estratégica se desenvolveu a partir de diversos aspectos, sendo um deles a constatação de que são os clientes que definem se os produtos atendem às suas necessidades e expectativa, e não as empresas. 1.2 Agenda ESG e a proposta de valor A crescente preocupação mundial nos últimos anos com a degradação ambiental, a inclusão social e a redução de desigualdades socioeconômicas atingiram o meio empresarial com o interesse pela qualidade de vida e a sustentabilidade dos negócios dentro do ecossistema de atuação. Esta agenda surgiu em 2004 com a publicação Who cares wins, elaborada pelo Pacto Global da ONU em parceria com o Banco Mundial (UN GLOBAL COMPACT, 2004). Esse relatório disseminou os conceitos conhecidos como ESG (do inglês environmental, social and governance, referindo-se, em português, às questões ambientais, sociais e de governança) e vem despertando amplo interesse entre as empresas e a sociedade como resposta do setor privado aos desafios de geração de valor econômico como forma de demonstrar responsabilidade e comprometimento. Esse plano apresenta diretrizes próprias que avaliam os aspectos: • ambiental, abrangendo gestão de resíduos, desmatamento, uso de energia renovável, procedimentos para eliminar a poluição, logística reversa e biodiversidade; • social, envolvendo políticas de contratação e inclusão social, direitos humanos, diversidade e minorias, privacidade e proteção de dados e relações trabalhistas; • governança, que possui uma forte identificação com os assuntos de qualidade, com foco no modelo de gestão e atenção com as partes interessadas na empresa, destacando-se ações de transparência financeira e contábil, relatórios financeiros, remuneração dos acionistas, composição de diretorias, integridade, práticas anticorrupção e gestão de riscos. As empresas que se destacam dos concorrentes nos aspectos de qualidade e atendimento conseguem melhores resultados e participação no mercado em função da credibilidade que transmitem aos consumidores. Essas companhias transformam seus produtos em símbolo de excelência através da 17 QUALIDADE E INDICADORES EM PROCESSOS LOGÍSTICOS cultura e do marketing, fazendo com que a qualidade deixe de ser uma forma de reduzir custos para se incorporar ao modelo de geração de valor e negócios (CARPINTERO et al., 2021). Conforme os critérios do Modelo de Excelência da Gestão da Fundação Nacional da Qualidade (FNQ), os processos da cadeia de valor envolvem: • atendimento dos requisitos dos produtos; • desenvolvimento de projetos; • novas tecnologias e novos produtos; • criatividade e inovação; • qualidade e benchmarking (FNQ, 2011). Além disso, o envolvimento das empresas com a qualidade em seus processos e produtos refere-se não somente aos aspectos de mercado e de atendimento das necessidades dos clientes, mas também aos aspectos regulatórios e às normas legais brasileiras estabelecidas pelo Instituto Nacional de Metrologia, Qualidade e Tecnologia (Inmetro) e pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Essas entidades regulamentam os padrões de conformidade técnica na fabricação, segurança e validade, bem como as práticas comerciais. Saiba mais A inclusão dos fatores sociais, ambientais e de governança está mudando os planos estratégicos das empresas. Leia o relatório Who care wins, elaborado pelo Pacto Global da ONU em 2004, que deu início à discussão dos aspectos ESG: UN GLOBAL COMPACT. Who cares wins: connecting financial markets to a changing world. New York: UN Global Compact, 2004. Disponível em: https://bit.ly/3OC32qv. Acesso em: 27 jul. 2022. Lembrete ESG é uma sigla em inglês (environmental, social and governance) que defende que os negócios devem ser avaliados não só por critérios de mercado (rentabilidade e competitividade), mas por atributos ambientais, sociais e de governança (BELINKY, 2022). 18 Unidade I 1.3 Gurus da qualidade Destacamos no quadro a seguir alguns pioneiros da qualidade que desenvolveram seus trabalhos e disseminaram o conceito a partir dos modelos industriais. Quadro 1 Pioneiros Abordagem P. Crosby Conformidade; zero defeito; motivação das pessoas W. Deming Satisfação por preço acessível; melhoria contínua; ciclo plan, do, check, act (PDCA) A. Feigenbaum Controle por todos do desenvolvimento e melhoria da qualidade K. Ishikawa Garantia da qualidade com foco no cliente J. Juran Adequação ao uso; papel do cliente e do consumidor G. Taguchi Estatística e qualidade; design de novos produtos Adaptado de: Contador (1997). Também Walter Shewhart foi um especialista importante nesse campo. Idealizou a ferramenta da qualidade chamada carta de controle, que depois ficou conhecidacomo controle estatístico de processos (CEP), que avalia as variações que um produto pode apresentar sem que seja avaliado como defeituoso. Shewhart defendeu que o setor de qualidade deve monitorar todo o processo industrial, corrigindo falhas no decorrer da produção. William Deming desenvolveu o conhecido método PDCA a partir do método CEP de Shewhart. Elaborou também as bases do conceito de melhoria contínua, em que os gestores desenvolvem ações que devem ser acompanhadas periodicamente para reduzir a ocorrência de erros. Atuou no Japão após a Segunda Guerra Mundial, desenvolvendo testes estatísticos de qualidade e os métodos e análises de variantes; ficou conhecido como o estrangeiro que mais contribuiu com a recuperação industrial japonesa. Joseph Juran desenvolveu métodos técnicos de controle estatístico de qualidade nos Estados Unidos, e após a Segunda Guerra foi trabalhar com Deming no Japão, onde exerceu a profissão de consultor e criou a trilogia Juran, que consiste na análise da qualidade em três etapas: • planejamento: etapa que prioriza a qualidade que o produto deve oferecer e a criação de meios para alcançar esse resultado; • controle: fase que identifica defeitos e avalia métodos de controle e melhoria; • aperfeiçoamento: etapa que define ações para melhorar a qualidade cada vez mais. Kaoru Ishikawa, por sua vez, atuou como gestor de qualidade na Nissan Company. Traduziu os princípios do controle estatístico para o japonês e criou o diagrama de causa e efeito para ser usado por pessoas sem conhecimento na área, com as funcionalidades da melhoria de processos e identificação 19 QUALIDADE E INDICADORES EM PROCESSOS LOGÍSTICOS das casas. Criou com outros estudiosos os círculos da qualidade, que consistiam em reunir grupos de gestores da mesma área da empresa para discutir como aperfeiçoar a qualidade final. Armand Feigenbaum atuou como gestor da qualidade na General Electric e desenvolveu o Controle de Qualidade Total (TQC, na sigla em inglês), que responsabiliza todos os funcionários pela qualidade dos produtos, afirmando a dificuldade de atingir elevados padrões sem a integração de todas as áreas. Desenvolveu o método dos 9M, que aponta nove fatores que, se não forem considerados, podem comprometer a qualidade dos processos: dinheiro, gerência, pessoas, mercados, motivação, materiais, máquinas, métodos e montagem. Já Philip Crosby desenvolveu a teoria do zero defeito, que afirmava que o objetivo principal das empresas é garantir a entrega de produtos com elevados padrões de qualidade, o que poderia ser alcançado através de prevenção e antecipação de defeitos. Os pioneiros que elaboraram a fundamentação técnica e as premissas da qualidade surgiram entre as nações líderes do desenvolvimento industrial e tecnológico, como os Estados Unidos e o Japão, com uma visão de melhoria dos processos industriais. Essas bases evoluíram para os conceitos de qualidade total e hoje estão consolidadas no meio empresarial e social através da gestão estratégica da qualidade. 1.4 Conceitos de qualidade Até os anos 1950, o conceito de qualidade esteve ligado à economia industrial como sinônimo de perfeição técnica produtiva adequada a um padrão técnico estabelecido conforme os objetivos desejados. A partir dos trabalhos de Joseph Juran e William Deming, realizados em indústrias japonesas, como a Toyota, as aplicações desse conceito passam a enfocar não apenas as especificações técnicas dos produtos, mas a prestação de serviços aos clientes atendidos de acordo com os requisitos desejados (MELLO et al., 2011). Vejamos alguns conceitos diferenciados de pesquisadores que demonstram a evolução do termo qualidade: • qualidade é a condição necessária de aptidão para o fim a que se destina (ORGANIZAÇÃO EUROPEIA PARA A QUALIDADE, 1972 apud CASAS, 2020); • qualidade é o grau de ajuste de um produto à demanda que pretende satisfazer (JENKINS, 1981 apud CASAS, 2020); • qualidade é adequação ao uso (JURAN, 1991 apud CASAS, 2020); • qualidade é propriedade, atributo ou condição das coisas ou pessoas capaz de as distinguir das outras e lhes determinar a natureza, numa escala de valores (FERREIRA, 1994 apud CASAS, 2020); • qualidade é um produto que atende perfeitamente – de forma confiável, acessível e no tempo certo – às necessidades dos clientes (CAMPOS, 1992 apud CASAS, 2020). 20 Unidade I Podemos notar que os pesquisadores desenvolveram o conceito a partir de considerações sobre os atributos internos das empresas e inerentes aos produtos industrializados, evoluindo para atributos externos, voltados ao atendimento aos clientes, que resultam na gestão da qualidade total aplicada a todas as áreas organizacionais da empresa (MELLO et al., 2011). Hoje, as empresas incorporaram às práticas de qualidade ferramentas como pesquisa de campo e avaliação dos consumidores em comparação com os produtos dos concorrentes. Esses instrumentos ajudam a identificar ações de diferenciação e inovação que demandam atenção constante às mudanças no comportamento dos clientes e dos concorrentes. Para Marshall Junior et al. (2012), a partir dessa situação desafiadora, ampla e complexa, podemos propor o conceito de qualidade em outras dimensões além das de desempenho e conformidade tradicionais, como a de confiabilidade, durabilidade, atendimento, estética e qualidade percebida pelo mercado em um contexto de participação coletiva em busca de resultados e entregas. 1.5 Eras da qualidade A qualidade dos produtos é parte da qualidade da gestão das empresas, que precisam criar diferenciais competitivos, dos quais o reconhecimento da eficiência de seus produtos e serviços é parte integrante. Neste sentido, a gestão da qualidade é composta de um conjunto de elementos que garantem que as atividades organizadas aconteçam conforme o planejado, permitindo ações preventivas e corretivas de desempenho com ferramentas de gestão e controle e com a participação de todos (CROSBY, 1979). Hoje, com a ampliação do foco para o conceito de qualidade total, as empresas estenderam as premissas da gestão da qualidade para todos os processos organizacionais, como vendas, compras, produção, marketing, manufatura, fornecedores e logística, integrando-os (SILVA, 2002). Vejamos a seguir algumas definições específicas de qualidade associada a diversos fatores: • qualidade do design: fundamenta-se na identificação dos desejos e necessidades dos clientes e na adaptação dos produtos a essas expectativas, com inovação e criatividade para novas experiências; • qualidade dos processos: baseada nos processos de manufatura e logística dimensionados para as necessidades do mercado conforme as especificações técnicas e os pedidos comerciais; • qualidade de atendimento: é adquirida a partir do contato com os clientes, através de experiências positivas e dentro das expectativas; • cultura organizacional: qualidade alcançada através do direcionamento que parte da liderança e se espalha por todas as equipes, envolvendo nos processos as atitudes individuais. 21 QUALIDADE E INDICADORES EM PROCESSOS LOGÍSTICOS O quadro a seguir resume a evolução do conceito de qualidade: Quadro 2 – Evolução do conceito de qualidade Conceitos Período Foco Princípios Pontos fracos Ferramentas Adequação ao padrão Anos 1950 Controle do produto Avaliar produto com padrão (gabarito) Corrigir eventuais desvios Inspeção não melhora qualidade Retrabalho e rejeições Inspeção 100% Adequação ao uso Anos 1960 Controle do produto Evitar insatisfação dos clientes Rejeitar produtos fora do padrão Riscos para o cliente final Conflitos entre áreas funcionais Inspeção por amostragem Adequação ao custo Anos 1970 e 1980 Controle do processo Processos estáveis Redução da variabilidade Pode ser copiado por empresas com custos mais baixos Controle estatístico de processos Ferramentas básicas da qualidade Adequação às necessidades latentes Anos 1980 e 1990 Qualidade no projeto do produtoe do processo Satisfação de todos os interessados Ênfase no projeto do produto e do processo Exige muita rapidez e alta flexibilidade Desdobramento da função qualidade Delineamento de experimentos Método de Taguchi Fidelização dos clientes Anos 2000 até hoje Qualidade no projeto do produto e do processo Satisfação do cliente final Conquista da fidelidade A expectativa criada deve ser igual à qualidade percebida Exige comunicação rápida, sistemática e eficiente Necessita de disposição para planejar Ferramentas de análise de riscos Fonte: Berssaneti e Bouer (2013, p. 24). Com a evolução do conceito, além das especificações técnicas dos produtos, os processos que fazem parte do ecossistema de qualidade total foram incorporados de forma a aprimorar e acompanhar as transformações dos mercados, que são radicais e disruptivas. A gestão da qualidade é uma prática administrativa de negócios que vai além das características físicas. Pode ser definida como um conjunto de ações e procedimentos que conduzem as empresas a uma configuração focada no atendimento das necessidades e expectativas dos clientes (COSTA NETO; CANUTO, 2010). Lembrete Gestão é a capacidade de fazer o que tem que ser feito, e qualidade em gestão é a capacidade de obter a melhor relação entre recursos, ações e resultados de forma concreta. 22 Unidade I O quadro a seguir apresenta as principais fases técnicas do desenvolvimento da qualidade industrial: Quadro 3 – Eras da qualidade Era Características Inspeção Início do século XX, com foco na conformidade do produto com padrão e inspeção do produto final Controle estatístico Década de 1940, com foco na inspeção de lotes por amostragem em setores específicos de controle e ferramentas estatísticas de desvio padrão Garantia da qualidade Década de 1970, com foco na prevenção de defeitos, envolvimento de toda a empresa e criação dos sistemas de qualidade e qualidade total Qualidade total Década de 1980, com foco na gestão da empresa e nos serviços aos clientes; surgimento das normas ISO Adaptado de: Mello et al. (2011). Como podemos notar no quadro, o contexto original do termo qualidade é a manufatura industrial nos anos 1920, que se difundiu nas fábricas dos países industrializados. A seguir, vamos conhecer um pouco mais de cada fase da evolução tecnológica e empresarial das aplicações da qualidade. 1.5.1 Inspeção A etapa inicial dos processos industriais envolvia a inspeção dos produtos fabricados, visando identificar aqueles que não atendessem às especificações técnicas. Essa inspeção era realizada por profissionais contratados em laboratórios construídos para testar e aprovar tecnicamente os lotes quanto aos requisitos. Essas avaliações começam a ser realizadas antes da comercialização dos produtos, com o uso de modelos padronizados de verificação das especificações técnicas para remover e reprocessar, quando possível, as peças reprovadas. Quadro 4 – Inspeção da qualidade Características da qualidade Descrição Período Décadas de 1910, 1920 e 1930 Objetivo Detecção de não conformidades Preocupação básica Verificação; um problema a ser resolvido Ênfase Uniformidade do produto Métodos Inspeção da produção e medição Papel dos profissionais Inspeção, classificação e avaliação Quem é o responsável pela qualidade Departamento de Inspeção Orientação Em direção ao produto Caráter ou base de atuação Técnico Abordagem ou enfoque Inspeção, comprovação da qualidade Funções comprometidas Produção e controle do produto acabado Adaptado de: Toledo et al. (2012). 23 QUALIDADE E INDICADORES EM PROCESSOS LOGÍSTICOS 1.5.2 Controle estatístico Com a disseminação da tecnologia de produção industrial baseada em linhas de montagem e a expansão dos mercados consumidores, desenvolve-se o controle estatístico de qualidade utilizando procedimentos como a amostragem, em que algumas peças produzidas são retiradas de cada lote e testadas quanto à conformidade com as especificações. A partir do desenvolvimento estatístico amostral, as indústrias começaram a estabelecer setores dedicados à qualidade e contratar profissionais especializados no controle dos produtos finais. Esses especialistas deviam localizar os produtos com desvios em relação ao desejado, quantificando-os e apurando as origens da falha com foco na melhoria dos processos produtivos. Vejamos no quadro a seguir as principais características dessa era do CQ: Quadro 5 – Controle estatístico da qualidade Características da qualidade Descrição Período Décadas de 1940 e 1950 Objetivo Controle de processo de fabricação Preocupação ou visão Controle; um problema a ser resolvido Ênfase Produto uniforme com menos inspeção Métodos Instrumentos e técnicas estatísticas Papel dos profissionais Solução de problemas; avaliação por meios estatísticos Quem é o responsável pela qualidade Departamento de produção e engenharia Orientação Em direção ao processo Caráter ou base de atuação Técnico Abordagem ou enfoque Controle da qualidade Funções comprometidas Fabricação do produto e processos Adaptado de: Toledo et al. (2012). 1.5.3 Garantia da qualidade Esta etapa é atribuída aos japoneses da Toyota dos anos 1960 em sua busca por excelência na gestão fabril, com fábricas de elevado padrão e sem perdas e refugos industriais. Seus sistemas de qualidade disseminaram o conceito de melhorias contínuas ou kaizen, que envolvem todas as áreas e colaboradores por meio de uma cultura de erro zero, em que os custos da má qualidade são avaliados de forma proativa para eliminar o defeito antes da produção (ARAUJO; GARCIA; MARTINES, 2011). A garantia da qualidade representa a soma de todos os esforços da empresa em atender aos padrões de utilização e deve incluir os aspectos de pós-venda, como garantia de produtos, atualizações e assistência técnica ou devolução em caso de defeitos, com oferta de peças de reposição e manutenção. 24 Unidade I 1.5.4 Controle de Qualidade Total (TQC) O TQC também surgiu no Japão na década de 1960, na empresa Toyota, e difundiu-se para o ramo de autopeças e eletrônica, levando o modelo japonês a ser reconhecido como padrão de excelência. Na década de 1970, a General Motors, indústria ocidental do ramo automotivo, desenvolveu o modelo conhecido como qualidade total, com foco não mais nas necessidades coletivas dos consumidores americanos, mas nas necessidades individuais de cada cliente e na melhoria dos processos fabris. A empresa mudou seu perfil de produção do modelo fordista – de produção em massa, padronizada –, refreando o foco na redução de falhas e defeitos e adotando um diferencial para criar valor e novas experiências aos consumidores. Nos anos 1980, com o avanço da economia japonesa, a TQC passou a receber mais atenção dos estudiosos de sistemas de produção. Isso universalizou essa filosofia, que foi implantada com sucesso no mundo ocidental. Quadro 6 – Qualidade total Característica Descrição Liderança e apoio da alta direção Liderar o processo de mudança, ser exemplo e motivar a força de trabalho. Estimular práticas e abordagens direcionadas à gestão da qualidade total Relacionamento com os clientes Concentrar as atividades nos clientes e estabelecer canais de comunicação visando entender suas necessidades e níveis de satisfação Gestão da força de trabalho Aplicar os princípios da gestão de recursos humanos, com base em um sistema de trabalho em equipe com empoderamento, recrutamento e seleção, capacitação e treinamento Relação com os fornecedores Selecionar e qualificar fornecedores e medir seu desempenho em relações de longo prazo, visando à colaboração e à melhoria da qualidade Gestão por processos Definir os processos-chave da organização, promover práticas preventivas e autoinspeção, utilizando planos de controle e métodos estatísticos na produção Projeto de produto Envolver todas as áreas funcionais no processo de desenvolvimento de produto de modo que o resultado satisfaça os requisitosdos clientes Fatos e dados da qualidade Disponibilizar informações relativas à qualidade como parte de um sistema de gestão transparente com registros e indicadores de refugo, retrabalho, dados de garantia e custos Adaptado de: Carvalho e Paladini (2012). O modelo de TQC que se difundiu mundialmente e conferiu aos produtos industriais japoneses a reputação de qualidade assegurada concentra-se na identificação, análise e solução de problemas (pois problema é perda de qualidade) e no método produtivo conhecido como just in time, com conceitos de zero estoque e confecção sob encomenda (depois da venda) em todas as etapas do processo de produção. 25 QUALIDADE E INDICADORES EM PROCESSOS LOGÍSTICOS Observação Problema é o desempenho indesejado de um processo, produto ou serviço. O TQC baseado no modelo japonês difundiu-se com os objetivos de satisfazer as necessidades dos clientes, eliminar desperdícios, promover melhorias contínuas e envolver as pessoas com as seguintes ações: • produção orientada pelo cliente; • lucro pelo domínio da qualidade; • priorizar as ações apoiadas em fatos; • controle do processo; • responsabilidade na fonte; • controle do fluxo de produção sem falhas de padronização. 1.6 Abordagens Para Marshall Junior et al. (2012), existem vários conceitos e definições sobre o tema da qualidade, que podem ser divididos em cinco abordagens principais: • transcendental: qualidade é excelência e marca, e deve ser reconhecida por todos; • baseada no produto: qualidade é uma variável precisa e pode ser medida com base nas especificações e utilidade dos produtos; • baseada no usuário: qualidade é uma questão subjetiva, conforme a avaliação de cada cliente, e podem variar em custos e satisfação pessoal; • baseada na produção: qualidade é precisa e pode ser medida conforme a aderência aos padrões esperados; • baseada no valor: qualidade corresponde a uma combinação de níveis variáveis de qualidade e preços por meio de trade-offs possíveis. As abordagens oscilam entre a subjetividade (grau individual de avaliação e percepção da qualidade) e a objetividade (grau definido de padrão de qualidade conforme especificações). Elas podem comportar diversos níveis combinados de avaliações, pois a qualidade é um fator individual conforme as necessidades e expectativas de cada consumidor, que avalia o que considera de melhor qualidade. 26 Unidade I Neste sentido, existe uma divisão entre as empresas sobre o uso dos sistemas de gestão da qualidade (SGQ) conforme as condições dos mercados em que atuam. Uma parte dos gestores comanda seus processos em função do momento presente e das condições competitivas dos mercados, sendo por isso pressionada por maior produtividade, eficiência, resultados e empenho em inovações em produtos e processos (PALADINI, 2009). A necessidade de manterem-se competitivas e sustentáveis no mercado obriga as empresas a promover mudanças frequentes, através do uso de novas tecnologias, e a desenvolver novos produtos e estruturas organizacionais com modelo de negócios em redes, envolvendo parceiros e equipes de trabalho em formatos de comando mais horizontais. Ressalta-se que as empresas precisam do comprometimento dos funcionários com seus objetivos. Concluímos esta parte conceitual recomendando que cada empresa deve elaborar sua política de qualidade a partir das peculiaridades dos seus processos, produtos e mercados, de forma a unir procedimentos e responsáveis em uma única direção e estratégia de qualidade. Quadro 7 – Eras da qualidade Etapa Interesses Visão Ênfase Métodos Responsável Inspeção Verificação Problema a resolver Produto uniforme Inspeção Departamento de Inspeção CEP Controle Problema a resolver Padrão uniforme Técnica estatística Departamento de Produção e Engenharia Garantia da qualidade Coordenação Problema a resolver, mas de modo proativo Cadeia de produção Programas e sistemas Todos os departamentos Gestão da qualidade Impacto estratégico Diferenciar da concorrência Necessidade de mercado Estratégia Todos da empresa Adaptado de: Carvalho e Paladini (2012). 1.7 Atributos da qualidade Entre os aspectos da qualidade que se estabelecem entre empresas e consumidores estão aqueles que correspondem aos requisitos configurados em um relacionamento comercial de longo prazo, baseados nos aspectos mais valorizados, além das práticas comerciais, em que destacam as demandas dos clientes (SELEME; STADLER, 2010). Alguns desses atributos fundamentais referem-se a: • moral, que envolve a ação das empresas e avalia as condições em que os funcionários trabalham e desenvolvem suas tarefas segundo os critérios de qualidade, entrega, custo e segurança; • qualidade, que engloba aspectos funcionais e especificações dos produtos conforme o que os clientes querem como experiência de consumo; 27 QUALIDADE E INDICADORES EM PROCESSOS LOGÍSTICOS • entrega, que pode ser um ponto de má avaliação, visto que os clientes desejam receber os pedidos de compras no local e hora esperados; • custos, que se relacionam à renda familiar e são decisivos na escolha entre concorrentes; • segurança, que envolve os aspectos técnicos de uso e aplicação e considera como os produtos são produzidos. Saiba mais Sobre a evolução da qualidade no Brasil, leia: FERNANDES, W. A. O movimento da qualidade no Brasil. Duque de Caxias: Inmetro, 2011. 2 MATURIDADE E GESTÃO As empresas nascem e evoluem em estágios de maturidade organizacional, e com o decorrer do tempo desenvolvem-se em relação às questões da qualidade conforme a estrutura de mercado em que atuam e a maturidade da administração. Neste sentido, o caminho da excelência não é uma linha reta e de resultado rápido, mas um percurso repleto de dificuldades que são superadas com constância de propósitos e mobilização das competências, que igualmente evoluem em estágios de maturidade conforme o tempo de mercado (FNQ, 2011). Os níveis de maturidade apontam o grau de adoção dos preceitos da gestão da qualidade e podem ser classificados em quatro estágios: iniciante, intermediário, avançado e excelente. Nível de maturidade Excelência Rumo à excelência Compromisso com a excelência Tempo e esforço Classe mundial Implementando as práticas de gestão Estado da arte Figura 3 – Etapas de maturidade empresarial Adaptado de: FNQ, 2009 (p. 6). 28 Unidade I Vamos avaliar os níveis de maturidade das empresas em relação ao tema da qualidade: • estágio 1: a empresa explora suas atividades sem determinar um mix de distribuição específico, está focada no atendimento aos clientes pelo menor custo possível e adota as ferramentas de inspeção da qualidade; • estágio 2: a empresa desenvolve os conceitos de gestão da qualidade e procura finalizar os produtos dentro das suas instalações, centralizando sua comercialização e distribuição; • estágio 3: a empresa busca a qualidade total entre as diversas áreas internas com objetivos de integração e foco na prestação de serviços aos clientes; • estágio 4: a empresa busca a integração estratégica e inclui todos os colaboradores com vistas à competitividade, abandona as operações isoladas e adota um modelo de negócios com foco na excelência e em resultados que proporcionam novas experiências aos clientes. Exemplo de aplicação O processo de transformação da abordagem de qualidade de uma empresa de logística global ilustra o nível de comprometimento necessário. Anteriormente, o foco da empresa era a entrega rápida (um objetivo que havia alcançado em grande parte), mas os clientes cada vez mais olhavam para outros fatores, como a precisão dos prazos de entrega previstos – a velocidade não era necessariamente útil se uma encomenda chegasse antes que o cliente estivesse pronto para recebê-la. A ascensão da economia digital significava que as entregas estavam se tornando mais complexas: menos entregas grandes para armazéns e lojas de varejo e mais entregas muito pequenas para um grande número de endereçosresidenciais. E, ainda, o mundo exigia não apenas alta qualidade, mas liderança de qualidade. Toda a empresa, desde a diretoria até os motoristas, mergulhou em sessões de capacitação para entender as razões competitivas para a maior qualidade e suas implicações para o trabalho diário. Foram implementados métodos de solução de problemas que permitiam aos funcionários identificar novas maneiras de atender os clientes, com novas tecnologias de roteirização que minimizavam a chance de erro para permitir a reestruturação por atacado das práticas de entrega. O resultado foi um grande aumento na satisfação dos clientes e um crescimento renovado (CARPINTERO et al., 2021). Conclusão: o caso demonstra como as questões de qualidade evoluem nas empresas, e que a determinação de implantar melhorias pode gerar bons resultados. Vejamos um pouco mais sobre o tema da maturidade e qualidade, agora com os modelos de maturidade dos SGQ desenvolvidos por Crosby (1979), que sistematizou o comportamento das empresas com a qualidade em cinco níveis evolutivos, do menor para o maior. 29 QUALIDADE E INDICADORES EM PROCESSOS LOGÍSTICOS Observação Maturidade é o processo no qual a empresa adquire habilidades específicas e alcança objetivos de forma crescente e gradativa, decidindo investir em qualidade para gerar um diferencial qualitativo e ser reconhecida no mercado de excelência de gestão. Segundo a escala desenvolvida por Crosby (1979), os estágios evolutivos dos SGQ são: • Incerteza: a liderança da empresa não considera a qualidade como um fator positivo, julgando-a pouco relevante. As não conformidades são normais, não há um método de ação e os custos da não qualidade não são medidos. Todos trabalham muito, mas se sentem frustrados por conta do grande esforço para manter a operação. • Despertar: a liderança começa a perceber que a qualidade é importante, mas não está disposta a investir. Geralmente, é nomeado um responsável para acompanhar a inspeção e os testes finais, que são realizados com frequência. Os problemas da qualidade são identificados de maneira mais preventiva, o que diminui a taxa de retrabalhos e dá mais liberdade para as pessoas trabalharem em melhorias. Os problemas reincidentes são relacionados e entregues às equipes operacionais, mas sem soluções em longo prazo, e as pessoas voltam a fazer o que faziam sem um compromisso com as melhorias contínuas. • Esclarecimento: a empresa se compromete a ter um programa de melhoria da qualidade, com uma equipe organizada que comanda as mudanças com capacidade e recursos próprios. O custo da qualidade começa a ser apurado e as melhorias começam com ações de conscientização. O trabalho visa sistematizar os comportamentos das equipes, mas ainda existem problemas. • Sabedoria: os resultados são visíveis, notando-se reduções nos custos de desperdício. Os problemas são enfrentados quando surgem e a empresa concretiza mudanças permanentes, mas convive com o risco de se acomodar no novo patamar e reduzir os esforços de continuar evoluindo. • Certeza: a empresa sabe que a qualidade é parte vital da estratégia, com foco nas ações de prevenção, e quem lidera a área faz parte da direção. Os custos são reduzidos e as equipes de trabalho atuam em inovações. Conforme Carla (2020), é por meio destes estágios que as empresas evoluem, passam a incorporar qualidade e produtividade, melhoram o relacionamento com os clientes e apresentam melhores resultados nas operações e processos, nos SGQ e na cultura organizacional. 30 Unidade I Quadro 8 – Grade de maturidade empresarial da gestão de qualidade Incerteza Despertar Esclarecimento Sabedoria Certeza Compreensão da qualidade como ferramenta gerencial Nenhuma Reconhece a utilidade Compreende como ferramenta Compreende como processo TQC é parte essencial do sistema da empresa Situação da qualidade na organização Oculta na produção Não há inspeção Na liderança do Departamento de Engenharia Departamento de Qualidade O gerente de qualidade é da alta gerência Ação preventiva e foco no cliente O conselho de diretoria defende a qualidade Qualidade é um pensamento dominante Adaptado de: Crosby (1979). Conforme pesquisa da consultoria McKinsey (CARPINTERO et al., 2021), o grau de maturidade da gestão da qualidade não evolui de modo tranquilo e direto, mas com a quantidade de problemas que surgem. Esses obstáculos são determinantes para a liderança decidir buscar maior qualificação. Existem três decisões centrais: • implementar a gestão operacional de processos; • ter ou implantar um SGQ; • criar e modificar a cultura organizacional. O estágio mais avançado é a base do nível atual de desenvolvimento e inclusão da gestão da qualidade no planejamento estratégico em longo prazo, com as novas aplicações dos conceitos de consumer experience (experiência do consumidor) através da interatividade digital se unindo às ferramentas tradicionais de diferenciação de mercado e geração de valor aos clientes nos negócios. 2.1 Ambiente regulatório: especificações dos produtos e serviços Com a popularização do consumo de produtos industrializados vendidos por setores que lidam com aspectos sensíveis, como alimentação e segurança, surgiu a necessidade de regular e controlar a qualidade nas fábricas e nos processos de comercialização. Essa regulamentação visa assegurar que os produtos vendidos atendam às especificações técnicas e estejam em conformidade com os padrões de qualidade e segurança para os consumidores. De acordo com o Código de Proteção e Defesa do Consumidor (CDC), os fabricantes são responsáveis por defeitos de qualidade ou quantidade dos produtos que os tornem impróprios ou inadequados ao consumo […], assim como por aqueles decorrentes da disparidade, com as indicações constantes do recipiente, da embalagem, rotulagem ou mensagem publicitária, […] podendo o consumidor exigir a substituição das partes viciadas (BRASIL, 1990, art. 18). 31 QUALIDADE E INDICADORES EM PROCESSOS LOGÍSTICOS No Brasil, a regulamentação e o controle das especificações técnicas de cerca de 150 categorias de produtos de diversas finalidades e aplicações estão a cargo do Inmetro, que determina os padrões produtivos de qualidade e de segurança. Segundo o site do instituto, esse órgão “regula produtos e serviços com foco na segurança; proteção da vida e da saúde humana, animal e vegetal; proteção do meio ambiente; e prevenção de práticas enganosas de comércio” (PRODUTOS…, 2020). O atendimento dessa regulamentação técnica e comercial é compulsória ou voluntária, a depender do tipo de produto ou serviço. Entre as principais funções técnicas desenvolvidas pelo Inmetro, destacam-se: • implementar as políticas nacionais de metrologia e da qualidade no que se refere aos produtos comercializados no país e verificar a correta execução das normas técnicas; • conservar os padrões das unidades de medida e a rastreabilidade; • estimular as técnicas de gestão da qualidade nas empresas brasileiras; • executar as atividades de acreditação de laboratórios de calibração, provedores de ensaios e organismos de certificação; • desenvolver programas de avaliação da conformidade de produtos, processos, serviços e pessoas. O selo do Inmetro atesta e confirma que todos os produtos certificados e identificados com ele estão em conformidade com os padrões produtivos e técnicos exigidos. Alguns dos setores regulados são: • materiais de construção civil e de uso doméstico; • vestuário e assessórios; • componentes elétricos; • produtos descartáveis e embalagens; • componentes de combustíveis e acessórios para uso industrial; • meio ambiente e materiais para veículos de propulsão humana; • eletrodomésticos, eletrônicos e equipamentos tecnológicos e digitais; • capacetes e materiais de segurança; • acessórios e componentes automotivos e de transporte; 32 Unidade I • lâmpadas, ventiladores e condicionadores de ar; • saúde e componentes hidráulicos; • acessóriosde crianças e bebês. Observação Compliance refere-se a um conjunto de regras que as empresas devem seguir para obedecer às normas legais e regulamentares, às políticas e às diretrizes estabelecidas para o negócio e para as atividades da empresa, de modo a evitar, detectar e tratar desvios ou inconformidades que possam ocorrer. O termo tem origem no verbo em inglês to comply, que significa cumprir. Por sua vez, a Anvisa é a agência reguladora que fiscaliza, promove e protege a saúde da população por intermédio do controle sanitário de produção e consumo de produtos e serviços submetidos à vigilância sanitária. Seu escopo abrange ambientes, processos, insumos e tecnologias dos setores de farmácias e drogarias, insumos farmacêuticos, produtos para saúde, saneantes, cosméticos, alimentos, agrotóxicos, embarcações, tabaco, medicamentos, equipamentos médicos e produtos importados nos portos, aeroportos e fronteiras. A Anvisa atua em: • locais de produção, transporte e comercialização de alimentos; • locais de produção, distribuição e comercialização de medicamentos; • locais de serviços de saúde, como hospitais, unidades básicas e clínicas; • meio ambiente; • ambientes e processos do trabalho/saúde do trabalhador; • projetos de arquitetura; • locais públicos. A Anvisa, em conjunto com o Ministério da Saúde, fiscaliza e controla as instalações empresariais e comerciais, com foco nos aspectos sanitários, através de inspeções regulares. Além disso, a Agência também está envolvida nos processos de aprovação de imunizantes, como as vacinas utilizadas no combate ao coronavírus. 33 QUALIDADE E INDICADORES EM PROCESSOS LOGÍSTICOS Figura 4 Disponível em: https://bityli.com/znzRYCF. Acesso em: 22 jul. 2022. Além dos aspectos regulatórios relativos às especificações técnicas e às normas sanitárias coordenadas pelo Inmetro e pela Anvisa, questões jurídicas relacionadas à qualidade devem ser observadas. Multas e indenizações podem ser cobradas de empresas que não atenderem às normas, envolvendo ainda situações de troca e devolução de produtos e valores, levando a problemas financeiros. 2.2 Ambiente regulatório: defesa do consumidor A principal norma legal brasileira que regula as relações de consumo é o CDC, Lei n. 8.078/1990. Entre os órgãos públicos que atuam diretamente nos aspectos legais ou através do sistema judiciário estão os diversos Procons estaduais e municipais, o Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor, o Ministério Público, a Defensoria Pública e as delegacias do direito do consumidor, localizadas em várias cidades do Brasil, além de associações independentes, como a Proteste. Essas entidades viabilizam o acesso dos consumidores à Justiça, e lidam com: • dívidas, cobranças e contratos de compra e de prestação de serviços; • condições de conserto, troca e devoluções; 34 Unidade I • danos pessoais e patrimoniais; • arrependimento; • garantias legais contra vícios e defeitos e assistência técnica; • publicidade abusiva e enganosa e responsabilização civil e administrativa; • pagamentos e cartão de crédito; • recall; • vida, saúde e segurança. O CDC responsabiliza os fornecedores por defeitos ou imperfeições, e define o que é vício, nesse contexto, em seu artigo 18: Os fornecedores de produtos de consumo duráveis ou não duráveis respondem solidariamente pelos vícios de qualidade ou quantidade que os tornem impróprios ou inadequados ao consumo a que se destinam ou lhes diminuam o valor, assim como por aqueles decorrentes da disparidade, com as indicações constantes do recipiente, da embalagem, rotulagem ou mensagem publicitária, respeitadas as variações decorrentes de sua natureza, podendo o consumidor exigir a substituição das partes viciadas. 2.3 Qualidade e logística Para empresas e prestadores de serviços, o desempenho logístico de qualidade é considerado um fator crítico de sucesso nos negócios, devendo garantir resultados através da integração de todos os fluxos de materiais que compõem a cadeia de suprimentos, desde os fornecedores até os clientes finais (OLIVEIRA, 2009). Para isso acontecer é necessário considerar alguns aspectos centrais, como a implantação de um SGQ com base nas prescrições da norma ISO 9001 e em indicadores de desempenho que podem ajudar a reduzir os problemas sempre presentes nas operações diárias, diminuindo custos e melhorando resultados. As ações citadas precisam ser lideradas por uma equipe de gestão com profissionais qualificados e que trabalham com foco em planejamento operacional, adoção de tecnologias de monitoramento e controle e agilidade, com base em quatro aspectos centrais: • comprometimento com os pedidos de vendas; • pontualidade e agilidade; 35 QUALIDADE E INDICADORES EM PROCESSOS LOGÍSTICOS • inexistência de erros operacionais e de informação; • gestão de estoques. Em função da variedade dos papéis que desenvolvem no mercado, o nível de qualidade dos serviços logísticos depende das características das empresas embarcadoras e de seus produtos, o perfil do serviço prestado e as condições dos pedidos comerciais e clientes. Entre as principais formas de avaliação da qualidade, podemos dividir os serviços em três grupos principais: logística de abastecimento ou suprimento; logística de produção; e logística de distribuição (NUNES, 2017). Fornecedor Consumidor Manufatura Atacadista Varejista Processo logístico Figura 5 Adaptado de: Bowersox e Closs (2001). 2.3.1 Logística de abastecimento ou suprimento Na etapa de suprimento devem ser avaliados os aspectos externos, como as qualificações dos fornecedores e prestadores de serviços – transportadoras, centros de distribuição e entregadores, por exemplo. Devem ser analisados dados de compras, prazos de entrega e regularidade de atendimento conforme os pedidos emitidos, bem como as especificações técnicas. Desvios nesses requisitos e erros dos fornecedores em relação a volumes e condições comerciais, como preços, prazos de pagamento e encargos financeiros, podem comprometer a qualidade dos produtos e incorrer em reprocessamentos custosos. As funções da logística nessa fase envolvem gestão operacional de suprimentos e programação de compras, processamento de pedidos, controle de transportadores, armazéns e estoques, embalagem e gestão de informações. 36 Unidade I A qualidade pode ser avaliada por meio de checklists, relatórios de controle de entregas e pontualidade, planejamento de compras sem atrasos e regulação de níveis de estoque através de ferramentas como diagramas de causa e efeito (de Ishikawa) e histogramas. 2.3.2 Logística de produção Em relação à logística produtiva, os problemas de qualidade são internos e passíveis de correção. Deve-se avaliar como os processos são executados em termos de disponibilidade de equipamentos e mão de obra, e as condições das movimentações internas são analisadas em termos de produtividade e atendimento. As funções nessa etapa englobam gerentes de produção, operadores de máquinas, analistas de supply chain e de planejamento e controle de produção (PCP), controle de estoques, armazenagem e expedição, CQ de produtos finais e insumos e serviços de manutenção. A qualidade pode ser avaliada por meio de indicadores de produção prevista e efetiva, checklists, índices de produtos conformes, índices de refugos, devoluções e retrabalhos, tempo de máquinas paradas, tempo de manutenção, produção nos prazos definidos e avarias. 2.3.3 Logística de distribuição Nos processos de distribuição física ocorrem os maiores desafios e problemas para embarcadores, prestadores de serviços e clientes quanto a coleta e entrega, incluindo entregas expressas. Entre os desafios mais usuais estão as dificuldades de coletar os produtos e atingir todos os locais de entrega com rapidez e sem atrasos. Além disso, a logística de distribuição está sujeita a falta de produtos, avarias, devoluções e outras reclamações diversas que acabam impactando a imagem dos vendedores e prestadores.As funções nessa fase abrangem atividades de expedição e preparação de pedidos de vendas, controle de produtos em estoque, disponibilização de veículos para locais com poucas entregas, manutenção da frota, qualificação dos motoristas e observância de particularidades segundo a área de distribuição, como restrições de horários e estacionamento em regiões urbanas. A qualidade pode ser avaliada por meio de planejamento de entregas e expedição, gestão de frotas, checklists, relatórios de entregas e coletas, diagramas de Pareto, aplicativos de rotas e intenso controle de informações e comunicações. O desempenho logístico com qualidade não deve ser avaliado apenas em uma das etapas da cadeia de suprimentos, mas na sua totalidade (NUNES, 2017). Os mercados para os prestadores de serviços logísticos são competitivos e demandam constante modernização e investimentos em veículos, equipamentos, pessoal, instalações, pátios e tecnologias de gestão, controle e monitoramento e de atendimento a clientes e parceiros de negócios. Neste sentido, é essencial que as empresas melhorem a qualidade e produtividade dos seus processos de serviços. 37 QUALIDADE E INDICADORES EM PROCESSOS LOGÍSTICOS O conceito de processo é vital, uma vez que a sequência de atividades nem sempre é visível para o cliente e para quem as realiza. Sua abrangência e relevância aumentam à medida que os serviços agregam cada vez mais capacitação intelectual, se afastando do modelo industrial. Quadro 9 – Manufaturados e serviços Características Serviços Manufaturados Propriedade Vários proprietários Definida claramente Fronteiras Pouco nítidas e difusas Responsabilidade definida Pontos de controle Não existem Formais e limitados Indicadores Medição limitada/inexistente Gestão específica Ações corretivas Corretivas perante o problema Frequente e preventiva Adaptado de: Toledo et al. (2012). Para quem trabalha em contato direto com os clientes, a distinção entre manufaturados e serviços (quadro 9) pode parecer simples, mas, para os funcionários que atuam nos processos de apoio, nem sempre a visualização é clara. Os processos dos prestadores de serviços logísticos são diferentes dos processos industriais em alguns aspectos, como a tangibilidade e os estoques – os produtos são tangíveis; os serviços, intangíveis, e não podem ser estocados. Figura 6 Disponível em: https://bityli.com/QiTfLjQ. Acesso em: 28 jul. 2022. 38 Unidade I Os conceitos de qualidade, produtividade e competitividade em logística são importantes para as decisões estratégicas de gestão da qualidade, que, apesar da evolução temporal e das novas aplicações no contexto empresarial e social com foco na excelência, envolvem ainda aspectos técnicos de pontualidade e custos. Quadro 10 – Qualidade e produtividade Aspecto Produtividade Qualidade Abordagem Uso dos recursos atuais Satisfação dos clientes Avaliação Eficiência dos processos Eficácia dos processos Foco Esforço Resultados Estrutura Como fazer O que fazer Treinamento Fazer as coisas certas Fazer as coisas certas Adaptado de: Oliveira (2009). Os prestadores de serviços logísticos que implantaram SGQ desenvolvem diferenciais competitivos através de competências e produtividade na execução dos processos, na redução de custos e preços e na melhoria da qualidade dos serviços. 2.4 Custos da qualidade Neste tópico iremos discutir os custos envolvidos nos processos de qualidade e seu impacto na condução dos negócios. A falta da qualidade nos serviços logísticos acarreta custos maiores que aqueles relacionados à produção e entrega de produtos e serviços. É preciso considerar os gastos com perdas e desperdícios, visto que a não conformidade gera novas despesas e reduz o nível de satisfação dos clientes (PALADINI, 2009). Para Toledo (2002), a avaliação dos custos de qualidade pode fornecer informações relevantes aos gestores, que podem, por meio de quantificação e análise, orientar as empresas de modo a responder às seguintes questões: • Qual é o valor da qualidade e dos processos? • Quanto custa a falta da qualidade e qual é a avaliação da empresa? Os custos da qualidade podem ser divididos em dois grupos (custos da qualidade e da sua falta), que podem ser avaliados sob o ponto de vista do processo (conformidade e não conformidade) e classificados em custos de prevenção, de avaliação, de falhas internas e de falhas externas (TOLEDO, 2002). 39 QUALIDADE E INDICADORES EM PROCESSOS LOGÍSTICOS Quadro 11 – Custos da falta de qualidade Custos de defeitos ou falhas internas (gastos com defeitos identificados antes de produtos e serviços serem expedidos para o cliente) Matérias-primas e produtos refugados (produtos que não podem mais ser processados) Produtos que precisam ser retrabalhados Modificações nos processos produtivos Perda de receita Tempo de espera dos equipamentos parados enquanto se fazem correções Pressa e tensão para entregar os produtos corrigidos ou consertados Custos de defeitos ou falhas externas (gastos com defeitos identificados depois que chegam ao cliente) Cumprimento das garantias oferecidas ao cliente Perda de encomendas Processamento de devoluções Processos nos organismos de defesa do consumidor Comprometimento da imagem Perda de clientes e de mercado Adaptado de: Toledo (2002). Para Costa Neto e Canuto (2010), os custos da não qualidade devem ser sanados por investimentos em prevenção e melhorias nos processos. Esses autores concordam que defeitos podem ser identificados durante a produção ou pelos clientes, sendo separados entre falhas internas ou externas: • os custos das falhas internas resultam dos desvios que ocorrem dentro da empresa, portanto, durante o processo de fabricação ou de serviço; • os custos das falhas externas decorrem dos problemas que acontecem fora do ambiente de produção, ou seja, envolvendo os produtos ou serviços já vendidos e entregues ao cliente, sendo associados a devoluções, queixas e reclamações dos consumidores. A quantificação dos custos da qualidade pode auxiliar os gestores a avaliar o desempenho da empresa e elaborar um plano de ação. Essa análise permite: • avaliar os programas de qualidade através de dados físicos e financeiros; • estabelecer metas para esses programas; • medir a perda para a empresa, relacionada aos custos da falta de qualidade; • transmitir aos funcionários essas perdas e custos; • classificar a participação dos custos em diferentes categorias, de forma a direcionar os investimentos em qualidade; • comprometer a direção da empresa com a qualidade, através de uma visão geradora de lucro e produtividade. 40 Unidade I O conjunto dos impactos positivos da gestão da qualidade nas empresas é denominado valor da qualidade e diz respeito a resultados reais nos volumes e valores vendidos. Permite ganhos efetivos que podem ser sustentáveis, desde que as empresas desenvolvam regras e procedimentos de qualidade, o que significa assumir custos adicionais (PALADINI, 2009). Quadro 12 – Custos da qualidade Custos de prevenção (gastos com o processo de evitar a ocorrência de erros e defeitos) Planejamento do processo de controle da qualidade Treinamento para a qualidade Desenvolvimento de fornecedores Desenvolvimento de produtos Manutenção preventiva Implantação e manutenção do sistema da qualidade Custos de avaliação (gastos com o processo de aferir a qualidade do sistema de produção) Testes de matérias-primas e todos os tipos de insumos do processo Compra de equipamentos especiais para a avaliação de produtos Realização de programa de controle estatístico de processo Inspeção Elaboração de relatórios Adaptado de: Toledo (2002). Os custos totais da qualidade, portanto, são os gastos inevitáveis com prevenção e avaliação mais as despesas evitáveis com as falhas internas e externas (TOLEDO, 2002). A distribuição entre os quatro grupos de custos depende das condições e características de cada setor produtivo, de cada família de produtos