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A H I S T Ó R I A D A E C O N O M I A B R A S I L E I R A
A S C I C AT R I Z E S D E U M C I C L O F U G A Z E O I N Í C I O D A I N D U S T R I A L I Z A Ç Ã O
Borracha 
amazonia
na
A H I S T Ó R I A D A E C O N O M I A B R A S I L E I R A
A S C I C AT R I Z E S D E U M C I C L O F U G A Z E O I N Í C I O D A I N D U S T R I A L I Z A Ç Ã O
Borracha 
amazonia
na
PORTO ALEGRE, RS, BRASIL
NOVEMBRO DE 2012
1a EDIÇÃO 
QUATTRO PROJETOS
R I C A R D O B U E N O
A H I S T Ó R I A D A E C O N O M I A B R A S I L E I R A
A S C I C AT R I Z E S D E U M C I C L O F U G A Z E O I N Í C I O D A I N D U S T R I A L I Z A Ç Ã O
Borracha 
amazonia
na
PROJETO CULTURAL: QUATTRO PROJETOS
REALIZAÇÃO: QUATTRO PROJETOS I 51 3209.7568 
 www.quattroprojetos.com.br I quattro@quattroprojetos.com.br
COORDENAÇÃO EXECUTIVA: FLAVIO ENNINGER
COORDENAÇÃO EDITORIAL: RICARDO BUENO – ALMA DA PALAVRA
CONSULTORIA: VOLTAIRE SCHILLING
TEXTOS: RICARDO BUENO E VOLTAIRE SCHILLING (CAPÍTULOS 1 E 3 E BOX CAPÍTULO 6 – “À MARGEM DA HISTÓRIA?”)
REVISÃO: FERNANDA PACHECO – ALMA DA PALAVRA
PROJETO GRÁFICO E DIREÇÃO DE ARTE: LUCIANE TRINDADE
IMPRESSÃO: GRÁFICA E EDITORA PALLOTTI
REALIZAÇÃOPATROCÍNIO 
 
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação ( CIP ) 
 
 
B928b Bueno, Ricardo 
 Borracha na Amazônia : as cicatrizes de um ciclo fugaz e o início 
da industrialização / Ricardo Bueno. – 1. ed. – Porto Alegre : 
Quattro Projetos, 2012. 
128 p. : fots. col. ; 23 x 31 cm. – (A história da economia 
brasileira ; v.2). 
 
História do ciclo da borracha e sua importância no cenário 
histórico e econômico da Amazônia. 
 
ISBN 978-85-64393-05-9 
 
1. Amazônia – Borracha. 2. Economia – Ciclo da borracha. 
Borracha – Economia. I. Título. II. Coleção. 
 
CDU 316.31(81) 
 33(81-928.8)(091) 
 
 Bibliotecária Responsável: Denise Pazetto CRB-10/1216 51 30297042 
A Case New Holland pertence a uma categoria especial de empresas: aquelas 
que ajudam a moldar o mundo. A CNH produz máquinas agrícolas, fundamentais no 
plantio, cultivo e colheita de alimentos, e equipamentos para a construção, utilizados 
em larga escala em vários tipos de obras.
Em seus mais de 60 anos no Brasil, a CNH sempre desempenhou um papel im-
portante no desenvolvimento agrícola nacional. Suas soluções para a maior eficiência 
da agricultura e da produtividade do campo contribuíram para que o país conseguisse 
usufruir do seu imenso potencial agrícola, ajudando o Brasil a se tornar um dos líderes 
mundiais na produção de alimentos.
A CNH também participou, de forma ativa, de grandes momentos da história do 
país, como a consolidação de Brasília, a implantação de importantes rodovias federais 
e de diversas outras obras fundamentais na interiorização do desenvolvimento, além 
da construção das usinas de Furnas e de Itaipu.
Investir em hidrelétricas era um dos pilares do governo do então presidente Getúlio 
Vargas. Mesmo sem ver as principais obras prontas, ele vislumbrou, no Estado Novo, 
uma grande oportunidade para reduzir a dependência do país desses “ciclos”, em prol 
do avanço da industrialização.
O último ciclo vivido pelo presidente Vargas foi o da borracha, já na sua segunda 
fase, no final dos anos 1940. Mas a primeira grande participação da borracha na história 
do Brasil aconteceu no final do século XIX e no início do século XX, na Amazônia, 
quando a exploração deste vegetal proporcionou a atração de estrangeiros em busca 
de riquezas e a expansão da colonização, transformando sociedades e culturas e impul-
sionando o crescimento de importantes cidades como Manaus, Belém e Porto Velho, 
além da compra e depois criação do Estado do Acre.
O “ciclo da borracha” e os “primeiros passos da industrialização brasileira” foram 
períodos riquíssimos da história do país, tão importantes que eles são os dois princi-
pais temas do livro Borracha na Amazônia – as cicatrizes de um ciclo fugaz e o início da 
industrialização”, que dá sequência, com maestria, à coleção “A História da Economia 
Brasileira”.
A primeira publicação, lançada em 2010, aborda os ciclos do pau-brasil, ouro 
e cana-de-açúcar. Já o ciclo do café foi o tema do segundo livro, lançado em 2011. 
Para 2013, a nova obra abordará a industrialização e o nacionalismo dos anos 50-60, 
entrelaçado com movimentos culturais. Toda a coleção é patrocinada pela CNH, com 
o apoio da Lei Rouanet de Incentivo à Cultura.
Com ações como esta, a Case New Holland mostra que seu papel não se limita à 
construção física, mas também à construção cultural de nosso país.
Esta publicação comemora também o 20º ano do Prêmio CNH de Jornalismo 
Econômico.
VALENTINO RIZZIOLI 
PRESIDENTE DA CASE NEW HOLLAND E VICE-PRESIDENTE EXECUTIVO DA FIAT PARA A AMÉRICA LATINA 
a cultura 
construindo
amazônia: 
da conquista 
à integração
introdução 14
20 32 54
sumário
a conquista
do acre
ouro branco:
martírio,riqueza
e cultura
70 94 112
fontes consultadas 122
trilhos no
inferno 
verde
frustração e 
abandono em 
meio à floresta
os primeiros 
passos da 
industrialização
14 
P O R R I C A R D O B U E N O
histórias
sobre contadores de 
 15
Há uma máxima no mundo da comunicação 
que diz o seguinte: para que um jornalista consiga 
ter sucesso em sua profissão, é necessário que ele 
seja um bom contador de histórias. Para tanto, 
além de talento na apuração e, depois, na narra-
tiva, é preciso que ele goste de contá-las – toda 
e qualquer história. Evidentemente o jornalismo 
pressupõe lidar com fatos (ou as versões possíveis 
de serem levantadas e comprovadas sobre eles), 
diferentemente da literatura, que na construção de 
uma narrativa pode trabalhar com a realidade, com 
a ficção ou com ambas, simultaneamente. Mas o 
que significa, afinal, ser bem-sucedido como jorna-
lista? Tal e qual um romancista, o segredo está em 
conseguir prender a atenção do leitor, conquistar 
seu interesse, estabelecer um canal de identificação 
dele com a narrativa, de forma a que se garanta que 
a informação/história seja transmitida na íntegra. 
A posterior avaliação sobre o que foi lido cabe ao 
leitor, que pode gostar, não gostar, acreditar, não 
acreditar. Acontece que, mesmo para bons apu-
radores e contadores de histórias, se não houver 
um enredo minimamente atraente, dificilmente a 
conexão com o leitor/interlocutor vai funcionar.
Mas há também certas histórias que, quase independentemente da 
forma como são contadas ou de quem as conta, por si só se sustentam, 
tal a carga de dramaticidade que carregam, tal a riqueza de personagens 
interessantes, conflitos, mistérios, sutilezas e curiosidades que as cercam. 
Este é o caso do chamado ciclo da borracha, uma das atividades econômicas 
mais relevantes na história de pouco mais de 500 anos do Brasil. Trata-se 
de um episódio cujas tramas e dramas paralelos à atividade econômica 
em si rendem não um, mas vários romances – alguns dos quais, inclusive, 
já foram escritos; que rendem, como já renderam, muitos livros escritos 
também por historiadores. Período esse da nossa história que, por mais que 
se escreva e leia sobre ele, a sensação é a de que sempre há a possibilidade 
de um novo olhar, a remexer e, quem sabe, reescrever o passado.
16 
Ainda que à história da extração e da exportação da borracha no 
Brasil se possa, com relativa adequação, usar a palavra ciclo como de-
finidora – no sentido de um processo econômico que nasceu, cresceu, 
expandiu-se e, de certa forma, encerrou-se, tudo isso em curtíssimo 
espaço de tempo –, a realidade é que os fatos históricos que se corre-
lacionam, para quem busca entender o que efetivamente representou 
a saga da extração do látex da hevea brasiliensis, são um terreno farto.
A começar pelos segredos, mistérios e fantasias que ainda hoje 
envolvem a Amazônia, suas dimensões colossais, suas peculiaridades 
dos pontos de vista geográfico, biológico, antropológico. Acrescente-
-sea esse cenário uma árvore de lindas e delicadas flores, que no 
território amazônico se distribui de forma bastante esparsa, apenas 
três ou quatro em um hectare, mas que esconde por trás de sua casca 
um líquido precioso, cuja forma de extração, ao menos em meados 
do século XIX, exigia de um ser humano uma capacidade quase in-
comensurável de resistência física e psicológica para sobreviver em 
meio à floresta. Homens esses, quase todos, que chegavam fugidos 
do flagelo de secas inclementes no Nordeste brasileiro, e que talvez 
nem em sonho pudessem imaginar o significado para a humanidade 
daquele gesto simples de abrir sulcos em algumas dezenas de árvores, 
colocar copos para recolher o látex, e depois transformar o líquido em 
estranhas bolas elásticas, mas resistentes.
Junte-se a esses personagens alguns outros, encarnados pelos homens 
que os controlavam – e que de certa forma os aprisionavam –, e também os 
patrões destes intermediários, donos de grandes terras ou investidores inter-
nacionais. Tempere essa relação de trabalho desigual com pitadas de muito, 
muito dinheiro acumulado, que proporcionaria a transformação, quase da 
noite para o dia, de duas pequenas e pacatas cidades do Norte brasileiro 
em metrópoles modernas, dos pontos de vista urbanístico, cultural e social. 
Faça uma pausa para tentar entender como se deu a luta, na floresta 
e nos gabinetes dos diplomatas, pela agregação de um território que até 
então pertencia a um país vizinho, o qual também se empenhava na 
luta por mais e mais território de onde pudesse extrair a matéria-prima 
da borracha, e que ansiava, mais do que tudo, por uma ligação com 
introdução
 17
OS FATOS HISTÓRICOS QUE SE 
CORRELACIONAM SÃO UM TERRENO 
FARTO PARA QUEM TENTA ENTENDER OS 
IMPACTOS DO CICLO DA BORRACHA
18 
introdução
NÃO HÁ UMA HISTÓRIA DO CICLO 
DA BORRACHA, E SIM VÁRIAS LEITURAS 
DAQUELE MOMENTO HISTÓRICO 
E DAS CICATRIZES QUE DEIXOU
 19
o mar – qualquer mar. Depois, imagine que alguém teve a ideia de 
construir na região uma ferrovia, talvez desconhecendo tão inóspito 
cenário, cortado por rios e corredeiras, onde doenças as mais variadas 
e pequenos insetos disputam, ainda hoje, o privilégio de aniquilar a 
saúde de qualquer ser humano que por ali permaneça por mais de três 
meses. Tente calcular o número de brasileiros e de muitos estrangeiros 
que por aqui aportaram para trabalhar nessa obra insana, os quais 
perderam a vida em meio a febres torturantes, chuvas torrenciais e 
índios hostis, enquanto os dormentes eram assentados.
Avance no tempo e calcule o tamanho dos sonhos e ambições 
do empreendedor que transformou não apenas a forma como o ser 
humano se locomovia dentro das cidades, mas que também revolucio-
nou o modo como uma indústria deveria funcionar. Tente entender a 
dimensão de sua frustração ao constatar que os milhões de dólares in-
vestidos no cultivo manejado de uma planta como aquela que brotava 
no seio da selva amazônica estavam sendo implacavelmente devorados 
por uma pequena criatura da natureza, apelidada de mal-das-folhas. 
Siga o percurso da história, e reencontre novas levas de nordestinos 
dirigindo-se para a Amazônia, mais uma vez seduzidos pelo sonho de 
fazer fortuna na floresta, mas também de certa forma ludibriados por 
uma campanha governamental que apelou para o seu patriotismo, 
em nome de uma guerra que eles não sabiam exatamente qual era.
Costure tudo isso com o enredo de um país que buscava alternativas 
a um modelo baseado na economia rural, e que tentava dar seus primeiros 
passos rumo à industrialização e à criação de um mercado interno sólido, 
reduzindo, assim, sua dependência dos oscilantes mercados externos. 
Ao fim e ao cabo será fácil concluir que não há uma história do 
ciclo da borracha no Brasil, e sim várias possíveis leituras daquele incrí-
vel momento histórico. A que está agora em suas mãos é apenas uma 
delas. Esperamos conquistar sua atenção daqui até a última página. 
Se assim acontecer, a missão desta série sobre ciclos econômicos no 
Brasil e sua correlação com a cultura e a sociedade estará mais uma 
vez sendo cumprida. O que não deixa de ser um enorme privilégio para 
um jornalista que gosta de contar uma boa história – qualquer uma.
20 
amazônia
da conquista
à integração
 21
22 
A Amazônia é a maior região florestal e hidrográ-
fica do mundo. Ocupa grande parte do hemisfério 
setentrional da América do Sul, correspondendo 
a 42% do território brasileiro. Estende-se das mar-
gens do Oceano Atlântico, no leste, até o sopé da 
Cordilheira dos Andes, no oeste. Espalha-se pelas 
Guianas, Venezuela, Colômbia, Equador, Peru e 
Bolívia, perfazendo mais de 6 milhões de km2. O 
vale amazonense é, ao sul, abastecido pelos rios que 
descem do Planalto Central brasileiro e dos que 
vêm da região das Guianas ao norte, e pelos filetes 
de água gelada que se desprendem da “corcova 
andina”, fazendo com que termine por assumir – 
como constatou o geólogo americano C.F. Marbut, 
que visitou-o em 1923 – a forma de um leque, pelo 
qual escorre 1/5 da água doce do planeta. O ensaísta 
nortista Raymundo Moraes, por sua vez, descreveu 
o vale como “o anfiteatro amazonense”.
Devido a sua inacessibilidade, insalubridade e as dificuldades para 
explorá-la economicamente, a Amazônia é uma das áreas mais subpovo-
adas do globo. É um “deserto verde”, pertencente a uma época em que a 
Terra ainda amanhecia abrigando uma das populações mais primitivas que 
se conhece – o homem neolítico em estado puro. Para outros, como Pedro 
de Rates Hanequim, que viveu por mais de 20 anos no Brasil, havia sido 
a morada de Adão e onde se encontrava a Árvore da Vida. Tanta certeza 
tinha de ter habitado o Paraíso Terreal – sendo o Amazonas o maior rio do 
Éden – que, ao voltar a Portugal, deixou-se processar e executar – “afogado 
e queimado” – em 1744, por ordem de um Tribunal do Santo Ofício pelo 
crime de heresia e apostasia, sem jamais ter pedido clemência.
Os diversos governos, brasileiros e vizinhos, até hoje procuram 
integrá-la, promovendo sua ocupação, tanto por garimpeiros, por 
extrativistas, por sertanejos, criadores de gado ou empresas de mi-
neração. O resultado disso são as intensas queimadas, ou coivaras, 
antigo método indígena de limpar o terreno para a lavoura, além de 
longas estradas que cortam as matas em todas as direções. Do Mato 
Grosso a Roraima, a fumaça toma conta dos ares e, por vezes, escapa 
completamente ao controle. Este é um dos temores do ecólogo Ro-
bert Goodland e do botânico Howard Irwin: o de que o inferno verde 
torne-se um deserto vermelho, conforme o subtítulo do livro deles.
O destino da Amazônia, portanto, tem preocupado as mais diversas 
amazônia: da conquista à integração
 23
 “TRATA-SE [A AMAZÔNIA] DE UM GRANDIOSO ANFITEATRO 
DE TERRAS BAIXAS, ENCERRADO ENTRE O ARCO INTERIOR DAS TERRAS 
SUBANDINAS E O PLANALTO DAS GUIANAS E O PLANALTO BRASILEIRO.”
A Z I Z N A C I B A B ’ S Á B E R
24 
instituições, tanto a Organização das Nações Unidas (ONU), como as orga-
nizações não-governamentais ambientalistas, que temem por um desastre 
irreversível, a qualquer momento. O governo brasileiro sofre pressões de 
todos os lados para tentar coibir a ocupação predatória, ao mesmo tempo 
em que é politicamente constrangido pelos interesses internos no sentido 
de que proporcione vantagens, isenções e benefícios a grupos, empresas 
ou classes, para acelerar sua exploração econômica. Nesta tensão entre os 
apelos internacionais e a satisfação das necessidades locais de crescimento, 
Brasília vai alternando, ao longo dos anos, suas políticas para a região. 
PRIMEIRAS EXPEDIÇÕES
“Do abismo viu o profundo/ do profundo o paraíso/ do paraíso viu
o mundo/ e do mundo viu o que quis”
 Gil Vicente, 1539
As primeiras notícias que os espanhóis tiveram da existência de uma 
imensa região de selvas do outro lado dos Andes foi-lhes dada pelos próprios 
A FLORESTA AMAZÔNICA NAVISÃO DE JOSEPH LEONE RIGHINI
amazônia: da conquista à integração
 25
O RIO AMAZONAS À ESQUERDA, EM MAPA DE 1579, DE JACQUES DE VAU DE CLAYE
nativos em Quito e em Cuzco. Graças a sua fantasia de homens medievais, 
os conquistadores imaginaram de imediato que aquela área misteriosa e 
desconhecida abrigava o lendário El Dorado, uma serra repleta de ouro 
puro. Bastava chegar lá e carregar o que desse. É certo que o grande rio 
já era conhecido desde que Vicente Pinzón navegou na sua foz, em 1500, 
chamando-o de Mar Dulce, mas quem primeiro organizou uma expedição 
partindo foi Gonzalo Pizarro, irmão do conquistador do Peru. 
Partindo de Quito, em 1541, comandando uma expedição com 150 
soldados, 4 mil índios e 3 mil animais de tropa, inclusive com alpacas 
e lhamas, Gonzalo conseguiu transpassar os Andes por dificílimos 
caminhos, chegando às cabeceiras do rio Amazonas. As dificuldades 
encontradas fizeram com que ele destacasse Francisco Orellana para 
que, utilizando um barco lá mesmo construído, desse prosseguimento 
à missão exploratória. A viagem, assim, teve seguimento, até que 
atingiu a desembocadura do grande rio no Atlântico, em 1542, depois 
de terem sido percorridos por inteiro seus 5.825 km. 
Deve-se, pois, a Orellana a denominação do lugar. Deparando-se, nas 
margens do rio, com um grupo de belicosas índias que acompanhavam os 
homens em combate, chamou-as de amazonas, confundindo-as com as 
ORELLANA CHAMOU 
AS ÍNDIAS QUE 
COMBATIAM AO 
LADO DE HOMENS DE 
AMAZONAS, 
COMO AS LENDÁRIAS 
GUERREIRAS DA 
MITOLOGIA GREGA
26 
lendárias guerreiras da mitologia grega. Ao retornar à Espanha, Orellana 
conseguiu ser nomeado adelantado, organizando uma nova sortida que o 
levou ao naufrágio e morte a bordo de um bergantim, provavelmente nas 
proximidades de Macapá, em 1550.
O feito de navegação de Orellana repetiu-se depois, em 1561, por 
Lopo de Aguirre, um celerado e doido que assassinou Pedro de Ursua, o 
chefe da expedição, aceitando ser o rei dos seus seguidores, os marañones. 
FIXAÇÃO E PRIMEIRAS MISSÕES
“Esta incorporação definitiva do Amazonas ao Brasil fez-se com
as ‘jornadas’ dos capitães, com as ‘entradas’ dos colonos e com
a ‘catequese’ dos missionários. Tríplice elemento, oficial, particular, 
religioso, este simultaneamente particular e oficial, interdependentes, 
todos três, e nem sempre concordes.” 
Serafim Leite, S.J. – História da Companhia de Jesus
no Brasil, Tomo III, 1943
Não demorou muito para que outros desbravadores viessem ins-
talar feitorias na região amazônica, preferencialmente na embocadura 
do grande rio e suas circunvizinhanças. A presença dos heréticos 
ingleses e holandeses nas Guianas seguiu-se pela dos franceses no 
Golfão do Maranhão, onde fundaram o forte de São Luís em 1612. 
As autoridades da União Ibérica (entre 1580-1640, quando Espanha 
e Portugal estavam sob o mesmo governo) decidiram por expulsar os 
franceses de São Luís e fixar-se em definitivo no estuário amazônico. 
A cidade caiu em mãos portuguesas em 1615 e, no ano seguinte, 
em 16 de janeiro de 1616, o capitão-mor Caldeira Castelo Branco 
fundou, na região que denominou de Lusitânia Feliz, o forte Presépio 
de Belém, a casa forte que deu origem à capital do Pará. Cidade essa, 
na baía de Guará, que se tornou a sentinela portuguesa na emboca-
dura do Grande Rio e o trampolim para a conquista da hinterlândia 
amazonense. 
Uma longa guerra – comercial e teológica – travou-se na região, até 
que em 1697 afixou-se mais ou menos a fronteira entre os interesses 
holandeses, ingleses e franceses de um lado, do lado das Guianas, e os 
lusitanos do outro, do lado do Amapá, tendo o cabo Orange, no rio 
Oiapoque, como o acidente geográfico divisor, acordo esse celebrado 
no Tratado de Lisboa, de 1701. As portas do Amazonas, desde então, 
abriram-se exclusivamente aos navegantes portugueses, que passaram 
a deter o monopólio sobre o vale amazônico. Em 1639, o capitão 
Pedro Teixeira, partindo do rio Tocantins, atingiu a extremidade da 
sua investida no rio Napo, seguindo dali até Quito, no Equador. Em 
seguida, entre 1648 e 1651, foi a vez de Antônio Raposo Tavares, um 
reinól dedicado às bandeiras que marchou por 10 mil quilômetros 
Amazonas adentro.
amazônia: da conquista à integração
SOMENTE EM 1697, 
APÓS UMA LONGA 
GUERRA COMERCIAL 
E TECNOLÓGICA, 
AFIXARAM-SE 
AS FRONTEIRAS
 DA REGIÃO
 27
MAPA DAS GUIANAS E REGIÃO AMAZÔNICA, DE JAN JANSSON (1588-1664)
28 
Paralelo aos capitães e desbravadores privados, assentaram-se as 
missões de jesuítas, franciscanos, mercedários, carmelitas e seculares, 
que se espalharam pelas vastas áreas entre os rios Solimões e Tapajós. 
Os missionários foram convocados para catequizar os gentios e também 
evitar a possível influência dos hereges protestantes. A orientação das 
ordens religiosas, por lá já encontradas em 1570, era de que aldeassem 
os nativos, geralmente dispersos em amplos territórios e divididos entre 
as nações tupinambás, urubus, gamelas, timbiras, apinajés, jurunas, 
caiapós, carajás, aimorés, munducurus, tapajós, aruaques, turumás, 
murás, jurimaguás, omáquas, manaus, barés e ianomâmis, para melhor 
evangelizá-los. 
Quase que imediatamente iniciou-se um conflito entre as cha-
madas “tropas de resgate”, chefiadas por mamelucos escravagistas, 
e os padres. A disputa se estendeu por mais de século, na luta pelo 
braço indígena. Os religiosos desejavam-nos orando a Deus e a Cristo, 
enquanto os colonos queriam-nos no eito, suando sobre a lavoura e 
a extração. Os sacerdotes, mais influentes, conseguiram uma série de 
decretos, provisões, leis e alvarás reais atribuindo-lhes autoridade sobre 
os nativos e proibindo sua escravidão. Foi o caso da lei de 30 de julho 
de 1609, que determinava que “fossem os índios tratados como pessoas 
livres, sem serem constrangidos a executar serviços contra a vontade”, 
desde que lhes divulgassem a fé – a qual, obviamente, poucas vezes foi 
obedecida. Como defensor da causa dos gentios, destacou-se o Padre 
Antônio Vieira, o grande sermonista, que desembarcou no Maranhão 
em 1653, a quem logo os nativos chamaram de paiacu, o grande pai.
amazônia: da conquista à integração
DUROU MAIS DE 
UM SÉCULO A LUTA 
ENTRE MISSIONÁRIOS 
E MAMELUCOS 
ESCRAVAGISTAS PELO 
BRAÇO INDÍGENA
 29
OCUPAÇÃO E ADMINISTRAÇÃO
Em 1640, Portugal recuperou sua independência, e a Espanha 
voltou a ser sua adversária. Novos fortins foram instalados nas mar-
gens do Solimões e nos encontros dos rios, como o forte de São José 
do Rio Negro, em 1699, onde bem mais tarde, nas suas proximidades, 
surgiu Manaus. Esse período foi marcado pela penetração extrativista 
e coletora atrás das “drogas do sertão” e, também pela captura, por 
bandeirantes vindos do Sul, da mão de obra indígena tornada escrava. 
A resistência dos padres ao costume das “repartições”, onde os 
índios eram divididos entre os reinóis, agravada pela prática monopo-
lista da Companhia de Comércio do Maranhão e Grão-Pará, ativada 
em 1682, fez com que uma revolta eclodisse no Maranhão: a rebelião 
– antijesuítica e antimonopolista – do senhor de engenho Manuel 
Beckmann, a Revolta de Bequimão, que morreu executado em 1685.
Somente em 1750, pelo Tratado de Madri, Espanha e Portugal 
acordaram em relação às suas fronteiras. De Lisboa, o Marquês do 
Pombal, o todo-poderoso primeiro-ministro (1756-1777), enviara 
já o seu irmão Mendonça Furtado, em 1751, para supervisionar os 
negócios da companhia monopolista na Amazônia. A época do des-
potismo ilustrado, representada por Pombal, na Metrópole, e por seu 
irmão, no Grão-Pará (como politicamente denominou-se a região do 
Amazonas), foi extremamente ativa. Os jesuítas que lá estavam desde 
1607 foram expulsos em 1760. Novas lavouras foram introduzidas, 
POMBAL (AO LADO) EXPULSOU 
OS JESUÍTAS DA AMAZÔNIA. 
NA PÁGINA AO LADO, OBRA 
DE JACQUES BURKHARDT 
RETRATA MANAUS EM 1865
30 
amazônia: da conquista à integração
PASSAGEM DA FAMÍLIAREAL PELO PORTO DE BELÉM, EM 1807, É SAUDADA COM FESTA
PADRE ANTONIO VIEIRA E SEUS SERMÕES: DEFESA DA CAUSA DOS GENTIOS NA AMAZÔNIA
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como a do algodão, a do tabaco, a da cana-de-açúcar e a do café 
(trazido por Francisco de Melo Palheta – ver volume 2 desta coleção, 
Dos cafezais, nasce um novo Brasil). “Lusitanizou-se” o nome das ci-
dades, abandonando-se a toponímica brasílica, e a língua portuguesa 
passou a ser ensinada. “Liberaram-se os silvícolas” dos seus encargos 
nos aldeamentos, bem como um pequeno número de colonos açoritas 
foi distribuído entre Belém, Santarém e Ourém, para viabilizar os 
empreendimentos. 
Administrativamente, a região sofreu uma reforma: pelo ato régio 
de 20 de agosto de 1772, dividiu-se o antigo Estado do Grão-Pará – 
existente desde 1618 – entre o Estado do Maranhão e Piauí (com 
capital em São Luís) e o Estado do Grão-Pará e do Rio Negro (atual 
estado do Amazonas, com sede em Belém), ambos subordinados di-
retamente a Lisboa. A integração política da Amazônia com o resto 
do Brasil só deu seus primeiros passos com a instalação da corte de D. 
João VI no Rio de Janeiro, em 1808, quando então as duas capitais, 
Belém e Manaus, se lhe subordinaram.
Os portugueses, dentro de um rígido mercantilismo, sempre 
mantiveram uma política de clausura das colônias. A Amazônia não 
foi exceção. Nem mesmo ao célebre naturalista alemão Alexander 
von Humboldt, que visitou a América entre 1799 e 1804 (dele, a 
propósito, é a expressão “hileia amazônica”) foi permitido penetrar 
no lado português da floresta. Essa política começou a ser reformada 
com a vinda da família real para o Brasil, e com o decreto da Aber-
tura dos Portos às Nações Amigas. Durante o império, começaram 
a chegar ao país inúmeros naturalistas europeus, entre eles o francês 
Auguste Saint-Hilaire e os germânicos Spix e Martius, que coletaram 
informações sobre a botânica amazonense. 
Mas o imperador D. Pedro II, apesar das pressões internacionais, 
negou-se, pelo menos até 7 de setembro de 1867, a liberar a navega-
ção do grande rio aos estrangeiros, tarefa que desde 1853 estava ao 
encargo monopolista de uma empresa do Barão de Mauá. A propósito, 
a abertura do rio Amazonas à navegação estrangeira, quebrando com 
o monopólio de Mauá, foi um dos grandes debates políticos e ideo-
lógicos da segunda metade do século XIX, no qual se antepuseram 
liberais contra os mercantilistas. Três anos antes, em 1850, em uma 
outra reforma administrativa, criara-se a Província do Amazonas, 
separando-a do Grão-Pará, tendo Manaus como sua capital. 
A posição brasileira sobre a Amazônia era – e ainda é – ambígua. 
De um lado, reconhecia-se a escassez de recursos humanos e finan-
ceiros para explorar o continente verde, e do outro, impedia-se que 
estrangeiros, por meio de acordos e tratados, o fizessem. Uma das 
razões mais fortes – talvez por dizer respeito às raízes psicológicas, ao 
imaginário popular – é que a maioria dos brasileiros vê naquela região, 
no seu verdor, nos seus imensos rios e matas, um dos símbolos maiores 
da nacionalidade, tendo dificuldades em aceitar sua exploração eco-
nômica por mãos forâneas. Foi então que se deu o ciclo da borracha. 
INTEGRAÇÃO POLÍTICA 
DA AMAZÔNIA DEU 
SEUS PRIMEIROS 
PASSOS A PARTIR 
DE 1808, COM A 
CHEGADA DA FAMÍLIA 
REAL AO BRASIL
32 
martírio
riqueza
ouro branco:
e cultura
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34 
Foi em 1743, quando descia o Amazonas, vin-
do do Equador, que o naturalista francês Charles 
Marie de La Condamine tomou contato com uma 
árvore grande e descorada, de galhos altos e flores 
delicadas. Da planta, que posteriormente seria cha-
mada de Hevea brasiliensis, os nativos extraíam um 
líquido leitoso e viscoso. Condamine reparou que 
esse líquido, após coagulado, produzia uma substân-
cia maleável, de elasticidade e impermeabilidade 
sem-par, a qual os índios moldavam na forma de 
seringas, botas, garrafas e brinquedos. De volta à 
França, com certa quantidade do caoutchouc, como 
era chamado na Amazônia, o naturalista tentou 
fabricar uma roupa à prova d’água a partir do ma-
terial, que seguiu importando da Guiana Francesa 
para dar suporte a várias experiências. Foi assim que 
a substância aos poucos ganhou mais e mais espaço 
na Europa, tendo os ingleses, inclusive, percebido 
que a goma era excelente para apagar, e então a 
batizaram de rubber.
As seringas e galochas deixaram de ser artigos incomuns na Europa 
do início do século XIX. Tanto que, em 1827, a Amazônia exportou 
31 toneladas de borracha bruta, cifra que em 1830 subiria para 156 
toneladas. O problema da matéria-prima, entretanto, era sua sensi-
bilidade a mudanças de temperatura: as botas poderiam tanto ficar 
duras como pedra no auge do inverno, como grudentas no calor do 
verão. Somente em 1839 Charles Goodyear aperfeiçoou o processo 
de vulcanização, o que permitiu usar a borracha em rodas dentadas, 
correias, mangueiras, telhas, suspensórios, sapatos e capas de chuva. 
Mas o grande boom no consumo da borracha viria mesmo com a 
mania da bicicleta, inventada em 1890, seguida da popularização do 
automóvel, a partir de 1900 (Ford construiu seu primeiro carro em 
1896). A fabricação de pneus, portanto, alteraria completamente o 
equilíbrio do mercado de borracha, que durante algumas décadas seria 
dominado pela produção amazônica.
No Brasil, apesar do período conhecido como ciclo da borracha 
ser comumente identificado como tendo ocorrido entre 1870 e 1910, 
constata-se que já a partir de 1840 toda a atividade econômica da 
região amazônica passou a girar em torno da extração do látex e da 
exportação do produto fabricado a partir de seu manuseio. De acordo 
ouro branco: martírio, riqueza e cultura
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A PARTIR DE 1840 TODA A ATIVIDADE ECONÔMICA DA REGIÃO 
AMAZÔNICA PASSOU A GIRAR EM TORNO DA EXTRAÇÃO DO LÁTEX
GOODYEAR CONSEGUIU ESTABILIZAR QUIMICAMENTE A BORRACHA. ABAIXO, À ESQ., SERINGUEIRO, E À DIR., SEMENTES DA HEVEA
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ouro branco: martírio, riqueza e cultura
com Bárbara Weinstein, a penetração em novas zonas produtoras 
de borracha tornou-se preocupação especial já na década de 1860. 
Com o contínuo crescimento da demanda pelo produto no mercado 
mundial, a economia amazônica teve de incrementar sua produção 
do único modo que se julgava possível, até então: via expansão física 
para seringais ainda não explorados rio acima, especialmente na 
província do Amazonas. 
Em decorrência, Belém assumiu o papel de principal porto de escoa-
mento da produção gomífera. Mas diz Bárbara Weinstein: “Embora o 
Pará continuasse à frente na produção da borracha até anos avançados 
da década de 1880, a parcela que lhe cabia na produção total da região 
decaiu rapidamente de 1870 em diante. Enquanto durante os primeiros 
anos apenas uns poucos municípios paraenses (Breves, Anajás, Melgaço 
e Gurupá) haviam respondido pela maior parte da borracha produzida, 
na década de 1870 a extração da borracha havia se espalhado para o 
oeste, no baixo Xingu e no baixo Tapajós, no Pará, e de maneira ainda 
mais impressionante no Amazonas, nas zonas ricas em seringueiras dos 
rios Solimões, Madeira, Purus e Juruá”. Segundo Bárbara, embora muito 
distantes do mercado exportador de Belém, a densa concentração de 
ESTRADA DE FERRO MADEIRA-MAMORÉ SERIA IMPORTANTE CANAL DE ESCOAMENTO DA PRODUÇÃO DE BORRACHA A PARTIR DE 1912
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seringueiras ao longo desses rios e a relativa facilidade com que todos 
eles, com exceção do Madeira (ver capítulo 4), podiam ser navegados 
pela crescente frota de barcos a vapor do Amazonas, faziam com que 
fossem preferíveis aos trechos superiores do Xingu e do Tapajós, que 
corriam através de florestas também ricas em Heveas, mas semeados de 
corredeiras e quedas d’água intransitáveis. Ainda assim, era em Belém 
que quase toda a borracha amazônica continuava a ser armazenada, 
acondicionada e vendida para exportação.
De 1870 a 1910, ocorreu o maior surto econômico da região. Em 
1871, a borracha alcançou o primeiro lugar nas exportações do Pará, 
com4,8 milhões de quilos, contra 3,3 milhões de quilos de cacau. 
Segundo Bárbara Weinstein, em fins da década de 1880 o valor anual 
das exportações de borracha havia subido 800% na comparação com 
os números de 1860, e a borracha representava aproximadamente 
10% do comércio exterior do Brasil, apesar da acentuada expansão da 
economia cafeeira no período (ver volume 2 desta coleção, Dos cafezais 
nasce um novo Brasil). “Na virada do século, a borracha se tornaria 
o segundo produto brasileiro, constituindo 24% da exportação total 
do país”, atesta Bárbara.
EM FINS DA DÉCADA
DE 1880, O VALOR 
ANUAL DAS 
EXPORTAÇÕES DE 
BORRACHA HAVIA 
SUBIDO 800% EM 
RELAÇÃO A 1860
PARÁ DOMINOU A PRODUÇÃO DE BORRACHA ATÉ MEADOS DOS ANOS 1880
38 
ouro branco: martírio, riqueza e cultura
REGISTROS DE SERINGUEIRO PRODUZINDO BORRACHA DENTRO DE ABRIGO CONHECIDO COMO TAPIRI
NO SÉCULO XIX, GOVERNO DO AMAZONAS NÃO COGITAVA CULTIVO MAJENADO DA HEVEA
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OS SERINGUEIROS
O ciclo da borracha alterou de maneira significativa, não apenas a 
economia, mas também as relações sociais e culturais no Brasil de finais 
do século XIX. As duas mais importantes vertentes do processo dizem 
respeito, de um lado, às formas brutais de exploração da floresta, e de outro, 
à riqueza proporcionada pela borracha, que alterou completamente dois 
centros urbanos, Manaus e Belém, os quais, de cidades inexpressivas, em 
pouco tempo passaram a figurar como importantes e modernas metrópoles 
brasileiras. Vejamos de início como se dava a rotina de um seringueiro. 
Euclides da Cunha definiu o seringueiro como “o homem que 
trabalha para escravizar-se”. Tão chocantes eram suas condições de 
vida e tamanha sua impotência que o próprio Euclides registrou, em 
sua narrativa Judas-asvherus, que na época da malhação do judas os 
seringueiros faziam um boneco a sua semelhança, um judas-seringueiro. 
Malhavam a si mesmos, como que se autopunindo por aceitarem aquela 
situação infeliz. Na visão de Euclides, o maior jornalista brasileiro da 
época, a exploração a que os seringueiros estavam sujeitos era tamanha 
que constituía “a organização do trabalho mais criminosa que podia ser 
imaginada pelo egoísmo mais revoltante”. Como isso se dava na prática?
Quando chegavam à Amazônia, os homens que imaginavam fazer 
fortuna trabalhando na floresta, quase todos eles vindos do Nordeste, 
fugindo da seca, eram obrigados a comprar não apenas os utensílios usados 
na extração do látex, mas também o pirarucu ou charque e alguns litros 
de farinha que cada um deles iria precisar nos primeiros dias na mata, 
enquanto não aprendessem a caçar. O patrão do seringueiro tanto podia 
ser o grande proprietário (seringalista), que arrendava suas terras ao se-
ringueiro, como também o comerciante local, conhecido como aviador, 
que controlava informalmente a produção e o comércio da borracha na 
área, negociando a produção dos seringueiros e mantendo-os abastecidos 
de ferramentas, víveres e quaisquer outras extravagâncias a que pudessem 
se dar ao luxo.
Nas palavras de Warren Dean, respeitado brasilianista e autor de A luta 
pela borracha no Brasil: um estudo de história ecológica, livro que se tornou 
um clássico sobre o tema, a técnica da coleta do látex “é fácil de explicar, 
mas difícil de imaginar”. Dean assim descreve o trabalho dos seringueiros 
em meados do século XIX e início do XX:
“A Hevea brasiliensis é uma espécie típica do estágio clímax da floresta 
pluvial amazônica. Como quase todas as espécies semelhantes, não se 
encontrava em arvoredos ou em grupos, mas bastante dispersa na floresta, 
comumente apenas duas ou três árvores por hectare. O seringueiro espe-
rançoso tinha, primeiro, de localizar as árvores, depois abrir picadas – as 
chamadas estradas – ligando-as entre si. Essa tarefa poderia levar seis e 
até sete meses, tempo durante o qual pouca ou nenhuma extração podia 
ser feita. Normalmente o seringueiro abria duas ou três picadas com 60 a 
150 árvores cada, o máximo que uma pessoa seria capaz de se ocupar. Os 
métodos de extração foram ligeiramente aperfeiçoados: em vez de deixar o 
látex escorrer tronco abaixo a partir de numerosas pequenas incisões feitas 
com uma machadinha, prendiam-se pequenos copos sob cada incisão. (...) 
LOCALIZAR AS 
ÁRVORES DA 
HEVEA PODERIA LEVAR 
DE SEIS A SETE MESES 
DE TRABALHO, ANTES 
DE SE INICIAR A 
COLETA DO LÁTEX
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ouro branco: martírio, riqueza e cultura
Efetuava-se a sangria em dias alternados em cada estrada, a fim de permitir 
que as árvores se recuperassem. O seringueiro passava duas vezes por uma 
estrada. Na primeira vez, de manhã cedinho, quando o fluxo de látex era 
mais pesado, fazia as incisões. Depois, na segunda passagem, colhia o látex. 
À tarde, acocorava-se diante de um fogo alimentado por cocos, sobre o 
qual suspendia uma vara, que girava sem parar, enquanto o látex gotejava 
lentamente. Aos poucos, formava-se uma grande bola de borracha sólida”.
Prossegue Dean sobre a rotina do seringueiro:
“A temporada de coleta resumia-se aos seis meses de pluviosidade 
relativamente baixa, porque na estação das chuvas as trilhas se alagavam 
e os copos se enchiam de água. Dependendo das características variáveis 
das árvores, do tempo, do solo e dos seringueiros, essas técnicas propor-
cionavam uma produção anual de 200 a 800 quilos por seringueiro, com 
a média ficando abaixo de 500 quilos. (...) O processo de extração muitas 
vezes transcorria de tal modo que as árvores logo se exauriam ou sua 
casca ficava tão danificada que não podiam mais ser exploradas. Embora 
o produto acabado, se cuidadosamente ‘defumado’, atingisse preços tão 
elevados quanto os da melhor borracha coagulada das plantações, ami-
DESENHO DE JEAN PIERRE CHABLOZ, DE 1943, MOSTRA SERINGUEIRO PRODUZINDO AS BOLAS DE BORRACHA
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úde era cheio de impurezas, umidade e adulterações, estas introduzidas 
para elevar o preço de venda. O seringueiro deve ter sentido que merecia 
algum tipo de compensação. As torturantes condições de isolamento, 
privação e perigo a que estava sujeito limitavam sua carreira a algumas 
poucas temporadas, durante as quais contrair malária, doença de Chagas 
e leishmaniose era uma certeza virtual.”
O seringueiro era o último elo da cadeia econômica da borracha. Apa-
rentemente, era livre, mas a estrutura econômica o colocava em situação 
de trabalho semelhante à relação de servidão. Isto porque ele não tinha 
alternativa a não ser comprar os suprimentos necessários, a preço altíssimo, 
no armazém mantido pelo seringalista, e por isso estava sempre em débito 
na contabilidade e endividado, não conseguindo escapar da exploração 
do patrão. Aqueles que tentavam fugir de seus débitos eram remetidos de 
volta aos seringais, capturados em Belém ou Manaus.
Apesar da desigualdade absurda a que se submetiam os seringueiros, 
Warren Dean acredita que tal forma de organização era a única que acei-
tariam: “Embora o sistema extrativo lhes impusesse taxas de mortalidade 
e uma exploração tão severa que sua reprodução se tornava impossível, 
SERINGUEIRO 
ESTAVA SEMPRE 
ENDIVIDADO, 
NÃO CONSEGUINDO 
ESCAPAR DA 
EXPLORAÇÃO 
DOS PATRÕES
SERINGAL NO ACRE NOS DIAS DE HOJE: CULTIVO MANEJADO GARANTE RENTABILIDADE E MELHORES CONDIÇÕES DE TRABALHO
42 
os seringueiros, segundo se afirma, preferiam a existência itinerante ao 
plantio, por um orgulho embriagador e uma idêntica predileção pelo en-
riquecimento rápido em detrimento de uma remuneração fixa.”
A lucratividade da borracha era tanta e o domínio do mercado mun-
dial, tão marcante, que pouco se cogitava, na época, de buscar métodos 
de plantio manejado. Como relata Warren Dean, “a seringueira nativa era 
invencivelmente superior à seringueira plantada. O governo do Amazo-
nas exprimia sua confiança em que, quando a demanda desabrochasse, o 
Estado atrairia cada vez mais capital estrangeiro, o que reduziria os custos 
da coleta, estimulando, assim, o fornecimento nativo.” A crença na épo-
ca, portanto, era de que, caso um diaos estoques naturais se esgotassem, 
os amazonenses poderiam plantar a Hevea quando bem quisessem, e a 
borracha resultante sempre seria mais barata e de melhor qualidade que 
a asiática, onde, por volta de 1890, se iniciaram as primeiras experiências 
de cultivo manejado. As sementes da Hevea brasiliensis que viriam a desen-
cadear uma violenta alteração no mercado da borracha, cerca de 20 anos 
depois, teriam sido contrabandeadas do Brasil pelo inglês Henry Wickham, 
tendo as plantas que brotaram passado por um período de adaptação no 
Jardim Botânico de Kew, na Inglaterra, antes de serem transportadas 
para Ceilão, Java e Sumatra, onde deram origem a enormes seringais. Em 
seu livro, Warren Dean narra com riqueza de detalhes toda a misteriosa 
operação de contrabando realizada por Wickham, que acabou inclusive 
recebendo, em 1926, um prêmio por ter sido “o Francisco de Mello Palheta 
dos ingleses” (Palheta é o sargento-mor que em 1726 teria contrabandeado 
para o Brasil as primeiras sementes de café, as quais transformariam o país 
no maior produtor mundial do grão).
BELÉM, DO PARÁ E DO MUNDO
Os sacrifícios a que eram submetidos os seringueiros na floresta ama-
zônica eram apenas uma das faces do ciclo da borracha. Graças à riqueza 
proporcionada pela exportação do produto, Manaus e Belém viveram 
momentos de luxo e glamour. As duas cidades passaram a ser as mais 
desenvolvidas do Brasil e das mais prósperas no mundo, principalmente 
Belém, não só pela sua posição estratégica – quase no litoral –, mas tam-
bém porque sediava um maior número de residências de seringalistas, 
casas bancárias e outras importantes instituições. Foram atraídas para a 
região, nesse período, levas de imigrantes estrangeiros, como portugueses, 
chineses, franceses, japoneses, espanhóis e outros grupos menores, com o 
fim de desenvolverem a agricultura nas terras da Zona Bragantina.
Maria de Nazaré Sarges, autora do estudo Belém – riquezas produzindo 
a Belle Époque (1870-1912), refere que todo o processo de transformação 
pelo qual passou a capital do Pará se deve ao fato de que uma parte do 
excedente que se originou da riqueza proporcionada pela borracha foi 
canalizada para os cofres públicos, os quais direcionaram o investimento 
para a área urbana, incluindo o calçamento de ruas com paralelepípedos 
ouro branco: martírio, riqueza e cultura
DE PEQUENAS E 
MODESTAS CIDADES, 
BELÉM E MANAUS SE 
TRANSFORMARAM 
EM MODERNAS 
METRÓPOLES
RUA XV DE NOVEMBRO E OS TRILHOS DOS BONDES: MODERNIDADE NA CAPITAL PARAENSE
 43
44 
de granito importados da Europa, construção de prédios públicos, casarões 
em azulejos, monumentos, praças etc. “Era preciso alinhar a cidade aos 
padrões da civilização europeia. Desse modo, a destruição da imagem da 
cidade desordenada, feia, promíscua, imunda, insalubre e insegura, fazia 
parte de uma nova estratégia social, no sentido de mostrar ao mundo 
civilizado (entenda-se Europa) que a cidade de Belém era o símbolo do 
progresso, imagem que se transformou na obsessão coletiva da burguesia”, 
refere a autora.
Da Europa, especialmente da França, é que veio o modelo de urbanis-
mo moderno, reproduzido em Belém com expressividade. Foi durante a 
administração do Intendente Antônio José de Lemos que se construíram 
boulevards, praças, bosques, asilo, mercados. Na mesma época, implantou-
-se também uma rigorosa política sanitarista. “Belém vai sofrer alterações 
que se operam nas estruturas sociais, ocasionando uma intensificação da 
vida social e intelectual da cidade, aumento demográfico, maior comple-
xidade nas relações sociais e a concentração de fortunas entre os novos 
setores dominantes”, atesta Maria de Nazaré.
Esse nova ordem econômica propiciou a composição de uma nova 
elite, formada por comerciantes, seringalistas, financistas, com destaque 
para os profissionais liberais, geralmente de famílias ricas e oriundos de 
universidades europeias. É este novo grupo dominante que, em nome 
ouro branco: martírio, riqueza e cultura
CHAFARIZ NO LARGO DA PÓLVORA E CASAL EM TRAJES DE ÉPOCA, EM FOTO DE BELÉM NO INÍCIO DO SÉCULO XX
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VER-O-PESO LOGO SE TRANSFORMOU EM UM DOS MAIS MODERNOS MERCADOS DO PAÍS
do progresso, vai direcionar a remodelação da cidade, imprimindo-lhe o 
brilho da chamada belle époque.
O cosmopolitismo do ciclo da borracha transformou Belém, e também 
Manaus, como se verá adiante, em pequenas reproduções de cidades 
europeias. Em Belém, entre 1890 e 1900, surgiram 25 novas fábricas – 
de biscoitos, açúcar refinado, caramelo, pão, café; de fibras e cordas; de 
artefatos de borracha, e até uma fábrica de licores, além da Fábrica de 
Cerveja Paraense, em 1905.
Não há dúvida de que a moda é um fenômeno típico da sociedade ur-
bano-industrial, estimuladora do consumo. Na Belém do século XIX, mu-
lheres das classes abastadas tinham um zelo especial pela indumentária,de 
tal forma que precisavam mandar buscar seus vestidos em Londres e/ou 
Paris. Para resolver essa questão, surgiram na cidade estabelecimentos 
comerciais para atender o requinte das damas e cavalheiros, entre eles 
Paris N’América, Bom Marché, Maison Française, além de lojas ambu-
lantes que vendiam, em carros e tabuleiros, fazendas francesas, inglesas e 
diversas miudezas.
A navegação a vapor, introduzida em 1853, teve grande importância 
econômica para a exportação da borracha e o comércio internacional.
Os modernos extrativistas trataram de mandar seus filhos estudarem na 
Europa, visando a uma futura substituição dos burocratas administrativos 
EXTRATIVISTAS 
MANDAVAM OS FILHOS 
PARA A EUROPA, 
FORMANDO UMA NOVA 
ELITE INTELECTUAL
46 
que comandavam o país até então. Essa elite de doutores e intelectuais 
influenciou na formação de novos hábitos: os donos de seringais, em sua 
maioria, moravam na cidade, atraídos pelos confortos que esta passara a 
lhes oferecer. Alguns dos novos ricos construíram suas residências inspira-
dos no estilo art nouveau, com azulejos de Portugal, colunas de mármore de 
Carrara e móveis de ebanistas franceses. Mandavam buscar companhias 
artísticas na França, em Portugal e no Rio de Janeiro, que fizeram época 
no Teatro da Paz. Calcula-se que apenas de fevereiro a dezembro de 1878 
foram apresentados aproximadamente 126 espetáculos no teatro.
Foram criadas linhas de bonde, bancos instalaram-se na cidade (em 
1886 já funcionavam quatro estabelecimentos), assim como companhias 
seguradoras, essas últimas intimamente ligadas ao sistema financeiro es-
tabelecido na região. Na verdade, franceses, ingleses e norte-americanos 
dirigiam a comercialização da borracha. Os ingleses chegaram a instalar 
na cidade uma agência do London Bank of South America, antes mesmo 
de outros bancos brasileiros. A libra esterlina circulava como mil-réis, e 
os transatlânticos da Booth Line faziam linhas regulares entre a capital 
amazonense e Liverpool.
Todo o processo de urbanização em Belém não esteve ligado somente 
à intensificação da vida industrial, como ocorreu nas cidades europeias 
e americanas. Aqui, as funções comercial, financeira, política e cultural 
tiveram influência decisiva. O crescimento populacional impactou a cida-
de. Em 1872, a população do Pará era de 275 mil habitantes, 61.900 dos 
ouro branco: martírio, riqueza e cultura
O TEATRO DA PAZ, EM OBRA DE RIGUINI 
 47
quais em Belém. Em 1900, estes números subiram para 445 mil no Estado 
e 96.500 na capital. Em 1920, o Pará tinha quase 1 milhão de habitantes, 
dos quais 236 mil em Belém.
Além dos lucros gerados pela extração e comercialização da borracha, a 
queda da Monarquia e a proclamação da República garantiram aos Estados 
maior autonomia e maior participação na renda concernente à exportação 
da borracha. Foi graças a esses recursos que surgiram na cidade o Merca-
do Ver-o-Peso (1901), o Hospital Dom Luiz, o Grêmio Literário, a The 
Amazon Telegraph Company, o Arquivo e a Biblioteca Pública (1894), o 
já citado Teatro da Paz (1878), 43 fábricas (que produziam desde chapéus 
atéperfumarias), cinco bancos, quatro companhias seguradoras, além da 
implantação da iluminação a gás, em 1905.
Do ponto de vista do saneamento e da limpeza pública, o objetivo 
era afastar os ares fétidos causados pela emanação mal cheirosa do lixo 
urbano. A utilização do crematório do lixo tornou-se imprescindível. O 
governo estabeleceu e divulgou a hora em que o arrematante da limpeza 
passaria nos prédios e casas para recolher os lixos e nos lugares públicos 
em que seus carros especiais passariam. Os infratores seriam multados. 
Graças à criação do Departamento Sanitário Municipal, viabilizou-se a 
construção de redes de esgotos e de água e a drenagem de pântanos. Até 
mesmo barbeiros, cabeleireiros e semelhantes foram obrigados a empregar 
materiais que não prejudicassem a saúde e a esterilizar seus instrumentos. 
O conceito de “higienização” da cidade incluiu também uma nova 
A IMPONENTE CATEDRAL DA CAPITAL DO PARÁ, TAMBÉM NA VISÃO DE RIGHINI
DEPARTAMENTO 
SANITÁRIO CONSTRUIU 
REDES DE ESGOTOS 
E ÁGUA E DRENOU
OS PÂNTANOS
48 
ordem no que se refere às questões de moralidade. Ao observarem-se as 
condutas que passavam a ser proibidas, é possível detectar alguns dos 
hábitos frequentes dos cidadãos que moravam nos núcleos urbanos antes 
do boom da borracha. Pelo artigo 110 do Código de Posturas, por exemplo, 
ficava proibido “fazer algazarras, dar gritos sem necessidade, apitar, fazer 
batuques e sambas”. Já o artigo 128 proibia inclusive “proferir palavras 
obscenas nas ruas e lugares públicos, praticar atos ou gestos reputados 
ofensivos à moral e à decência, tomar banho nas praças e fontes públicas”. 
O inciso VII do mesmo artigo ia além: “... é proibido chegar à janela ou 
porta em traje indecente ou em completa nudez, ou conservar-se em casa 
em tais condições, de maneira que seja visto pelos transeuntes”. 
Se de um lado Belém era dependente comercialmente da Inglaterra, 
de outro mantinha uma relação cultural muito próxima com a França, a 
qual se intensificou a partir de 1838, com a criação do Instituto Histórico 
Geográfico Brasileiro. A babel de influências estrangeiras nos hábitos e 
costumes, de outra parte, se expressava na importação de biscoitos e cham-
panha franceses; de vinagre e azeitonas portuguesas; de vinhos franceses, 
portugueses e espanhóis; de manteiga inglesa; de sabão americano e até 
de chá de Pequim. Os navios europeus, principalmente franceses, traziam 
também as notícias sobre as peças e livros mais em voga, as escolas filosófi-
cas predominantes, o comportamento, o lazer, as estéticas e até as doenças. 
Até a arborização fez parte do planejamento urbano, visando à 
qualidade de vida proporcionada pelo ar purificado, mas também o 
embelezamento da cidade, amenizando o clima tropical. O calçamento 
se intensifica, tomando o lugar das pedras soltas e areia. Nas vias que 
circundavam o Teatro da Paz, por exemplo, foram usados paralelepípedos 
de asfalto, para que o tráfego de veículos condutores de passageiros, 
quando feito junto a esse prédio, não perturbasse os assistentes das 
funções da casa de espetáculos.
O serviço de viação pública, a propósito, foi inaugurado em agosto 
de 1907. Havia vários tipos de bondes, incluindo-se carros-salões, com 
vestíbulo em cada extremo, 12 cadeiras móveis, seis janelas de ventiladores, 
ouro branco: martírio, riqueza e cultura
ALARGAMENTO DAS 
RUAS E CONSTRUÇÃO 
DE AVENIDAS E 
SUNTUOSAS PRAÇAS 
RENOVARAM O CENÁRIO 
URBANO DE BELÉM 
E DE MANAUS
 49
caprichado acabamento interno e até mesmo serviço de buffet. Quando 
ocorria a condução de autoridades em ocasiões especiais, acrescentavam-
-se ventiladores, cortinas, porta-chapéus e bengalas, vasos com plantas e 
pequenas mesas.
O alargamento das ruas, a construção de largas avenidas e suntuosas 
praças também integrava a renovação do cenário urbano de Belém. No 
Mercado de Ferro Ver-o-Peso, os balcões dos açougues eram de mármore 
e as ruas do interior calçadas a paralelepípedos de granito, sobressaindo-se 
na construção os gradis, a escada em espiral feita de ferro, tudo de acordo 
com o estilo art nouveau.
MANAUS
Manaus, simultaneamente, foi uma das primeiras cidades do Brasil 
a vivenciar o espírito da belle époque, transformando-se de um sim-
ples vilarejo à beira do rio Negro em uma pujante cidade, dotada de 
infraestrutura urbana moderna, tornando-se a sede dos negócios que 
giravam em torno da borracha na Amazônia ocidental. O governador 
Eduardo Ribeiro destacou-se por suas ações administrativas visando à 
estruturação urbana e paisagística da cidade, dotando-a, inclusive, com 
o Teatro Amazonas, inaugurado em dezembro de 1896 e considerada 
a mais importante demonstração de refinamento e bom gosto da belle 
époque no Brasil. Em janeiro de 1909, os amazonenses criaram aquela 
que é considerada a primeira universidade brasileira, que recebeu o nome 
de Escola Universitária Livre de Manaus, atualmente denominada de 
Universidade Federal do Amazonas (Ufam).
Os médicos Adolfo Lindenberg e Vítor Godinho publicaram, inicial-
mente no jornal O Estado de S. Paulo, e depois em livro (Norte do Brasil 
através do Amazonas, do Pará e do Maranhão) as impressões de uma viagem 
que empreenderam em 1904. A respeito de Manaus, dizem eles:
 “A cidade de Manaus lembra São Paulo por muitas razões: por seu 
cosmopolitismo, por seu progresso vertiginoso, por sua arquitetura, por 
suas obras municipais, por ter um monopólio comercial e pelo futuro que 
lhe está reservado. Há 50 anos, Manaus era uma cidade pequeníssima: 
contudo, os seus visitantes já lhe previam um futuro grandioso por sua 
situação privilegiada. Depois da República, ela tem aumentado extraor-
dinariamente, devendo possuir hoje uma população de 50 mil a 55 mil 
habitantes. Pode-se dizer que foi a imigração maranhense que lhe levou 
a iniciativa e o progresso.”
Prosseguem Lindenberg e Godinho em sua narrativa:
“O progresso de Manaus lembra o vertiginoso progresso de São Paulo, 
porque se acentuou depois da República. (...) Em Manaus, há muito menos 
pedra de construção do que em São Paulo; por isso, as edificações são em 
sua grande maioria de tijolos, que se prestam a uma arquitetura muito mais 
fácil e mais em conta do que pedra. (...) Quase todas as casas têm platiban-
das, o que as torna muito mais elegantes. Também as ruas são largas e bem 
alinhadas, e já se tem cuidado da arborização de alguma delas, e sobretudo 
das praças. Bonitos jardins existem, ostentando a exuberância da região 
amazônica, e nos arredores da cidade bosques bem aproveitados. (...) As 
ALFÂNDEGA (ALTO) E SEDE 
DO BANCO ULTRAMARINO 
(ACIMA), EM MANAUS. NA 
PÁGINA AO LADO, BANCO 
COMERCIAL, EM BELÉM
50 
ruas centrais da cidade são bem calçadas a paralelepípedos de granito, 
importados de Portugal ou do Rio de Janeiro, e duas delas são asfaltadas. 
(...) É de lastimar. Os chopes consumidos em Manaus são de procedência 
alemã, e por isso custam caro, 1 mil réis. O consumo de cerveja é muito 
grande, como em geral de todas as bebidas alcoólicas. Os botequins e 
mercearias existem profusamente e são todos muito frequentados. Neles 
se nota um hábito muito europeu: as mesinhas dispostas nos passeios dos 
boulevares ou avenidas, nos trottoirs, como se diria em Paris.” 
 Mais adiante, comentam os médicos:
“Em Manaus, não faltam doentes de impaludismo. Os seringueiros 
que adoecem nas regiões mais paludosas vêm tratar-se na cidade, e são 
em tão grande número que dão meios de subsistência a um respeitável 
corpo clínico. Quando lá estivemos, havia na cidade cerca de 70 médi-
cos. (...) O Palácio da Justiça é um monumento aparatoso tanto por sua 
construção como por sua mobília. (...) A mesma coisa se poderá dizer do 
teatro, que custou 11 mil contos de réis. Este tem enormes saguões, espa-
çosos corredores, um recinto primoroso e um foyer magnífico. O foyer é 
circundado de vistosas colunatas fingindo mármore, e a decoração é obra 
de De Angelis. (...) A cúpula do teatro é toda de mosaico, com as coresda bandeira nacional, losangos amarelos em campo verde.” 
A DECADÊNCIA 
Em janeiro de 1910, o mundo industrial foi subitamente acometido 
de grave crise de “febre” da borracha. Após dois anos de aumentos de 
ouro branco: martírio, riqueza e cultura
CÚPULA DO TEATRO AMAZONAS: 36 MIL PEÇAS DE ESCAMAS EM CERÂMICA ESMALTADA E TELHAS VITRIFICADAS, VINDAS DA ALSÁCIA
 51
preço firmes, porém gradativos, uma alta sem precedentes no valor da 
borracha fez com que os capitalistas de todo o mundo se lançassem a 
investir apressadamente na produção da borracha bruta. Nos meses que 
se seguiram, centenas de companhias, representando milhões de libras 
esterlinas de capital, surgiram literalmente da noite para o dia. A Indian 
Rubber World, sempre tomando o pulso do mercado da borracha bruta, 
instava com seus leitores que não hesitassem em aceitar adquirir a borracha 
a 2 dólares a libra, advertindo ser pouco provável que os preços viessem a 
cair em futuro próximo. Mas já no mês de maio a febre estacou. Ninguém 
estava preparado para o violento mergulho que deu o mercado da borracha 
bruta nos meses restantes do ano de 1910, chegando a menos de um 1,20 
dólar já em novembro. 
Ao contrário do que também imaginavam os brasileiros, a partir 
de 1911 o preço do produto caiu vertiginosamente, à medida que uma 
quantidade cada vez maior da borracha de cultivo (originária da Ásia) 
chegava ao mercado. Numa onda especulativa, o produto brasileiro 
subiu para 15 mil réis o quilo em abril de 1910, mas em junho de 1911 
caiu para 6 mil réis. Nas palavras de Bárbara Weinstein, “essa queda, 
longe de um simples interlúdio, acabou sendo o começo de uma de-
cadência de dez longos anos que iria aleijar a economia extrativa da 
Amazônia”. Prossegue Bárbara: “Para tornar pior o que já estava mau, 
a causa real dessa febre de última hora da borracha era exatamente 
aquilo que iria desferir o golpe fatal na economia extrativa da região: 
após 20 anos de trabalho dedicado de botânicos e de empresários 
TOMBADO COMO PATRIMÔNIO HISTÓRICO EM 1966, TEATRO TEM CAPACIDADE PARA 701 PESSOAS NA PLATÉIA E NOS CAMAROTES
QUEDA BRUSCA 
DOS PREÇOS DA 
BORRACHA, EM 1910, 
DEU INÍCIO A UMA 
LONGA E DEMORADA 
DECADÊNCIA
52 
britânicos, as plantações de Hevea na Ásia tinham, afinal, começado 
a produzir borracha em quantidades consideráveis”.
Ao contrário do que caracterizava o modo de produção brasileiro, 
que previa a necessidade de mais e mais seringueiros embrenhando-se 
cada vez mais profundamente na floresta, a borracha cultivada quase não 
apresentava obstáculo à expansão, após o período de cinco a oito anos 
para as árvores atingirem a maturidade. Em termos gerais, as condições 
na Ásia eram extremamente favoráveis ao cultivo: enormes extensões 
de terra podiam ser ocupadas sem burocracia, o transporte era feito sem 
dificuldades e a preços baixos, enquanto a mão-de-obra era abundante e 
sabidamente barata. Com isso, não é de se estranhar que a área de cultivo 
da Hevea crescesse de 5,3 milhões de hectares, em 1905, para 46 milhões 
em 1910, e para incríveis 101 milhões de hectares em 1915. Como aponta 
Bárbara Weinstein, “se se calcular uma média de 200 árvores por hectare, 
torna-se logo evidente como o cultivo de Hevea conseguiu, em tão pouco 
tempo, eclipsar a economia da borracha silvestre”, com suas duas ou três 
árvores por hectare.
O governo brasileiro, tardiamente, tentou reagir, criando o plano 
Defesa Econômica da Borracha, que incluía prêmios para pessoas que 
tentassem um “cultivo racional” e recursos para estações agrícolas experi-
mentais. De nada adiantou. Mais uma vez é Warren Dean quem sintetiza 
o momento: “Quando a crise atingiu a região, o crédito privado logo sofreu 
um colapso, juntamente com o do governo. Os aviadores e patrões estavam 
endividados, com pouca margem para honrar os exportadores credores. 
Diz-se que as perdas em 1913 chegaram a mais de 4 milhões de libras. A 
elite regional lutou para persuadir os investidores estrangeiros a renovarem 
seus investimentos na coleta da borracha. Procurou fundos para o banco 
regional proposto, para novos escritórios locais de compra das indústrias 
da borracha e para mais aquisições de seringais nativos pelas chamadas 
companhias de plantação”.
Mas tudo foi por água abaixo com a queda do preço da borracha. Em 
1910, a exportação do produto correspondia a 134 mil contos de réis, para 
uma produção de 34 mil toneladas. Três anos depois, não alcançava 70 
mil contos de réis. A crise se manifestou na falência das casas aviadoras, 
na queda da produção dos seringais, no caos das finanças públicas. 
Luis Osiris da Silva assim resumiu a fase de decadência: “A Amazônia, 
descapitalizada, manietada pela falta de poupanças locais, presa a uma 
estrutura econômica retrógrada, viu passar desse modo sua chamada fase 
áurea. E assim, embora tenha sido a pedra de toque da conquista do vale 
para o Brasil, a borracha ficaria reduzida apenas ao mais vibrante capítulo 
do homem planiciário para constituição de sua economia”.
Se o primeiro ciclo da borracha estava encerrado, outros capítulos na 
história da região amazônica ainda estavam por ser escritos: a conquista 
do Acre, a construção da Estrada de Ferro Madeira-Mamoré, a Fordlândia 
e a triste história dos soldados da borracha. 
ouro branco: martírio, riqueza e cultura
SE O CICLO DA 
BORRACHA ESTAVA 
ENCERRADO, OUTROS 
CAPÍTULOS NA 
HISTÓRIA DA AMAZÔNIA 
ESTAVAM POR 
SER ESCRITOS
TEATRO AMAZONAS PASSOU POR COMPLETA RESTAURAÇÃO EM 1990
 53
54 
do acre
a conquista
 55
56 
Trinta e cinco anos antes de eclodir o problema 
do Acre, território que o Brasil reconhecia ser da 
Bolívia, o governo do império do Brasil assinara o 
Tratado de Ayacucho, em 1867, com aquele país 
no sentido de mais ou menos fixar áreas limítrofes 
em comum. Dez anos depois, assombrados pela 
violenta seca de 1877/79, que devastou o Ceará, 
milhares de cearenses partiram para os fundões 
da Amazônia atrás de uma alternativa para a sua 
sobrevivência. Em 1882, fundaram o Seringal Em-
presa, que mais tarde veio a ser a capital do Acre, 
rebatizada de Rio Branco. 
Foi assim, na chamada “transumância amazônica”, que os nordestinos 
adentraram na região do rio Acre, situada no extremo noroeste do Brasil, 
atrás das valiosas seringueiras. A revolução dos transportes que andava a 
galopes nos países Europeus e nos Estados Unidos, paralela à expansão da 
eletricidade, tinha fome por borracha, que naquela época saía toda ela da 
Amazônia, sendo que 60% era extraída do território acreano. 
Obviamente que o governo andino não via com bons olhos aquela 
arribada crescente dos brasileiros. Para os bolivianos, a situação pratica-
mente repetia o que ocorrera na década de 1870, com a penetração de 
trabalhadores chilenos na área do Atacama atrás do salitre, que provocara 
a Guerra do Pacífico (1879-1883). A Bolívia, derrotada, perdeu sua saída 
para o Oceano Pacífico, tendo que aceitar ficar isolada dos oceanos do 
mundo. 
Em um primeiro momento, José Paravicini, o embaixador boliviano 
no Rio de Janeiro, determinou que fosse fundado, em 3 de novembro de 
1899, um posto alfandegário em Puerto Alonso, para se fazer presente na 
área. Ato de soberania que, se bem que legítimo, irritou profundamente 
os seringueiros brasileiros que cercaram o posto e expulsaram os funcio-
nários dali. 
Neste entremeio, entra em cena o aventureiro Luís Galvez, dito “o 
Imperador do Acre”. Luiz Galvez Rodrigues Arias era um jornalista de 
origem espanhola, que pretendeu ocupar o vazio deixado pela momen-
tânea ausência das autoridades bolivianas, espantadas com a fúria dos 
seringueiros. Poliglota, duelista audaz e boêmio, Galvez era diretor do 
jornal Comércio do Amazonas, e escorado pelo governador Ramalho Júnior, 
tomou a peito realizar uma incursão ao Acre. 
Tratou-se de uma epopeia rocambolesca, digna das páginas da litera-
tura fantástica, visto que Galvez, um sem-raízes que vivia intrigando nas 
redações, consulados e palácios,terminou não somente proclamando a 
a conquista do acre
IMAGEM DE J.A.CORREA RETRATA A FOME NO CEARÁ EM 1877-78
 57
58 
Independência do Estado do Acre, na data simbólica de 14 de julho de 
1899, como ainda, por nove meses (entre 14 de julho de 1899 e 1º de 
janeiro de 1900 e depois, entre 30 de janeiro e 15 de março), agiu por 
lá, nos velhos moldes ibéricos, como um ditador. Assumiu por igual a 
magistratura, mandou fazer selos, desenhou a bandeira acreana (a estrela 
vermelha pairando em meio às cores brasileiras), criou ministérios e até 
um serviço de bombeiros. Por igual abriu escolas para tentar dirimir o 
analfabetismo dos seringueiros. 
É possível que, com a captura do Acre, ele quisesse realizar uma espécie 
de desforra contra os ianques, pois naquele mesmo ano, com o desastre 
da Espanha na Guerra Hispano-Americana de 1899, Cuba e Porto Rico 
haviam sido integradas aos interesses dos Estados Unidos. Tanto assim que, 
na formação do seu “exército”, Galvez conseguiu atrair uns 20 veteranos 
espanhóis que, foragidos do Caribe e enfiados no interior da Amazônia 
atrás da fortuna, se mostraram dispostos a embarcar no navio para dar 
uma lição nos prepostos dos americanos. Para eles, impedir que os ianques 
ocupassem o Acre era compensar-se da recente derrota.
Era um império de selva fechada e de barrancas de rio, habitado 
por uns 13 mil seringueiros com suas famílias. O sonho delirante acabou 
A GRANDE SECA NO CEARÁ LEVOU MILHARES A MIGRAREM PARA O ACRE
AVENTURAS E 
TRAPALHADAS DE 
GALVEZ RENDERAM 
LIVROS EM PORTUGUÊS 
E ESPANHOL
a conquista do acre
 59
MONUMENTO A GALVEZ, EM FRENTE À ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ACRE 
CAPA DO LIVRO DE ALFONSO 
DOMINGO SOBRE GALVEZ
quando tropas federais brasileiras, atendendo os reclamos dos bolivianos, 
deslocaram-se para lá para afastá-lo definitivamente. Luiz Galvez, que ao 
seu jeito, como modos de tirano, implementou o primeiro governo moder-
nizador naquelas áreas, ainda que bem pouco conhecido, foi o derradeiro 
aventureiro espanhol a embrenhar-se na conquista da Amazônia, façanha 
começada no século XVI com Gonzalo Pizarro e Francisco Orellana.
Detido sem resistência no Acre, Galvez, levado de volta para Manaus, 
viu-se desterrado para Pernambuco, de lá embarcando de volta para a 
Espanha. Suas aventuras e trapalhadas atraíram a atenção do novelista 
amazonense Marcio de Souza, que narrou suas peripécias no livro Galvez, 
imperador do Acre, de 1976. Na Espanha, editou-se em 2003 o livro La 
Estrela Solitaria, de autoria de Alfonso Domingo, que conta a aventura do 
espanhol que criou o Estado Independente do Acre, concluindo que ele 
foi “o único espanhol que ganhou uma guerra contra os Estados Unidos”.
O BOLIVIAN SYNDICATE
Cada vez ficava mais evidente de que a Questão do Acre repetia 
Atacama, portanto La Paz precisava agir para manter o território em mãos 
nacionais. Além de enviar uma força para lá, engendraram um outro 
60 
a conquista do acre
PLÁCIDO DE CASTRO E BARÃO DO RIO BRANCO: FIGURAS DECISIVAS NA HISTÓRIA DO ACRE
 61
caminho. A solução encontrada não podia ter sido pior. Fora o próprio 
Luís Galvez que, trabalhando então para o cônsul boliviano em Manaus, 
descobriu que os bolivianos estavam em tratativas de passar o controle 
do território do Acre para o Anglo-Bolivian Syndicate, de Nova York, 
que tinha o milionário Withridge como seu acionista principal. Era um 
contrato do tipo conhecido como chartered companies, muito em voga na 
África naquela época, pelo qual uma empresa concessionária qualquer, 
europeia ou americana, praticamente assumia as funções soberanas sobre 
certa área que ela desejava explorar economicamente. Detinha não só o 
monopólio sobre a produção e exportação, como também auferia os direitos 
fiscais, mantendo ainda as tarefas de polícia local. 
Concretizado o contrato, o Bolivian Syndicate, associado à U.S. 
Rubber Co., que compraria toda a produção da borracha, fatalmente 
atrairia para dentro da região amazônica o poder dos Estados Unidos 
que, em última instância, assumiriam, ainda que indiretamente, a 
proteção dos interesses de uma empresa norte-americana no Acre 
que gozaria por lá de privilégios majestáticos. Portanto, qualquer de-
savença que ocorresse entre os seringueiros e os interesses do Bolivian 
Syndicate oporia o Brasil aos Estados Unidos. Dois acontecimentos 
vieram, então, a atrapalhar aqueles planos dos bolivianos: a rebelião 
acreana de Plácido de Castro e a ação diplomática do Barão do Rio 
Branco, que considerou a concessão boliviana ao Bolivian Syndicate 
uma “monstruosidade legal”. 
A REVOLTA DOS SERINGUEIROS
Os conflitos anteriores entre brasileiros e bolivianos – entre os quais a 
célebre “expedição dos poetas”, uma romântica aventura de intelectuais e 
estudantes amazonenses liderados por Orlando Corrêa Lopes que, partindo 
de Manaus a bordo do vapor Solimões, quiseram ajudar os seringueiros 
a “libertar o Acre”, fracassando lamentavelmente –, fizeram-se quase 
espontaneamente, sem planos, sem estratégia, sem liderança. Foi então 
que entrou em cena um novo personagem, que daria outros rumos aos 
acontecimentos.
A vida de Plácido de Castro ainda não gerou um romance a sua altura. 
Nem os poucos ensaios que lhe foram dedicados conseguiram capturar a 
diversidade dramática das suas façanhas. Gaúcho de São Gabriel, nasci-
do em 9 de setembro de 1873 na estância Tapera da Genoveva, Plácido 
trazia no sangue o pulsar de um guerreiro. Descendia de uma dinastia 
de militares: seu pai, Prudente da Fonseca, havia lutado na Guerra do 
Paraguai; seu avô, José Plácido, esteve nas Guerras Cisplatinas, e um dos 
seus bisavós, Joaquim José Domingues, participou junto com Borges do 
Canto na ocupação das Missões, que levou à integração delas ao território 
do Rio Grande do Sul, em 1801.
Quando aluno do Colégio Militar, Plácido não acompanhou seus 
colegas de farda na época da Revolução Federalista de 1893. Antifloria-
nista e anticastilhista, abandonou o exército e foi alistar-se junto ao líder 
maragato Gumercindo Saraiva (1852-1894), que assombrava o interior do 
Rio Grande do Sul com sua veia de combatente astuto e muito valente.
A VIDA DE PLÁCIDO 
DE CASTRO AINDA 
NÃO DEU ORIGEM A 
UM ROMANCE QUE 
ESTEJA À ALTURA 
DE SEUS FEITOS
62 
Anistiado no posto de major aos 21 anos ao findar o levante, Plácido 
de Castro tinha alguns conhecimentos técnicos, e assim tornou-se inspetor 
do Colégio Militar do Rio de Janeiro e, logo depois, funcionário das docas 
de Santos. Curiosamente, justo quando estava na função de fiscal do cais 
do porto, obteve a provisão de agrimensor. 
Entediado com aquilo, tomando por meio de um amigo ciência da 
carência de profissionais nas áreas da borracha, embarcou em 1899 para 
o Amazonas, atrás de fortuna. Pouco depois, quando estava demarcando 
áreas seringueiras no rio Purus, estourou o escândalo do Bolivian Syndicate, 
que implicava no arrendamento do território por 20 anos. Os seringais 
voltaram a se abalar com os gritos de guerra. A notícia do arranjo de La 
Paz com os americanos foi o elemento catalisador de todas as energias 
revolucionárias. Desta vez o furor dos acreanos teria um comandante 
profissional na liderança da insurgência. O tempo dos amadores impul-
sivos, como Galvez e os poetas, passara. A Revolução Acreana, por fim, 
encontrara o seu caudilho. 
Em uma reunião feita em Caquetá, no 1º de julho de 1902, Plácido e 
os demais insurgentes, formando a Junta Revolucionária, urdiram as bases 
do futuro Estado Independente do Acre, prevendo sua integração no Brasil. 
O gaúcho exigiu de todos o compromisso de obediência indiscutível ao 
Comandante-em-chefe do Exército do Estado Independente do Acre, 
não aceitando a dispersão da autoridade ou seu questionamento. Obteve, 
inclusive, a anuência do representante do governador do Amazonas, o 
doutor Gentil Norberto, que, mesmo sendo o homem do dinheiro e do 
fornecimento das armas, aceitou subordinar-se a ele. 
A experiência de combate adquiridapor ele junto à guerrilha maragata 
ajudou-o na montagem da estratégia. Em pouco tempo, um exército de 
2 mil seringueiros estava à disposição nos arredores de Xapuri. Bastaram 
33 deles, capitaneados por um tal de José Galdino, para capturarem o 
povoado. Em 6 de agosto de 1902, começara a etapa final do processo 
revolucionário com a imediata proclamação de independência, ato que 
se seguiu ao arriar a bandeira boliviana.
A LUTA NA SELVA
Cercando as guarnições enviadas de La Paz com grandes cinturões 
de homens armados com rifles e com arma branca (por força do ofício, 
os caucheiros eram exímios lutadores com facas), surgiam de repente do 
interior dos matos e punham todos os inimigos a correr. Diga-se que, na-
quelas condições, caminhando pelas trilhas em meio à selva densa, mais 
medo tinham das feras e dos insetos do que de enfrentar homens.
Em uma campanha relâmpago, uma por uma das praças foram 
caindo no controle dos revoltosos, até que, 171 dias depois da tomada 
de Xapuri, em 21 de janeiro de 1903, Plácido de Castro contou com 
a vitória definitiva. Os combates mais importantes foram o da Volta 
da Empresa, travado em 18 de setembro de 1902 (ocasião em que 
os acreanos emboscaram a tropa do coronel Rosendo Rojas), e o da 
Nova Empresa (onde o mesmo oficial foi novamente batido quando 
submetido a um cerco em 6 de outubro de 1902).
a conquista do acre
A EXPERIÊNCIA DE 
COMBATE ENTRE OS 
MARAGATOS 
AUXILIOU PLÁCIDO 
A MONTAR A MELHOR 
ESTRATÉGIA DE LUTA
 63
PLÁCIDO LIDEROU 
2 MIL SERINGUEIROS, 
MAS TERMINOU MORTO 
EM UMA EMBOSCADA 
NO BRASIL
UMA DAS RARAS IMAGENS DE PLÁCIDO DE CASTRO 
EM COMBATE (NO ALTO, À DIREITA, A CAVALO)
64 
A operação derradeira foi concluída com o ataque de Plácido 
ao Porto Acre, manobra que se estendeu por nove dias, de 15 a 24 
de janeiro de 1902, e que findou com o içar da bandeira branca por 
parte do governador boliviano e a assinatura da Carta de Rendição da 
Bolívia por Dom Lino Romero. Os remanescentes dos destacamentos 
bolivianos entregaram-se ou deram a volta para o interior do país.
Plácido de Castro pouco proveito tirou da vitória. Ainda que trans-
formado em mito vivo aos olhos dos seringueiros, não conseguiu fazer 
frente às práticas traiçoeiras da política das selvas. No dia 8 de agosto 
de 1908, foi vítima de um atentado tramado pelo coronel Gambino 
Bezouro e pelo subdelegado Alexandrino José da Silva, que lhe mon-
tou uma tocaia. Baleado pelas costas, Plácido veio a falecer dois dias 
depois na companhia do seu irmão, Genesco, em um lugarejo chamado 
Benfica. Seu corpo foi transladado para Porto Alegre e sepultado no 
Cemitério da Santa Casa, sendo que a família mandou gravar sobre a 
lápide o nome dos 14 jagunços que participaram do crime, para que a 
infâmia jamais fosse esquecida. O nome dele foi dado a um município 
que hoje conta com pouco mais de 15 mil habitantes.
Voltando a 1902: quando o governo da Bolívia, na presidência do ge-
neral José Maria Pando (1899-1904), empenhou-se em uma mobilização de 
tropas, acenando com uma grande marcha para o Acre, a fim de recuperar 
o terreno perdido e dar fim nos “flibusteiros brasileiros”, a diplomacia do 
Barão do Rio Branco entrou em ação.
a conquista do acre
QUANDO O GOVERNO 
BOLIVIANO AMEAÇOU 
MARCHAR SOBRE O 
ACRE, NA TENTATIVA DE 
RECUPERAR O TERRITÓRIO 
PERDIDO, ENTROU EM 
CENA A HABILIDADE DO 
BARÃO DO RIO BRANCO
O BARÃO DO RIO BRANCO 
RETRATADO POR J.G. 
FAJARDO, OBRA EXPOSTA NO 
CONGRESSO NACIONAL
 65
TRATADO DE PETRÓPOLIS 
ENTROU PARA A HISTÓRIA 
DA DIPLOMACIA BRASILEIRA 
O TRATADO DE PETRÓPOLIS
Estimaram a multidão que o recepcionou em 10 mil pessoas, que se 
espalhavam desde o cais do porto até as avenidas do centro do Rio de 
Janeiro. Todos lá estavam, naquele dia jubiloso de 2 de dezembro de 1902, 
para saudar o Barão do Rio Branco, o Juca Paranhos, como era conhecido 
entre os cariocas. Viram-no como um bom filho que retornava à casa, o 
Brasil. Recepcionaram-no desde o porto com bandas, palmas e aclamações, 
espalhando os retratos dele por toda parte. Até a estátua do pai do barão, 
o Visconde do Rio Branco, merecera uma bela ramada de flores. 
Provavelmente muitos deles, dos que lá estavam presentes para 
aplaudir o novo ministro das Relações Exteriores, recém vindo da Eu-
ropa, tinham estado umas semanas antes na frente do Palácio da Catete 
para vaiarem estrepitosamente o presidente Campos Sales, quando esse 
deixava o poder coberto de impopularidade. Enquanto o político paulista 
saía debaixo de apupos, o chanceler carioca desembarcava com vivas. 
 A república, o novo regime recém implantado no Brasil fazia 13 anos, 
tinha causado enormes decepções ao povo. Primeiro, pela inflação e pelos 
escândalos financeiros provocados pelo Encilhamento, em 1890/91; em 
seguida, a Armada rebelou-se por duas vezes, uma em 1891 e outra em 
1893, disparando contra a própria Capital Federal, ocasião em que tam-
bém rebentou no Rio Grande do Sul a sangrenta Revolução Federalista 
de 1893/95 e, mal cauterizada essa, foi a vez da revolta de Canudos fazer 
correr sangue no sertão da Bahia, em 1896/97. 
66 
Como uma espécie de arremate de tanta desgraça, o presidente 
Campos Sales, herdando os rombos orçamentários daquilo tudo, teve que 
apelar para o Funding Loan, uma renegociação geral da dívida externa do 
país, acertada em 1898, que implicou em tomar mais 10 milhões de libras 
esterlinas das casas financeiras. 
UMA REPÚBLICA SEM BONS EXEMPLOS
Deodoro da Fonseca morrera, Floriano Peixoto também, Benjamin 
Constant fora-se antes de todos os outros, a república não tinha heróis, 
não oferecia alguém de peso, um vulto ilustre, um varão a lá Plutarco com 
quem o povo pudesse se empolgar ou se orgulhar. Daí a vibração com o 
barão, ironicamente um monarquista, alguém do antigo regime derru-
bado em 1889, mas que naquele momento muito especial, quase que de 
depressão coletiva, encarnava, por assim dizer, as melhores expectativas 
da nacionalidade. Rodrigues Alves (1902-1906), o novo presidente, o 
convidara para o ministério, e ele, deixando Londres, viera assumir o 
posto. E chegava em boa hora, porque os atritos na fronteira do Brasil com 
a Bolívia, lá longe, na floresta amazônica, soltavam chispas para todos os 
lados. Como observou Álvaro Lins, o melhor biógrafo do barão, “o caso 
do Acre fora a princípio de geografia e história, depois, uma questão de 
ordem política e econômica.”
Rio Branco estabeleceu dois frontes para evitar o choque militar com 
a Bolívia. Em um deles, arregimentou o apoio da Casa Rothschild, de Lon-
dres, instituição financeira de históricas ligações com o Brasil, para que os 
banqueiros intermediassem um acordo com o Bolivian Syndicate de Nova 
York. Operação bem-sucedida, pois os norte-americanos aceitaram uma 
compensação de 110 mil libras esterlinas para desistir do negócio, o que 
enfraqueceu o lado do governo de La Paz. O outro, foi mostrar à Bolívia que 
o Brasil estaria mesmo disposto a ir à guerra na defesa do povo extrativista 
do Acre, visto que a opinião pública não aceitaria que o governo do Rio de 
a conquista do acre
POR IRONIA, A 
REPÚBLICA, QUE 
NÃO TINHA HERÓIS, 
FESTEJOU O RETORNO 
AO PAÍS DE UM 
MONARQUISTA 
CENTENÁRIO DA MORTE DO BARÃO DE RIO BRANCO REUNIU DESCENDENTES EM BRASÍLIA
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FOTO DE PEDRO HESS, FEITA EM 1860-1870, MOSTRA PRAÇA DE PETRÓPOLIS 
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a conquista do acre
MAPA DA FRONTEIRA BRASIL-BOLÍVIA, DE HORACIO E. WILLIANS (1905)
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Janeiro cruzasse os braços, caso soubesse que os seringueiros seriam expulsos 
pelas armas daquela área. Um admirador exaltado da posição tomada pelo 
barão escreveu na imprensa: “Temos um homem no Itamaraty.” 
Para dar prova de seriedade, como demonstração de força, ordenou-
-se a mobilização de tropas federais em Mato Grosso e no Amazonas para 
que se deslocassem para o território do Acre. Assim, com essa articulada 
combinação de diplomacia e do uso do argumento militar, só restou ao 
governo da Bolívia retroceder. Aceitou