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1 SISTEMA RESPIRATÓRIO O trato respiratório pode ser dividido de acordo com a função ou de acordo com sua estrutura. Quando dividido em razão da estrutura, temos: superior, que compreende das narinas até a laringe e inferior, que compreende traqueia, os brônquios, os bronquíolos e os pulmões. Já quando dividido em razão da função, temos: sistema condutor, de transição e de trocas gasosas. Figura 1 SISTEMA CONDUTOR Inclui as narinas, a cavidade nasal, os seios paranasais, a nasofaringe, a laringe, a traqueia e os brônquios extrapulmonares e intrapulmonares, todos amplamente revestidos por células colunares ciliaras pseudoestratificadas, além de uma proporção variável de células secretoras caliciformes (secretoras de muco) e serosas. Figura 2. Mucosa Normal, Traqueia, Cão. A mucosa consiste em células secretoras ciliadas e não ciliadas. As células caliciformes contêm um citoplasma de coloração pálida (setas). A proporção entre células ciliadas e não ciliadas varia de acordo com o nível das vias aéreas. As 2 células ciliadas (pontas de seta) são mais abundantes nas vias aéreas proximais, enquanto as secretoras são proporcionalmente mais numerosas nas porções distais dos sistemas condutor e de transição. A submucosa do sistema condutor (do nasal aos brônquios) possui vasos sanguíneos (BV) em abundância. Coloração por HE. Figura 3. Aparelho Mucociliar do Sistema Condutor. Tanto as células ciliadas quanto as células caliciformes encontram-se localizadas na membrana basal. O muco produzido e liberado pelas células caliciformes forma um tapete sobre o qual as partículas inaladas (pontos pretos) são retidas e subsequentemente expelidas pelo aparelho mucociliar para a laringe. SISTEMA DE TRANSIÇÃO O sistema de transição do trato respiratório é composto por bronquíolos, estruturas microscópicas que servem de zona de transição entre o sistema condutor (ciliado) e o sistema de trocas gasosas (alveolar). O desaparecimento dos cílios no sistema de transição não é abrupto; as células ciliadas da região bronquiolar proximal tornam-se escassas e progressivamente atenuadas, até ponto em que os bronquíolos distais não mais possuam células ciliadas. Os bronquíolos normais também são destituídos de células caliciformes, mas possuem outros tipos de células secretoras, as células Club (nome em inglês dado às células exócrinas bronquiolares) e as células neuroendócrinas. As células Club, também conhecidas como células secretoras bronquiolares, contêm várias organelas biossintéticas que desempenham papel ativo na detoxificação de xenobióticos (substâncias estranhas), semelhante ao dos hepatócitos. As células Club são também células-tronco fundamentais no reparo e remodelação não apenas dos bronquíolos, mas também da maior parte do trato respiratório. Além disso, essas células contribuem para a imunidade inata do pulmão com a secreção de proteínas protetoras (colectinas) e surfactante pulmonar. Nos animais carnívoros e nos macacos, e em menor proporção, nos cavalos e nos seres humanos, as porções terminais dos bronquíolos são revestidas não apenas por epitélio cúbico, mas também por capilares alveolares. Essas estruturas bronquioloalveolares peculiares são conhecidas como bronquíolos respiratórios. 3 Figura 4. Bronquíolo Normal, Rato. A, Bronquíolo mostrando uma fina parede composta por uma membrana basal, músculo liso e tecido conjuntivo. Na superfície luminal do bronquíolo, observa-se a presença de células Club em forma de cúpula (setas) projetando-se para o lúmen. Coloração por HE. B, Representação esquemática de uma célula Club mostrando um retículo endoplasmático liso abundante (sER) e grânulos citoplasmáticos, extrudados no lúmen bronquiolar. MFO, oxidases de função mista. Figura 5. Bronquíolo Respiratório Normal, Cão. A parede do bronquíolo é recoberta pelo epitélio ciliado, que é sustentado por músculo liso e tecido conjuntivo. Terminalmente, a parede torna-se interrupta, criando comunicações laterais entre o lúmen bronquiolar e os alvéolos (setas). Coloração por HE. 4 SISTEMA DE TROCAS Em todos os mamíferos, o sistema de trocas gasosas do trato respiratório é formado por ductos alveolares e milhões de alvéolos. A superfície dos alvéolos é revestida por dois tipos distintos de células epiteliais conhecidas como pneumócitos do tipo I (membranosos) e do tipo II (granulares). Figura 6. Barreira Hematoaérea. A, Nesse diagrama esquemático, observa-se a fina membrana (barreira hematoaérea) separando o compartimento do sangue dos alvéolos. Os pneumócitos do tipo I (membranosos) são notadamente finos e recobrem a maior parte da parede alveolar. Observa-se a presença das células endoteliais revestindo o capilar alveolar. O interstício alveolar sustenta o epitélio alveolar de um lado e o endotélio do outro lado da barreira hematoaérea. Os pneumócitos do tipo II (granulares) aparecem como grandes células cuboidais com corpos lamelares (surfactante) no citoplasma. Um macrófago intravascular pulmonar, componente do sistema monócito-macrófago, aparece representado na parede de um capilar alveolar. Observa- se a presença de um glóbulo vermelho (RBC) no interior do lúmen do capilar alveolar. B, Parede alveolar. A barreira hematoaérea consiste em extensões citoplasmáticas de (1) pneumócitos do tipo I (membranosos), (2) uma lâmina basal dupla sintetizada por pneumócitos do tipo I e (3) extensões citoplasmáticas de células endoteliais. A vulnerabilidade do sistema respiratório a lesões aerógenas (transmitidas pelo ar) se deve basicamente a três fatores: (1) a extensa área dos alvéolos, que funcionam como a interface entre o sangue nos capilares alveolares e o ar inspirado; (2) o grande volume de ar que entra continuamente nos pulmões; e (3) a alta concentração de elementos nocivos que podem LEMBRE-SE: Os pneumócitos tipo I, (também chamados de pneumócitos membranosos) são células bastante delgadas, cuja morfologia favorece a troca gasosa entre o ar inspirado e o sangue circulante, processo denominado hematose. No entanto, são muito suscetíveis a lesões e não têm capacidade de proliferação. Já os pneumócitos tipo II (também chamados de pneumócitos granulares ou secretórios) são células volumosas, com aspecto cuboide, que secretam surfactante e têm capacidade de proliferação. Durante o processo de reparação de diferentes tipos de lesões, há proliferação dos pneumócitos tipo II, e, posteriormente, durante a fase de resolução das lesões, alguns deles se diferenciam em pneumócitos tipo I, reconstituindo a estrutura normal do revestimento alveolar. 5 estar presentes no ar. Além disso, para exercer sua função de hematose (troca gasosa), o parênquima pulmonar recebe intenso fluxo sanguíneo, que corresponde a todo o volume da grande circulação direcionado a um único órgão (o pulmão). A maioria das doenças e/ou lesões que ocorrem no sistema respiratório é causada por agentes lesivos que atingem o trato respiratório por meio do ar inspirado (via aerógena) ou do sangue (via hematógena). Dessas duas rotas, a mais importante é a aerógena, principalmente nos animais criados em sistemas de confinamento, pois a concentração de agentes potencialmente patogênicos no ar é maior, assim como a concentração de gases irritantes, como amônia (NH3) e gás sulfídrico (H2S). MECANISMOS DE DEFESA Resumidamente, a função dos mecanismos de defesa é proteger o parênquima pulmonar (alvéolos) por meio da remoção de agentes potencialmente lesivos, além de umedecer e aquecer o ar inspirado, o que ocorre principalmente nas vias respiratórias superiores. Os mecanismos de defesa do trato respiratório incluem: o lençol mucociliar; a microbiota bacteriana saprófita; os macrófagos alveolares; o tecido linfoide broncoassociado; e reflexos protetores, como tosse e espirro. Tapete mucociliar Possui epitélio pseudoestratificadocilíndrico ciliado e exerce movimentação no sentido que leva a deglutição. As funções primordiais do lençol mucociliar são a remoção de partículas do trato respiratório e a difusão de substâncias protetoras, como anticorpos produzidos pelo tecido linfoide associado aos brônquios, particularmente imunoglobulina A (IgA). Esse tipo de imunoglobulina atua na neutralização e favorece a fagocitose de agentes invasores. Além dos anticorpos, outras substâncias protetoras também são difundidas pelo lençol mucociliar, como o interferon, que limita a infecção viral, a lisozima e o lactoferrin, que têm atividade antibacteriana seletiva, além de fatores do sistema do complemento. Macrófagos Alveolares Embora o lençol mucociliar seja extremamente eficiente na remoção de partículas inaladas, algumas partículas, particularmente aquelas com tamanho igual ou inferior a 1 μm, podem chegar aos alvéolos pulmonares. Em condições normais, os alvéolos são estéreis, sendo a defesa e a esterilidade alveolar mantidas graças à atividade fagocitária de macrófagos alveolares. A fagocitose de pequenas partículas ocorre em torno de 4 h e é facilitada pela presença de imunoglobulinas específicas, por meio do processo de opsonização. Além da fagocitose, os macrófagos alveolares são importantes fontes de interferon. A população de macrófagos residentes no pulmão inclui, além dos alveolares, macrófagos localizados no interstício e macrófagos intravasculares (que somente são observados no parênquima pulmonar). Esses macrófagos têm função de fagocitose de microrganismos ou outras partículas que atingem os alvéolos. Além disso, por meio da secreção de diversas citocinas, os macrófagos pulmonares desempenham importante papel na modulação da resposta inflamatória e dos processos de reparação do parênquima pulmonar. Além de macrófagos, há também células dendríticas no 6 parênquima pulmonar, que têm como funções primárias a apresentação de antígenos e a regulação da resposta imune adaptativa. Microbiota Saprófita Outro componente fundamental da defesa pulmonar é a microbiota saprófita, presente predominantemente no trato respiratório superior. Essa microbiota atua por competição, por meio da aderência dos pili bacterianos aos receptores das células epiteliais, de modo a não possibilitar a colonização do trato respiratório por organismos de maior potencial patogênico. BALT Em várias regiões do trato respiratório, particularmente nos brônquios, são observados aglomerados de células linfoides com localização adjacente às vias respiratórias, chamados de tecido linfoide broncoassociado. Esses aglomerados linfoides frequentemente apresentam morfologia de folículo linfoide, com centro germinativo evidente. A população celular é constituída por linfócitos T e B, com predominância de linfócitos B, que são responsáveis pela produção de IgA, IgG, IgM e IgE. Em animais saudáveis, podem ser detectadas moléculas de IgA específicas contra vírus e bactérias patogênicos para o trato respiratório. Embora a importância dos anticorpos produzidos no trato respiratório não esteja totalmente esclarecida, estes facilitam o processo de fagocitose de agentes infecciosos por meio do fenômeno de opsonização, que favorece a ação dos macrófagos alveolares, mecanismo fundamental para a defesa do pulmão. Figura 7. BALT 7 Reflexos Protetores Os mecanismos de defesa do trato respiratório se completam com mecanismos reflexos, como o espirro e a tosse, que proporcionam a eliminação mecânica de partículas ou material estranho ao trato respiratório. O reflexo de tosse é um mecanismo importante para a eliminação de quantidades excessivas de muco ou de exsudato presentes nas vias respiratórias, prevenindo, assim, a chegada desse material ao parênquima pulmonar. Para que esse mecanismo seja eficiente, é importante que o parênquima pulmonar (alvéolos) suprido pela via respiratória a ser desobstruída tenha sua elasticidade normal e contenha ar. LESÕES SEM SIGNIFICADO CLÍNICO E ALTERAÇÕES POST MORTEM Colapso Pulmonar Durante o procedimento de necropsia, imediatamente após a abertura da cavidade torácica, ocorre retração dos pulmões. Tal fenômeno se deve à elasticidade dos pulmões, que são mantidos distendidos dentro do tórax devido à pressão negativa da cavidade torácica. Portanto, o colapso pulmonar se deve ao equilíbrio entre a pressão intratorácica, que é negativa antes da abertura da cavidade torácica, e a pressão atmosférica. A não ocorrência de colapso pulmonar após a abertura da cavidade torácica geralmente está associada ao acúmulo de material ou ar dentro dos alvéolos, como nos casos de edema pulmonar, inflamação ou enfisema alveolar. Hipóstase O fenômeno de hipóstase corresponde ao acúmulo post mortem de sangue no hemiórgão posicionado do lado de baixo quando o cadáver é mantido em decúbito lateral. Tal acúmulo se deve à ação da gravidade, e o hemiórgão posicionado próximo ao solo apresenta coloração vermelho-escura. É importante fazer a diferenciação entre essa condição e a congestão ante mortem, que geralmente é bilateral e tem distribuição difusa. Figura 8. Cão. O pulmão direito apresenta coloração avermelhada devido à hipóstase post mortem. 8 CAVIDADE NASAL E SEIOS NASAIS - Anomalias do desenvolvimento Fenda Palatina/ Palatosquise A fenda palatina, também chamada de palatosquise, é caracterizada por fenda no palato que faz com que haja uma comunicação entre as cavidades nasal e oral. É uma alteração mais frequente em bovinos e suínos, particularmente em rebanhos endogâmicos (com alto grau de consanguinidade). Apesar de serem alterações compatíveis com a vida, em geral os animais com essa condição morrem precocemente devido à broncoaspiração de leite e consequente broncopneumonia. Palatosquise pode ou não estar associada à ocorrência de lábio leporino (queilosquise). Está relacionada ao uso de corticoides e deficiência em vitamina A na gestação. Figura 9. Palatosquise e Queilosquise, Palato Duro e Palato Mole, Filhote de Cão. Lábio leporino/ Queilosquise A queilosquise é ocasionalmente denominada lábio leporino por ser uma característica normal do coelho. Trata-se de uma falha de fusão do lábio superior ao longo da linha mediana ou do filtro. Figura 10 9 AGENTES INFECCIOSOS Garrotilho O garrotilho é uma doença infecciosa e altamente contagiosa dos equídeos causada por Streptococcus equi ssp. equi (Streptococcus equi). Caracteriza-se por rinite e linfadenite (linfonodos mandibulares e retrofaríngeos) supurativas com disseminação hematógena ocasional para os órgãos internos. A infecção ocorre quando equinos suscetíveis entram em contato com alimento, exsudato ou gotículas de ar que contenham a bactéria. Depois de penetrar na mucosa nasofaríngea, Streptococcus equi é drenado para os linfonodos regionais — linfonodos mandibulares e retrofaríngeos — através dos vasos linfáticos. As lesões macroscópicas nos equinos com garrotilho (rinite mucopurulenta) correlacionam-se com os achados clínicos e consistem em grandes quantidades de exsudato mucopurulento na cavidade nasal, com acentuada hiperemia da mucosa nasal. Os linfonodos afetados estão aumentados, podendo conter abscessos preenchidos com um espesso exsudato purulento (linfadenite purulenta). A expressão garrotilho bastardo é usada nos casos em que a disseminação hematógena de Streptococcus equi resulta na formação de abscessos metastáticos em órgãos como os pulmões, o fígado, o baço, os rins ou o cérebro, ou nas articulações. Essa forma de garrotilho geralmente é fatal. As sequelas comuns do garrotilho incluem broncopneumonia causada por aspiração do exsudato nasofaríngeo; hemiplegia laríngea (―ronco‖), resultante da compressão dos nervos laríngeos recorrentes pelos linfonodos retrofaríngeos aumentados; paralisia facial e síndrome de Horner causadas pela compressão dos nervos simpáticosdorsais ao linfonodo retrofaríngeo medial; e púrpura hemorrágica decorrente de vasculite causada pela deposição de complexos antígeno- anticorpo de Streptococcus equi nas arteríolas, vênulas e capilares da pele e das membranas mucosas. Em casos graves, a infecção nasal estende-se diretamente aos seios paranasais ou às bolsas guturais através das tubas de Eustáquio, causando inflamação e acúmulo de pus (empiema da bolsa gutural). A ruptura de abscessos nos linfonodos mandibulares e retrofaríngeos resulta em inflamação supurativa do tecido subcutâneo adjacente (celulite) e, em casos severos, o exsudato escapa pelas fístulas cutâneas. O garrotilho pode afetar equinos de todas as idades, mas é mais comum em potros e equinos jovens. Clinicamente, a condição caracteriza-se por tosse, descarga nasal, conjuntivite e intumescimento doloroso dos linfonodos regionais. Alguns equinos tornam-se portadores e fonte de infecção para outros equinos. Mormo O mormo é uma doença infecciosa, de notificação obrigatória pelo OIE (Escritório Internacional de Epizootias), que afeta equídeos e é causada por Burkholderia mallei (Pseudomonas mallei). Pode ser transmitida aos carnívoros pelo consumo de carne de cavalo infectada. Os seres humanos são igualmente suscetíveis, e a infecção não tratada geralmente é fatal. Essa bactéria Gram- negativa é catalogada como um agente em potencial para uso em guerras biológicas e bioterrorismo. No passado, Burkholderia mallei era encontrada no mundo inteiro, no entanto, atualmente o mormo foi erradicado da maioria dos países, à exceção de algumas áreas no Norte da África, na Ásia e no Leste Europeu. Existem também relatos de surtos esporádicos ocorridos no Brasil. 10 A patogênese do mormo não é totalmente conhecida. Os resultados de infecções experimentais sugerem que a infecção ocorre por meio da ingestão de alimento e água contaminados e, muito raramente, da inalação de gotículas infectadas. As portas de entrada são, presumivelmente, a orofaringe ou o intestino, onde as bactérias penetram na mucosa e se disseminam através dos vasos linfáticos para os linfonodos regionais, depois para a corrente sanguínea e, consequentemente, por via hematógena, para os órgãos internos, particularmente os pulmões. As lesões da cavidade nasal começam como nódulos piogranulomatosos na submucosa; posteriormente, essas lesões ulceram, liberando grande quantidade de exsudato contendo Burkholderia mallei na cavidade nasal. Por fim, as lesões ulcerativas da mucosa dos cornetos cicatrizam e são substituídas por típicas cicatrizes fibrosas estreladas. Em alguns casos, os pulmões também contêm vários nódulos miliares (que se assemelham a sementes de painço) pequenos (2 a 10 mm), cinzentos e firmes distribuídos aleatoriamente por um ou mais lobos pulmonares através da corrente sanguínea. Microscopicamente, esses nódulos são granulomas crônicos típicos formados por um centro necrótico, com ou sem calcificação, cercado por uma camada de macrófagos envolvidos por uma espessa faixa de tecido conjuntivo infiltrado por macrófagos, algumas células gigantes, linfócitos e plasmócitos. As lesões cutâneas, geralmente conhecidas como “rosário”, são resultantes de linfangite supurativa severa caracterizada pelo espessamento nodular de extensos segmentos de vasos linfáticos no tecido subcutâneo das pernas e da porção ventral do abdome. Por fim, os vasos linfáticos afetados se rompem e liberam grande quantidade de exsudado purulento, que são liberados por meio de tratos de drenagem na superfície da pele. Figura 11. Mormo. A, Mucosa, turbinados nasais, múltiplas úlceras e granulomas nasais. A Burkholderia mallei coloniza os turbinados nasais, provocando inflamação piogranulomatosa, necrose e ulceração da mucosa. B, Quando a bactéria coloniza a mucosa do sistema de condução do pulmão, se dissemina pelo parênquima do órgão, resultando na formação disseminada de piogranulomas (inserto) pelo pulmão. Inserto, Coloração por HE. C, Na disseminação cutânea da bactéria, há colonização dos vasos linfáticos subcutâneos, com formação de nódulos piogranulomatosos, geralmente no trajeto vascular (linfangite piogranulomatosa), levando ao aparecimento de lesões elevadas, similares a contas, na pele. D, Estes nódulos tendem a se romper, devido a traumas cutâneos ou à necrose por pressão, pela 11 expansão do volume do exsudato. Este processo forma úlceras semelhantes a crateras na pele, com liberação de material purulento espesso, viscoso e de coloração amarelo-esbranquiçada com grandes quantidades de bactérias. NEOPLASIAS As neoplasias da cavidade nasal e dos seios paranasais podem originar-se de quaisquer dos tecidos que compõem essas estruturas, incluindo ossos (osteoma ou osteossarcoma), cartilagem (condroma ou condrossarcoma), tecido conjuntivo (fibroma ou fibrossarcoma, mixoma ou miossarcoma) e vasos sanguíneos (hemangioma ou hemangiossarcoma) e de todos os diferentes tipos de células glandulares e do tecido epitelial de revestimento (adenoma, carcinoma ou adenocarcinoma). O equino apresenta uma lesão não neoplásica da cavidade nasal, que pode ser facilmente confundida com tumor. Trata-se do hematoma etmoidal progressivo, que se desenvolve a partir do etmoide ou da parede dos seios maxilares, é localmente destrutivo, mas não tem natureza neoplásica. As lesões líticas em tecidos adjacentes provavelmente são resultantes de compressão e, à medida que o hematoma se expande, ocorre ulceração de sua superfície, resultando frequentemente em epistaxe recorrente. O carcinoma de células escamosas é a neoplasia mais comum na cavidade nasal de gatos, comum também em cavalos, sendo nesta última espécie a neoplasia nasal de maior ocorrência, EM RESUMO: Garrotilho (Streptococcus equi spp equi) Causa rinite e linfadenite supurativa e aumento dos linfonodos SUBMANDIBULARES e RETROFARÍGEOS. Na macro podemos encontrar um linfonodo tão inflamado que rompe o subcutâneo e verte pus. Pode levar ao empiema da bolsa gutural. Quando ocorre sepssemia é chamado de garrotilho bastardo. Na micro podemos encontrar na mucosa nasal e nos linfonodos um infiltrado inflamatório de polimorfonucleares e quando for bastardo podemos observar esse infiltrado em outros órgãos, como pulmões, rins, baço e cérebro (na macro: áreas multifocais amareladas e focos supurativos). Mormo (Burkholderia mallei) É uma zoonose e de notificação obrigatória. Alguns portadores podem ser assintomáticos e a contaminação se da pela inalação e ingestão. Leva a um aumento dos linfonodos MANDIBULARES, RETROFARÍGEOS e CERVICAIS SUPERFICIAIS (diferencial do garrotilho). Os sinais clínicos incluem emagrecimento progressivo, apatia, febre, secreção oral purulenta, mucosas com úlceras, nódulos na pele e linfangite (rosário). O diagnóstico diferencial deve incluir pitiose. Na macro é possível observar lesões ulcerativas e supurativas ou pielogranulomatosas. Na micro, infiltrado de polimorfonucleares com áreas de necrose, tecido conjuntivo, macrófagos e células gigantes. 12 e, ao contrário das demais espécies domésticas, na maioria das vezes, a neoplasia tem origem no seio maxilar, e não na cavidade nasal. Outra neoplasia epitelial maligna que ocorre na cavidade nasal é o adenocarcinoma, principalmente nos casos de tumor etmoidal enzoótico. O tumor etmoidal enzoótico acomete ovinos, caprinos e bovinos e é classificado morfologicamente como adenocarcinoma. Essa neoplasia, que ocorre em algumas regiões do Brasil, está associada à infecção por retrovírus, tendo sido identificados o retrovírus do tumor enzoótico nasal (ENTV, enzootic nasal tumor retrovírus) de ovinos e outro vírus muito semelhante (ENTV2) que causa a mesma lesão em caprinos. Cabe ressaltar que alguns casos previamente diagnosticados como tumor etmoidal enzoótico em ovinos na região nordestedo Brasil são, na realidade, casos de rinite granulomatosa decorrente de infecção por Conidiobolus spp. Figura 12. Adenocarcinoma Nasal, Secção Mediossagital, Cabeça, Cão Adulto. A, Uma grande massa neoplásica (setas) oriunda da concha etmoidal infiltrou-se nas passagens nasais. B, Múltiplos agregados de células epiteliais neoplásicas com citoplasma eosinofílico abundante e nucléolos proeminentes. Coloração por HE. 13 ESPÉCIE LOCAL MAIS ATINGIDO Cães Cavidade nasal e seios nasais. Gatos Cavidade nasal; ponta do nariz e ponta da orelha. Equinos Cavidade nasal e seios maxilares. FARINGE, LARINGE E TRAQUEIA Síndrome das vias aéreas em braquiocefálicos - Anomalias Síndrome das vias aéreas dos braquicéfalos é um termo clínico usado para designar o aumento da resistência do fluxo de ar causado por narinas e meatos nasais estenóticos e por um palato mole excessivamente longo. Essas anomalias acometem cães de raças braquicefálicas, como bulldogs, boxers, boston terriers, pugs, pequineses e outros. Os defeitos são resultantes de uma incompatibilidade entre a proporção de tecidos moles e ossos cranianos e da obstrução do fluxo de ar pelo comprimento excessivo do tecido do palato mole. Alterações secundárias, como edema nasal e laríngeo causado pela inspiração forçada, acabam por provocar obstrução severa das vias aéreas superiores, desconforto respiratório e intolerância ao exercício. Colapso de traqueia O colapso traqueobrônquico ou colapso da via aérea central, acomete cães, bovinos, equinos e caprinos. Pode ser de origem congênita, por conta da composição da cartilagem, ou adquirida, por conta de trauma, neoplasias ou inflamação. Causa tosse crônica (excitação ou exercício físico), dispneia e cansaço durante exercício. É caracterizado pelo achatamento dorsoventral da traqueia devido a uma alteração de seus semianéis cartilaginosos, que formam arcos muito abertos, e ao relaxamento da musculatura lisa que os sustenta. Como consequência, há diminuição do diâmetro do lúmen traqueal, podendo ocorrer dificuldade respiratória e maior suscetibilidade a colapsos respiratórios, devido à protrusão da musculatura lisa para o lúmen traqueal durante exercício ou estresse intenso. Essa condição ocorre com maior frequência em cães de raças miniaturas, resultando em dispneia ocasional e intolerância ao exercício. LEMBRE-SE: Estenose das narinas; Palato mole extenso; Hipoplasia da traqueia; Aumento das tonsilas; Estreitamento da glote. 14 Figura 13. Cão. Colapso traqueal. Achatamento acentuado dos anéis traqueais. Em detalhe: corte transversal demonstrando redução do lúmen traqueal. PULMÃO Além dos mecanismos que atuam na defesa, como o tapete há também mecanismos que previnem o colapso alveolar. Um desses mecanismos é a produção de surfactante pelos pneumócitos tipo II, presentes no epitélio de revestimento do alvéolo. O surfactante é constituído por fosfolipídios, primariamente dipalmitoilfosfatidilcolina, e, em menor proporção, por proteína e se distribui por toda a superfície do alvéolo, diminuindo a tensão superficial dentro do alvéolo, de tal modo que menor pressão é requerida para manter o alvéolo aberto, o que evita seu colapso. Além disso, há o mecanismo de ventilação colateral, que nada mais é do que a passagem de ar entre alvéolos adjacentes pelos poros de Kohn. Durante a inspiração, os alvéolos são distendidos, favorecendo a passagem de ar pelos poros de Kohn. Durante a expiração ocorre o contrário. Esse mecanismo favorece o equilíbrio de pressão entre os alvéolos, possibilitando o fluxo de ar entre eles. Essa ventilação colateral favorece a eliminação de muco ou exsudato inflamatório, uma vez que, quando esse mecanismo é funcional, o ar proveniente de um alvéolo suprido por um brônquio desobstruído pode mover-se para alvéolos adjacentes, supridos por via respiratória obstruída e previamente colapsados. Com isso, os alvéolos previamente colapsados podem viabilizar reflexo de tosse eficiente, forçando o ar pelas vias respiratórias, o que promove a desobstrução destas quando obstruídas por material móvel, como muco ou exsudato inflamatório. A presença dos poros de Kohn é variável entre as espécies domésticas, o que afeta a habilidade do pulmão de desobstruir as vias respiratórias pelo reflexo da tosse. A ventilação colateral é muito desenvolvida no cão e no gato e virtualmente ausente em bovinos. O exame macroscópico dos pulmões deve ser feito cuidadosamente, e, na interpretação, deve-se levar em conta sua coloração, consistência, volume e superfície de corte. A coloração normal é rósea, desde que não haja alterações post mortem, conforme já relatado. Logo após a abertura da caixa torácica, a pressão atmosférica interna se iguala à externa, levando ao colabamento dos 15 pulmões. O não colabamento já indica possibilidade de lesões. A palpação indica a consistência dos pulmões e também possibilita localizar abscessos, neoplasias, granulomas, cistos ou outras lesões palpáveis. O exame dos linfonodos regionais, apicais e mediastínicos tem importância capital no diagnóstico de tuberculose em bovinos. É um exame obrigatório nas linhas de inspeção de bovinos em abatedouros. Deve-se fatiá-los totalmente para expor ao máximo seu interior, onde as lesões são encontradas. Hipoplasia pulmonar É caracterizada pelo desenvolvimento incompleto dos pulmões, que se apresentam nitidamente diminuídos de volume. A diminuição do volume dos pulmões fica evidente quando se compara o tamanho dos pulmões com o tamanho do coração ou da traqueia. A hipoplasia pulmonar é uma condição pouco frequente e geralmente está associada à hérnia diafragmática congênita, condição na qual pode haver deslocamento de vísceras abdominais para o interior da cavidade torácica, resultando em compressão dos pulmões durante o desenvolvimento fetal. É mais comum em bovinos e ovinos. Coristoma pulmonar X Ectopia pulmonar O coristoma corresponde ao tecido pulmonar em outros lugares do corpo e a ectopia é o órgão fora da cavidade em que deveria estar normalmente. Atelectasia “O ar não entra” Por definição, atelectasia é a , que pode ser localizada ou expansão incompleta do pulmão generalizada, e resulta no colapso de alvéolos previamente preenchidos por ar. Portanto, morfologicamente, a atelectasia é caracterizada pela condição na qual os alvéolos pulmonares encontram-se sem ar e sem nenhum outro conteúdo em seu interior. A atelectasia pode ser congênita, em decorrência da expansão incompleta dos alvéolos, ou adquirida, devido ao colapso alveolar. Congênita Pode ser subclassificada em total ou parcial (focal ou multifocal) e ocorre em neonatos cujos pulmões não se insuflaram após as primeiras inspirações de ar e é causada por obstrução das vias aéreas, geralmente resultante da aspiração de líquido amniótico e mecônio – síndrome da . aspiração do mecônio Também ocorre quando os alvéolos não conseguem permanecer distendidos após a aeração inicial devido a uma alteração na qualidade e na quantidade do surfactante pulmonar produzido pelos pneumócitos do tipo II e pelas células Club (células de Clara). Esta forma neonatal de atelectasia congênita é conhecida em neonatologia humana como “síndrome da angústia ” (IRDS), ou como “ ”, devido às suas respiratória infantil doença da membrana hialina características clínicas e microscópicas. A atelectasia e a imaturidade pulmonar causam anóxia (ausência total de oxigênio celular), que, por sua vez, lesa as células endoteliais dos capilares pulmonares, aumentando sua permeabilidade. O aumento da permeabilidade capilar resulta em extravasamento de proteínas 16 plasmáticas, inclusive fibrina, para a luz alveolar, constituindo as membranas hialinas, fortemente eosinófilas, que recobrem parcialmente a superfície dos alvéolos. Esta alteração dificulta aindamais a expansão pulmonar e as trocas gasosas. Figura 14 Macroscopicamente, nos casos de atelectasia congênita, os pulmões podem apresentar-se completamente atelectásicos, no caso de natimortalidade, ou parcialmente expandidos em neonatos com respiração fraca. Nesses casos, os pulmões têm coloração vermelho escura por não ter havido separação das paredes alveolares por ar, o que dilui a coloração vermelha no pulmão normal. Figura 15 17 Figura 16. A, Atelectasia neonatal multifocal do pulmão de um bezerro de 1 dia de idade. Observa-se o proeminente padrão em mosaico dos lóbulos insuflados normalmente (mais claros) e dos lóbulos atelectásicos não insuflados (mais escuros). B, Atelectasia de um lóbulo pulmonar superficial (parte superior central da imagem) em uma vaca. Observa-se a ausência de ar nos alvéolos desse lóbulo, o que resultou no seu colapso e na sua coloração mais escura vista na imagem A. Coloração por HE. Adquiridas A atelectasia adquirida pode ser , devido à obstrução total de vias respiratórias obstrutiva (exsudato, corpo estranho, parasita - Dictyocaulus viviparus, por ex.), ou , por compressiva compressão externa do parênquima pulmonar (massa ou líquido – pneumotórax; timpanismo). 18 Macroscopicamente, a área afetada apresentasse deprimida em relação ao restante da superfície do órgão, com coloração vermelho escura. Tal coloração se deve ao fato de que os capilares na área de atelectasia encontram-se mais próximos uns dos outros do que no parênquima com conteúdo normal de ar. A área de atelectasia tem consistência flácida com ausência completa de crepitação à palpação. Microscopicamente, os alvéolos apresentam-se colapsados ou em forma de fendas e as paredes alveolares parecem paralelas e próximas umas das outras, realçando o tecido intersticial mesmo sem inflamação imposta. A atelectasia tem duas causas essenciais: a presença de massas que ocupam compressiva espaço na cavidade pleural, como abscessos e tumores, e a transferência de pressão, como aquela causada por distensão abdominal, hidrotórax, hemotórax, quilotórax e empiema. Outra forma de atelectasia compressiva ocorre em caso de perda de pressão negativa na cavidade torácica resultante de pneumotórax. Em geral, essa forma envolve uma atelectasia maciça, razão pela qual é conhecida também como colapso pulmonar. Figura 17. Atelectasia Compressiva e Hidrotórax, Pulmões, Cão. O pulmão atelectásico aparece como um tecido pulmonar deprimido e escuro (setas). Observa-se também um grande volume de transudato na parte ventral da cavidade pleural (asteriscos). 19 A atelectasia é a forma mais comum e decorre da obstrução total de uma determinada obstrutiva via respiratória, quando a não é suficiente para a expansão da área afetada. ventilação colateral Por isso, essa condição é comum na espécie bovina e suína, que apresentam ventilação colateral inexpressiva, e menos comum em espécies com ventilação colateral bem desenvolvida, como o cão e o gato. Já no caso dos cães e dos gatos, há necessidade de obstrução de um brônquio calibroso que seja responsável pelo suprimento de um lobo pulmonar ou de extensas áreas do parênquima para que ocorra atelectasia obstrutiva. Essa característica se deve à ventilação colateral muito bem desenvolvida nessas espécies. Figura 18. Ventilação colateral. Enfisema “Entrou mais ar do que saiu” Por definição, enfisema pulmonar significa distensão excessiva e anormal dos alvéolos , o que caracteriza , associada à destruição de paredes alveolares excesso de ar nos pulmões ou seja, condição contrária à atelectasia. Nas espécies domésticas, o enfisema pulmonar pode ser de dois tipos: e . alveolar intersticial Enquanto em humanos é uma doença primária extremamente importante em seres humanos, em animais é quase sempre uma condição secundária resultante de uma variedade de lesões pulmonares. Em animais, essa lesão é sempre decorrente de obstrução do efluxo de ar ou é de natureza agonal no abate. Geralmente ocorre em animais com broncopneumonia, na qual o exsudato que obstrui os brônquios e bronquíolos provoca um desequilíbrio no fluxo de ar em que o volume de ar que entra no pulmão excede o volume que sai. Às vezes, as bolhas de ar retidas no enfisema alveolar ou intersticial tornam-se confluentes, formando grandes (vários centímetros de diâmetro) bolsas de ar, conhecidas como bolhas; a lesão é denominada enfisema bolhoso. Ela não é um tipo específico de enfisema nem indica um processo patológico diferente, mas sim um acúmulo de ar um pouco maior em um determinado foco. 20 Alveolar O enfisema alveolar, caracterizado pela distensão e ruptura das paredes alveolares formando bolhas de ar de tamanho variável no parênquima pulmonar, ocorre em todas as espécies. A patogênese do enfisema alveolar envolve a obstrução parcial ou ―obstrução expiratória‖ da árvore brônquica. Cabe enfatizar que o processo de inspiração é ativo e coincide com a dilatação das vias respiratórias, enquanto a expiração é passiva e associada à diminuição do diâmetro brônquico decorrente da contração da musculatura lisa. Isso faz com que, como resultado de uma obstrução brônquica parcial, ocorra entrada de ar nos alvéolos por ocasião da inspiração, mas não ocorra a saída do ar durante a expiração, de modo que há acúmulo de quantidade excessiva de ar nos alvéolos. Entre os animais domésticos, o enfisema alveolar é mais importante na espécie equina, particularmente na doença conhecida como asma equina, que acomete principalmente animais mantidos em baias e ambientes empoeirados. Macroscopicamente, a área afetada encontrasse aumentada de volume, uma vez que não ocorre colapso da área enfisematosa, que tem coloração róseo clara, superfície elevada em relação às áreas normais, consistência fofa e hipercrepitante, deixando impressão dos dedos à palpação. É importante ressaltar que acúmulo de ar ou a hiperinflação das bordas craniais e ventrais dos pulmões é comum em animais velhos, particularmente em cães, e carece de algum significado clínico. Intersticial Essa lesão ocorre em espécies que têm pulmão septado (com lobulação completa e ausência de ventilação colateral). Por isso acomete principalmente bovinos, baixa frequência em suínos e raramente em equinos, não ocorrendo em outras espécies de animais domésticos. O ar acumulado penetra nas paredes dos alvéolos e bronquíolos e força sua entrada no tecido conjuntivo interlobular, causando notável distensão dos septos interlobulares. Macroscopicamente, são observadas bolhas de ar nos septos interlobulares, o que confere um aspecto semelhante ao de um rosário ao septo interlobular. 21 Figura 19. Edema e Enfisema Pulmonar Bovino (Febre da Rebrota), Pulmão, Vaca. A, Enfisema, edema e pneumonia intersticial com envolvimento de todos os lobos pulmonares. Observa-se a presença de bolhas de ar de tamanhos variáveis nos septos interlobulares e no parênquima pulmonar. A textura desses pulmões seria notavelmente crepitante em decorrência do acúmulo de ar no parênquima pulmonar. Detalhe, Imagem em close das bolhas de ar no parênquima. B, É possível observar as espessas membranas hialinas eosinofílicas (setas) que cobrem os alvéolos. Os alvéolos apresentam-se dilatados e também contêm algum líquido de edema, eventuais macrófagos pulmonares e células alveolares necrosadas. Coloração por HE. 22 CLASSIFICAÇÃO DAS PNEUMONIAS Figura 20 BRONCOPNEUMONIA O termo broncopneumonia refere-se a um determinado tipo morfológico de pneumonia em que a agressão e o processo inflamatório ocorrem basicamente nos lúmens brônquico, bronquiolar e . A broncopneumonia é, sem dúvida, o tipo mais comum de pneumonia observado em alveolar 23 animais domésticos e, com poucas exceções, caracteriza-se macroscopicamente pela . consolidação cranioventral dos pulmões As broncopneumonias são causadas,geralmente, por bactérias e micoplasmas, por broncoaspiração de alimento ou conteúdo gástrico, ou por intubação inadequada. Como regra geral, os patógenos causadores das broncopneumonias chegam aos pulmões por meio do ar inspirado (via aerógena), seja a partir de aerossóis infectados, seja a partir da microbiota nasal. Fatores como superlotação, desidratação. Stress, transporte prolongado, etc. podem ser predisponentes para o animal desenvolver uma broncopneumonia. Quando a lesão pulmonar é muito mais grave, as citocinas pró-inflamatórias induzem alterações vasculares mais pronunciadas, abrindo mais as junções endoteliais e, consequentemente, aumentando a permeabilidade vascular, o que resulta no vazamento de fibrinogênio plasmático (exsudato fibrinoso) e, às vezes, hemorragia nos alvéolos. A broncopneumonia pode ser subdividida em broncopneumonia , se o supurativa ou lobular exsudato for composto predominantemente por neutrófilos, e broncopneumonia fibrinosa ou , se a fibrina for o componente predominante do exsudato. A fibrinosa é mais perigosa, por lobar ser causada por bac mais patogênicas. Supurativa ou lobular “+ neutrófilos” A broncopneumonia supurativa caracteriza-se pela consolidação cranioventral dos pulmões, com a presença de exsudato tipicamente purulento ou mucopurulento nas vias aéreas. É possível demonstrar melhor esse exsudato mediante a compressão dos brônquios intrapulmonares, forçando, desse modo, a saída do exsudato dos brônquios. A aparência macroscópica lembra, de modo geral, um tabuleiro de damas irregular por causa da mistura de lóbulos normais e anormais (consolidados). Além disso, a área de consolidação é deprimida, avermelhada escura e firme. Não há crepitação. Microscopicamente, as broncopneumonias supurativas agudas caracterizam-se pela presença de hiperemia, neutrófilos abundantes, macrófagos e restos celulares no lúmen dos brônquios, bronquíolos e alvéolos. O recrutamento de leucócitos é promovido pelas citocinas, pelo complemento e por outros fatores liberados em resposta à lesão alveolar ou pelo efeito quimiotático das toxinas bacterianas, particularmente da endotoxina. Nos casos mais graves, o exsudato purulento ou mucopurulento obstrui completamente todo o lúmen dos brônquios, bronquíolos e alvéolos. 24 Figura 21. Broncopneumonia Supurativa, Pneumonia Enzoótica, Pulmão, Bezerro. A, A consolidação cranioventral (C) do pulmão envolve aproximadamente 40% do parênquima pulmonar. A maior parte do lobo pulmonar caudal apresenta-se normal (N). B, Superfície de corte. O pulmão consolidado é de cor vermelho-escura a mogno (C), e um brônquio principal contém exsudato purulento (seta). Figura 22. Broncopneumonia Supurativa, Pulmão, Porco. Observa-se um bronquíolo no centro da figura obstruído por exsudato purulento. Os alvéolos adjacentes apresentam-se preenchidos com leucócitos e líquido do edema. Detalhe, Maior ampliação da parede bronquiolar. Coloração por HE. 25 Do ponto de vista clínico, as broncopneumonias supurativas podem ser agudas ou fulminantes, mas geralmente são crônicas, dependendo do agente etiológico, dos fatores de estresse que afetam o hospedeiro e do estado imunológico. Os patógenos mais comuns causadores da broncopneumonia supurativa em animais domésticos são os seguintes: Pasteurella multocida, Bordetella bronchiseptica, Trueperella (Arcanobacterium) pyogenes, Streptococcus spp., Escherichia coli e etc. A maioria desses organismos são patógenos secundários que requerem um dano anterior aos mecanismos de defesa dos pulmões que permita a colonização dos pulmões e o estabelecimento de uma infecção. A broncopneumonia supurativa é resultante também da aspiração de material não irritante (p. ex. leite). Fibrinosa ou lobar “+ fibrina que neutrófilos” É semelhante à broncopneumonia supurativa, exceto pelo fato de que o exsudato predominante é fibrinoso e não neutrofílico. Com algumas exceções, as broncopneumonias fibrinosas também apresentam uma distribuição cranioventral. Entretanto, a exsudação não se restringe aos limites dos lóbulos pulmonares individuais, como no caso das broncopneumonias supurativas. Ao contrário, o processo inflamatório nas pneumonias fibrinosas envolve vários lóbulos contíguos e o exsudato se desloca rapidamente pelo tecido pulmonar até que o lobo pulmonar seja completamente afetado. De modo geral, as broncopneumonias fibrinosas são resultantes de agressões pulmonares mais graves e, por essa razão, causam a morte mais cedo na sequência do processo inflamatório do que as broncopneumonias supurativas. Mesmo nos casos em que a broncopneumonia fibrinosa envolve 30% ou menos da área total, os sinais clínicos e a morte podem ocorrer em decorrência de toxemia severa e sepse. A aparência macroscópica da broncopneumonia fibrinosa depende da evolução e da gravidade da lesão, bem como do fato de a superfície pleural ou a superfície de corte do pulmão estar visível. Externamente, os estágios iniciais das broncopneumonias fibrinosas caracterizam-se por congestão severa e hemorragia, dando aos pulmões afetados uma coloração avermelhada caracteristicamente intensa. Algumas horas depois, a fibrina começa a permear e acumular-se na superfície pleural, conferindo à pleura uma aparência de vidro fosco e eventualmente formando placas de exsudato fibrinoso sobre um pulmão de cor vermelho-escura. Nesse estágio, um líquido amarelo começa a se acumular na cavidade torácica. Em animais que sobrevivem aos estágios iniciais da broncopneumonia fibrinosa, a necrose pulmonar geralmente se transforma em áreas de “sequestro” pulmonar (fibrose), que são pedaços isolados de pulmão necrótico encapsulados por tecido conjuntivo. Os sequestros pulmonares são resultantes de necrose extensa do tecido pulmonar em decorrência de isquemia grave (infarto) causada pela trombose de um vaso pulmonar principal ou do efeito das toxinas necrosantes liberadas por bactérias patogênicas, como Mannheimia haemolytica. Nos bovinos, a forma mais comum de estresse é o transporte; por isso, a causa mais comum de pneumonia lobar em bovinos é a infecção por Mannheimia (Pasteurella) haemolytica associada a condições estressantes, particularmente o transporte. Essa condição é conhecida como febre dos transportes. 26 Figura 23. Broncopneumonia Fibrinosa (Pleuropneumonia), Broncopneumonia Fibrinosa (Pleuropneumonia), Pulmão Direito, Novilho Castrado. A, A pneumonia apresenta uma distribuição cranioventral que se estende para os lobos médio e caudal e afeta aproximadamente 80% do parênquima pulmonar. O pulmão apresenta-se firme, intumescido e coberto por fibrina amarela (asterisco). A porção dorsal do lobo caudal do pulmão está normal (N). B, Superfície de corte. O parênquima afetado apresenta-se escuro e hiperêmico em comparação com o pulmão mais normal (quadrante superior da figura). Os septos interlobulares apresentam-se como faixas amarelas proeminentes devido ao acúmulo de fibrina e líquido do edema. Esse tipo de lesão é característico de infecção por Mannheimia haemolytica em bovinos (febre do transporte). Microscopicamente, no estágio inicial da broncopneumonia fibrinosa, ocorre uma exsudação maciça de proteínas plasmáticas para os bronquíolos e alvéolos com consequente obstrução dos espaços aéreos por fluido e fibrina. O vazamento de fibrina e fluido para o lúmen alveolar se deve à extensa alteração da integridade e à maior permeabilidade da barreira hematoaérea. O exsudato fibrinoso pode deslocar-se entre os alvéolos através dos poros de Kohn (ventilação colateral). Como a fibrina é quimiotática para neutrófilos, esses tipos de leucócitos estão sempre presentes algumas horas após o início da inflamação fibrinosa. À medida que a inflamação progride (3-5 dias), o exsudato do líquido é gradativamente substituído por exsudato fibrinocelular composto por fibrina, neutrófilos, macrófagose restos necróticos. Nos casos crônicos (após 7 dias), observa-se acentuada fibrose dos septos interlobulares e da pleura. 27 Figura 24. Broncopneumonia Fibrinosa Crônica, Pulmão, Bezerro. Observa-se a presença de grandes agregados de fibrina condensada (asteriscos) circundados e infiltrados por células fagocitárias. Coloração por HE. PNEUMONIA INTERSTICIAL No caso da pneumonia intersticial, o local de origem do processo tem início nos septos alveolares, não ocorrendo envolvimento das vias respiratórias. Outra característica da pneumonia intersticial é que a via de infecção é, na maioria dos casos, aerógena ou hematógena. Ao contrário da broncopneumonia e da pneumonia lobar, o curso da pneumonia intersticial é geralmente crônico, embora ocorra um estágio inicial agudo. A sequência de eventos no desenvolvimento das lesões envolve, inicialmente, lesão difusa das paredes alveolares, seguida por um período breve de exsudação e, em seguida, estabelecimento da fase crônica, caracterizada por uma resposta proliferativa e fibrótica. As causas de pneumonia intersticial são variadas, incluindo causas infecciosas (como , bactérias, protozoários e vírus larvas de helmintos), químicas e tóxicas. As causas infecciosas de pneumonia intersticial incluem , septicemias e parasitemias. viremias Como exemplos de agentes específicos podem ser mencionados: vírus da cinomose (paramixovírus), em cães; (coronavírus), em gatos; vírus vírus da peritonite infecciosa felina respiratório sincicial bovino; salmonelose septicêmica, principalmente em bezerros e leitões; toxoplasmose; parasitismo por vermes pulmonares e migração de larvas de ascarídeos; lentivírus dos pequenos ruminantes ; Pneumocystis carinii, principalmente em potros. Além das causas infecciosas, agentes químicos, como oxigênio em concentrações acima de 50%, paraquat ( comercialmente denominado Gramoxone) e fumaça também podem levar a doença. herbicida Além disso, toxinas endógenas (acidose; uremia; etc.) e exógenas (toxinas da batata doce ) também podem desencadear a pneumonia intersticial. mofada Macroscopicamente, a pneumonia intersticial se caracteriza por áreas de consolidação difusas por todo o pulmão, principalmente nas porções dorsocaudais. O pulmão apresenta falha em 28 colapsar, com aspecto ―armado‖, geralmente com impressões do gradil costal e ao corte não há exsudação. Microscopicamente, os septos alveolares estão espessos devido à proliferação celular e à infiltração de células inflamatórias. Sob o ponto de vista microscópico, a pneumonia intersticial é predominantemente proliferativa, enquanto a broncopneumonia e a pneumonia lobar são predominantemente exsudativas. Figura 25. Bovino. Pneumonia intersticial neutrofílica aguda em um caso de salmonelose. Intenso aumento na espessura dos septos alveolares com infiltrado intersticial difuso de neutrófilos e acúmulo de pequena quantidade de fibrina e alguns neutrófilos no lúmen alveolar. 29 Figura 26. Pneumonia Intersticial, Pulmão, Suíno Confinado. A, O pulmão apresenta-se pesado, pálido e com textura borrachuda, com proeminentes impressões costais (costelas) (setas) em consequência da hipercelularidade do interstício e pelo fato de os pulmões não colabaram após a abertura do tórax. B, Secção transversal. O parênquima pulmonar tem aparência “carnuda” e um pouco edematosa, mas sem presença de exsudato nas vias aéreas ou na superfície pleural. Esse tipo de alteração pulmonar em suínos é altamente sugestivo de pneumonia viral. Micro: hiperplasia dos pneumócitos tipo II e na fase crônica, fibrose alveolar e infiltrado inflamatório mononuclear (perda da capacidade respiratória). PNEUMONIA EMBOLICA A pneumonia embólica refere-se a um determinado tipo de pneumonia em que as lesões macroscópicas e microscópicas distribuem-se multifocalmente por todos os lobos pulmonares. Por definição, a agressão pulmonar é por via hematógena e a resposta inflamatória normalmente se concentra nas arteríolas pulmonares e nos capilares alveolares. As lesões iniciais da pneumonia embólica caracterizam-se macroscopicamente pela presença de focos brancos muito pequenos (1-10 mm) circundados por halos vermelhos e hemorrágicos distintos. Quando a pneumonia embólica ou as suas sequelas (abscessos) são diagnosticadas na necropsia, deve-se tentar localizar a fonte dos êmbolos sépticos. As mais comuns são os abscessos hepáticos que se rompem para dentro da veia cava caudal em bovinos, a onfaloflebite em animais de fazenda, as infecções bacterianas crônicas de pele ou infecções do casco e cateteres contaminados em todas as espécies. A endocardite valvular ou mural no ventrículo direito é uma fonte recorrente de êmbolos sépticos e pneumonia embólica em todas as espécies. Mais frequentemente, os isolados bacterianos oriundos de êmbolos pulmonares sépticos em animais domésticos são: Trueperella (Arcanobacterium) pyogenes (bovinos), Fusobacterium necrophorum (bovinos, suínos e seres humanos), Erysipelothrix rhusiopathiae (suínos, bovinos, caninos e seres humanos), Streptococcus suis (suínos), Staphylococcus aureus (cães e seres humanos) e Streptococcus equi (equinos). 30 Figura 27. Pneumonia Embólica, Pulmões, Filhote de Cão com 6 Semanas de Idade. Grandes focos hemorrágicos distribuídos de maneira relativamente uniforme por todos os lobos pulmonares (setas). Esses focos hemorrágicos são os locais de alojamento de êmbolos (sépticos) de Pseudomonas aeruginosa oriundos de enterite necrosante. Observe a distribuição multifocal dos focos inflamatórios, uma característica da pneumonia embólica. Havia também presença de êmbolos sépticos no fígado. Figura 28. Pneumonia Embólica, Pulmão, Vaca. A, Focos de necrose e infiltração de neutrófilos (setas) resultantes de êmbolos sépticos. Observa-se a distribuição multifocal da lesão, que é característica da pneumonia embólica. A endocardite vegetativa que envolveu a valva tricúspide foi a fonte dos êmbolos sépticos nessa vaca. Coloração por HE. B, Foco embólico no pulmão. Observa-se a presença de colônias bacterianas (setas) misturadas a neutrófilos e restos celulares. Coloração por HE. 31 PNEUMONIA GRANULOMATOSA A pneumonia granulomatosa refere-se a um determinado tipo de pneumonia em que a lesão aerógena ou hematógena é causada por organismos ou partículas que normalmente não têm como ser eliminadas por fagocitose e que evocam uma reação inflamatória local com numerosos macrófagos alveolares e intersticiais, linfócitos, alguns neutrófilos e, às vezes, células gigantes. O termo granulomatosa, nesse caso, é usado para descrever um padrão anatômico de pneumonia normalmente caracterizado pela presença de granulomas. O modelo típico de pneumonia granulomatosa é a tuberculose pulmonar. Essa doença acomete todas as espécies de animais domésticos, porém é mais prevalente em bovinos. O principal agente etiológico nos bovinos é o Mycobacterium bovis, embora o M. tuberculosis seja capaz de causar infecção em bovinos que são expostos a pessoas infectadas. Eventualmente, outras espécies do gênero Mycobacterium podem causar lesões granulomatosas em bovinos, mas a infecção, nesses casos, é autolimitante. Macroscopicamente, as pneumonias granulomatosas se apresentam sob a forma de nódulos de tamanhos variáveis distribuídos pelo parênquima pulmonar (granulomas). No caso da tuberculose, as porções centrais dos nódulos contêm material necrótico caseoso e, às vezes, mineralizado. Microscopicamente, a pneumonia granulomatosa caracteriza-se pela abundância de macrófagos com aspecto epitelióides e, frequentemente, células gigantes multinucleadas. Esses achados estão associados a quantidades variáveis de infiltrado linfocitário e fibrose. A pneumonia granulomatosa invariavelmente tem curso crônico. Outros agentes, como Aspergillus sp., Histoplasma capsulatum e outros, podem provocar lesõesgranulomatosas no pulmão em diferentes espécies domésticas. Figura 29. Tuberculose Pulmonar, Pulmão, Vaca Idosa. A, Uma pneumonia granulomatosa multifocal coalescente envolve a maior parte do pulmão, exceto a porção dorsal do lobo caudal do pulmão. B, Secção transversal. Presença de grandes granulomas caseosos multifocais ou confluentes no parênquima pulmonar. Observa-se a aparência caseosa (“aspecto de queijo”, de coloração pálida amarelo-esbranquiçada) dos granulomas, uma característica da tuberculose bovina. 32 Figura 30. Pneumonia Granulomatosa, Pulmão, Vaca. Granulomas não caseosos confluentes (setas) com um pequeno centro necrótico preenchido com neutrófilos, cercado por histiócitos e células mononucleares, e com uma borda externa de tecido conjuntivo. Coloração por HE. Detalhe, Macrófagos epitelióides e uma célula gigante multinucleada (centro da figura). Coloração por HE.
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