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Dor abdominal crônica na infância LAYANE SILVA O quadro de dor abdominal é comum na infância e adolescência, compreende um grande número de atendimentos ambulatoriais e de emergência. Em crianças existem várias causas, mas assim como na constipação, a principal causa é dor abdominal funcional (até 95% dos casos de dor abdominal em crianças). Assim, na maioria das vezes há um distúrbio funcional, associado a uma alteração no eixo cérebro-intestino por algum distúrbio emocional, embora os pais sempre tenham a expectativa de que a criança tem um quadro orgânico pelo padrão recorrente do sintoma, o que gera ansiedade nos pais e na criança. Dor abdominal orgânica (DAO): associada a causa anatômica, inflamatória ou dano tecidual (prevalência de 5-10%). Dor abdominal funcional (DAF): ausência de causa anatômica, inflamatória ou dano tecidual (sem alterações macro ou microscópicas). Pela baixa prevalência da dor abdominal orgânica, nota-se que nesse caso o distúrbio funcional não é um diagnóstico de exclusão, visto que para diagnosticá-lo seria necessário expor mais de 90% das crianças a exames desnecessários que geram estresse, piorando o quadro. Portanto, ele não deve ser colocado como diagnóstico de exclusão se existem critérios para preencher o distúrbio funcional e nenhum sinal de alarme para causa orgânica. EPIDEMIOLOGIA É uma queixa comum de prevalência desconhecida (varia entre 0,5-19%) a depender da idade e definição, pois existem muitos estudos com diferentes parâmetros. Mas, observa-se que ocorre principalmente na idade escolar e adolescência, mas tem 2 picos de ocorrência: 4-6 anos e 7- 12 anos. Portanto, a DAC geralmente é funcional sem doença orgânica associada, ou seja, não há lesão, inflamação, dano estrutural ou nenhum outro fator orgânico que justifique a dor. No contexto de dor abdominal, tanto orgânica quanto funcional, existe uma grande variedade de patologias, desde as mais simples, como verminoses, até as mais complexas, como neoplasias e doenças inflamatórias. Desse modo, formam um grupo heterogêneo de doenças com etiologia, fisiopatologia, sintomas e abordagem variadas. Assim, uma das dificuldades é a difícil compreensão e recorrência pela ansiedade nos envolvidos que muitas vezes não conseguem aceitar o diagnóstico e requerem exames desnecessários em busca de uma causa orgânica. Isto porque a maioria dos distúrbios são funcionais e tem um tratamento subjetivo (terapia multidisciplinar), assim, muitas vezes os pais contribuem para dor abdominal da criança gerando desgaste emocional. DEFINIÇÃO 3 ou mais episódios de dor abdominal Intensidade suficiente para interromper as atividades habituais Período superior a 03 meses O primeiro conceito de DAC (Apley -1958), define que a dor abdominal crônica é aquela com: No entanto, na maioria dos distúrbios funcionais, os critérios de Roma IV já serão avaliados com 2 meses de sintomas. Esses episódios de dor abdominal precisam ser intensos a ponto de interferir nas atividades habituais da criança para ser considerado um episódio doloroso. Em geral, é uma dor que impede a criança de ir para a escola, pois muitas vezes a escola é um fator deflagrador da dor - por isso, destaca-se a importância de uma investigação psicossocial. SUBGRUPOS Dor abdominal crônica (DAC): longa duração (> 03 meses) com padrão contínuo ou intermitente; Dentro da classificação tanto da AAP quanto da NASPGHAN, existem subgrupos: DISTÚRBIOS FUNCIONAIS Dispepsia funcional Síndrome do intestino irritável Enxaqueca abdominal (menos comum e mais difícil de diagnosticar) Dor abdominal funcional sem outra especificação (maioria dos casos, ocorre quando não é possível classificar em nenhuma das outras 3 desordens) As desordens gastrointestinais funcionais (DGIFs) incluídas no Roma IV são: FISIOPATOLOGIA Após a introdução de cereais e alimentos sólidos; Geralmente a constipação funcional ocorre em 3 períodos de estresse para a criança relacionada ao hábito intestinal, nos quais as crianças são mais susceptíveis a constipação: A introdução de alimentação complementar muda a consistência e textura dos alimentos - e os pais comumente oferecem alimentos que prendem mais as fezes. I . CAUSA ORGÂNICA Lesão ou dano tissular (inflamação ou obstrução) A fisiopatologia da DAC de causa orgânica está relacionada à lesão ou dano tissular em cada tipo de doença, frequentemente associada a inflamação ou obstrução. I I . CAUSA FUNCIONAL Eixo cérebro-intestino Mecanismos de forma isolada ou associada A fisiopatologia dos distúrbios funcionais inclui um mecanismo complexo, multifatorial, não esclarecido. Sabe-se da existência do eixo cérebro-intestino que pode ser modulado por fatores como: alimentos que levam à distensão abdominal, emocional, microbiota ou até mesmo por pequenas inflamações na mucosa após infecções. Tais fatores podem modular o eixo de forma que a criança sinta dor por aumento da sensibilidade visceral. Hiperalgesia (ou alodinia) visceral: menor limiar de percepção dos sinais do TGI enviados ao cérebro. Em pessoas sem distúrbios funcionais existem alimentos que causam distensão, mas não há a percepção dolorosa dessa alteração, já pacientes com distúrbios funcionais possuem uma hiperalgesia, que leva a uma percepção maior desse estímulo, provocando dor. Assim, é importante esclarecer que a criança sente a dor mas muitas vezes não LAYANE SILVA Predisposição genética Alterações na composição da microbiota intestinal/pós infecções bacterianas ou rotavírus Distúrbios na motilidade Inflamação de pouca intensidade Perfil psicológico da criança e estresse ambiental: quadro e evolução sabe lidar com a sensação, e, se tiver algum fator emocional envolvido, isso pode aumentar a modulação da dor, gerando maior sensibilidade à palpação. Algumas infecções virais por alterarem a microbiota ou gerar níveis de inflamação no intestino pode predispor a síndrome do intestino irritável pós-infecção viral. Assim, é comum pacientes que tem virose e ficam um tempo maior com dor abdominal, porque a inflamação gerou uma desregulação à nível local, que muitas vezes é temporária, mas se houverem outros fatores predisponentes pode se tornar um quadro prolongado. Nos distúrbios funcionais, além do aumento da sensibilidade visceral, podem haver distúrbios na motilidade, tanto constipação quanto diarréia, ou aumento da produção de muco, assim na SII pode haver eliminação de muco mesmo na ausência de inflamação. Acredita-se que nos distúrbios funcionais, exista uma pequena inflamação local, mas que é insuficiente para classificar o quadro como um distúrbio orgânico. Sabe-se que o eixo cérebro-intestino está muito associado a questões emocionais, então há maior frequência de ansiedade, depressão e baixa autoestima. Em escolares, pode haver uma associação com eventos estressantes, como: desordens familiares, hospitalização, “bullying” e abuso infantil - em função disso, é necessário colher uma boa história para identificar quais são os gatilhos da dor. Dor periumbilical (região mesogástrica) ou epigástrica (dispepsia funcional) Dor raramente irradia Duração: minutos a horas (prolongada) - intercalados por períodos de bem-estar Ocorrem durante o dia Intensidade variável: choro e interrupção das atividades habituais Entre os fatores na história que chamam atenção para distúrbio funcional estão: A dor pode ser difusa na enxaqueca abdominal, mas não migra de uma região para outra, e se ultrapassar a linha média é importante suspeitar de causa orgânica, principalmente se for do lado direito, que tem estruturas mais “perigosas” pelo acometimento agudo e necessidade de intervenção rápida (apêndice, vesícula, fígado). Geralmente, a dor funcional ocorre durante o dia associada ao estado emocional da criança, geralmente no período em que os pais estão fora de casa - pois um dos gatilhos emocionais é a ausência dos pais - e não provoca despertar noturno. Em geral, pacientes que tem transtorno de humor ou um distúrbio funcional, quando está exercendo uma atividade prazerosa,observa-se uma redução dos sintomas e melhora do quadro por questão emocional. DIAGNÓSTICO História clínica detalhada Exame físico Exames complementares O primeiro passo no processo de investigação é o diagnóstico diferencial dos quadros de etiologia orgânica (DAO) daqueles funcionais. Como a maioria dos casos são distúrbios funcionais, o diagnóstico é clínico, que necessita de uma boa anamnese e um bom exame físico, buscando sinais e sintomas que afastem distúrbios funcionais ou sinais e sintomas de alerta para doença orgânica (diagnóstico diferencial). A maioria dos sinais de alarme para doença orgânica é clínico e podem ser identificados na história, mas existem alguns sinais obtidos em exames complementares, como por exemplo a anemia. ANAMNESE Na avaliação de um paciente com dor abdominal sempre destrinchar as características da dor (decálogo da dor): localização, intensidade (usar a escala de graduação da dor que a criança compreender melhor), frequência, periodicidade, duração dos episódios, relação com alimentação (pode ser gatilho da distensão abdominal), dor noturna (despertar noturno é um sinal de alarme importante - ou seja, questionar se a criança acorda por conta da dor) e interferência com as atividades habituais. SINTOMAS DE DISTÚRBIO FUNCIONAL Importante! Se dor noturna ou que interrompe atividades prazerosas (atividade que a criança mais gosta de fazer), suspeitar de causa orgânica pois são sinais de alarme. Sintomas neurovegetativos: palidez, sudorese, náuseas e vômitos (mal-estar) Sintomas associados: pirose, saciedade precoce, náusea, empachamento pós-prandial, vômitos, diarreia, constipação, tenesmo, sangramentos de TGI, icterícia. Na anamnese é importante questionar sinais e sintomas associados ao quadro para buscar um diagnóstico diferencial, a partir de um interrogatório sintomatológico da parte gastrointestinal. Isto porque a maioria das doenças gastrointestinais se manifestam com dor, então os sintomas associados podem direcionar o diagnóstico. OUTROS DADOS RELEVANTES Sinais/sintomas de outros sistemas: sintomas urinários, cefaleia, sonolência após as crises de dor, artralgias, artrites, tosse crônica, asma, respiração bucal. Medicações em uso ou utilizadas: antibióticos, AINES e corticosteróides. História alimentar: leite e produtos lácteos, sucos naturais e artificiais, bebidas gaseificadas, balas e chicletes, irritantes gástricos (alimentos industrializados, condimentos picantes) e conteúdo de fibra na dieta. História familiar: doenças do TGI ou de outro sistemas que evoluem com dor abdominal, enxaqueca, alergias, tuberculose, quadros depressivos Vale questionar sobre sintomas associados de outros sistemas, particularmente olho, articulação, cavidade oral, sintomas urinários e cefaléia. Sabe-se que algumas medicações podem causar dor abdominal, por isso devem ser questionadas na história. Na história alimentar, vale questionar sobre alimentos que deflagram ou melhoram a dor. Sempre buscar a história familiar de outras doenças do TGI, principalmente história de síndrome do intestino irritável. LAYANE SILVA Antecedentes pessoais: virose recente (SII pós-viral), trauma abdominal (questionar prática de esportes ou lutas), intervenção cirúrgica prévia Perfil psicológico e comportamental: ansiedade SINAIS DE ALARME DE CAUSA ORGÂNICA Após investigar a história, deve-se questionar individualmente os sinais de alarme para a causa orgânica. História familiar de DII, doença celíaca ou péptica Dor persistente em QS ou QI direito (distante da região mesogástrica) Disfagia/odinofagia Vômitos persistentes Exame abdominal detalhado: localização da dor, massas, fígado, baço, loja renal e cicatrizes Avaliação perianal e toque retal O exame físico deve ser detalhado, avaliando não só abdome, mas também investigando acometimento de outros órgãos e segmentos - como por exemplo: cavidade oral (aftas) e olhos. Importante! Pode haver vômito no momento da dor como sintoma neurovegetativo, mas considera-se sinal de alarme se a criança tem vômito mesmo fora do período de dor. Sangramento de TGI (melena, hematoquezia) Anemia Suspeitar de anemias ferroprivas refratárias, que apesar do uso de medicamento não há aumento da ferritina. Curiosidade! No caso de anemia, pode-se solicitar a calprotectina fecal, que é uma proteína de neutrófilo, então qualquer inflamação que leve à migração de neutrófilo aumenta esse marcador, cujo ponto de corte é 200 - assim, se calprotectina fecal aumentada, solicitar colonoscopia para investigar doenças inflamatórias intestinais. Doença perianal (fístula, fissura de repetição, abscesso) Perda ponderal involuntária (ausência de dieta ou transtorno alimentar) Desaceleração do crescimento linear Atraso da puberdade Febre sem explicação Diarreia de repetição/dor noturna Artrites/artralgia Deve-se investigar também o ganho ponderal inadequado, isto porque muitas vezes uma das únicas manifestações em crianças é não ganhar peso, sem sintomas associados. Existem outros sinais de alarme que podem ser investigados, mas esses são os principais que devem ser buscados na história. EXAME FÍSICO Importante! Sempre encaminhar a criança para o oftalmologista pois o olho está associado a manifestações de várias doenças gastrointestinais. Sempre realizar a avaliação antropométrica a partir de: peso, estatura e velocidade de crescimento; e registrar estágio puberal (estadiamento de Tanner). EXAMES COMPLEMENTARES Avaliar solicitação de VHS, PCR, função tireoidiana, amilase e lipase a depender da história. No Roma IV, há indicação de sorologia para doença celíaca, mesmo diante de um distúrbio funcional, por ser uma doença com manifestações difusas. Se a história clínica sugerir intolerância à lactose, podem ser solicitados exames para avaliação ou realizar o teste clínico, se melhora dos sintomas com a exclusão da lactose, indica má absorção. Exames de imagem serão feitos somente se evidências clínicas de causa orgânica. Como são distúrbios funcionais, se não tiver sinais de alarme, os exames são desnecessários - no máximo pode ser feita a avaliação laboratorial básica: hemograma, sumário de urina e exame parasitológico de fezes para investigar anemia e parasitoses. Importante! Pode ser que o paciente tenha doença crônica associada a outro órgão com repercussão emocional importante pelo comprometimento da qualidade de vida, que leva a uma síndrome do intestino irritável. CRITÉRIOS DIAGNÓSTICOS DOS DITÚRBIOS FUNCIONAIS Ausência de alteração ao exame clínico e testes complementares Preencher os critérios de Roma IV para cada problema Sinais e sintomas não atribuídos a outra doença Distúrbios funcionais devem ser vistos como primeira hipótese e não diagnóstico de exclusão (Roma IV), e para confirmar o diagnóstico deve ter os seguintes pontos: DISPEPSIA FUNCIONAL A dispepsia funcional é uma das principais classes de distúrbio funcional, há uma maior dificuldade de classificar em um primeiro momento, pois em geral a principal suspeita é uma doença péptica, por isso acaba sendo um diagnóstico de exclusão (após endoscopia e pHmetria). I . CRITÉRIOS Plenitude pós-prandial Saciedade precoce Dor epigástrica que não se associa à defecação Os sintomas não podem ser plenamente explicados por outra doença Um ou mais dos sintomas ao menos 4 dias por mês: 1. 2. 3. 4. Ocorrer por pelo menos 2 meses antes do diagnóstico. I I . SUBTIPOS Existem 02 formas de apresentação da dispepsia, uma em que o paciente sente mais desconforto após comer LAYANE SILVA Dor não generalizada e sem localização em outra parte do abdômen ou tórax Dor não é aliviada pela evacuação ou eliminação de flatos (dificuldade pós-prandial) e outra que está mais associado a dor epigástrica que não melhora com evacuação ou eliminação de flatos. 1. Síndrome de dificuldade pós-prandial: desconforto da plenitude pós-prandial ou saciedade precoce que impede o término da refeição regular. Critérios de suporte: distensão abdominal superior, náusea pós-prandial ou eructações excessivas2. Síndrome de dor epigástrica: dor ou queimação epigástrica (pode interferir com as atividades) Critérios de suporte: (a) dor tipo queimação não retroesternal (b) dor induzida ou aliviada pela ingesta mas pode ser em jejum - ou seja, não tem relação direta com alimentação. I I I . DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL Doença péptica (DRGE, gastrite erosiva, úlcera gástrica ou duodenal) Efeito colateral de medicamentos Doença de Crohn Tuberculose Infecções parasitárias Doença celíaca Colecistite crônica Pancreatite crônica Inclui a maioria das doenças gastrointestinais, que podem causar dor e saciedade precoce, principalmente doença péptica. SÍNDROME DO INTESTINO IRRITÁVEL O quadro de dor abdominal associada à alteração do hábito intestinal pode corresponder à síndrome do intestino irritável (SII). I . CRITÉRIOS Relação com a evacuação Alteração na frequência das fezes Alteração na aparência das fezes 1. Dor abdominal ao menos 4 dias por mês associada com um ou mais dos seguintes sintomas: Observação! Podem ocorrer esforço ou urgência para defecar, sensação de evacuação incompleta, passagem de muco e distensão abdominal - em geral a dor melhora após a evacuação. 2. Constipação: dor pode não resolver com a resolução da constipação 3. Sintomas não podem ser plenamente explicados por outra condição médica Ocorrer por pelo menos 2 meses antes do diagnóstico I I . SUBTIPOS SII com constipação (dor abdominal e constipação) SII com diarreia (diarreia intermitente) SII com constipação e diarréia (alternando) SII não especificada A síndrome do intestino irritável pode ter diferentes formas de apresentação, como: I I I . CONSTIPAÇÃO FUNCIONAL X SI I A constipação intestinal crônica funcional está frequentemente relacionada à dieta pobre em fibras, que pode acarretar dor abdominal do tipo cólica, que melhora após a evacuação. Ao exame, consegue-se palpar massas fecais no abdome ou, ao toque retal, constata-se a ampola retal cheia de fezes endurecidas. A diferenciação pode ser difícil entre constipação e SII, em geral sabe-se que se o paciente tem dor abdominal e constipação, deve-se iniciar tratamento para constipação funcional - se a dor desaparece: constipação funcional. Isto porque na SII existem vários outros fatores desencadeadores da dor além da constipação. IV . DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL Retocolite ulcerativa Doença de Crohn Doença celíaca Doenças infecciosas Infecções parasitárias Infecções bacterianas Intolerância à lactose V. FISIOPATOLOGIA Fluxo sanguíneo, motilidade, secreção e imunidade, regulada por agentes hormonais, neurais e imunológicos. Alteração na hipersensibilidade visceral relacionada a eventos psicológicos (estresse, depressão). Aumento de atividade inflamatória na mucosa (SII pós- infecciosa) Alterações do microbioma intestinal Entre os distúrbios, a SII é a classe que há mais estudos, consequentemente maior conhecimento da sua fisiopatologia. Tal qual os outros distúrbios, a SII é resultante da modulação bidirecional: cérebro-intestino, que pode afetar outros fatores como: ENXAQUECA ABDOMINAL Aumento na frequência: 4% Sintomas prodrômicos: mudanças de comportamento e humor, fotofobia e sintomas vasomotores A enxaqueca abdominal é a classe de menor prevalência por ser mais difícil de diagnosticar, pois, ao contrário dos demais distúrbios, este necessita de 6 meses de ocorrência dos episódios para diagnóstico pois os episódios são muito intercalados. O padrão da dor é estereotipado e individualizado para cada paciente, normalmente consiste em uma dor abdominal de forte intensidade em crises e incapacitante, assim como os pródromos e os fatores desencadeantes. Importante! Alívio dos sintomas com o uso de medicamentos para prevenção de enxaqueca reforça diagnóstico. Fatores desencadeantes: estresse, fadiga e obesidade; e alimentos, como: chocolate (75%), queijo (48%), frutas cítricas (30%) e bebidas alcoólicas (25%). I . CRITÉRIOS Todos os seguintes sintomas ocorrendo ao menos duas vezes: 1. Episódios paroxísticos de dor abdominal intensa, aguda e periumbilical, na linha média ou difusa, durando 1 hora ou mais (deve ser o sintoma mais grave e aflitivo) 2. Episódios intercalados por semanas ou meses 3. Dor é incapacitante e interfere com as atividades normais LAYANE SILVA Anorexia Náusea Vômito Cefaleia Fotofobia Palidez 4. Padrões estereotipados e sintomas individualizados para cada paciente 5. Dor associada a dois ou mais dos seguintes sintomas secundários (predomínio da dor): 6. Os sintomas não podem ser plenamente explicados por outra condição médica. Ocorrer por pelo menos 6 meses antes do diagnóstico. Frutose, lactose, sorbitol, frutooligossacarídeos, gluco oligossacarídeos e manitol aumentam distensão abdominal e sinalização dolorosa, causando piora dos sintomas, nesse contexto, observa-se o papel dos carboidratos fermentáveis não absorvíveis (FODMAPs - oligossacarídeos, dissacarídeos, monossacarídeos fermentáveis e polióis) principalmente em SII. Visto que o consumo desses alimentos, que ao serem fermentados, levam a uma distensão abdominal que é percebida como dor. DOR ABDOMINAL FUNCIONAL SEM OUTRA ESPECIFICAÇÃO Caso a dor abdominal não seja associada a nenhum dos outros 3 subtipos, é classificada como uma dor abdominal não especificada. I . CRITÉRIOS Todos os seguintes sintomas ao menos 4 vezes por mês: 1. Dor abdominal episódica ou contínua que não ocorre exclusivamente durante eventos fisiológicos (ex: alimentação, menstruação) 2. Critérios insuficientes para outros distúrbios funcionais 3. A dor abdominal não pode ser plenamente explicada por outra condição médica Ocorrer por pelo menos 2 meses antes do diagnóstico I I . DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL Doença de Crohn Má rotação com ou sem volvo Invaginação intestinal de repetição Aderências pós-cirúrgicas Linfoma de intestino delgado Tuberculose intestinal Parasitoses intestinais Desordens do trato urinário Dismenorreia Importante! Ficar atento à causas infecciosas de órgãos como ITU e colecistite, como possibilidades diagnósticas. TRATAMENTO Abordagens dietéticas Terapia farmacológica Suporte psicológico Terapias suplementares Assegurar aos pais a benignidade do quadro A abordagem da criança com DAC dependerá da hipótese diagnóstica e será específico para cada doença, se suspeita de causa orgânica. Causa orgânica: terapêutica específica Funcionais: como é um distúrbio multicausal, o tratamento é multidisciplinar, incluindo: Uma boa relação médico-paciente pode ser útil na abordagem de crianças, sendo necessário estimular a aquisição de habilidades verbais para relato da algia. ABORDAGEM DIETÉTICA DAC com distensão abdominal, diarreia e relato de associação com leite: retirar temporariamente a lactose ou realizar teste. Dispepsia funcional: evitar alimentos que agravam sintomas (cafeína, picantes, gordurosos) Sensibilidade ao glúten não celíaca: algumas pessoas tem uma sensibilidade ao glúten não celíaca, ou seja, ao consumir glúten manifestam distensão abdominal, dor, diarréia ou cefaléia - nesses casos, se a história trouxer essa suspeita, deve-se suspender o glúten da dieta. Reação aos aditivos alimentares (corantes e conservantes). No entanto, as evidências para uso da dieta restrita de FODMAPs na infância ainda são restritas. De forma geral, é necessário melhorar a alimentação habitual da criança, se identificado os erros alimentares, ou trocar alimentos que pioram o quadro de dor por causar distensão (FODMAPs). Sabe-se que alguns alimentos TERAPIA FARMACOLÓGICA Probióticos (pp na SII): Lactobacillus rhamnosus GG, Lactobacillus reuteri DSM 17938 e o VSL#3 (não disponível no Brasil). Manipulação do microbioma intestinal: potencial alvo terapêutico, visto que há muitos estudos a respeito da microbiota intestinal buscando identificar formas de manipular o microbioma para combater patologias específicas pelo uso de probióticos. Sabe-se que o uso de probióticos diminuem a intensidade da dor, mas tem uso controverso - além disso, muitos dos probióticos que são comercializados possuem prebióticosna sua composição, que são oligossacarídeos e monossacarídeos, que podem levar a piora do quadro. Anticolinérgicos: sem evidência para controle da dor nas causas funcionais O uso de analgésicos não tem benefício na modulação da doença à longo prazo, mas pode ter um benefício pontual, visto que há uma atenção maior à criança no momento de medicar, principalmente no caso de pais ausentes. Antidepressivos: benéficos na DAF Podem ser utilizados em pacientes selecionados, particularmente em crianças que já tem algum transtorno do humor associado, em conjunto com psiquiatra/psicólogo. Esses medicamentos atuam diminuindo o trânsito intestinal, além de tratar depressão (enquanto comorbidade), melhorar o sono e induzir analgesia, mas devem ser usado com cautela pelos efeitos colaterais. Enxaqueca abdominal: tratamento medicamentoso profilático (ciproheptadina, amitriptilina, propranolol, pizotifeno e flunarizina). TERAPIAS ESPECÍFICAS LAYANE SILVA Dispepsia funcional: antagonistas (H2) ou IBP: por quatro semanas em crianças maiores e adolescente Baixas doses de antidepressivo tricíclico e ciproeptadina em casos difíceis. Náuseas, distensão e saciedade precoce são sintomas mais difíceis de tratar: procinéticos podem ser prescritos para aumentar a motilidade. SUPORTE PSICOLÓGICO Terapias psicológicas efetivas: suporte familiar, terapia cognitivo comportamental (TCC) e psicoterapia Práticas comportamentais: amenizam tensão muscular e/ou comportamentos restritivos - impulsos sensoriais inadequados e aumento da percepção dolorosa É a principal terapia e a mais negligenciada pelos pais, depende do estabelecimento de uma boa relação médico- paciente-família, visto que os fatores psicológicos podem contribuir para a gravidade do problema. TCC é mais efetiva, pois focar em outro pensamento ou imagem, em geral, bloqueia ou diminui percepção da dor - ativação do sistema opióide e não-opioide da supressão dolorosa. Em geral, modificam comportamentos no paciente e nos cuidadores, que iniciam, mantêm e/ou exacerbam a dor Exemplos: exercício físico, relaxamento e condicionamento operante. PROGNÓSTICO Em 30% DAC persiste: fator de risco para a SII em adultos O prognóstico da dor abdominal funcional, de forma geral, é bom, se forem tratados os gatilhos da dor, mas é necessário intervir de forma precoce e adequada, pois muitas dessas crianças se tornam adultos com dor abdominal funcional.
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