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1 Júlia Morbeck – @med.morbeck Objetivos 1- Rever a morfofisiologia da próstata; 2- Comparar a epidemiologia, etiologia, fisiopatologia, manifestações clínicas, diagnóstico e tratamento da hiperplasia prostática benigna e do câncer de próstata. Próstata ↠ A próstata é uma glândula única em forma de rosca, aproximadamente do tamanho de uma bola de golfe. Ela mede cerca de 4 cm de um lado a outro, aproximadamente 3 cm de cima a baixo, e cerca de 2 cm de anterior a posterior (TORTORA, 14ª ed.). ↠ A próstata é uma glândula do tamanho de uma noz, que envolve a uretra proximal; apresenta as seguintes características: (HANSEN, 2019) • Contribui com o fluido ejaculatório; produz cerca de 20% do volume da ejaculação. • Produz um fluido fino, leitoso e ligeiramente alcalino que ajuda a liquefazer o sêmen coagulado depois que este é depositado na vagina; contém ácido cítrico, enzimas proteolíticas, açúcares, fosfato e diversos íons. Em cada ejaculação, cerca de 3 a 5 mL de sêmen e 100 milhões de espermatozoides/mL estão presentes. O pH é entre 7 e 8 (HANSEN, 2019) ANATOMIA ↠ Encontra-se inferiormente à bexiga urinária e circunda a parte prostática da uretra (TORTORA, 14ª ed.). ↠ A próstata tem o formato de um cone arredondado invertido, com uma base maior, que é contínua, acima, com o colo da bexiga, e um ápice mais estreito, que fica abaixo do assoalho pélvico. As faces inferolaterais da próstata ficam em contato com os músculos levantadores do ânus, que, juntos, seguram a próstata (DRAKE et al., 2021). A próstata aumenta de tamanho lentamente desde o nascimento até a puberdade. Em seguida, se expande rapidamente até aproximadamente os 30 anos de idade; após esse período, seu tamanho normalmente permanece estável até os 45 anos, quando podem ocorrer novos aumentos (TORTORA, 14ª ed.). ↠ A próstata tem três zonas distintas: (JUNQUEIRA, 2017). • a zona central (cerca de 25% do volume da glândula); • a zona de transição; • zona periférica (cerca de 70% da glândula); seus ductos desembocam na uretra prostática. ↠ A divisão anatômica dessa glândula é importante, principalmente, para descrever a localização dos processos neoplásicos que ocorrem nesse órgão. A parte glandular representa cerca de dois terços da próstata, sendo composta pela zona periférica e uma pequena – 2 Júlia Morbeck – @med.morbeck zona central que formam cerca de 95% da próstata; enquanto o outro terço é fibromuscular, composto por zona muscular anterior, zona de transição e glândulas periuretrais (SANARFLIX). • Zona periférica (ZP): localizado posterior à uretra, corresponde a uma zona glandular. • Zona de transição (ZT): por se tratar de uma área de transição apresenta tanto característica glandular quanto fibromuscular • Zona muscular anterior (AMZ): localizado anteriormente à uretra, é também chamada de istmo. Característica fibromuscular com pouco ou nenhum tecido glandular. Representa a continuação superior do músculo esfíncter externo da uretra para o colo da bexiga; • Zona Central (ZC): localizado ao redor da uretra, é uma zona glandular. A zona periférica e de transição, apesar de anatomicamente distintas, apresentam uma origem embrionária comum (sino urogenital). As glândulas da zona central são morfologicamente distintas devido a origem embrionária diferente. Cerca de 60 a 70% dos tumores de próstata ocorrem na zona periférica e de 10 a 20% ocorrem na zona de transição. Apenas 5 a 10% dos tumores se originam na zona central. Já a Hiperplasia Prostática Benigna decorre de um aumento no número das células musculares, principalmente em região de AMZ, podendo ocorrer também em zona de transição (SANARFLIX). ↠ A estrutura possui uma cápsula prostática fibrosa e densa, que incorpora os plexos prostáticos de nervos e veias. A cápsula é circundada pela fáscia visceral da pelve, formando uma bainha prostática fibrosa, que é fina anteriormente, contínua anterior e lateralmente com os ligamentos puboprostáticos e densa posteriormente, contínua com o septo retovesical (AGUR, 2021). HISTOLOGIA ↠ A próstata é um conjunto de 30 a 50 glândulas tubuloalveolares ramificadas que envolvem uma porção da uretra chamada uretra prostática (JUNQUEIRA, 2017). ↠ As glândulas tubuloalveolares da próstata são formadas por um epitélio cuboide alto ou pseudoestratificado colunar. Um estroma fibromuscular cerca as glândulas. A próstata é envolvida por uma cápsula fibroelástica rica em músculo liso. Septos dessa cápsula penetram a glândula e a dividem em lóbulos, que não são facilmente percebidos em um adulto (JUNQUEIRA, 2017). FISIOLOGIA ↠ A próstata secreta um líquido leitoso e ligeiramente ácido (pH de aproximadamente 6,5) que contém diversas substâncias: (TORTORA, 14ª ed.). Porção da região central da próstata em secção transversal à uretra prostática. Epitélio das glândulas tubuloalveolares da próstata (setas) constituído de células cuboides ou colunares. 3 Júlia Morbeck – @med.morbeck • O ácido cítrico do líquido prostático é usado pelos espermatozoides para a produção de ATP por meio do ciclo de Krebs. • Várias enzimas proteolíticas, como o antígeno prostático específico (PSA), pepsinogênios, lisozima, amilase e hialuronidase, que por fim quebram as proteínas de coagulação das glândulas seminais. • A função da fosfatase ácida secretada pela próstata é desconhecida. • A plasmina seminal do líquido prostático é um antibiótico que pode destruir as bactérias. A plasmina seminal pode ajudar a diminuir a quantidade de bactérias que ocorrem naturalmente no sêmen e no sistema genital inferior da mulher. As secreções da próstata entram na parte prostática da uretra por meio de diversos canais prostáticos. As secreções prostáticas constituem aproximadamente 25% do volume do sêmen e contribuem para a motilidade e viabilidade dos espermatozoides (TORTORA, 14ª ed.). Hiperplasia prostática benigna ↠ A hiperplasia prostática benigna (HPB) é um processo patológico que contribui para o desenvolvimento de sintomas do trato urinário inferior (STUI) nos homens (JAMESON, 2019). ↠ A HPB é uma condição médica que se deve à proliferação excessiva das células epiteliais e estromais glandulares (MACHADO; LIMA, 2022). ↠ Associada a sintomas do trato urinário inferior, tem sua origem na zona periuretral, sendo resultado de uma multiplicação celular, não neoplásica, mas sim das células estromais e o aumento da glândula prostática (MACHADO; LIMA, 2022). EPIDEMIOLOGIA ↠ A HPB é o tumor benigno mais comum nos homens, e sua incidência está relacionada com a idade. A prevalência de HPB histológica em estudos de necropsia se eleva de aproximadamente 20% em homens na idade de 41 a 50 anos, para 50% naqueles com idade de 51 a 60, e maior que 90% em homens com mais de 80 anos (MCANINCH.; LUE, 2014). FATORES DE RISCO ↠ Os fatores de risco para o desenvolvimento de HPB são mal compreendidos. Alguns estudos têm sugerido uma predisposição genética, e alguns têm notado diferenças raciais. Aproximadamente 50% dos homens com menos de 60 anos que sofrem cirurgia para HPB podem ter uma forma hereditária da doença. Essa forma é mais provavelmente um traço autossômico dominante, e parentes masculinos em primeiro grau têm um risco relativo aumentado em aproximadamente quatro vezes (MCANINCH.; LUE, 2014). ETIOLOGIA E PATOGÊNESE ↠ A etiologia da HPB não é compreendida completamente, mas parece ser multifatorial e ter controle endócrino (MCANINCH.; LUE, 2014). Pesquisas adicionais têm demonstrado uma correlação positiva entre níveis de testosterona livre e estrogênio e o volume da HPB. Isso pode sugerir que a associação entre envelhecimento e HPB resulte dos níveis aumentados de estrogênio no envelhecimento, causandoindução do receptor de androgênio, que, assim, sensibiliza a próstata à testosterona livre. Há evidência de que os estrogênios, atuando por meio de receptores de estrogênio do estroma e epiteliais, possam contribuir, em parte, para doenças da próstata. Fatores genéticos ou ambientais que influenciam a 5a-redutase também parecem ser importantes no desenvolvimento de HPB (MCANINCH.; LUE, 2014). ↠ A di-hidrotestosterona (DHT) é o principal androgênio na próstata, onde é formado a partir da testosterona pela ação da 5α-redutase tipo 2. Essa enzima é expressa sobretudo nas células do estroma, mas não nas células epiteliais da próstata. A 5α-redutase tipo 1 é outra enzima que medeia a produção de DHT a partir da testosterona em locais extraprostáticos (p. ex., fígado e pele) e proporciona uma fonte adicional de DHT que alcança a próstata por meio do sangue (KUMAR et al., 2023). Esquema simplificado da patogênese da hiperplasia prostática. A. O papel central das células do estroma na produção de di-hidrotestosterona (DHT) é apresentado. A DHT também pode ser produzida na pele e no fígado pela 5α-redutase tipos 1 e tipo 2. 4 Júlia Morbeck – @med.morbeck ↠ A DHT liga-se aos receptores de androgênios (AR) encontrados nas células prostáticas do estroma e epiteliais, ativando-os. A DHT é mais potente do que a testosterona, visto que tem maior afinidade pelos AR e forma um complexo mais estável com eles. A ligação da DHT aos AR os transloca do citoplasma para o núcleo e ativa a transcrição de genes dependentes de androgênio, que codificam vários fatores de crescimento e seus receptores. Entre os fatores suprarregulados, os mais importantes são membros da família do fator de crescimento dos fibroblastos (FGF) e o fator de crescimento transformador (TFG) β (KUMAR et al., 2023). ↠ Os FGF, produzidos por células do estroma, são reguladores parácrinos do crescimento epitelial estimulado por androgênio durante o desenvolvimento embrionário da próstata, e algumas dessas vias podem ser “reativadas” na vida adulta para produzir o crescimento da próstata na HPB. O TGFβ serve como agente mitogênico para os fibroblastos e outras células mesenquimais, porém inibe a proliferação epitelial. Embora a causa final da HPB seja desconhecida, acredita-se que os fatores de crescimento induzidos pela DHT atuem aumentando a proliferação das células do estroma e diminuindo a morte das células epiteliais (KUMAR et al., 2023). ↠ Embora seja reconhecido que os androgênios desempenham um papel permissivo na patogênese da HPB, múltiplas linhas de evidências também sustentam um papel para os estrogênios. Duas formas diferentes de receptor de estrogênio (ER), o Erα e o Erβ, têm, respectivamente, efeitos proliferativos e antiproliferativos opostos sobre as células prostáticas. Os efeitos dos estrogênios sobre a próstata estão associados a múltiplos mecanismos, como apoptose, expressão da aromatase e regulação parácrina pela prostaglandina E2. Por conseguinte, os estrogênios contribuem para a patogênese da HPB ao inclinar a balança no sentido da proliferação celular (KUMAR et al., 2023). MORFOLOGIA Na HPB, o peso da próstata aumenta frequentemente de três a cinco vezes (60 a 100 g), e em alguns casos pode-se observar um aumento ainda maior. A HPB afeta a zona de transição e, portanto, pode invadir a uretra, comprimindo-a até formar um orifício semelhante a uma fenda. Em corte transversal, são observados nódulos hiperplásicos que variam de cor e consistência, dependendo de seu conteúdo celular. Os nódulos que contêm principalmente glândulas são rosa-amarelados e moles e exsudam um líquido prostático branco leitoso. Os nódulos compostos sobretudo de estroma fibromuscular são cinza pálidos e firmes (KUMAR et al., 2023). No exame microscópico, os nódulos individuais contêm glândulas de pequenas a grandes a cisticamente dilatadas, que são separadas por células fusiformes do estroma. As glândulas são revestidas por duas camadas de células, uma camada interna de células colunares secretoras e uma camada externa de epitélio basal cuboide ou plano, e a formação de dobras das glândulas pode produzir uma arquitetura papilar. Em glândulas com acentuado aumento, o comprometimento do suprimento vascular pode gerar infartos prostáticos, que podem apresentar áreas adjacentes de metaplasia escamosa (KUMAR et al., 2023). À medida que os nódulos de HPB na zona de transição aumentam, eles comprimem as zonas externas da próstata, resultando na formação de uma assim chamada cápsula cirúrgica (MCANINCH.; LUE, 2014). MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS ↠ Os sintomas de HPB podem ser correlacionados ou ao componente obstrutivo da próstata ou à resposta secundária da bexiga à resistência na via de saída. O componente obstrutivo pode ser subdividido em obstrução mecânica e dinâmica (MCANINCH.; LUE, 2014). B. A contribuição do estrogênio em inclinar o equilíbrio a favor da proliferação em relação à morte celular é ilustrada. EGF, fator de crescimento epidérmico; IGF, fatores de crescimento semelhantes à insulina; KGF, fator de crescimento do queratinócito; TGFβ, fator de crescimento transformador β. 5 Júlia Morbeck – @med.morbeck • Quando ocorre o crescimento da próstata, a obstrução mecânica pode resultar de uma intrusão para o lúmen da uretra ou para o colo vesical, levando a uma resistência em nível mais alto na via de saída da bexiga. • O componente dinâmico da obstrução prostática explica a natureza variável dos sintomas experimentados pelos pacientes. O estroma da próstata, composto por musculatura lisa e colágeno, é rico em suprimento nervoso adrenérgico. Assim, o nível de estimulação autonômica estabelece um tônus para a uretra prostática. ↠ As queixas miccionais irritativas da HPB resultam da resposta secundária da bexiga ao aumento da resistência na via de saída. A obstrução da via de saída da bexiga leva à hipertrofia e à hiperplasia do músculo detrusor, bem como à deposição de colágeno. Embora a última provavelmente seja mais responsável por uma diminuição da complacência vesical, a instabilidade do detrusor também é um fator (MCANINCH.; LUE, 2014). Os principais sintomas da HPB são resultantes da obstrução urinária causada pelo aumento da próstata e contração do estroma mediada pelo músculo liso. O aumento da resistência ao fluxo urinário leva à hipertrofia e distensão da bexiga, acompanhadas de retenção urinária (KUMAR et al., 2023). A incapacidade de esvaziar a bexiga por completo cria um volume residual de urina, que constitui uma fonte comum de infecção. Os pacientes apresentam aumento da frequência urinária, nictúria, dificuldade em iniciar e interromper o jato de urina, gotejamento por transbordamento e disúria (micção dolorosa) e correm risco aumentado de desenvolver infecções bacterianas da bexiga e dos rins. Em muitos casos, ocorre retenção urinária aguda e súbita, que exige cateterização de emergência para alívio (KUMAR et al., 2023). Os sintomas de HPB podem ser divididos em queixas obstrutivas e irritativas. Os sintomas obstrutivos incluem hesitação, diminuição da força e calibre do jato, sensação de esvaziamento incompleto da bexiga, micção dupla (urinar uma segunda vez dentro de 2 horas da micção prévia), esforço para urinar e gotejamento pós-micção. Os sintomas irritativos incluem urgência miccional, polaciúria e nictúria (MCANINCH.; LUE, 2014). DIAGNÓSTICO ↠ Uma história detalhada enfocando o trato urinário exclui outras causas possíveis de sintomas que podem não resultar de hipertrofia da próstata, como infecção do trato urinário, bexiga neurogênica, estreitamento uretral ou câncer de próstata (MCANINCH.; LUE, 2014). ↠ Exame físico, TR e exame neurológico focalizado são realizados em todos os pacientes. O tamanho e a consistência dapróstata são observados, embora o tamanho, como determinado pelo TR, não se correlacione com a gravidade dos sintomas ou com o grau de obstrução. A HPB geralmente resulta em uma próstata aumentada lisa, firme e elástica. O endurecimento, se detectado, deve alertar o médico para a possibilidade de câncer e a necessidade de avaliação adicional (i.e., antígeno prostático específico [PSA], ultrassonografia transretal [USTR] e biópsia) (MCANINCH.; LUE, 2014). ACHADOS LABOORATORIAIS ↠ Um sumário de urina para excluir infecção ou hematúria e dosagem da creatinina sérica para avaliar a função renal são necessários. Insuficiência renal pode ser observada em 10% dos pacientes com prostatismo e é indicação para estudo de imagem do trato superior. Pacientes com insuficiência renal estão em risco aumentado de desenvolver complicações pós-operatórias após intervenção cirúrgica para HPB (MCANINCH.; LUE, 2014). ↠ O PSA sérico é considerado opcional, mas a maioria dos médicos o incluirá na avaliação inicial (MCANINCH.; LUE, 2014). EXAMES DE IMAGEM ↠ Um exame de imagem (ultrassonografia renal ou uretrografia por tomografia computadorizada [TC]) é recomendado somente na presença de doença do trato urinário concomitante ou de complicações da HPB (p. ex., hematúria, infecção do trato urinário, insuficiência renal, história de litíase) (MCANINCH.; LUE, 2014). QUESTIONÁRIO O questionário autoadministrado desenvolvido originalmente pela American Urological Association (AUA) é válido e confiável para identificar a necessidade de tratamento dos pacientes e monitorar sua resposta à terapia. O questionário de escore de sintomas da AUA tem sido validado e traduzido extensamente, sendo agora mais comumente chamado de International Prostate Symptom Score (IPSS). O IPSS talvez represente a ferramenta isolada mais importante usada na avaliação de pacientes com HPB, sendo recomendado para todos os pacientes antes do início da terapia. Essa avaliação focaliza 7 itens que pedem aos pacientes para quantificar a gravidade de suas queixas obstrutivas ou irritativas, numa escala de 0 a 5. Assim, o escore pode variar de 0 a 35. Um IPSS de 0 a 7 é considerado leve; 8 a 19 é considerado moderado; e 20 a 35, grave (MCANINCH.; LUE, 2014). 6 Júlia Morbeck – @med.morbeck TRATAMENTO ↠ Depois que os pacientes são avaliados, eles devem ser informados sobre as várias opções terapêuticas para HPB (MCANINCH.; LUE, 2014). Recomendações específicas de tratamento podem ser oferecidas a certos grupos de pacientes. Para aqueles com sintomas leves (escore IPSS de 0-7), geralmente se aconselha espera vigilante. Na outra ponta do espectro terapêutico, as indicações cirúrgicas absolutas incluem retenção urinária refratária ao tratamento clínico e tentativas de remoção de sonda, infecção recorrente do trato urinário, hematúria macroscópica recorrente, cálculos vesicais, insuficiência renal ou grandes divertículos da bexiga (MCANINCH.; LUE, 2014). TRATAMENTO CLÍNICO a-Bloqueadores ↠ A próstata humana e a base da bexiga contém alfa 1- adrenoceptores, e a próstata mostra uma resposta contrátil aos agonistas correspondentes. As propriedades contráteis da próstata e do colo vesical parecem ser mediadas primariamente pelo subtipo de receptores alfa 1. Tem sido demonstrado que o bloqueio a resulta em graus de melhora tanto objetivos como subjetivos dos sintomas e sinais de HPB em alguns pacientes. Os a- bloqueadores podem ser classificados de acordo com a seletividade de seu receptor, bem como com sua meia- vida (MCANINCH.; LUE, 2014). ↠A fenoxibenzamina e a prazosina representam protótipos dos a-bloqueadores não seletivos e seletivos, mas, atualmente, eles são de interesse principalmente histórico. Os alfa 1-bloqueadores de ação prolongada tornam possível a dosagem uma vez por dia. Efeitos colaterais possíveis incluem hipotensão ortostática, tontura, cansaço, ejaculação retrógrada, rinite e cefaleia (MCANINCH.; LUE, 2014). ↠ O bloqueio seletivo dos alfa 1-receptores, que estão localizados na próstata e no colo vesical, resulta em menos efeitos colaterais sistêmicos (particularmente cardiovasculares), eliminando, assim, a necessidade de titulação de dose com esses agentes (tansulosina, alfuzosina e silodosina). Outros efeitos colaterais, como a ejaculação retrógrada, ainda podem ocorrer (MCANINCH.; LUE, 2014). Inibidores da a-redutase ↠ A finasterida é um inibidor da 5 alfa-redutase que bloqueia a conversão de testosterona em di- hidrotestosterona (DHT). Esse fármaco afeta o componente epitelial da próstata, resultando em uma redução do tamanho da glândula e melhora dos sintomas. Terapia por pelo menos 6 meses é necessária para verificar os efeitos máximos sobre o tamanho da próstata (redução de 20%) e melhora sintomática (MCANINCH.; LUE, 2014). ↠ Efeitos colaterais são incomuns e incluem diminuição da libido, redução do volume ejaculado e impotência (MCANINCH.; LUE, 2014). ↠ A dutasterida difere da finasterida no fato de que ela inibe ambas as isoenzimas da 5a-redutase. De modo semelhante à finasterida, ela reduz o PSA sérico e o volume total da próstata (MCANINCH.; LUE, 2014). Terapia combinada ↠ A redução de risco de progressão clínica geral associada com a terapia de combinação (66%) foi significativamente maior que a associada com doxazosina ou finasterida isoladamente. Os pacientes com maior probabilidade de se beneficiar da terapia de combinação são aqueles nos quais o risco de progressão na linha de base é muito alto, em geral pacientes com glândulas 7 Júlia Morbeck – @med.morbeck maiores e valores de PSA mais elevados (MCANINCH.; LUE, 2014). Fitoterapia ↠ A fitoterapia refere-se ao uso de plantas ou extratos vegetais para fins medicinais. A utilização da fitoterapia na HPB tem sido popular na Europa há anos, e seu uso nos Estados Unidos (EUA) está crescendo em consequência do entusiasmo motivado por pacientes (MCANINCH.; LUE, 2014). Terapia cirúrgica • Ressecção transuretral da próstata: A grande maioria das prostatectomias subtotais realizados para HPB pode ser feita por via endoscópica. A maioria desses procedimentos envolve o uso de um anestésico espinal ou geral, e geralmente requer uma permanência no hospital durante à noite. A magnitude e a durabilidade da melhora no IPSS e na velocidade de fluxo com a ressecção transuretral da próstata (RTUP) são superiores às de qualquer terapia minimamente invasiva. • Incisão transuretral da próstata: Homens com sintomas moderados a graves e uma próstata pequena muitas vezes têm hiperplasia da comissura posterior (colo vesical elevado). Esses pacientes frequentemente se beneficiam de uma incisão da próstata. Câncer de próstata ↠ O câncer de próstata é a segunda causa de morte entre os cânceres em homens, ultrapassado apenas pelo câncer de pulmão. O comportamento biológico do câncer de próstata abrange desde cânceres “histológicos” (com diagnóstico histológico de câncer, mas clinicamente insignificantes) até tumores agressivos rapidamente fatais. Trata-se, em grande parte, de uma doença do envelhecimento (KUMAR et al., 2023). EPIDEMIOLOGIA ↠ O câncer de próstata (CaP) é o câncer não cutâneo mais comum detectado entre homens nos EUA. Mais de 200 mil casos são diagnosticados anualmente (MCANINCH.; LUE, 2014). ↠ No mundo, também é o segundo tipo de câncer mais comum, sendo estimado que 1 em cada 9 homens será diagnosticado com câncer de próstata durante sua vida. Já é registrado cerca de 1,2 milhão de casos e 358 mil mortes anualmente, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS) (SANARFLIX). ↠ Com base em estudos de necropsia, a incidência do câncer de próstata aumenta de 20% em homens na quinta década de vida para até cerca de 70% em homens entre 70 e 80 anos (KUMARet al., 2023). ↠ Os estudos epidemiológicos mostram que o risco de diagnóstico de câncer de próstata aumenta em 2,5 vezes quando um parente de primeiro grau é acometido e em cinco vezes quando dois ou mais forem acometidos. Na atualidade, estima-se que 40% dos cânceres de início precoce e 5 a 10% de todos os cânceres de próstata sejam hereditários (JAMESON et al., 2019). ↠ O câncer de próstata acomete diferentemente os grupos étnicos. Quando pareados para a idade, os homens negros apresentam maior incidência e encontram-se em um estágio mais avançado, com tumores mais agressivos e de maior grau. Um alto risco em famílias foi associado ao locus de suscetibilidade HPC1 (câncer de próstata hereditário 1) no gene RNASEL (JAMESON et al., 2019). ↠ O aumento das taxas de incidência no Brasil pode ser justificado pela evolução dos métodos diagnósticos, pela melhoria na qualidade dos sistemas de informação do país e pelo aumento da expectativa de vida (SANARFLIX). FATORES DE RISCO ↠ Dos vários fatores de risco, os mais importantes são idade, etnia, fatores genéticos e, possivelmente, fatores alimentares (SANARFLIX). IDADE ↠ Observa-se uma relação clara entre o aumento da idade e o aumento da incidência de câncer de próstata. Raramente o diagnóstico é feito antes dos 40 anos, mas a incidência aumenta rapidamente a partir dessa idade, atingindo pico entre 65 e 74 anos (SANARFLIX). A probabilidade de diagnóstico de CaP em um homem com menos de 40 anos é de 1 em10mil; para homens de 40 a 59 anos de idade é de 1 em 103; e para homens de 60 a 79 é de 1 em 8 (MCANINCH.; LUE, 2014). ETNIA ↠ O câncer de próstata é mais comum em homens negros do que em brancos ou hispânicos, talvez relacionado a fatores genéticos combinado a fatores alimentares. Além das taxas de incidência mais altas, a 8 Júlia Morbeck – @med.morbeck idade de início nos homens afro-americanos é anterior ao dos outros grupos, ocorrendo em menos de 50 anos em 8,3% dos negros e 3,3% dos brancos (SANARFLIX). FATORES GENÉTICOS HERDADOS ↠ Entre as variantes relativamente comuns que conferem um aumento modesto do risco, destacam-se as variantes em regiões regulatórias que influenciam a expressão do MYC, um importante oncogene no câncer de próstata. Foram identificadas outras variantes raras, que estão associadas a um alto risco de doença agressiva de início precoce. Entre elas estão mutações que impedem a função de vários genes de reparo do DNA, como mutações de perda de função no BRCA2 (necessário para o reparo por recombinação homóloga) e em genes de reparo de mau pareamento do DNA (KUMAR et al., 2023). FATORES AMBIENTAIS A prevalência de cânceres detectados na necrópsia é semelhante em todo o mundo, ao passo que a incidência da doença clínica varia. Por conseguinte, os fatores ambientais e nutricionais podem desempenhar um papel no crescimento e na evolução do câncer de próstata (JAMESON et al., 2019). Os fatores ambientais e nutricionais podem desempenhar um papel no crescimento e na evolução do câncer de próstata. Acredita- se que o consumo elevado de gorduras da dieta, como o ácido α- linoleico, ou dos hidrocarbonetos aromáticos policíclicos, que se formam durante o cozimento de carnes vermelhas, aumente o risco (JAMESON et al., 2019). ↠ Foi formulada a hipótese de que a exposição a carcinógenos, estrogênios e oxidantes provoca dano ao epitélio da próstata, preparando o terreno para a aquisição de alterações genéticas e epigenéticas que levam ao desenvolvimento do câncer (KUMAR et al., 2023). De modo geral, a “dieta ocidental” é suspeita, tendo em vista a incidência relativamente alta do câncer de próstata nos EUA, na América do Sul, na Europa Ocidental e na Austrália. Um componente da dieta capaz de contribuir para o risco sugerido por estudos epidemiológicos e em modelos animais é o consumo de carnes vermelhas na brasa e gorduras animais, o que leva à formação de aminas aromáticas heterocíclicas e hidrocarbonetos aromáticos policíclicos carcinogênicos. Estas e outras exposições dietéticas podem criar estresse oxidativo no epitélio prostático, levando à lesão celular e à inflamação. Uma evidência que liga essas exposições ao desenvolvimento do câncer de próstata é a observação de que polimorfismos na glutationa-S-transferase (GSTP1), uma enzima envolvida na destoxificação de hidrocarbonetos policíclicos aromáticos, estão ligados ao risco de câncer de próstata (KUMAR et al., 2023). FATORES PROTETORES ↠ Os fatores protetores incluem o consumo do isoflavonoide genisteína (que inibe a 5α-redutase), vegetais crucíferos que contêm isotiocianato sulforafano, licopeno encontrado em tomates e inibidores da biossíntese de colesterol (p. ex., estatinas) (JAMESON et al., 2019). ETIOLOGIA E PATOGÊNESE ANDROGÊNIOS ↠ À semelhança de seus correspondentes normais, o crescimento e a sobrevida das células no câncer de próstata dependem de androgênios, que se ligam ao AR e induzem a expressão de genes pró-crescimento e pró- sobrevida (KUMAR et al., 2023). A importância dos androgênios na manutenção do crescimento e sobrevida das células do câncer de próstata pode ser observada no efeito terapêutico da castração ou do tratamento com antiandrogênios, que costumam induzir regressão da doença (KUMAR et al., 2023). ↠ Infelizmente, a maioria das neoplasias finalmente torna- se resistente ao bloqueio androgênico. As neoplasias escapam por meio de uma variedade de mecanismos, como aquisição de hipersensibilidade a baixos níveis de 9 Júlia Morbeck – @med.morbeck androgênio (p. ex., por meio de amplificação do gene do AR); ativação do AR independente do ligante (p. ex., por meio de variantes splice que carecem do domínio de ligação do ligante); mutações em AR que possibilitam sua ativação por ligantes não androgênicos; e outras mutações ou alterações epigenéticas que ativam vias de sinalização alternativas e escapam da necessidade do AR (KUMAR et al., 2023). ALTERAÇÕES GENÉTICAS E EPIGENÉTICAS ADQUIRIDAS ↠ À semelhança de outros tipos de câncer, o câncer de próstata é causado por alterações genéticas e epigenéticas que modificam a expressão dos genes supressores de tumor e oncogenes, levando, em última análise, à aquisição das características essenciais do câncer. A alteração genética mais comum na próstata consiste em um rearranjo cromossômico que se justapõe à sequência de codificação de um gene do fator de transcrição da família ETS (mais comumente ERG ou ETV1), próximo ao promotor TMPRSS2 regulado por androgênios. Esses rearranjos, que ocorrem em cerca da metade dos cânceres de próstata, colocam o oncogene ETS envolvido sob o controle do promotor TMPRSS2 regulado por androgênio e levam à sua superexpressão de maneira dependente de androgênios (KUMAR et al., 2023). LESÕES PRECURSORAS ↠ As evidências a favor do desenvolvimento sequencial do câncer de próstata incluem a existência de uma suposta lesão precursora, a neoplasia intraepitelial prostática (NIP). O papel precursor da NIP, em pelo menos alguns casos de câncer de próstata, é respaldado por várias observações. Tanto a NIP quanto o câncer normalmente predominam na zona periférica e são relativamente incomuns em outras zonas, e as próstatas que contêm câncer apresentam maior frequência e maior extensão da NIP, que frequentemente é observada próxima ao câncer. De forma mais direta, muitas das alterações moleculares observadas em cânceres invasivos também estão presentes na NIP, sustentando fortemente o argumento de que a NIP é um precursor (KUMAR et al., 2023). PATOLOGIA Mais de 95% dos CaPs são adenocarcinomas. A histologia dos restantes 5% é heterogênea, originando-se de células do estroma, epiteliais ou ectópicas. As variantes não adenocarcinoma podem ser categorizadas em dois grupos,com base na origem celular: epiteliais e não epiteliais (MCANINCH.; LUE, 2014). • As variantes epiteliais compreendem carcinoma endometrioide, mucinoso, em anel de sinete, cístico adenoide, adenoescamoso, de células escamosas, de células transicionais, neuroendócrino e comedocarcinoma. • As variantes não epiteliais incluem rabdomiossarcoma, leiomiossarcoma, osteossarcoma, angiossarcoma, carcinossarcoma, linfoma maligno e neoplasias metastáticas, entre outras. ↠ Em cerca de 70% dos casos, o carcinoma de próstata surge na zona periférica da glândula, normalmente em localização posterior e palpável ao exame retal. De maneira característica, em corte transversal, o tecido neoplásico é áspero e firme à palpação; entretanto, sua visualização é, algumas vezes, extremamente difícil (KUMAR et al., 2023). ↠ No exame histológico, a maioria dos adenocarcinomas consiste em glândulas dispostas em padrões bem definidos e facilmente reconhecidos, que são utilizados para classificar essas neoplasias. As glândulas normalmente são menores do que as glândulas benignas e são revestidas por uma única camada uniforme de epitélio cuboide ou colunar baixo. Diferentemente das glândulas benignas, as glândulas malignas apresentam células densamente aglomeradas e caracterizam-se pela ausência de ramificações e dobras papilares. A camada externa de células basais típica das glândulas benignas está ausente (KUMAR et al., 2023). ↠ O citoplasma das células neoplásicas varia de pálido claro até um aspecto anfofílico distinto. Os núcleos estão aumentados e, com frequência, contêm um ou mais nucléolos grandes. Observa-se alguma variação no tamanho e no formato dos núcleos, porém em geral o pleomorfismo não é acentuado. As figuras mitóticas são raras (KUMAR et al., 2023). ↠ Quando ocorre invasão local, o câncer de próstata costuma afetar o tecido periprostático, as glândulas seminais e a base da bexiga urinária, o que, na doença avançada, pode provocar obstrução ureteral. As metástases disseminam-se por via linfática até os linfonodos obturatórios e, por fim, até os linfonodos paraórticos. A disseminação hematogênica ocorre sobretudo para os ossos, em particular para o esqueleto axial. Normalmente, as metástases ósseas são osteoblásticas, uma característica que, nos homens, indica fortemente uma origem prostática. Os ossos mais comumente afetados, por ordem decrescente de frequência, são a coluna lombar, a parte proximal do fêmur, a pelve, a coluna torácica e as costelas. As neoplasias também podem se disseminar para as vísceras, 10 Júlia Morbeck – @med.morbeck porém a disseminação visceral extensa representa mais a exceção do que a regra (KUMAR et al., 2023). MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS ↠ A grande maioria dos pacientes com CaP em estágio inicial é assintomática. A presença de sintomas frequentemente sugere doença avançada localmente ou metastática (MCANINCH.; LUE, 2014). ↠ Queixas miccionais obstrutivas ou irritativas podem resultar de crescimento local do tumor para dentro da uretra ou do colo vesical, ou de sua extensão direta para o trígono da bexiga. É muito mais comum, entretanto, que esses sintomas sejam atribuíveis a HPB coexistente (MCANINCH.; LUE, 2014). ↠ A doença metastática para os ossos pode causar dor óssea. Doença metastática para a coluna vertebral com invasão para a medula espinal pode estar associada a sintomas de compressão medular, inclusive parestesias e fraqueza das extremidades inferiores, e incontinência urinária ou fecal (MCANINCH.; LUE, 2014). Adenocarcinoma de próstata. Observa-se uma área do câncer na face posterior (parte inferior à esquerda) com aparência branco-acinzentada sólida, diferentemente da aparência esponjosa da zona periférica benigna no lado contralateral. Carcinoma de próstata osteoblástico metastático dentro de corpos vertebrais. Adenocarcinoma de próstata. A. Fotomicrografia de pequeno aumento de adenocarcinoma de próstata mostrando pequenas glândulas aglomeradas entre glândulas benignas maiores. Adenocarcinoma de próstata. B. Aumento maior mostrando várias glândulas malignas pequenas com núcleos aumentados, nucléolos proeminentes e citoplasma escuro, em comparação com a glândula benigna maior (parte superior). 11 Júlia Morbeck – @med.morbeck ↠ Os tumores localmente avançados também podem resultar em hematúria e hematospermia. O câncer de próstata que se disseminou para os linfonodos pélvicos regionais ocasionalmente causa edema de membros inferiores ou desconforto nas áreas pélvica e perineal (GOLDMAN; SCHAFER, 2022). DIAGNÓSTICO ↠ Mais de 60% dos pacientes com câncer de próstata são assintomáticos, e o diagnóstico é feito apenas em razão da elevação do nível de PSA detectada no rastreamento. Um nódulo palpável no toque retal, que é a segunda manifestação clínica inicial mais comum, em geral motiva a biopsia (GOLDMAN; SCHAFER, 2022). ↠ O toque retal pode detectar alguns carcinomas de próstata iniciais, devido à sua localização posterior, porém o exame apresenta baixa sensibilidade e especificidade. Os pacientes com câncer de próstata clinicamente avançado podem apresentar sintomas de obstrução urinária. Normalmente, é necessária uma biopsia transretal por agulha para confirmar o diagnóstico (GOLDMAN; SCHAFER, 2022). EXAME FÍSICO - TOQUE RETAL ↠ O TR avalia o tamanho e a consistência da próstata, bem como anormalidades em seu interior ou fora dela. Muitos cânceres ocorrem na região periférica e podem ser palpados pelo TR. Em geral, os carcinomas são duros, nodulares e irregulares, mas o endurecimento também pode ser devido à hipertrofia prostática benigna (HPB) ou a cálculos. De modo geral, 20 a 25% dos homens com TR anormal apresentam câncer de próstata (JAMESON et al., 2019). ANTÍGENO PROSTÁTICO ESPECÍFICO ↠ A medição dos níveis séricos de PSA é amplamente utilizada para auxiliar no diagnóstico e tratamento do câncer de próstata, embora seja controversa. O PSA é um produto do epitélio prostático que costuma ser secretado no sêmen (KUMAR et al., 2023). ↠ Trata-se de uma serina protease regulada por androgênio, cuja função é clivar e liquefazer o coágulo seminal formado após a ejaculação. Em homens normais, apenas quantidades mínimas de PSA circulam no soro. Ocorrem níveis sanguíneos elevados de PSA em associação ao câncer localizado, bem como avançado. Entretanto, como rastreamento para o câncer de próstata, a medição do PSA apresenta sensibilidade e especificidade subótimas. O PSA é específico de órgão, porém não específico de câncer (KUMAR et al., 2023). Outros fatores também aumentam os níveis séricos de PSA, como prostatite, infarto da próstata (p. ex., no contexto da HPB), instrumentação da próstata e ejaculação (KUMAR et al., 2023). ↠ Um PSA “normal” tem sido definido tradicionalmente como menor ou igual a 4 ng/mL, e o valor preditivo positivo de um PSA sérico entre 4 e 10 ng/mL é de aproximadamente 20 a 30%. Para níveis acima de 10 ng/mL, o valor preditivo positivo aumenta de 42 a 71,4% (MCANINCH.; LUE, 2014). ↠ Os valores médios de PSA por faixa etária estão descritos abaixo: (SANARFLIX) O teste de PSA pode identificar o câncer de próstata localizado. Porém existem limitações que dificultam a sua utilização como marcador desse câncer. Suas principais limitações são: (SANARFLIX) • O PSA ser tecido-específico, mas não tumor-específico; assim, condições como aumento benigno da próstata, prostatite e infecções do trato urinário inferior podem elevar o nível de PSA. Cerca de 2/3 dos homens com PSA elevado NÃO apresentam câncer de próstata detectado em biópsia. • Até 20% de todos os homens com câncer de próstata clinicamente significativo têm PSA normal; 12 Júlia Morbeck – @med.morbeck • O valor preditivopositivo desse teste está em torno de 33%, o que significa que 67% dos homens com PSA positivo serão submetidos desnecessariamente à biópsia para confirmação do diagnóstico; • O teste de PSA leva à identificação de cânceres de próstata que não teriam se tornado clinicamente evidentes durante a vida do paciente. O teste de PSA não vai, por si só, distinguir entre tumores agressivos que estejam em fase inicial (e que se desenvolverão rapidamente) e aqueles que não são agressivos. Acredita-se que a partir de 75 anos os pacientes não devem ser submetidos a detecção precoce, já que não se beneficiarão das intervenções. O exame de toque retal adiciona sensibilidade ao uso do PSA e deve ser oferecido aos pacientes acima de 40 anos. A biópsia transretal da próstata será solicita com base no valor do PSA, alterações nodulares de endurecimento no exame do toque retal ou alterações em ambos (SANARFLIX). ↠ Outros métodos também são utilizados para aumentar o valor preditivo na investigação: (SANARFLIX) RELAÇÃO PSA LIVRE/TOTAL ↠ Tem sido útil na diferenciação entre câncer de próstata e hiperplasia prostática benigna. Caso está relação esteja acima de 25%, o risco de câncer na biópsia é de apenas 8%, porém se a relação estiver abaixo de 10% o risco poderá chegar em até 56%, especialmente em homens com PSA entre 4 e 10 ng/ml (SANARFLIX). Velocidade de aumento do PSA ↠ O uso da velocidade de crescimento ou duplicação do PSA é mais utilizada para acompanhamento de um câncer já diagnosticado, do que para uma avaliação inicial. Essa velocidade é influenciada pelo crescimento benigno da próstata. Estudos apontam que sua utilização não aumenta o poder de detecção do PSA, apesar de apresentar algum valor na evolução após tratamento e na doença metastática (SANARFLIX). MARCADOR URINÁRIO PCA3 ↠ O PCA3 é um gene hiperexpresso no câncer de próstata e o RNA mensageiro (RNAm) desse gene pode ser dosado na urina após massagem prostática. A avaliação é feita por meio do resultado da relação do RNAm do PCA3 e do PSA encontrados na urina. Estudos vem mostrando uma superioridade desse exame para o diagnóstico em relação ao uso do PSA livre/total em pacientes com PSA elevado (SANARFLIX). O antígeno 3 do câncer de próstata (PCA3) é um RNAm não codificador, específico da próstata, que está superexpresso na maioria dos CaPs, com uma expressão 66 vezes maior que o observado no tecido adjacente não canceroso (JAMESON et al., 2019). BIÓPSIA DA PRÓSTATA ↠ A biópsia de próstata deve ser considerada em homens com um PSA sérico elevado, TR anormal ou uma combinação dos dois, a depender adicionalmente da saúde geral do paciente, comorbidades, expectativa de vida, níveis de ansiedade e de aversão ao risco, e preferências de informação. A biópsia de próstata é guiada pela USTR usando-se um dispositivo de biópsia carregado com mola acoplado à sonda de imagem (MCANINCH.; LUE, 2014). ↠ A visualização direta por ultrassonografia transretal (USTR), ressonância magnética (RM) ou fusão das imagens de ultrassonografia e RM assegura a obtenção de amostras de todas as áreas da glândula, incluindo as áreas suspeitas. Os esquemas atuais recomendam uma biópsia (core) de padrão estendido de 12 fragmentos, incluindo uma amostra da zona periférica, bem como biópsia dirigida a um nódulo palpável ou amostra suspeita guiada por imagem (JAMESON et al., 2019). ↠ A biópsia de próstata geralmente é realizada usando- se anestesia local e profilaxia antibiótica pré-procedimento (habitualmente uma fluoroquinolona). O uso de anestesia local, ou aplicada topicamente ao longo da parede retal anterior, ou injetada na próstata ou adjacente a ela, ou uma combinação das duas, diminui a dor associada ao procedimento (MCANINCH.; LUE, 2014). ACHADOS LABORATORIAIS GERAIS ↠ Azotemia pode resultar de obstrução ureteral bilateral, ou por extensão direta para o trígono, ou por adenopatia retroperitoneal. Anemia pode estar presente na doença metastática. A fosfatase alcalina pode estar elevada na presença de metástases ósseas. A fosfatase ácida sérica pode estar elevada caso a doença se localize fora dos limites da próstata (MCANINCH.; LUE, 2014). A diretriz de câncer de próstata de 2006, apesar de trazer o conflito em relação a realizar ou não o rastreamento, se apoia no American Cancer Society (ACS), definindo um rastreio anual dos indivíduos ou a cada 2 anos quando PSA inicial < 2 ng/ml. Quanto à idade de início do rastreamento, devido a essas questões entre risco e benefício, ainda não foi precisamente definida A maioria dos autores indica 13 Júlia Morbeck – @med.morbeck 50 anos, apesar de haver referências a 45 anos e 55 anos. Homens de raça negra ou que tenham dois ou mais parentes de primeiro grau afetados devem ser avaliados a partir de 45 anos (SANARFLIX). GRAU E ESTADIAMENTO ↠ O grau e o estágio constituem os fatores prognósticos de maior importância no câncer de próstata (KUMAR et al., 2023). ↠ A determinação do grau é realizada com o sistema de Gleason, que estratifica o câncer de próstata em cinco graus, com base nos padrões glandulares de crescimento (KUMAR et al., 2023). ↠ O grau 1 corresponde às neoplasias bem diferenciadas, em que as glândulas neoplásicas apresentam aspecto uniforme e redondo e estão agrupadas em nódulos bem circunscritos. Em contrapartida, as neoplasias de grau 5 não apresentam glândulas, e as células neoplásicas infiltram o estroma em cordões, lâminas e ninhos sólidos. Outros graus estão situados entre esses extremos (KUMAR et al., 2023). ↠ A maioria das neoplasias contém mais de um padrão; nesses casos, atribui-se um grau primário ao padrão dominante, e estabelece-se um grau secundário para o segundo padrão mais frequente. Os dois graus numéricos são então adicionados para obter uma pontuação combinada de Gleason (KUMAR et al., 2023). As neoplasias que apresentam apenas um padrão são tratadas como se seus graus primário e secundário fossem os mesmos, de modo que o número é duplicado para obter a pontuação. A maioria dos cânceres detectados em biopsia por agulha como resultado de rastreamento apresentam uma pontuação de Gleason de 6 ou 7. As neoplasias com pontuações de Gleason de 8 a 10 tendem a ser cânceres avançados, com menos probabilidade de cura. Embora haja algumas evidências de que os cânceres de próstata podem se tornar mais agressivos com o tempo, é comum que a pontuação de Gleason permaneça estável por um período de vários anos. Atualmente, as pontuações de Gleason são combinadas em cinco grupos de graus, cada uma com um prognóstico diferente (KUMAR et al., 2023). Escore de Gleason do câncer de próstata. A. Adenocarcinoma de próstata de baixo grau (pontuação de Gleason 1 + 1 = 2), que consiste em glândulas malignas consecutivas de tamanho uniforme, revestidas por uma única camada de células epiteliais. B. Biopsia por agulha da próstata com adenocarcinoma do grupo 1 (pontuação de Gleason 3 + 3 = 6), composto de glândulas individuais bem formadas e de tamanho variável. C. Adenocarcinoma do grupo 5 (pontuação de Gleason 5 + 5 = 10), composto de lâminas de células malignas sem formação de glândulas identificáveis. 14 Júlia Morbeck – @med.morbeck Tradicionalmente, os graus de Gleason variavam de 1 a 5, e, por consequência, os escores de Gleason variavam de 2 a 10. Escores de Gleason de 2 a 4, 5 a 7 e 8 a 10 correspondiam a tumores bem, moderadamente e fracamente diferenciados, respectivamente (MCANINCH.; LUE, 2014). ↠ O estadiamento patológico do câncer de próstata é utilizado em combinação com o grau para estratificar o tratamento do câncer de próstata. Como mostra a Tabela abaixo, o estadiamento pTNM baseia-se na extensão do tumor (T) e na presença de metástases para linfonodos ou a distância (N e M).O grau é agora integrado com os dados do estágio patológico TNM para obter grupos de prognóstico combinados, resultando em “supraestadiamento” de algumas neoplasias (KUMAR et al., 2023). Note-se que, no que diz respeito à categorização do tumor primário (estágio T), o sistema de estadiamento clínico usa resultados de TR e USTR, mas não os resultados da biópsia (MCANINCH.; LUE, 2014). EXAMES DE IMAGEM Imageamento axial (TC, RM) ↠ O imageamento em corte transversal da pelve em pacientes com CaP é realizado seletivamente para excluir metástases em linfonodos de pacientes de alto risco que se pensa serem candidatos à terapia local definitiva, seja por cirurgia ou irradiação (MCANINCH.; LUE, 2014). ↠ Tanto TC como RM baseada em bobina corporal são usadas para esse propósito. Nenhuma das modalidades é particularmente acurada para estadiamento T local. Pacientes identificados como tendo linfadenopatia ao exame de imagem podem, ocasionalmente, ser submetidos à aspiração com agulha fina guiada por TC se o diagnóstico for equívoco (MCANINCH.; LUE, 2014). Vários critérios podem ser usados para identificar pacientes candidatos ao imageamento axial, inclusive cintilografias ósseas negativas e ou cânceres T3, ou um PSA 20 ng/mL, e cânceres primários grau 4 ou 5 de Gleason (MCANINCH.; LUE, 2014). CINTILOGRAFIA ÓSSEA ↠ Quando o CaP dissemina metástases, ele mais comumente o faz para os ossos. Metástases para partes moles (p. ex., pulmão e fígado) são raras na apresentação inicial. Embora a cintilografia óssea tenha sido considerada uma parte rotineira da avaliação inicial de homens com CaP recém-diagnosticado, boas evidências têm se acumulado de que ela pode ser excluída na maioria desses homens com base no PSA sérico (MCANINCH.; LUE, 2014). TRATAMENTO ↠ Os cânceres são os que aparecem sem metástases após a realização de estudos de estadiamento. Os pacientes com doença clinicamente localizada são tratados com prostatectomia radical, radioterapia ou observação ativa. A escolha do tratamento requer a consideração de vários fatores: a presença de sintomas, a probabilidade de que o tumor não tratado possa afetar adversamente a qualidade ou a duração da sobrevida do paciente e, portanto, exigir tratamento, e a probabilidade de que o tumor possa ser curado com tratamento de Estágios T do câncer de próstata. A. T1: tumor clinicamente inaparente, não palpável nem visível nos exames de imagem; B. T2: tumor confinado dentro da próstata; C. T3: tumor que se estende através da cápsula prostática e que pode invadir as glândulas seminais; D. T4: tumor fixo ou que invade estruturas adjacentes. Oitenta por cento dos pacientes apresentam doença local (T1 e T2), que está associada a uma taxa de sobrevida de até 100% após 5 anos. 15 Júlia Morbeck – @med.morbeck modalidade única direcionado para a próstata ou exija tratamento tanto local quanto sistêmico para obter a cura (JAMESON et al., 2019). VIGILÂNCIA ATIVA ↠ Um conceito mais moderno de espera vigilante é mais bem denominado como “vigilância ativa”. Na vigilância, homens com câncer muito bem caracterizado, em estágio inicial, e de grau baixo a intermediário, são acompanhados muito cuidadosamente com avaliações seriadas de TR e PSA, e biópsias de seguimento guiadas por USTR para garantir a estabilidade do tumor. Os cânceres geralmente são tratados ao primeiro sinal de progressão subclínica (MCANINCH.; LUE, 2014). ↠ Embora entre 20 e 41% dos homens nesses regimes possam precisar de tratamento com 3 a 5 anos de seguimento, o tratamento na progressão parece ser tão efetivo como teria sido se administrado por ocasião do diagnóstico para a maioria dos pacientes (MCANINCH.; LUE, 2014). RADIOTERAPIA ↠ A radioterapia é administrada com feixe externo, fontes radioativas implantadas na glândula ou combinação das duas técnicas (JAMESON et al., 2019). A terapia hormonal neoadjuvante antes da radiação é utilizada para diminuir o tamanho da próstata e, consequentemente, reduzir a exposição dos tecidos normais a doses integrais de radiação, aumentar as taxas de controle local e diminuir a taxa de falha sistêmica. A terapia hormonal a curto prazo pode diminuir as toxicidades e melhorar as taxas de controle local, porém é necessário um tratamento em longo prazo (2-3 anos) para prolongar o momento de falha do PSA e reduzir o risco de doença metastática em homens com cânceres de alto risco. O impacto na sobrevida não está bem esclarecido (JAMESON et al., 2019). ↠ Radioterapia externa: A atual modalidade de radioterapia externa, a radioterapia de intensidade modulada (IMRT, de Intensity-Modulated Radiation Therapy), possibilita o ajuste da dose e o fornecimento de doses mais altas na próstata, permitindo, ao mesmo tempo, uma acentuada redução da exposição dos tecidos normais, em comparação com o tratamento conformacional tridimensional apenas. Essas vantagens possibilitaram a administração segura de doses > 80 Gy e resultaram em maiores taxas de controle local e menos efeitos colaterais (JAMESON et al., 2019). ↠ Braquiterapia: A braquiterapia refere-se à implantação direta de fontes radioativas (sementes) na próstata. Baseia-se no princípio de que o depósito de energia radioativa nos tecidos diminui em função do quadrado da distância da fonte. O objetivo é fornecer uma irradiação intensa da próstata, minimizando a exposição dos tecidos adjacentes. A técnica-padrão atual obtém uma distribuição mais homogênea da dose, colocando as sementes de acordo com um modelo individualizado, com base na avaliação do câncer por exame de imagem e dosimetria computadorizada. O implante é realizado por via transperineal, como procedimento ambulatorial com obtenção de imagem em tempo real (JAMESON et al., 2019). PROSTATECTOMIA RADICAL ↠ A prostatectomia radical tem por objetivo remover o câncer por completo com uma margem livre de doença, a fim de manter a continência ao preservar o esfíncter externo, bem como manter a potência sexual ao poupar os nervos autonômicos no feixe neurovascular. O procedimento é aconselhado para pacientes com expectativa de vida de 10 anos ou mais e é realizado por via retropúbica ou perineal ou por abordagem laparoscópica manual ou robótica minimamente invasiva (JAMESON et al., 2019). • MUITO BAIXO RISCO: são os que podem experimentar “não tratar”. • BAIXO RISCO: têm indicação de prostatectomia ou de radioterapia. • RISCO INTERMEDIÁRIO: a terapia hormonal é uma das primeiras escolhas, no entanto, cirurgia e radioterapia também devem ser opções. • ALTO RISCO: a prostatectomia e radioterapia são a primeira escolha. 16 Júlia Morbeck – @med.morbeck Referências TORTORA, Gerard J. Princípios de anatomia e fisiologia / Gerard J. Tortora, Bryan Derrickson; tradução Ana Cavalcanti C. Botelho... [et al.]. – 14. ed. – Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2016. HANSEN, John T. Netter Anatomia Clínica. Grupo GEN, 2019. JUNQUEIRA, Luiz Carlos U.; CARNEIRO, José. Histologia Básica - Texto e Atlas. Grupo GEN, 2017. DRAKE, Richard L.; VOGL, A W.; MITCHELL, Adam W M. Gray - Anatomia Clínica para Estudantes. Grupo GEN, 2021. AGUR, Anne M R. Fundamentos de Anatomia Clínica. Grupo GEN, 2021. MCANINCH, Jack W.; LUE, Tom F. Urologia geral de Smith e Tanagho. Grupo A, 2014. JAMESON, J L.; FAUCI, Anthony S.; KASPER, Dennis L.; et al. Medicina interna de Harrison - 2 volumes. Grupo A, 2019. KUMAR, Vinay; ABBAS, Abul K.; ASTER, Jon C. Robbins & Cotran Patologia: Bases Patológicas das Doenças Grupo GEN, 2023. GOLDMAN, Lee; SCHAFER, Andrew I. Goldman-Cecil Medicina. Grupo GEN, 2022. MACHADO, F. C.; LIMA, R. N. Hiperplasia prostética benigna e suas complicações. 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