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SP 3.1 - Diarreia aguda e crônica

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Ana Beatriz Figuerêdo Almeida - Medicina 2023.1 
Página | 1 
 
Diarreia aguda e crônica 
SP 3.1 - CAMINHADA EXTENSA 
1) ESTUDAR AS CLASSIFICAÇÕES DA DIARREIA 
(ALTA/BAIXA E AGUDA/CRÔNICA); 
Muitos pacientes apresentam queixas relativas ao 
hábito intestinal. Alguns desses referem frequência 
evacuatória acima da média e outros, abaixo. Portanto, 
é importante definir o que é hábito intestinal normal, 
ou melhor, saudável. A evacuação de fezes consistentes 
1 a 3 vezes/dia ou até a cada 2 a 3 dias é considerada 
normal. Em algumas situações, os pacientes podem 
alternar o ritmo intestinal, mantendo-se nos 
parâmetros normais da frequência evacuatória, porém 
com desconforto. Nesses casos, deve-se avaliar 
adequadamente o paciente. 
Diarreia consiste em alteração do hábito intestinal 
por diminuição de consistência das fezes e aumento da 
frequência e do volume das evacuações. Apesar de a 
quantificação do peso fecal diário ser a forma mais 
precisa para se definir diarreia, esta medida é pouco 
prática e restrita ao academicismo necessário às 
pesquisas. Habitualmente, o peso médio diário das 
fezes é de 100 g/dia. 
Existem várias formas de se classificarem as diarreias. 
A definição que apresenta maior relevância clínica é a 
que distingue tipos de diarreia de acordo com seu 
tempo de evolução. Assim, define-se como aguda a 
diarreia que tem duração máxima de 30 dias, 
habitualmente ficando restrita a 2 semanas. A diarreia 
é considerada crônica quando tem duração superior a 
1 mês. Essa distinção auxilia na conduta médica desde 
a avaliação de etiologias mais frequentes até as 
necessidades de terapêuticas empíricas iniciais. 
As diarreias agudas devem ser consideradas como 
urgência médica devido aos riscos inerentes 
especialmente relacionados com a desidratação 
habitual nesses casos. A principal etiologia é a 
infecciosa. Contudo, são processos autolimitados, na 
maioria das vezes, e a conduta primordial é a 
manutenção da homeostase com o equilíbrio 
hidreletrolítico. 
As diarreias crônicas apresentam condições 
etiopatogênicas muito mais complexas, porém 
raramente necessitam de abordagem emergencial. 
Com isso, a necessidade de tratamento empírico inicial 
é reduzida e o médico tem condições de conduzir 
investigação adequada. 
Outra forma também muito utilizada na prática clínica 
de classificar diarreia é em relação ao local do trato 
gastrintestinal de sua origem. Denomina-se diarreia 
alta a originada no intestino delgado e diarreia baixa a 
relacionada com o intestino grosso. A importância 
dessa classificação está na diferenciação de causas 
mais frequentes em cada local, dirigindo melhor 
conduta médica investigativa e terapêutica iniciais. A 
maioria das etiologias que causam problemas ao trato 
gastrintestinal alto desencadeia diarreia de padrão 
secretor. Por outro lado, as diarreias baixas costumam 
apresentar padrão inflamatório. 
 
Escala de Bristol 
A escala de Bristol foi desenvolvida pelos 
pesquisadores Stephen Lewis e Ken Heaton, da 
Universidade de Bristol, na Inglaterra, e publicada no 
“Scandinavian Journal of Gastroenterology”, em 1997. 
É uma tabela predominantemente gráfica que serve 
para classificar a forma dos resíduos em sete grupos e 
apontar se o funcionamento do intestino pode ser 
considerado normal ou anormal. 
 
Os tipos 3, 4 e 5 são considerados normais. Já os tipos 
1 e 2 podem indicar constipação; e o 6 e o 7 se associam 
a doenças que evoluem com diarreia. 
“Devemos evacuar pelo menos três vezes na semana, 
com fezes macias e pastosas, bem formadas (as 
categorias 3 e 4 da escala de Bristol), sem presença de 
sangue ou muco e que não cause dor ou necessite de 
esforço na evacuação.” 
Referência: 
• Dani - Gastroenterologia essencial, 4ª ed. 
2) ENTENDER A FISIOPATOLOGIA DAS DIARREIAS 
(DISTÚRBIOS DE ABSORÇÃO, AUMENTO DE 
PERISTALTISMO, INFECÇÕES); 
O intestino tem a função de secretar substâncias que 
auxiliam no processo digestivo e de absorver líquidos, 
eletrólitos e nutrientes. Fisiologicamente, a absorção 
de nutrientes e líquidos excede a secreção, e o intestino 
delgado é predominante nessa atividade. O intestino 
delgado recebe, aproximadamente, 10L de líquidos por 
Ana Beatriz Figuerêdo Almeida - Medicina 2023.1 
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dia (ingesta, secreções de saliva, gástrica, biliar, 
pancreática e intestinal), absorve cerca de 6L no jejuno 
e 2,5L no íleo. O cólon recebe do delgado em torno de 
1,5L, e apenas 100mL são eliminados nas fezes. A 
capacidade absortiva total do cólon é de 4 a 5L/24h e, 
quando essa quantidade é ultrapassada, surge a 
diarreia. 
O principal mecanismo pelo qual a água é absorvida 
e secretada se faz segundo o gradiente osmótico criado 
pelo transporte ativo do sódio. O sódio é absorvido 
associado ao cloro ou a alguns nutrientes. A absorção 
de Na+/Cl- pelas vilosidades leva a água passivamente 
através da mucosa. Isso se dá pela menor concentração 
de sódio no interior do enterócito em relação à luz 
intestinal. Essa via é inibida pelo AMPc e GMPc, que 
sofrem estimulação da adenilciclase e guanilciclase do 
enterócito. Essas enzimas podem ser ativadas pelas 
toxinas bacterianas. A absorção acoplada de Na+ com 
glicose, galactose e aminoácidos é ativa e não sofre 
influência dos agentes infecciosos, por isso é utilizado 
para restaurar as perdas nas diarreias infecciosas. A 
secreção entérica depende da secreção ativa de Cl-, que 
se acompanha da eliminação de Na+ e H2O para o 
lúmen intestinal pelas células das criptas. Assim, a água 
acompanha o movimento do Na+, e a absorção se faz 
pelas células do ápice das vilosidades intestinais, 
enquanto a secreção é realizada pelas células das 
criptas. Diversos agentes estimulam a secreção ou 
inibem a absorção, como as prostaglandinas, o 
peptídeo vasoativo intestinal (VIP) e o peptídeo 
calmodulina, enquanto as encefalinas atuam no 
sentido de estimular a absorção de água e eletrólitos. 
No cólon, há vários mecanismos de transporte de 
sódio, através dos quais ocorre a absorção de água. A 
absorção e a secreção acontecem concomitantemente 
com predomínio do conteúdo absorvido. A diminuição 
da absorção ou aumento da secreção ou a alteração de 
ambas produzem diarreia. 
Muitos microrganismos alteram o equilíbrio de 
absorção e secreção no intestino delgado e são capazes 
de provocar diarreia. Alguns produzem enterotoxinas 
que ativam o mecanismo secretor e outros, por 
alterarem as vilosidades, prejudicam a absorção. No 
íleo distai e cólon, a diarreia é causada principalmente 
por invasão e destruição do epitélio, que resulta em 
ulceração, infiltração da submucosa com eliminação de 
soro e sangue. Além disso, podem estimular resposta 
inflamatória local, que resulta na produção de vários 
secretagogos, como as prostaglandinas e interleucinas, 
e contribuem para a perda de líquidos para o lúmen 
intestinal. 
A fisiopatologia da diarreia envolve cinco mecanismos 
básicos, sendo possível a concomitância de mais de um 
deles no desencadeamento de determinado tipo de 
diarreia: 
a. Diarreia Secretora: resulta da hipersecreção de água 
e eletrólitos pelo enterócito, como ocorre pela ação das 
enterotoxinas bacterianas. Pode também resultar da 
produção excessiva de hormônios e outros 
secretagogos, como no gastrinoma (gastrina), na 
síndrome carcinoide (serotonina, prostaglandinas, 
calcitonina), na cólera pancreática (VIPomas), no 
adenoma viloso, na insuficiência adrenal e no 
hipoparatireoidismo. 
b. Diarreia Osmótica: o processo da digestão 
determina fisiologicamente a transformação do 
conteúdo intestinal em material isosmótico. Distúrbios 
da digestão presentes nas deficiências de 
dissacaridases, que mantêm um conteúdo 
hiperosmolar, determinam a passagem de líquidos 
parietais para o lúmen intestinal e, consequentemente, 
diarreia. O mesmo pode acontecer pela ingestão de 
agentes osmoticamente ativoscomo a lactulose, o 
manitol, o sorbitol e os sais de magnésio. 
c. Diarreia Motora: resulta de alterações motoras com 
trânsito intestinal acelerado, como ocorre nas 
enterocolopatias funcionais ou doenças metabólicas e 
endócrinas. Surge, também, por redução da área 
absortiva consequente de ressecções intestinais ou de 
fístulas enteroentéricas. 
d. Diarreia Exsudativa/Inflamatória: decorre de 
enfermidades causadas por lesões da mucosa 
resultantes de processos inflamatórios ou infiltrativos, 
que podem levar a perdas de sangue, muco e pus, com 
aumento do volume e da fluidez das fezes. É 
encontrada nas doenças inflamatórias intestinais, 
neoplasias, shigelose, colite pseudomembranosa, 
linfangiectasia intestinal. 
e. Diarreia Disabsortiva: resulta de deficiências 
digestivas e lesões parietais do intestino delgado que 
impedem a correta digestão ou absorção. Este processo 
pode causar diarreia com esteatorreia e resíduos 
alimentares. 
Referência: 
• Dani - Gastroenterologia essencial, 4ª ed. 
3) DISCUTIR O MANEJO DAS DIARREIAS AGUDAS; 
As doenças diarreicas agudas (DDA) correspondem a 
um grupo de doenças infecciosas gastrointestinais. São 
caracterizadas por uma síndrome em que há ocorrência 
de no mínimo três episódios de diarreia aguda em 24 
horas, ou seja, diminuição da consistência das fezes e 
aumento do número de evacuações, quadro que pode 
ser acompanhado de náusea, vômito, febre e dor 
abdominal. Em geral, são doenças autolimitadas com 
Ana Beatriz Figuerêdo Almeida - Medicina 2023.1 
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duração de até 14 dias. Em alguns casos, há presença 
de muco e sangue, quadro conhecido como disenteria. 
A depender do agente causador da doença e de 
características individuais dos pacientes, as DDA 
podem evoluir clinicamente para quadros de 
desidratação que variam de leve a grave. 
As doenças diarreicas agudas (DDA) podem ser 
causadas por diferentes microrganismos infecciosos 
(bactérias, vírus e outros parasitas, como os 
protozoários) que geram a gastroenterite – inflamação 
do trato gastrointestinal – que afeta o estômago e o 
intestino. A infecção é causada por consumo de água e 
alimentos contaminados, contato com objetos 
contaminados e também pode ocorrer pelo contato 
com outras pessoas, por meio de mãos contaminadas, 
e contato de pessoas com animais. 
Quais são os fatores de risco para doenças diarreicas 
agudas? 
Qualquer pessoa, de qualquer faixa etária e gênero, 
pode manifestar sinais e sintomas das doenças 
diarreicas agudas após a contaminação. No entanto, 
alguns comportamentos podem colocar as pessoas em 
risco e facilitar a contaminação como: 
• Ingestão de água sem tratamento adequado; 
• Consumo de alimentos sem conhecimento da 
procedência, do preparo e armazenamento; 
• Consumo de leite in natura (sem ferver ou 
pasteurizar) e derivados; 
• Consumo de produtos cárneos e pescados e 
mariscos crus ou malcozidos; 
• Consumo de frutas e hortaliças sem higienização 
adequada; 
• Viagem a locais em que as condições de 
saneamento e de higiene sejam precárias; 
• Falta de higiene pessoal. 
→ Se tratadas incorretamente ou não tratadas, as 
doenças diarreicas agudas podem levar à desidratação 
grave e ao distúrbio hidroeletrolítico, podendo ocorrer 
óbito, principalmente quando associadas à desnutrição 
ou à imunodepressão. 
→ Crianças e idosos com DDA correm risco de 
desidratação grave. Nestes casos, a procura ao serviço 
de saúde deve ser realizada em caráter de urgência. 
Sinais e sintomas 
Ocorrência de no mínimo três episódios de diarreia 
aguda no período de 24hrs (diminuição da consistência 
das fezes – fezes líquidas ou amolecidas – e aumento 
do número de evacuações) podendo ser 
acompanhados de: 
• Cólicas abdominais; 
• Dor abdominal; 
• Febre; 
• Sangue ou muco nas fezes; 
• Náusea; 
• Vômitos. 
Tratamento e manejo 
O tratamento das doenças diarreicas agudas se 
fundamenta na prevenção e na rápida correção da 
desidratação por meio da ingestão de líquidos e 
solução de sais de reidratação oral (SRO) ou fluidos 
endovenosos, dependendo do estado de hidratação e 
da gravidade do caso. Por isso, apenas após a avaliação 
clínica do paciente, o tratamento adequado deve ser 
estabelecido, conforme os planos A, B e C descritos 
abaixo. Para indicar o tratamento é imprescindível a 
avaliação clínica do paciente e do seu estado de 
hidratação. 
A abordagem clínica constitui a coleta de dados 
importantes na anamnese, como: início dos sinais e 
sintomas, número de evacuações, presença de muco 
ou sangue nas fezes, febre, náuseas e vômitos; 
presença de doenças crônicas; verificação se há 
parentes ou conhecidos que também adoeceram com 
os mesmos sinais/sintomas. O exame físico, com 
enfoque na avaliação do estado de hidratação, é 
importante para avaliar a presença de desidratação e a 
instituição do tratamento adequado, além disso, o 
paciente deve ser pesado, sempre que possível. Se não 
houver dificuldade de deglutição e o paciente estiver 
consciente, a alimentação habitual deve ser mantida e 
deve-se aumentar a ingestão de líquidos, 
especialmente de água. 
O Tratamento com antibiótico deve ser reservado 
apenas para os casos de DDA com sangue ou muco nas 
fezes (disenteria) e comprometimento do estado geral 
ou em caso de cólera com desidratação grave, sempre 
com acompanhamento médico. 
 
 
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Referências: 
• Dani - Gastroenterologia essencial, 4ª ed. 
• Ministério da Saúde Manejo das Doenças Diarreicas 
Agudas, 2021. 
4) CITAR OS DIAGNÓSTICOS DIFERENCIAIS DAS 
DIARREIAS AGUDAS (BACTERIANA, PARASITÁRIA, 
TOXINAS E VIRAL); 
O diagnóstico das causas etiológicas, ou seja, dos 
microrganismos causadores da DDA é realizado apenas 
por exame laboratorial por meio de exames 
parasitológicos de fezes, cultura de bactérias 
(coprocultura) e pesquisa de vírus. O diagnóstico 
laboratorial é importante para determinar o perfil de 
agentes etiológicos circulantes em determinado local e, 
na vigência de surtos, para orientar as medidas de 
controle. Em casos de surto, solicitar orientação da 
equipe de vigilância epidemiológica do município para 
coleta de amostras. 
Importante: As fezes devem ser coletadas antes da 
administração de antibióticos e outros medicamentos 
ao paciente. Recomenda-se a coleta de 2 a 3 amostras 
de fezes por paciente. 
O diagnóstico etiológico das Doenças Diarreicas 
Agudas nem sempre é possível, uma vez que há uma 
grande dificuldade para a realização das coletas de 
fezes, o que se deve, entre outras questões, à baixa 
solicitação de coleta de amostras pelos profissionais de 
saúde e à reduzida aceitação e coleta pelos pacientes. 
Desse modo, é importante que o indivíduo doente seja 
bem esclarecido quanto à relevância da coleta de fezes, 
especialmente na ocorrência de surtos, casos com 
desidratação grave, casos que apresentam fezes com 
sangue e casos suspeitos de cólera a fim de possibilitar 
a identificação do microrganismo que causou diarreia. 
Essa informação será útil para prevenir a transmissão 
da doença para outras pessoas. A coleta de fezes para 
análise laboratorial é de grande importância para a 
identificação de agentes circulantes e, especialmente 
em caso de surtos, para se identificar o agente 
causador do surto, bem como a fonte da contaminação. 
História Clínica 
Na história do paciente, devem-se investigar o local e 
as condições em que a diarreia foi adquirida. Deve-se 
investigar a ingestão recente de água, frutas ou 
verduras potencialmente contaminadas, alimentos 
suspeitos, viagens recentes, presença de pessoas 
próximas também acometidas, uso recente de 
antibióticos e outros fármacos, história sexual, banho 
em locais públicos e contatos com animais. Na 
avaliação da origem da diarreia, há quese considerar o 
período de incubação no caso de infecções intestinais 
que podem levar de horas a 2 semanas. 
A apresentação clínica da diarreia aguda é bastante 
semelhante, independente do agente causador. 
Entretanto, algumas diferenças podem ocorrer de 
acordo com a fisiopatogênese envolvida. 
A diarreia inflamatória apresenta espectro clínico 
mais grave e exige tratamento mais criterioso. É 
causada por bactérias invasivas, parasitos e bactérias 
produtoras de citotoxinas que afetam preferentemente 
o íleo e o cólon. Promove ruptura do revestimento 
mucoso e perda de soro, hemácias e leucócitos para o 
lúmen. Manifesta-se por diarreia, em geral de pequeno 
volume, com muco, pus ou sangue, febre, dor 
abdominal predominante no quadrante inferior 
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esquerdo, tenesmo, dor retal. Algumas vezes, 
apresenta, no início da evolução, diarreia aquosa, que 
só mais tarde se converte em típica diarreia 
inflamatória, quando os microrganismos ou suas 
toxinas lesam a mucosa colônica. 
A diarreia não inflamatória é, em geral, moderada, 
mas pode provocar grandes perdas de volume. É 
causada habitualmente por vírus ou por bactérias 
produtoras de enterotoxinas e afeta preferentemente o 
intestino delgado. Os microrganismos aderem ao 
epitélio intestinal sem destruí-lo, determinando 
diarreia secretora, com fezes aquosas, de grande 
volume e sem sangue; pode estar associada a náuseas 
e vômitos. As cólicas, quando presentes, são discretas, 
precedendo as exonerações intestinais. 
Na avaliação clínica, além de definir o padrão da 
diarreia aguda, devem-se também avaliar possíveis 
complicações, especialmente a desidratação. Relato de 
boca seca e sede, diurese concentrada, oligúria, 
associados a achados ao exame físico de pele e 
mucosas desidratadas e hipotensão postural com 
taquicardia, demonstram desidratação e sua gravidade. 
Sinais de toxemia indicam quadro mais grave e 
necessidade de maior cuidado clínico. Desta forma, 
presença de febre alta, taquipneia, vasodilatação 
periférica com hipotensão e pulsos rápidos e finos são 
sinais de alerta. 
O exame físico do abdome normalmente exibe dor 
leve difusa à palpação, com possibilidade de 
descompressão brusca levemente dolorosa em 
situações de maior distensão de alças e dor mais 
intensa. Os ruídos hidroaéreos estão frequentemente 
aumentados. Dor localizada, sinais de irritação 
peritoneal intensa, massas ou visceromegalias, 
distensão abdominal importante e ausência de ruídos 
são achados que devem direcionar para avaliação 
cuidadosa pela possibilidade de outras afecções 
abdominais. 
Exames laboratoriais 
→ Hemograma: Em pacientes que evoluem com 
formas mais graves da diarreia aguda, podem-se 
encontrar anemia e hemoconcentração. Nas diarreias 
por vírus, linfocitose pode estar presente. Leucocitose 
com neutrofi.lia e desvio à esquerda é frequente nas 
infecções bacterianas mais invasivas com diarreia 
inflamatória. 
→ Função renal e eletrólitos: A desidratação causa 
hipovolemia que altera a perfusão renal, fazendo com 
que haja elevação da creatinina e, principalmente, da 
ureia em depleções volêmicas mais importantes. Essa 
complicação da diarreia deve ser prontamente 
diagnosticada principalmente em pacientes idosos. O 
distúrbio eletrolítico tem relação com perdas entéricas 
e deve ser corrigido quando presente. 
Diagnósticos diferenciais de diarreia aguda 
Na maioria dos casos, a avaliação clínica é suficiente 
para definição diagnóstica e para determinar a 
gravidade do quadro. O estado imunológico do 
hospedeiro também é importante na conduta 
diagnóstica e terapêutica. Exemplos disso são: 
deficiência de IgA e giardíase, acloridria e salmonelose, 
transplantados e infecção por citomegalovírus, AIDS e 
criptosporidíase, idosos residentes em asilo e infecção 
pelo Clostridium difficile, imunodeprimidos e 
candidíase intestinal. 
→ Diarreias virais: são as mais comuns entre as 
diarreias agudas. Caracterizadas, de forma geral, por 
fezes aquosas, vômitos e febre. Sendo de curta duração 
(<72h). Os principais agentes etiológicos são o 
rotavírus, o norovírus e o citomegalovírus (comum em 
imunodeprimidos, pode ser persistente e provocar 
desinteria). 
→ Diarreia pelo rotavírus: O rotavírus foi o primeiro 
agente identificado como importante causa de 
gastrenterite viral, principalmente em crianças entre 6 
meses e 2 anos de idade, mas os adultos também 
podem ser atingidos. É o agente viral mais comum 
como causa de gastrenterite endêmica. 
Biopsias obtidas após a inoculação do vírus para 
induzir gastrenterite mostraram encurtamento de 
vilosidades da mucosa do duodeno e do jejuno, nas 
quais havia grande infiltração da lâmina própria de 
células mononucleares. A microscopia eletrônica e a 
imunofluorescência evidenciam numerosas partículas 
de rotavírus no citoplasma das células epiteliais da 
mucosa atingida. O estômago e o cólon têm 
acometimento não significativo. 
As crianças infectadas pelo rotavírus reagem de modo 
variado, desde portadores assintomáticos até formas 
graves com desidratação e evolução para o óbito. A 
febre, geralmente baixa, e os vômitos precedem a 
diarreia. A febre pode persistir por até 1 a 2 dias, e os 
vômitos, em geral, não ultrapassam o 3° dia. A diarreia 
é aquosa, profusa, de cor amarelada a esverdeada e 
raramente contém muco. O número de evacuações 
pode ser de 8 ou mais por dia. A duração média da 
gastrenterite é de 8 dias, mas pode haver crises mais 
prolongadas. Sintomas respiratórios estão presentes 
em torno da metade dos casos. A recuperação é 
integral, mas têm sido descritas diarreias prolongadas 
e com outros distúrbios, como intolerância à lactose e 
a carboidratos. A doença aguda é associada à 
diminuição dos níveis das enzimas da borda em escova 
Ana Beatriz Figuerêdo Almeida - Medicina 2023.1 
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da mucosa, como maltase, sacarase e lactase, com 
consequente má absorção e presença de substâncias 
redutoras nas fezes. 
Os adultos adoecem mais frequentemente quando 
estão em contato com crianças infectadas. O rotavírus 
pode ser agente causal da diarreia dos viajantes. Os 
sintomas são similares, mas os vômitos tendem a ser 
menos intensos. Os imunodeprimidos, como os 
transplantados de medula, podem apresentar formas 
graves e mais prolongadas ou evoluir para o óbito. 
Entretanto, o rotavírus não é causa comum de diarreia 
grave nos portadores do HIV. 
A gastrenterite pelo rotavírus pode causar 
complicações como enterocolite necrotisante, 
invaginação intestinal, atresia das vias biliares, 
complicações neurológicas como convulsões e 
encefalopatia. 
O rotavírus pode ser isolado por coprocultura, mas 
esta tem a desvantagem de ser muito laboriosa. Outros 
testes para pesquisa de antígenos virais têm sido 
usados como PCR e ELISA. Este último é o mais 
difundido por ser um meio rápido e de baixo custo. O 
rotavírus é detectado nas fezes desde o início do 
quadro diarreico até 4 a 8 dias, mas há relatos de 
detecção por até 25 a 30 dias. 
A infecção viral tem normalmente evolução 
autolimitada e deve ser tratada com medidas para o 
alívio dos sintomas e terapêutica de suporte, como 
reidratação oral ou intravenosa, de acordo com a 
repercussão do quadro clínico. 
No Brasil, a partir de março de 2006, a vacina contra 
rotavírus foi incluída no calendário vacinal da criança. 
Utiliza-se a vacina monovalente feita do vírus atenuado 
de sorotipo mais frequente [sorotipo G1P(8)]. Ela 
apresenta ação cruzada contra outros sorotipos e tem 
eficácia global contra gastrenterite pelo rotavírus de 
85%. A vacina é administrada por via oral em duas 
doses aos 2 e 4 meses de vida. Com essa medida, 
espera-seredução das diarreias agudas da criança, 
responsáveis por grande percentual da mortalidade 
infantil no Brasil. 
→ Diarreias bacterianas: são a segundacausa mais 
frequente das diarreias agudas. 
Etiologia Características 
E. coli 
Cepas patogênicas (são 5) podem 
causar diferentes tipos de diarreia, 
como por exemplo a cepa 0157-h7 
(sorotipo EHEC) que além de 
causar diarreia e disenteria pode 
ser responsável pela Síndrome 
Hemolítico-urêmica. É a principal 
bactéria associada à diarreia do 
viajante. 
Salmonella 
Pode apresentar diarreia invasiva 
ou não, e nos pacientes com 
anemia falciforme é um 
importante agente causador de 
osteomielite. Pode causar 
disenteria. 
Shigella 
Possui alta infectividade, e a 
produção de neurotoxina pode 
levar a crises convulsivas, 
principalmente em crianças. Pode 
causar disenteria. 
Campylobacter 
Período de incubação de 2 a 5 
dias; febre, dor abdominal e 
diarreia; uma das complicações é 
a possibilidade de desencadear a 
Síndrome de Guillain-Barré. 
Yersinia 
Além da diarreia os pacientes 
podem apresentar quadro de dor 
abdominal em fossa ilíaca direita, 
sendo importante diagnóstico 
diferencial com apendicite. 
Staphylococcus 
Aureus 
Período de incubação curto (2 a 8 
horas) e normalmente está 
associada ao consumo de 
alimentos fora da geladeira 
(produção de toxina 
termoestável). 
Clostridium 
difficile 
Associada à diarreia secundária ao 
uso de antibióticos. Tratar com 
vancomicina. 
→ Intoxicação alimentar: A intoxicação alimentar 
resulta da ingestão de alimentos contaminados por 
bactérias, fungos, vírus, parasitos ou substâncias 
químicas, tendo como destaque o envolvimento de 
uma coletividade que fez uso do mesmo alimento. A 
intoxicação surge, principalmente, em decorrência de 
substâncias químicas ou de toxinas pré-formadas por 
agentes infecciosos. 
Para o diagnóstico, deve-se prestar atenção no 
intervalo relativamente curto entre a ingestão do 
alimento suspeito e o início dos sintomas: quando for 
inferior a 6h, a suspeita é da intoxicação pela toxina 
pré-formada por Staphylococcus aureus e Bacillus 
cereus; se, entre 8 e 14h, sugere intoxicação por 
Clostridium perfringens; mas se, inferior a 1h, deve-se 
pensar em intoxicação por uma substância química. 
→ Intoxicação por Staphylococcus aureus: Resulta de 
alimentos submetidos à cocção inadequada ou mal 
refrigerados, que constituem fonte ideal para a 
proliferação de agentes infecciosos e de rápida 
produção de toxinas. Os pacientes apresentam 
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náuseas, vômitos intensos, cólicas e diarreia aquosa. 
Podem evoluir para desidratação aguda e choque 
hipovolêmico. Em geral, a diarreia é autolimitada e 
cessa dentro de algumas horas. O tratamento inclui 
reposição hidreletrolítica VO e sintomáticos, mas casos 
graves exigem hidratação IV. 
→ Intoxicação por Clostridium botulinum A toxina 
produzida por essa bactéria causa o botulismo e resulta 
da ingestão de enlatados, peixes crus, mel, entre outros 
que contenham toxina pré-formada, esporos ou a 
própria bactéria. Por isso, deve-se ter cuidados 
especiais no manuseio dos alimentos e em sua 
industrialização. Embora possa ser destruída por 
fervura durante 10 min, a toxina botulínica é a mais 
potente toxina alimentar. 
A clínica depende da quantidade de toxina ingerida e 
da resistência do hospedeiro. Assim, os sintomas 
podem ser discretos ou intensos e levar ao óbito em 
poucas horas. O período de incubação varia de 12 a 72 
h após a ingestão do alimento contaminado. Cursa com 
náuseas, vômitos e diarreia, que se associam com 
repercussões neurológicas e se assemelham ao efeito 
do curare. Essas repercussões iniciam com alterações 
da visão (visão turva, diplopia, arreflexia pupilar), 
seguindo-se de sensação de fraqueza, tonturas, 
vertigens e complicações na mecânica respiratória. A 
recuperação, quando ocorre, se faz, em geral, após 1 
semana. O prognóstico depende da recuperação 
muscular, mas a mortalidade é alta. 
O diagnóstico diferencial deve ser feito, 
principalmente, com miastenia gravis e síndrome de 
Guillain-Barré. O tratamento específico é com 
antitoxina e medidas de suporte; o paciente pode 
necessitar de respiração assistida. 
→ Diarreia dos viajantes: É definida como diarreia 
infecciosa aguda que acomete indivíduos que viajam de 
área industrializada e com boas condições de higiene 
para outra com piores condições sanitárias. Ela é 
destaque nos viajantes internacionais que se dirigem 
de países com elevado padrão de infraestrutura 
sanitária para algumas regiões da América Latina, 
África e Ásia. No Brasil, com a grande desigualdade 
social entre as regiões, esse tipo de diarreia também 
pode acometer viajantes de áreas mais industrializadas 
para aquelas mais empobrecidas. 
Inicia-se em geral de modo abrupto, com 4 a 6 
evacuações por dia, associadas a cólicas e náuseas. 
Habitualmente, é autolimitada, mas pode ser 
progressiva, evoluindo para disenteria e, até mesmo, 
para a diarreia crônica. 
Pode ser causada por bactérias em cerca de 80% dos 
casos, e a Escherichia coli enterotoxigênica é a principal 
causa na América Latina. Além desta, são relacionadas 
também Salmonella, Shigella, Campylobacter jejuni, 
Aeromonas, Plesiomonas, Vi brio parahaemolyticus, os 
vírus Norovirus e Rotavirus, os protozoários Entamoeba 
histolytica, Giardia lamblia e Cryptosporidium, 
Microsporidium e Cyclospora cayetanensis. 
A prevenção é a principal arma contra a diarreia dos 
viajantes e relaciona-se aos cuidados com água 
utilizada para higiene pessoal, como o simples ato de 
escovar os dentes, devendo-se usá-la fervida ou com 
soluções cloradas ou iodadas, além de evitar legumes e 
frutas cruas. A quimioprofilaxia (com antibióticos ou 
subsalicilato de bismuto), embora eficaz, não deve ser 
rotineira, por causa de seu custo, efeitos adversos, 
resistência bacteriana, e pela falsa sensação de 
segurança que induz a abrir mão de cuidados básicos. 
O tratamento deve seguir os mesmos parâmetros já 
citados, reservando-se a prescrição de antibióticos para 
os casos graves e com diarreia prolongada. O uso 
empírico, guiado por parâmetros, pode ser indicado 
para pessoas que têm compromissos inadiáveis, como 
atletas e conferencistas. 
Diarreia infecciosa invasiva 
Pela potencial gravidade dessas condições clínicas, 
serão descritos seus principais agentes: Shigella e 
Salmonella. Também podem causar diarreia invasiva E. 
co li enteroinvasiva (discutida anteriormente), 
Campylobacter e Yersinia. 
→ Diarreia pela Shigella: A shigelose é a causa mais 
comum de diarreia bacteriana em todo o mundo. Essa 
bactéria é resistente à ação do ácido clorídrico; por 
isso, mesmo em pequeno número, passa pelo 
estômago e tem acesso ao intestino delgado onde se 
multiplica e chega ao cólon onde exerce sua ação 
patogênica. Assim, não necessita de sua replicação, nos 
alimentos contaminados ou na água, para tornar-se 
infecciosa. A transmissão ocorre por propagação de 
pessoa a pessoa, bem como através de alimentos e 
água. 
A Shigella é causadora da disenteria clássica, que 
consiste em febre, cólicas, diarreia com muco e sangue. 
Vômitos são pouco frequentes. O período de incubação 
é de 1 a 7 dias. O quadro clínico característico inicia com 
febre, anorexia, mal-estar e diarreia aquosa e, 
posteriormente, fezes com muco e sangue e tenesmo. 
O número de evacuações intestinais varia de 8 a 1 O por 
dia, mas pode ser mais frequente e em volume 
pequeno. Há perda pouco expressiva de líquidos, o que 
é característica das infecções do cólon. O vulto da 
infecção varia com o sorotipo da bactéria causadora. A 
S. sonnei causa distúrbios moderados, que podem ser 
limitados à diarreia aquosa. S. dysenteriae ou S. flexneri 
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causam geralmente sintomas disentéricos. Também o 
estado de saúde do hospedeiro interfere na 
repercussão da infecção, que tende a ser autolimitada 
naqueles com bom estado geral. Todavia, a shigelosepode desenvolver complicações diversas, no próprio 
intestino ou sistêmicas, sendo mais frequentes nas 
infecções por S. dysenteriae. 
O quadro disentérico clássico pode ser chave para a 
suspeita diagnóstica da shigelose, mas ele pode ocorrer 
na doença inflamatória intestinal e em outras diarreias 
infecciosas como naquelas causadas por Salmonella, 
Campylobacter, Y ersinia, EIEC ou por Clostridium 
difficile. Os leucócitos fecais estão presentes em mais 
de 70% dos casos. A coprocultura deve ser feita em 
amostras de fezes colocadas no meio de cultura 
imediatamente. Obtém-se melhor resultado com a 
parte mucoide das fezes. Outras técnicas mais sensíveis 
podem ser utilizadas como aPCR. 
Estudos comparativos mostraram que, apesar de ser 
em geral infecção autolimitada, a antibioticoterapia 
reduz o tempo de doença, com alívio mais rápido dos 
sintomas e do risco de disseminação interpessoal. 
Aqueles pacientes não tratados podem abrigar a 
bactéria por até 6 semanas, mesmo mantendo-se 
assintomáticos. 
A indicação terapêutica com antibióticos deve ser 
guiada pela apresentação clínica e pela presença de 
comorbidades que tornem o paciente mais vulnerável 
para infecção grave. Deve ser feita de modo empírico 
nos pacientes com suspeita de shigelose que se 
apresentam toxemiados, nos idosos, nos portadores de 
HIV, nos trabalhadores de clínicas e de hospitais e nos 
casos de bacteriemia. 
→ Diarreia por Salmonella: A Salmonella é um bacilo 
gram-negativo que coloniza ou infecta diversos 
animais, inclusive o ser humano. A infecção pela 
Salmonella pode causar gastrenterite, febre entérica 
(febre tifoide e paratifoide), bacteriemia e infecção 
endovascular, infecção focal como a osteomielite, 
estado de portador crônico assintomático. 
Com base nos avanços científicos que demonstraram 
altos níveis de similaridade de DNA, todas as espécies 
de Salmonella de importância clínica passaram a ser 
classificadas como uma única, a Salmonella 
choleraesuis. Assim, os organismos como S. typhi, S. 
choleraesuis e S. enteritidis, que anteriormente 
representavam espécies diferentes, baseando-se na 
estrutura antigênica, nas características bioquímicas e 
nos tipos de hospedeiros, são agora sorotipos 
individuais de uma mesma espécie. 
As salmonelas são facilmente reconhecidas em 
laboratórios de bacteriologia clínica. Elas crescem tanto 
em condições aeróbicas como anaeróbicas. Elas são 
oxidase-negativas e, virtualmente, todas são lactose-
negativas. Muitos laboratórios identificam a Salmonella 
pela combinação de antígenos e reações bioquímicas. 
Referência: 
• Dani - Gastroenterologia essencial, 4ª ed. 
5) CITAR OS DIAGNÓSTICOS DIFERENCIAIS DAS 
DIARREIAS CRÔNICAS (DOENÇA CELÍACA E 
INTOLERÂNCIA À LACTOSE); 
Enquanto a diarreia aguda está relacionada 
principalmente aos agentes infecciosos e, por isso, 
predomina entre as populações mais pobres, a crônica 
ocorre com expressiva frequência mesmo nos países 
industrializados. Nos EUA, estima-se que a prevalência 
de diarreia crônica seja de 5% da população adulta. 
Existem inúmeras causas de diarreia crônica, ligadas 
ora ao intestino delgado, ora ao cólon, criando 
dificuldades na sua identificação e terapêutica. Por isso, 
é necessário ter bom conhecimento de suas diversas 
etiologias, abreviando o sofrimento dos pacientes e 
reduzindo custos com propedêutica e terapêutica. 
Etiologia 
As principais causas de diarreia crônica são síndrome 
do intestino irritável (SII), doença inflamatória 
intestinal (DII), síndrome de má absorção e infecção 
crônica. Esta última, mais relevante em regiões de 
condições sanitárias inadequadas, com possibilidade 
de infecções bacterianas, por protozoários ou 
helmintos. 
Portadores de imunodeficiências apresentam 
frequentemente diarreia associada a infecções 
oportunistas crônicas. 
O câncer colorretal pode apresentar-se com diarreia 
crônica, habitualmente com sinais de perda de sangue. 
O uso de medicamentos também deve ser investigado. 
Algumas drogas têm efeito secretório direto no 
intestino delgado e no cólon, principalmente a 
fenolftaleína e os derivados antraquinônicos como o 
sene. 
O uso excessivo de dissacarídios não absorvíveis, 
como o sorbitol, em dietas com restrição de açúcar 
pode causar diarreia osmótica à semelhança de 
laxativos, como o manitol e o sulfato de magnésio. 
Tumores neuroendócrinos produtores de 
neurotransmissores com ação secretagoga, como o VIP 
(peptídio vasoativo intestinal) nos VIPomas e a 
serotonina na síndrome carcinoide, estão associados à 
diarreia crônica e intensa. Apesar de constituírem 
enfermidades mais raras, devem ser lembrados nessas 
situações. 
História clínica 
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A definição diagnóstica exclusivamente pelo quadro 
clínico é mais difícil na diarreia crônica devido a suas 
possíveis etiologias de grande complexidade. 
Entretanto, a avaliação clínica acurada pode direcionar 
a investigação complementar, minimizando custos e 
exposição do paciente. 
A caracterização da diarreia como alta (intestino 
delgado) ou baixa (cólon) é uma das formas de 
classificar e guiar a sequência de propedêutica 
complementar. 
Na qualificação da diarreia, devemos ter atenção para 
portadores de incontinência anal. Esses indivíduos 
apresentam o que denominamos pseudodiarreia. 
Existe aumento na frequência das evacuações por 
incapacidade de conter as fezes na ampola retal. Nesta 
condição, não há aumento da quantidade de água nas 
fezes nem de seu volume global; portanto, não há 
diarreia. 
Ausência de perda ponderai e de sinais de 
desnutrição, presença de sintomas 
predominantemente diurnos, alternância do hábito 
intestinal com períodos de constipação intestinal, além 
de crise de dor associada à distensão abdominal e 
aliviada pela evacuação são sugestivas de síndrome do 
intestino irritável (SII). O início dos sintomas, 
habitualmente, ocorre em períodos de instabilidade 
emocional e predomina em adultos jovens. Nestas 
condições, deve-se evitar investigação invasiva. 
Alguns fatores de risco para doenças específicas 
podem ser encontrados na história. O médico deve 
pesquisar - viagens a áreas endêmicas para parasitoses; 
sintomas precipitados ou agravados por uso de 
determinado alimento, como a lactose (intolerância à 
lactose) ou o glúten (doença celíaca); comorbidades 
como o diabetes de longa data e hipertiroidismo que 
podem cursar com diarreia; história familiar de doença 
inflamatória intestinal (DII) ou doença celíaca que 
apresentam risco de herança genética; exposição a 
fatores de risco para contaminação pelo HIV; uso de 
álcool em doses potencialmente lesivas ao pâncreas; 
abuso de produtos dietéticos com sacarídios não 
absorvíveis; história medicamentosa. 
Ao exame físico, podemos encontrar sinais 
extraintestinais de determinadas doenças. Na DII, além 
de massas inflamatórias abdominais, podem ocorrer 
lesões perianais, lesões cutâneas, aftas orais, olho 
vermelho e artropatias. Nas síndromes de má absorção 
e no câncer de cólon, devemos procurar sinais de 
desnutrição, como edema e anemia. 
Diagnóstico 
A orientação do diagnóstico necessita seguir 
parâmetros clínicos objetivos, em função da 
complexidade da propedêutica específica. Quando 
necessária, a solicitação de exames complementares 
deve guiar-se inicialmente pelas características do 
quadro diarreico, se diarreia alta ou baixa. 
Devem-se avaliar as alterações de caráter funcional 
na SII. Em casos de dúvida, exames gerais que 
demonstrem ausência de acometimento sistêmico 
como hemograma completo sem anemia, leucocitose 
ou plaquetose e provas de atividade inflamatória (p. 
ex., proteína C reativa e VHS) normais reforçam o 
diagnóstico de diarreia funcional. 
 
Exames laboratoriais 
Exames laboratoriais gerais são muito úteis na 
avaliação inicial da diarreiacrônica, especialmente para 
avaliar presença de atividade inflamatória e/ou 
comprometimento nutricional. 
→ Hemograma: Todas as séries hematológicas podem 
fornecer informações valiosas na pesquisa de diarreia 
crônica. Na série vermelha, presença de anemia pode 
estar relacionada com disabsorção ou com perdas. Em 
enfermidades que promovem perda sanguínea, 
encontraremos sinais de deficiência de ferro com 
microcitose e hipocromia. Nas síndromes de má 
absorção, o local do trato gastrintestinal (TGI) 
acometido determina a deficiência de nutrientes 
específicos. Assim, doenças que acometem o delgado 
proximal causam dificuldade de absorção de ferro e 
ácido fólico com formação de hemácias disfórmicas 
(poiquilocitose) com micro e macrocitose 
concomitantes. Doenças que lesam o íleo ou que 
causam insuficiência pancreática dificultam a absorção 
de vitamina B12 com consequente macrocitose. 
Alterações da série branca sugerem diarreia de 
origem inflamatória. Quando há predomínio de 
eosinofilia, parasitose intestinal é o diagnóstico mais 
provável. Porém, devemos considerar a possibilidade 
de síndrome eosinoffiica acometendo o TGI com 
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diarreia crônica, especialmente quando há histórico 
relevante de atopia. 
A plaquetose é marcador inespecífico de processo 
inflamatório crônico e pode ser encontrada em 
portadores de DII. 
→ Marcadores específicos: O anticorpo antiendomísio 
IgA e o antitransglutaminase tecidual IgA têm alta 
sensibilidade e especificidade para o diagnóstico de 
doença celíaca. O antitransglutaminase, apesar de 
discretamente superior ao antiendomísio, é menos 
disponível e mais caro. O antiendomísio tem 
especificidade e sensibilidade em torno de 95% e é útil 
na triagem de suspeitos de doença celíaca antes da 
realização de endoscopia para biopsia de delgado 
proximal. 
Anticorpo anti-Saccharomyces cerevisiae (ASCA) e 
anticorpo anticitoplasma de neutrófilo perinuclear 
(pANCA) podem auxiliar no diagnóstico diferencial de 
retocolite ulcerativa (RCUI) e doença de Crohn. 
Entretanto, não devem ser usados na avaliação 
diagnóstica inicial dessas doenças devido à baixa 
especificidade e sensibilidade. O ASCA tem 
sensibilidade de 40 a 76% para doença de Crohn e o 
pANCA, de 60 a 65% para RCUI. 
Os hormônios tireoideanos (T3, T4 e T4livre) e o 
tireoestimulante (TSH) nos casos de suspeita de 
diarreia secundária ao hipertiroidismo definem o 
diagnóstico. 
→ Estudo das fezes: A coleta de fezes para análise 
encontra frequente resistência por parte dos pacientes. 
Muitos consideram desagradável o ato de manipular as 
fezes para a amostra e alguns se sentem 
envergonhados ao imaginar a possibilidade do 
diagnóstico de parasitose intestinal. Por isso, muitos 
médicos deixam de solicitar essa avaliação. Entretanto, 
a análise das fezes pode traduzir vários problemas do 
TGI e é valiosa ferramenta diagnóstica. 
Intolerância à lactose 
A lactose também é conhecida como o açúcar do 
leite, ela é seu principal carboidrato. Possui grande 
importância na indústria alimentícia, pois através de 
sua fermentação ela contribui na produção de outros 
alimentos como iogurte, leite fermentado, bebida 
láctea, queijo e outros vários. Ela é composta por dois 
carboidratos menores a galactose e glicose. A Lactose é 
um carboidrato complexo, pois ele possui uma cadeia 
grande, desta maneira o nosso organismo não 
consegue absorve-la se não for fragmentada em duas 
moléculas pequenas. 
A lactase é uma proteína produzida na mucosa 
intestinal com função enzimática, qualquer lesão 
sofrida por essa mucosa, a produção de lactase é 
interrompida, e a depender da lesão ela poderá nunca 
mais voltar a ser produzida. Ela é responsável pela 
quebra da lactose em galactose e glucose. 
Crianças de todas as raças e etnias produzem lactase 
e digerem corretamente a lactose, no entanto, após o 
desmame, pode ocorre uma redução geneticamente 
programada da expressão dessa enzima, denominada 
hipolactasia primária ou lactase não persistente, e 
aproximadamente, 75% da população mundial têm a 
capacidade de digerir a lactose reduzida em algum 
momento da vida. 
A realização da hidrolise enzimática da lactose é feita 
no intestino delgado através da enzima β-galactosidase 
mais conhecida como lactase, nesse processo são 
liberados os monossacarídeos glicose e galactose na 
corrente sanguínea. Esses monossacarídeos passam 
pelo sistema digestivo através da veia porta e suas 
tributárias e de lá são transportados até o fígado, onde 
a galactose será convertida em glicose. 
A intolerância à lactose é uma deficiência total ou 
parcial da enzima lactase responsável por hidrolisar à 
lactose presente no leite. Pessoas com esse tipo de 
intolerância são incapazes de digerir a lactose e como 
consequência ela não irá até o intestino delgado, dessa 
forma ao chegar ao cólon à lactose será fermentada 
originando gases a partir da microbiana intestinal, 
causando vários problemas gastrointestinais como 
desconfortos, náusea, cólica, flatulência, diarreia, 
inchaço, dor abdominal, e etc. Esses desconfortos 
podem aparecer num intervalo de 30 minutos a 2 
horas, depois do consumo de algum alimento eu 
contenha a lactose. 
Na manifestação da IL, a lactose que não foi 
hidrolisada aumenta a osmolaridade do intestino 
delgado, onde acaba atraindo água e eletrólitos para 
mucosa intestinal, que resulta em um processo 
diarreico. A pressão osmótica desencadeia a dilatação 
do intestino que contribui para o aumento da má 
absorção, e quando essa capacidade de absorção é 
ultrapassada, a lactose sofre a ação da microbiota 
intestinal, dando início a fermentação que o converte 
em glicose e galactose ou em lactato. 
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Possuem três tipos de classificação para a 
Intolerância à lactose: a primária, a secundária e a 
congênita. 
→ A primária costuma se desenvolver em qualquer 
idade provocada pela queda da lactase no organismo, 
a denominada lactase não persistente, vai desde a 
infância até a fase adulta quando a lactose não é 
hidrolisada. 
→ A intolerância secundária ou adquirida é 
proveniente de lesões causadas na mucosa do 
intestino, geralmente causada por radiação ou uso de 
medicamentos para tratamento de câncer, 
gastroenterites, Doença de Crohn, colite ulcerativa, 
doença celíaca, e etc. Quando a lesão é curada, a 
lactase volta a ficar normal no organismo revertendo à 
intolerância. 
→ A intolerância congênita é hereditária considerada 
uma condição extremamente grave, se não for 
diagnosticada logo pode levar a óbito. Um dos 
primeiros sintomas é quando o recém-nascido 
apresenta uma diarreia líquida. Na presença da 
intolerância à lactose Congênita, verifica-se a 
impossibilidade de absorção do carboidrato pela falta 
da produção da enzima βgalactosidase (conhecida 
popularmente como Lactase), diminuindo o pH 
intestinal e ocasionando os problemas 
gastrointestinais, e consequentemente 
impossibilitando o consumo de lactose na dieta. 
 
Atualmente existem variados testes para diagnosticar 
a intolerância à lactose, é muito importante que façam 
testes precisos ou mais eu um, pois só os sintomas não 
são o suficiente para o diagnóstico, na maioria das 
vezes a intolerância pode ser confundida com a alergia 
a proteína do leite, mas ambas são diferentes, pois a 
intolerância não é imunológica. 
 
Vários métodos diretos e indiretos são utilizados, 
dentre os principais métodos estão: teste do pH fecal; 
pesquisa de substâncias redutoras nas fezes; teste de 
tolerância à lactose; teste de tolerância à lactose com 
etanol; teste respiratório com 14C-lactose; teste 
respiratório com 13C-lactose; teste de hidrogênio 
expirado e a biópsia intestinal. Dentre os métodos de 
diagnostico citados vale destacar três testes mais 
utilizadospor conta da sua eficácia: o teste oral por 
curva glicêmica; o teste respiratório do hidrogênio 
expirado; e o teste de acidez fecal. 
Teste de tolerância à lactose (teste oral): 
• avaliação da digestão dalactose através do aumento 
do nível de glicose no sangue; 
• ingestão de uma solução de lactose e recolha de 
várias amostras de sangue em intervalos de tempo 
pré-estabelecidos; 
• custo mais reduzido e maior rapidez; 
• menos sensível do que o teste de respiração; 
• o resultado positivo pode ser resultado de glicemia 
pós-prandial em indivíduos com alterações da 
tolerância à glicose ou diabetes. 
Referências: 
• Dani - Gastroenterologia essencial, 4ª ed. 
• Fonseca e Ribeiro (Monografia de graduação) - 
Intolerância à Lactose: fisiopatologia, diagnóstico e 
tratamento. 
6) CARACTERIZAR AS SÍNDROMES DE MÁ ABSORÇÃO 
INTESTINAL; 
Síndrome de má absorção intestinal é uma 
terminologia comumente empregada para descrever o 
resultado, tanto de hidrólise ineficiente de nutrientes 
(má digestão) quanto de defeitos na absorção intestinal 
pela mucosa (má absorção propriamente dita) e no 
transporte de nutrientes para a circulação sanguínea 
(no caso dos carboidratos e proteínas) e linfática (no 
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caso das gorduras). A designação “síndrome de má 
absorção intestinal”, no entanto, pode dar a falsa ideia 
de que somente problemas na absorção intestinal 
propriamente dita causam síndrome de má absorção. 
Contudo, problemas na digestão e no transporte de 
nutrientes também causam má absorção destes, com 
consequente comprometimento do estado nutricional 
do paciente. Um exemplo típico é a má absorção que 
acompanha a pancreatite crônica, em que há sério 
comprometimento da digestão dos hidratos de 
carbono, proteínas e gorduras, provocando grave 
esteatorreia e desnutrição. 
Na síndrome de má absorção intestinal, o quadro 
clínico pode variar consideravelmente, desde 
manifestações clássicas, como diarreia, esteatorreia, 
emagrecimento e desnutrição, até apresentações mais 
discretas, como distensão abdominal e flatulência, ou 
mesmo manifestações extraintestinais, como anemia 
ferropriva, perda óssea, hipodesenvolvimento 
ponderoestatural e distúrbios da menstruação. 
Atualmente, a abordagem da má absorção intestinal 
está mais simplificada e individualizada, em virtude dos 
avanços nos métodos diagnósticos (p. ex., marcadores 
sorológicos da doença celíaca) e de imagem (p. ex., 
enteroscopia, cápsula endoscópica etc.). Assim, o 
tradicional algoritmo de investigação da má absorção 
intestinal deu lugar a uma abordagem mais racional, 
individualizada, em que etapas são antecipadas, 
reduzindo, assim, o tempo para o diagnóstico e o custo 
da investigação diagnóstica. Além disso, classicamente, 
a suspeita de má absorção intestinal em geral surgia 
apenas diante de diarreia/esteatorreia. Nos dias atuais, 
o conceito de má absorção engloba a absorção 
deficiente de um ou mais nutrientes da dieta, 
independentemente de haver diarreia ou esteatorreia. 
Etiologia e classificação fisiopatológica 
Basicamente, a digestão e a absorção dos nutrientes 
envolvem três fases: 
1. Fase luminal: em que acontecem os processos de 
digestão intraluminal dos nutrientes; 
2. Fase mucosa: em que são observadas, tanto digestão 
complementar (hidrólise executada pelas 
oligossacaridases e peptidases da borda em es - cova) 
quanto absorção pela mucosa. 
3. Fase de transporte: relacionada à passagem dos 
nutrientes para a circulação sanguínea e linfática. 
Assim, didaticamente, a má absorção intestinal pode, 
do ponto de vista fisiopatológico, ser classificada em 
condições que afetam as fases luminal (ou pré-
entérica), mucosa (entérica) e de transporte (pós-
entérica). 
Tal divisão é muito mais didática que um reflexo do 
que ocorre na prática, pois uma doença pode provocar 
má absorção por mais de um mecanismo. Por exemplo, 
na doença celíaca, a má absorção ocorre 
primariamente por lesão da mucosa. No entanto, a 
lesão da mucosa – e isso vale para todas as situações 
com lesão da mucosa intestinal – provoca redução na 
liberação de secretina e colecistocinina (CCK) e, por 
conseguinte, redução na estimulação pancreática e 
déficit na digestão. Ademais, há relatos de fibrose 
retroperitoneal na doença celíaca, o que, 
potencialmente, pode comprometer a circulação 
linfática. O mesmo raciocínio pode ser feito para 
doença de Crohn, doença de Whipple e linfoma, entre 
outras situações. 
A absorção de nutrientes, vitaminas e sais minerais 
pelo trato gastrointestinal depende de várias etapas, e 
qualquer uma delas pode estar comprometida na 
síndrome de má absorção: solubilização, liberação do 
substrato ou ligação a fatores, alteração química, 
digestão de macromoléculas, funcionamento motor e 
sensitivo do intestino, funções hormonais e neuro-
humorais, absorção e transporte pós-mucosa. 
 
 
Para fins didáticos, as causas de má absorção 
intestinal podem, ainda, ser divididas de acordo com as 
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diversas fases dos processos de digestão e absorção 
normais: 
• distúrbios na mistura; 
• distúrbios na hidrólise luminal dos nutrientes, em 
especial a lipólise; 
• distúrbios na formação de micelas; 
• distúrbios na hidrólise da borda em escova; 
• distúrbios na absorção pela mucosa; 
• distúrbios no transporte de nutrientes; 
• mecanismos não totalmente esclarecidos. 
Distúrbios na mistura 
Os pacientes submetidos à gastrectomia parcial com 
reconstrução a Billroth II (gastrojejunoanastomose) 
podem desenvolver síndrome de má absorção 
resultante da liberação de secreções biliares e 
pancreáticas distante de onde o quimo chega ao jejuno. 
Os pacientes também apresentam uma tendência ao 
supercrescimento bacteriano, pelas anastomoses 
criadas pelo procedimento. 
Distúrbios na hidrólise luminal dos nutrientes, em 
especial a lipólise 
Como já ressaltado, as situações de lesão da mucosa, 
em geral, acabam provocando déficit na digestão 
luminal dos nutrientes por falta de estímulo 
pancreático pela secretina e CCK. A lipase pancreática 
é a enzima responsável pela degradação dos lipídios 
ingeridos na dieta, particularmente os triglicerídios. 
Uma série de condições pode prejudicar sua síntese ou 
ativação, entre as quais: deficiência congênita de lipase 
pancreática, hipersecreção ácida gástrica, como no 
caso da síndrome de Zollinger-Ellison ou gastrinoma, e 
destruição da glândula pancreática, por fibrose cística 
(mucoviscidose), inflamação crônica (pancreatite 
crônica) ou neoplasia. 
Distúrbios na formação de micelas 
Após a lipólise, o produto resultante (ácidos graxos e 
glicerol) interage com sais biliares e fosfolipídios para a 
formação de micelas, e sob essa forma ocorre a maior 
parte da absorção desses nutrientes. As micelas 
também incorporam colesterol e vitaminas 
lipossolúveis (A, D, E, K) em seus centros hidrofóbicos. 
Existe uma concentração mínima de sais biliares 
necessária para a formação de micelas. Portanto, 
condições em que sua síntese (p. ex., cirrose hepática), 
transporte (p. ex., obstrução das vias biliares) ou 
reabsorção (p. ex., lesão do íleo terminal como na 
doença de Crohn ou ressecção ileal) estejam 
prejudicados, ou, ainda, em casos de remoção ou 
inativação luminal dos sais biliares (p. ex., uso de 
colestiramina, quelando os sais biliares, desconjugação 
precoce dos sais biliares no supercrescimento 
bacteriano de delgado etc.) ocorre má absorção, a qual 
se caracteriza principalmente pela deficiência de 
vitaminas lipossolúveis, uma vez que a absorção de 
ácidos graxos e glicerol pode se dar de outras formas, 
em menor grau. 
Distúrbios na hidrólise da borda em escova 
A deficiência adquirida de lactase (intolerância à 
lactose) é a causa mais comum de má absorção seletiva 
decarboidratos; ocorre principalmente por uma 
diminuição em sua síntese, mas também por 
deficiência no transporte intracelular e na glicosilação 
da lactose. A prevalência da deficiência é 
extremamente elevada em negros e asiáticos, bem 
como em pacientes com aids. Os pacientes 
apresentam-se, tipicamente, com dor abdominal em 
cólica, flatulência e eructações após ingestão de leite e 
derivados. Secundariamente, pode ocorrer diarreia 
osmótica por dificuldade na reabsorção de grande 
quantidade de ácidos graxos de cadeia curta 
produzidos pela metabolização da lactose por bactérias 
colônicas. Algumas doenças podem causar deficiência 
de lactose secundária e reversível, como gastroenterite 
aguda (viral ou bacteriana), giardíase, doença celíaca e 
supercrescimento bacteriano. O diagnóstico é feito 
pelo teste do hidrogênio expirado após sobrecarga de 
lactose, e o tratamento compreende dieta pobre em 
alimentos que contenham lactose e uso da própria 
enzima sob forma de comprimidos. 
Intolerância à trealose também é descrita, por 
deficiência de trealose (presente principalmente em 
cogumelos). Os sintomas são semelhantes aos 
observados na intolerância à lactose. 
Distúrbios na absorção pela mucosa 
→ Infecção por Giardia intestinalis: Uma importante 
causa de má absorção intestinal, principalmente nos 
países em desenvolvimento, é a infecção por Giardia 
intestinalis, anteriormente chamada de Giardia 
lamblia. O quadro de infecção por esse protozoário 
pode variar de assintomático até o de diarreia crônica, 
esteatorreia, desnutrição e retardo de crescimento. Os 
fatores que provocam desenvolvimento de quadros 
mais graves são hipogamaglobulinemia, alta densidade 
de parasitas e fatores relacionados à própria virulência 
do protozoário. Nos casos de má absorção, o quadro 
histológico é de atrofia subtotal de vilos, com 
hiperplasia de criptas e infiltração intraepitelial de 
linfócitos. Além da enteropatia produzida, outros 
fatores contribuem para o quadro clínico, como 
supercrescimento bacteriano, desconjugação de sais 
biliares e inibição de enzimas. 
→ Doença de Whipple: A doença causada pelo 
Tropheryma whippelii é multissistêmica e envolve, 
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além do trato gastrointestinal, o sistema nervoso 
central (SNC), o coração e as articulações, bem como 
outros órgãos. Seu diagnóstico costuma ser dado por 
biópsia da terceira porção duodenal ou mais distal. O 
tratamento costuma ser feito com antibióticos simples 
como sulfametoxazol e trimetoprima por longo período 
– habitualmente um ano. A doença pode recorrer após 
sua interrupção. 
→ Espru tropical: O espru tropical consiste em uma 
síndrome de etiologia indeterminada (provavelmente, 
não relacionada a uma entidade única) que acomete 
habitantes ou visitantes de regiões tropicais e 
subtropicais. Os pacientes desenvolvem diarreia e má 
absorção de pelo menos duas substâncias não 
correlatas, xilose e vitamina B12, por exemplo. Existem 
evidências de colonização de bactérias provenientes do 
intestino grosso e protozoários, como Cryptosporidium 
sp., Isospora sp. e Cyclospora sp. 
→ Enterite actínica: Os pacientes submetidos à 
radioterapia por tumores pélvicos podem desenvolver 
quadros de diarreia até 20 anos após as sessões, por 
má absorção de sais biliares, vitamina B12 e lactose. 
Histologicamente, o quadro típico é o de uma 
endarterite obliterativa de pequenos vasos. Alguns 
estudos demonstram melhora da sintomatologia com 
terapia com câmara hiperbárica de oxigênio. 
Distúrbios no transporte de nutrientes 
→ Distúrbios na drenagem linfática: O aumento na 
pressão do sistema linfático causa perda e até ruptura 
dos vasos linfáticos, com extravasamento para o lúmen 
intestinal de lipídios, gamaglobulina, albumina e 
linfócitos, acarretando um quadro de diarreia e edema, 
por hipoalbuminemia. Dentre as principais causas, 
destacam-se: linfangiectasia intestinal congênita 
primária e linfangiectasias secundárias ao linfoma, à 
tuberculose, à blastomicose, ao lúpus, à doença de 
Crohn, ao sarcoma de Kaposi, à fibrose retroperitoneal, 
à pericardite constritiva e à insuficiência cardíaca 
congestiva em graus avançados. 
→ Enteropatia perdedora de proteínas: Muitas das 
condições supracitadas podem causar enteropatia 
perdedora de proteínas, sejam elas com dano da 
mucosa, como nos casos de linfoma, doença celíaca, 
espru tropical, doença de Whipple, lúpus eritematoso 
sistêmico (LES) e supercrescimento bacteriano, ou 
somente com lesão linfática. 
Mecanismos não totalmente esclarecidos 
Existem certas condições que são causadoras de 
síndrome de má absorção, porém, o mecanismo 
causador permanece desconhecido. Entre elas, citam-
se: hipoparatireoidismo, insuficiência de suprarrenal, 
hipertireoidismo e síndrome carcinoide. 
Síndrome de má absorção intestinal no idoso 
Um estudo revelou que alterações na arquitetura dos 
vilos do intestino superior em idosos resultam de um 
processo de doença que afeta o trato digestivo, e não 
apenas do processo de envelhecimento per se. 
Qualquer doença que, eventualmente, acometa os 
jovens, pode também ocorrer nos idosos. Entretanto, 
existe uma prevalência aumentada de certas afecções 
com o aumento da idade, como a pancreatite crônica e 
o supercrescimento bacteriano, este último pela hipo 
ou acloridria e/ou diminuição da motilidade intestinal. 
Mais raramente, pode haver má absorção por isquemia 
intestinal crônica. 
Referência: 
• Zaterka - Tratado de gastroenterologia, 2ª ed. 
7) CONTEMPLAR A DOENÇA CELÍACA (EPIDEMIOLOGIA, 
FATORES DE RISCO, FISIOPATOLOGIA, MANIFESTAÇÕES 
CLÍNICAS, DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO ); 
O glúten advém de proteínas de cereais. O grupo de 
proteínas (gliadinas e gluteninas) que constituem o 
glúten do trigo, do centeio, da cevada e da aveia é 
conhecido como prolaminas. Essas prolaminas contêm 
aminoácidos (prolina e glutamina) que fazem o glúten 
ter digestão difícil, consequente à quantidade de 
oligopeptídeos que chega ao intestino delgado. Assim, 
a ingestão de alimentos contendo glúten faz que o 
corpo detecte a presença de elemento estranho e 
deflagre uma série de atividades, mais graves (doença 
celíaca – DC) ou menos graves (sensibilidade ao glúten 
não celíaca – SGNC), ocasionando sintomas 
gastrointestinais (GI) ou sistêmicos. Tais sintomas 
usualmente desaparecem com a adoção de dieta isenta 
de glúten (DIG). 
As diferenças existentes entre DC e SGNC se dão tanto 
em nível molecular como na resposta imune: enquanto 
a DC deriva de mecanismo deflagrado pela resposta 
adaptativa do sistema imune, a SGNC estaria mais 
conectada à ação do sistema imune inato e parece não 
envolver a função da barreira intestinal. 
As doenças glúten-relacionadas podem ser 
classificadas de acordo com o mecanismo patogênico 
predominante, segundo consenso realizado em 
Londres. O mecanismo pode ser: 
• Alérgico: alergia ao trigo. 
• Autoimune: doença celíaca (DC). 
• Não alérgico e não autoimune: sensibilidade ao 
glúten não celíaca (SGNC). 
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Auto imune – doença celíaca 
A doença celíaca (DC) é considerada uma afecção 
sistêmica imune mediada, desencadeada e mantida 
pelo glúten em indivíduos geneticamente suscetíveis. O 
denominador comum para os pacientes com DC é a 
combinação variável de manifestações clínicas glúten-
dependentes; autoanticorpos específicos 
antiendomísio e antitransglutaminase (EmA e anti-tTG) 
no soro; presença de haplótipos HLA DQ2 e/ou DQ8; e 
diferentes graus de enteropatia, que variam desde 
infiltração linfocitária no epitélio até completa atrofia 
de vilosidades. 
Epidemiologia 
A prevalência global da DC aumentou 
substancialmente nos últimos 50 anos e, atualmente, 
pode ser considerada um problema de saúde pública. É 
de distribuição mundial, afetando cercade 1:100 ou 
1:300 pessoas. A proporção entre o sexo feminino e o 
masculino é de 2:1 ou 3:1. 5 O aumento da incidência 
da DC nos últimos anos pode ser explicado pela maior 
disponibilidade dos testes sorológicos (EmA-IgA e anti-
tTG IgA) e pela facilidade de biópsias por meio de 
exames endoscópicos. No entanto, há dados que 
apontam aumento real em todas as faixas etárias 
causado por alterações ambientais. 
Os grupos de risco incluídos são familiares de 
celíacos, anemia, osteoporose, doenças autoimunes 
(DAI), dermatite herpetiforme, diabete melito tipo 1, 
fadiga crônica, síndrome do intestino irritável e 
hipertransaminasemia idiopática. 
Etiopatogênese 
A DC resulta da imbricação de fatores genéticos, 
ambientais e imunológicos. 
 
Fatores ambientais 
O glúten é o fator ambiental desencadeador e 
mantenedor das alterações, mas há outros fatores a 
serem considerados, tais como: papel protetor do leite 
materno, a estação do nascimento, infecções 
gastrointestinais e o uso de antibióticos, disbiose no 
trato digestivo caracterizada por aumento 
deBacteroides spp. e pequena quantidade de 
Bifidobacterium spp. e B. longum quando comparados 
a controles sadios. Essa disbiose não parece normalizar 
após DIG. 
Fatores genéticos 
A DC é uma doença complexa, já que múltiplos fatores 
ambientais e genéticos influenciam em seu 
desenvolvimento. Constitui uma afecção com forte 
característica hereditária e poligênica. O amplo 
espectro de estádios patológicos, a heterogeneidade 
clínica, histológica e imunológica observadas na DC 
corroboram sua natureza poligênica. Possivelmente, 
diferentes genes de suscetibilidade contribuem nos 
diversos estádios para o desenvolvimento final da 
doença. 
Estudos com familiares de celíacos e gêmeos 
evidenciam a participação da genética na 
suscetibilidade à doença: concordância de 70 a 75% da 
DC em gêmeos monozigóticos, de 11 a 20% em gêmeos 
dizigóticos e de 5 a 15% de múltiplos casos da doença 
dentro de famílias afetadas. 
Os riscos são maiores em familiares. Estudos dos 
autores deste capítulo apontam evidência de 13,7% 
nos de primeiro grau e 6,35% nos de segundo grau. Tais 
dados reforçam a importância do rastreamento em 
todos os familiares dos celíacos, enfatizando a 
indicação de biópsia intestinal nos positivos, mesmo na 
ausência de sintomatologia clínica. 
Semelhante a outras doenças autoimunes, a DC é 
uma doença para a qual o locus MHC é o fator genético 
mais importante, estimando-se que contribui com 
aproximadamente 40 a 50% da variação genética da 
enfermidade. A relação entre a DC e os genes HLA no 
cromossomo 6p21 (região CELIAC 1) é uma das 
associações HLA-doença tida como o exemplo mais 
forte e bem estabelecido até o momento. A maioria dos 
pacientes (90 a 95%) são portadores de uma variante 
particular de HLA-DQ2 (DQA1*05:01, DQB1*02:01, 
também conhecida como DQ2.5), enquanto aqueles 
que não o são (aproximadamente 5 a 10%) expressam 
o HLA-DQ8 (DQA1*03, DQB1*03:02), ou carregam 
outra variante HLA-DQ2 (DQA1*02: 01, DQB1*02: 02, 
também conhecida como DQ2.2). Considerando que 
praticamente todos os pacientes com DC carreiam 
determinada variante HLA, é possível que esta possa 
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ser considerada um fator necessário, mas não 
suficiente, para o desenvolvimento da doença. É 
importante ressaltar, que mesmo que esses alelos 
sejam relativa mente comuns na população geral na 
qual a DC é prevalente (30 a 40%), apenas uma 
pequena proporção dos indivíduos que apresentam 
tais genes desenvolve a DC (~2 a 5%). 
Testes de HLA têm sido utilizados na clínica para 
excluir o diagnóstico de doença celíaca. Estes têm se 
mostrado clinicamente relevantes, além de 
apresentarem valor preditivo na detecção de familiares 
de alto risco ou em situações de suspeita clínica nas 
quais o diagnóstico de DC não é claro. Deve-se, no 
entanto, atentar ao fato de que, apesar de o HLADQ2 e 
o HLA-DQ8 apresentarem valor preditivo negativo 
próximo de 100%, relatos recentes têm caracterizado 
pacientes com DC na ausência de HLADQ2 e HLA-DQ8. 
Outras associações HLA têm sido detectadas, e um 
grande número de genes não HLA foram descritos 
recentemente como fatores de suscetibilidade à DC 
(aproximadamente 40 loci). Muitos desses loci abrigam 
genes que estão relacionados com a respos - ta imune, 
particularmente com funções de células T e B. 
Metanálises dos estudos de triagem genômica têm 
permitido sintetizar as informações disponíveis das 
investigações baseadas em famílias e identificar as 
novas regiões de potencial contribuição na 
predisposição à DC, embora a contribuição genética 
desses polimorfismos combinados como um todo seja 
substancialmente menor (14%) quando comparada à 
de 30 a 35% conferida pelos alelos HLA-DQ2 ou HLA-
DQ8. 
A identificação desses genes e de seu papel na 
suscetibilidade, ou mesmo na proteção à DC, pode 
trazer avanços nos aspectos diagnósticos e 
terapêuticos, além de servir como modelo nos estudos 
de outras doenças autoimunes. 
Fatores imunológicos 
Inúmeros avanços têm sido relatados no 
entendimento da patogênese da DC. A imunidade inata 
e a específica participam ativamente no processo de 
lesão da mucosa intestinal na DC, por meio de 
mecanismos humorais e celulares. As evidências 
autoimunes permitem classificá-la como um modelo de 
afecção ao demonstrar o fator ambiental envolvido 
(proteínas do glúten e cereais relacionados), o 
componente genético principal (HLA-DQ2 ou HLA-DQ8) 
e a consequente produção de autoanticorpos 
circulantes: antitransglutaminase tecidual (TG2) e 
antiendomisial (EmA). O efeito precoce do glúten se dá 
no intestino delgado, provocando alterações nas 
junções firmes intercelulares. Assim, os peptídeos 
adentram a lâmina própria em consequência de 
aumento da permeabilidade intestinal. O efeito do 
glúten na imunidade inata na DC, com ativação 
predominante de linfócitos intraepiteliais (LIE) e células 
do epitélio intestinal, se dá por meio do peptídeo alfa-
2-gliadina p31-43, que constitui o gatilho dessa reação 
ao estimular as células epiteliais e macrófagos/células 
dendríticas a secretar IL-15. Esta, por sua vez, atua na 
expansão de LIE e nos processos de destruição de 
células epiteliais e danos na mucosa. Moléculas HLA 
classe I não clássicas (MICA) no epitélio intestinal 
servem de ligante para o receptor NKG2D de células NK, 
linfócitos T-gama delta e linfócitos T citotóxicos CD8 +. 
MICA epitelial e a produção epitelial de IL-15 levam à 
ativação de NKG2D nos LIEs. Os LIEs citotóxicos 
ativados induzem aumento da apoptose epitelial e da 
permeabilidade. As vias da perforina/granzima e/ ou 
Fas/FasL participam dessas atividades de citotoxicidade 
e apoptose dos LIEs no epitélio intestinal na DC. Por sua 
vez, a IL-15 contribui na interligação do sistema imune 
adaptativo à resposta imune inata na fisiopatogenia da 
DC, ao promover a resposta de células T CD4 + a 
peptídeos deaminados de gliadina. 
As células T glúten-reativas estão presentes na lâmina 
própria de pacientes com DC. Elas dão início à resposta 
imune adaptativa, ao reconhecer o peptídeo 57-68 
(p57-68), levando à produção de citocinas pró-
inflamatórias como IFN-gama e TNFalfa. A enzima 
transglutaminase (TG2, usualmente denominada tTG) é 
uma enzima intracelular e tem sido detectada em todas 
as camadas da parede do intestino delgado. Constitui o 
autoantígeno-alvo na DC e tem importante 
participação no processo fisiopatológico da doença. O 
alto conteúdo em glutamina e a proximidade com 
prolina e resíduos hidrofóbicos de aminoácidos fazem 
das proteínas do glúten, especialmente as gliadinas, o 
substrato específico da enzima tTG. Por meio de 
deamidação, a tTG converte a glutamina em ácido 
glutâmico, em sítios-chave dentro do peptídeo de 
gliadina, gerando potentes epítopos 
imunoestimulatórios.O aumento de carga negativa da 
molécula do peptídeo favorece uma interação de maior 
afinidade na fenda de ligação da molécula HLA-DQ2 (ou 
HLA-DQ8), na superfície das células apresentadoras de 
antígenos, levando a uma intensa ativação dos clones 
de linfócitos T CD4+ glúten-específicos, induzindo, 
dessa forma, a reação autoimune da DC. 
Subsequente à ativação das células T CD4+ 
estabelece-se uma resposta Th1 e/ou Th2. As células da 
resposta Th1 liberam fator de necrose tumoral 
(TNFalfa) e interferon-gama (IFN-gama), que estimulam 
fibroblastos intestinais a secretarem 
metaloproteinases (MMP-1 e MMP-3), que causam a 
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destruição da mucosa, com consequente atrofia 
vilositária e hiperplasia de criptas. As citocinas da 
resposta Th2 promovem ativação e expansão clonal de 
células B, com consequente produção de 
autoanticorpos (IgA e IgG) contra o glúten (gliadina), 
tTG e complexos gliadina-tTG. Por sua vez, citocinas 
como IL-18, IFN-alfa e IL-21 parecem atuar na 
polarização e manutenção da resposta Th-1. A IL-21, 
produzida por células Th1 CD4+, foi caracterizada como 
um fator adicional da imunidade inata, ao atuar em 
conjunto com a IL-15. A detecção de altas 
concentrações de IL-21 em biópsias de pacientes com 
doença ativa sugere sua participação na patogênese da 
DC, embora o mecanismo envolvido em sua produção 
e seu papel preciso no processo de doença ainda 
permaneçam sem explicações. 
A compreensão da integração entre a resposta imune 
inata e a adaptativa tem possibilitado maior 
entendimento dos eventos decorrentes que levam à 
atrofia vilositária característica da DC. Muitos 
esclarecimentos ainda são necessários. 
Fisiopatologia 
A DC compromete o intestino delgado proximal, 
afetando a absorção de vários nutrientes. O 
comprimento do intestino lesado varia de um paciente 
para outro. Quanto mais grave a lesão e maior o 
segmento atingido, mais intensa será a má absorção e 
mais lesado será o indivíduo. Por outro lado, há 
pacientes celíacos com alterações discretas. 
 
O epitélio intestinal com as junções firmes entre as 
células, constitui barreira que regula o tráfego de 
macromoléculas entre o meio ambiente e o 
hospedeiro. Portanto, controla o equilíbrio entre 
tolerância e imunidade para antígenos não próprios. 
Zonulina é o único modulador fisiológico. Quando fica 
desregulado em indivíduos geneticamente suscetíveis, 
pode facilitar doenças. Algumas ações nesse nível 
podem preveni-las. Assim, alterações na função de 
barreira favorecem a penetração de peptídeos por falta 
de especificidade ou simplesmente por dano mucoso. 
Proteínas do leite de vaca ou da soja podem deter - 
minar anticorpos circulantes, trazendo implicações 
dietéticas importantes ao tratamento. 
Os efeitos decorrentes de tantas modificações 
resultam em má absorção, com predominância de um 
ou vários nutrientes, manifestando-se clinicamente por 
formas monossintomáticas ou até por síndrome 
carencial global. 
Quadro clínico 
O quadro clínico na DC varia muito, dependendo da 
gravidade e extensão das lesões e da idade do paciente. 
É possível encontrar desde sinais e sintomas de má 
absorção de apenas um nutriente (anemia, por 
exemplo) ou pandisabsorção, com repercussões graves 
à nutrição do indivíduo e ameaça à sua vida. A 
apresentação clássica da DC (má absorção grave e 
caquexia), descrita nos livros, está cada vez mais rara. 
Os gastroenterologistas devem se lembrar desse 
diagnóstico ao atenderem pacientes com dispepsia 
e/ou síndrome do intestino irritável, bem como os 
especialistas em outras doenças autoimunes. 
A DC pode ser diagnosticada em qualquer época da 
vida. Anteriormente, era considerada rara no idoso, 
mas com o aumento da longevidade chega a 27% dos 
casos, embora com grande intervalo entre os sintomas 
e o correto diagnóstico. 
Modos de apresentação 
O modo de apresentação também varia conforme a 
idade do paciente, mas raramente se apresenta como 
complicação no início do quadro (perfuração ou 
linfoma). Ehsani-Ardakani et al. chamam a atenção para 
o fato de os pacientes apresentarem sintomas diversos 
de acordo com o país, provavelmente por questões 
dietéticas e culturais, concluindo que os profissionais 
devem ter alto índice de suspeição. 
Forma clássica ou típica 
Decorre da má absorção de nutrientes, encontrada 
tanto em crianças quanto em adultos, com quadro de 
diarreia crônica e desnutrição. Na criança, a distensão 
abdominal e a intensa redução de massa glútea são 
dados que chamam a atenção (hábito celíaco). 
a. Crianças menores que 2 anos de idade: 
• pouco apetite; 
• dor abdominal; 
• vômitos; 
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• diarreia/constipação; 
• irritabilidade; 
• distensão abdominal; 
• emagrecimento; 
• hábito celíaco; 
• déficit de crescimento; 
• déficit de desenvolvimento; 
• desnutrição. 
b. Crianças maiores/adolescentes: 
• apetite pobre; 
• mal-estar digestivo; 
• cansaço; 
• mudanças de humor; 
• diarreia/constipação; 
• déficit de crescimento; 
• menarca atrasada; 
• anemia; 
• defeitos do esmalte dentário. 
c. Adultos/idosos: 
• sintomas gastrointestinais altos; 
• emagrecimento; 
• fadiga crônica; 
• mudanças de humor; 
• depressão; 
• diarreia/constipação; 
• distensão abdominal; 
• problemas gineco-obstétricos. 
Forma atípica 
• Tipo denominado atípico digestivo: dispepsia e/ou 
síndrome do intestino irritável. 
• Tipo denominado atípico extradigestivo: sem 
sintomas GI (tais como baixa estatura, anemia, 
tetania etc.), monossintomática ou 
polissintomática. 
Forma silenciosa 
Os indivíduos são assintomáticos. O diagnóstico é 
sugerido por testes sorológicos positivos, endoscopia e 
histologia com alterações compatíveis. 
Forma latente 
Ocorre em indivíduos com biópsia intestinal normal 
ante o consumo habitual de glúten e que, anterior ou 
posteriormente, desenvolvem atrofia parcial ou total 
de vilosidades, retornando novamente ao normal após 
isenção do glúten da dieta. 
a. Indivíduos com diagnóstico de DC responsiva à DIG e 
que apresentavam histologia normal ou somente > 
número de LIE. 
b. Indivíduos com mucosa normal em dieta com glúten 
que desenvolvem DC subsequentemente. 
Forma assintomática 
Ocorre entre familiares de celíacos com anticorpos 
positivos no soro, com alterações histológicas mais ou 
menos graves, número aumentado de LIE, revertendo 
com dieta isenta de glúten. 
DC não responsiva 
Trata-se de uma falha de resposta à dieta 
estritamente isenta de glúten pelo menos após seis 
meses de tratamento ou ressurgimento de sintomas ou 
anormalidades laboratoriais típicas de DC, enquanto 
em tratamento. Causas mais comuns: exposição ao 
glúten (36%), síndrome do intestino irritável (22%), DC 
refratária (10%), intolerância à lactose (8%) e colite 
microscópica (6%). Nesses pacientes, há elevação dos 
níveis de anti-tTG. 
DC refratária 
É considerada uma complicação. 
Dermatite herpetiforme 
Trata-se de uma DC da pele. Lesões aparecendo 
antes, ao diagnóstico ou durante a evolução da DC. 
 
Ciclos das DC 
A DC desenvolve-se em ciclos: 
1. Pode surgir no lactente, relacionando-se com a 
época do desmame e/ou introdução de cereais na 
alimentação. 
2. Pode regredir parcialmente na adolescência ou se 
apresentar pela primeira vez nessa fase, com ou sem 
fator desencadeante. 
3. Pode aparecer ou reaparecer na idade adulta, 
geralmente na terceira ou na quarta década, 
principalmente durante gestação ou puerpério. 
4. Pode surgir na idade adulta ou geriátrica 
desencadeada ou não por algum fator, como cirurgias, 
infecções etc. 
Manifestações gerais da DC 
As manifestações mais comuns são anorexia, cansaço, 
emagrecimento, fraqueza, hiperfagia, mal-estar, baixa 
estatura, construção delgada,

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