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Terapia de Aceitação e Compromisso

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Steven C. Hayes
Kirk D. Strosahl
Kelly G. Wilson
Terapia de
aceitação
e compromisso
o processo e a prática da mudança
consciente
2ª edição
Tradução
Sandra Maria Mallmann da Rosa
Revisão técnica
Mônica Valentim
Terapeuta comportamental contextual. Mestra em Psicologia Experimental
pela Universidade de São Paulo.
Doutora em Pediatria pela UNESP Botucatu. Ex-presidente e fundadora do
capítulo brasileiro
da Association for Contextual Behavioral Science (ACBS). Peer-Reviewed
ACT Trainer pela ACBS.
Versão impressa desta obra: 2021
Porto Alegre
2021
Obra originalmente publicada sob o título
Acceptance and commitment therapy: the process and practice of mindful
change, second edition.
ISBN 9781462528943
Copyright © 2012 The Guilford Press
A Division of Guilford Publications, Inc.
Published by arrangement with The Guilford Press
Gerente editorial
Letícia Bispo de Lima
Colaboraram nesta edição:
Coordenadora editorial
Cláudia Bittencourt
Capa
Paola Manica | Brand&Book
Preparação de originais
Camila Wisnieski Heck
Leitura final
Heloísa Stefan
Editoração
Ledur Serviços Editoriais Ltda.
Produção digital
Loope Editora | www.loope.com.br
Steven C. Hayes, PhD, é professor da Nevada Foundation do
Departamento de Psicologia da University of Nevada. Sua carreira está
focada na análise da natureza da linguagem e cognição humanas e na sua
aplicação à compreensão e ao alívio do sofrimento humano.
Kirk D. Strosahl, PhD, é psicólogo de cuidados primários da Central
Washington Family Medicine, em Yakima, Washington, onde promove o
uso da ACT na prática médica geral, predominantemente com clientes de
baixa renda, sem seguro ou com cobertura insuficiente.
Kelly G. Wilson, PhD, é professor associado de psicologia da University of
Mississippi, onde também é diretor do Center for Contextual Psychology e
do ACT Treatment Development Group.
H417t Hayes, Steven C.
Terapia de aceitação e compromisso : o processo e a prática da mudança consciente
[recurso eletrônico] / Steven C. Hayes, Kirk D. Strosahl, Kelly G. Wilson ; tradução:
Sandra Maria Mallmann da Rosa ; revisão técnica: Mônica Valentim. – 2. ed. – Porto
Alegre: Artmed, 2021.
E-pub.
Editado também como livro impresso em 2021.
ISBN 978-65-81335-29-8
1. Terapia cognitivo-comportamental – Psicoterapia. 2. Psicologia. I. Strosahl, Kirk D. II.
Wilson, Kelly G. III. Título.
CDU 159.9:616.89
Catalogação na publicação: Karin Lorien Menoncin – CRB 10/2147
Reservados todos os direitos de publicação, em língua portuguesa, ao
GRUPO A EDUCAÇÃO S.A.
(Artmed é um selo editorial do GRUPO A EDUCAÇÃO S.A.)
Rua Ernesto Alves, 150 – Bairro Floresta
90220-190 – Porto Alegre – RS
Fone: (51) 3027-7000
SÃO PAULO
11
Conexão com os valores
◊
◊
◊
◊
◊
◊
Se não decidimos para onde vamos, estamos sujeitos a acabar indo
para onde nos direcionamos.
DITADO CHINÊS
Neste capítulo, você aprenderá…
Como os valores podem ser usados para criar um senso de significado e direção na vida.
Como os valores diferem dos objetivos de vida, mas estão associados a eles.
A distinção entre o ato de escolher e o ato de decidir.
Como apoiar a construção do cliente de direções valorizadas.
Como ajudar os clientes a distinguir entre valorização como comportamento e valorização como
sentimento.
Como separar valores de pressões sociais e comunitárias insatisfatórias.
VISÃO GERAL PRÁTICA
A ACT presume que todo cliente já possui tudo o que é necessário para
viver uma vida rica e significativa. Para a maioria dos clientes, no entanto, a
habilidade de ver e seguir em uma direção valorizada foi prejudicada pela
fusão verbal e pela esquiva experiencial. Pensamentos sobre o passado,
emoções, estados corporais e outros não estimulam uma ação que enriquece
a vida, especialmente quando são vistos no contexto de literalidade,
controle e dar razões. Pensamentos e sentimentos com frequência levam a
direções contraditórias e convidam a um foco em objetivos de processo
irrelevantes (p. ex., livrar-se de certos sentimentos, ter apenas certos
pensamentos). Valores escolhidos fornecem uma leitura da bússola muito
mais estável. Valores podem motivar o comportamento mesmo em face de
adversidades pessoais imensas. Os clientes estão sofrendo, sim... mas sem
valores, não. Depois de despertada, a valorização pode se tornar uma parte
poderosa de uma existência vital.
Um exemplo dessa ideia simples é encontrado no livro Em busca de
sentido, de Victor Frankl. Frankl descreve um ponto no tempo próximo ao
final da II Guerra Mundial quando descobriu um meio de escapar do campo
de concentração onde era prisioneiro. Ele descreve quando fez uma última
ronda dos pacientes em seu hospital improvisado. Ele se aproxima de um
paciente a quem esperava salvar, mas que estava morrendo. O paciente
olhou para Frankl e disse: “Você também está saindo”. Frankl descreve ter
experimentado uma terrível sensação de agitação. Procurou seu colega, com
quem havia planejado fugir, e disse que iria ficar e cuidar dos seus
pacientes. Quando voltou ao seu trabalho, Frankl relatou que sentiu uma
sensação de paz diferente do que jamais havia experimentado (Frankl, 1992,
p. 68).
Se Frankl pôde experimentar um senso de propósito e paz em um dos
ambientes mais terríveis imaginados pela humanidade, então nossos
clientes, não importa a história que carregam, são capazes de viver uma
vida rica e significativa. Quando dizemos rica e significativa, não queremos
dizer sem dores. Queremos dizer rica e significativa segundo os padrões dos
nossos clientes.
Acreditamos que o sofrimento é universal na condição humana. Se você
viver por tempo suficiente, as pessoas que você ama algum dia vão morrer,
as carreiras chegarão ao fim, seu corpo vai envelhecer. O que ajuda a
dignificar a vida, considerando-se o conhecimento certo de que todos vão
sofrer com o tempo? Quando perguntamos aos clientes o que eles fariam se
pudessem finalmente aplacar sua dor psicológica, costumamos ouvir coisas
sobre família, carreira, engajamento social, autodesenvolvimento e outras.
Contudo, o modo de solução de problemas da mente nos diz que não se
pode ter essas coisas até que a dor psicológica seja dominada. Esse
pressuposto naturalmente leva ao foco excessivo nos objetivos do processo
(i.e., reduzir a depressão, a ansiedade, os flashbacks, o impulso de beber ou
se drogar, aumentar a autoconfiança, etc.), com o resultado de mais longo
prazo de que os clientes perdem sua conexão com missões mais
significativas na vida. Essa desconexão pode se tornar tão generalizada que
os clientes literalmente não “sabem” no que acreditam ou o que querem que
suas vidas signifiquem. Não é incomum, na prática clínica, perguntar ao
cliente algo como “O que você estaria fazendo na sua vida se não tivesse
que gastar toda essa energia no controle do seu X (depressão, bebida, etc.)?”
e ouvir como resposta: “Não sei”. Um objetivo importante da ACT é ajudar
os clientes a construir um senso de direção na vida que pode ser perdido em
sua luta para acabar com seu sofrimento diário. Eles podem descobrir que
mesmo os menores passos em direção à promoção dos próprios valores
podem trazer nova vitalidade para uma vida na qual uma mesmice
sufocante reina há muito tempo.
APLICAÇÕES CLÍNICAS
Em ACT, valores são consequências livremente escolhidas e verbalmente
construídas de padrões de atividade contínuos, dinâmicos e em evolução
que estabelecem reforçadores predominantes para essa atividade que são
intrínsecos ao engajamento no próprio padrão comportamental valorizado
(Wilon & DuFrene, 2009, p. 66). Examinamos os componentes dessa
definição no Capítulo 3 e discriminamos seu significado. Talvez as coisas
que mais devem ser lembradas no trabalho clínico são, primeiramente, que,
mesmo que os valores sejam socializados, eles têm uma qualidade de serem
livremente escolhidos em vez de serem forçados por outras pessoas ou por
emoções que precisam ser evitadas; e, em segundo lugar, que eles
estabelecem consequências apetitivas intrínsecas. Valores não pertencem a
um futuro distante. Eles têm uma qualidade apetitivanão evitativa no agora
a despeito de sua extensão temporal – é como se o significado no presente
se estendesse ao longo do tempo.
De certo modo, esse processo estabelece um novo tipo de contingência da
teoria evolucionária multinível dentro da ACT: não só as contingências de
reforçamento, mas contingências de significado baseadas no
condicionamento relacional e nos processos cognitivos que ele estabelece.
Depois que esse novo critério de seleção está estabelecido, os sistemas
comportamentais começam a evoluir naturalmente na sua direção. A
evolução do comportamento ocorre com qualquer reforçador, porém muitos
reforçadores levam a picos adaptativos. Por exemplo, a esquiva experiencial
é reforçada, mas não leva a lugar algum. O trabalho com valores permite
que os sistemas comportamentais evoluam na direção de qualidades e
padrões escolhidos.
Valorização como ação
Terapeuta:
Cliente:
O terapeuta em ACT faz diversas distinções quando discute a questão dos
valores. Entre as mais importantes, encontra-se a distinção entre valores
como sentimentos e valorização como ações. Esses dois aspectos com
frequência são inteiramente confusos para o cliente. O exemplo de valorizar
um relacionamento amoroso com o próprio cônjuge é instrutivo.
Sentimentos amorosos podem aumentar e diminuir com o tempo e as
situações. Ter um comportamento amoroso (i.e., respeitoso, atencioso, etc.)
somente quando temos sentimentos de amor (e nos comportamos da forma
oposta quando surgem sentimentos negativos) tem efeitos problemáticos em
um casamento. No entanto, esta é precisamente a dificuldade que
encontramos quando valores são confundidos com sentimentos, já que os
sentimentos não estão completamente sob controle voluntário e tendem a ir
e vir.
Esta questão é essencialmente a mesma que discutimos anteriormente no
contexto do controle emocional e do raciocínio emocional. O contexto
cultural que apoia a associação entre sentimentos de amor e atos de amor é
o mesmo contexto cultural que apoia que o cliente com agorafobia
permaneça em casa na presença de alta ansiedade e que o alcoolista beba na
presença de forte impulso. Se o cliente baseia a vida inteiramente na
ausência de obstáculos emocionais ou cognitivos, direções valorizadas não
poderão ser perseguidas de forma comprometida, já que mais cedo ou mais
tarde algum obstáculo formidável será encontrado. À medida que o cliente
segue a trajetória da vida, inevitavelmente surgem obstáculos, e a vida
pergunta: “Você vai me receber?”. Se a resposta for “Não”, então a jornada
deve parar. Na área dos valores, isso significa que precisamos aprender a
valorizar mesmo quando não gostamos, a amar mesmo quando estamos
com raiva e a cuidar mesmo quando estamos aflitos.
Uma maneira útil de distinguir sentimentos de ações é começar com
coisas pelas quais o cliente não tem sentimentos fortes. O diálogo a seguir é
um exemplo.
Vamos fazer um pequeno exemplo bobo. Você se preocupa com
o número de pessoas que usam meias com estampa de losangos?
Não, por que eu deveria?
Terapeuta:
Cliente:
Terapeuta:
Cliente:
Terapeuta:
Cliente:
Terapeuta:
Cliente:
Terapeuta:
Cliente:
Terapeuta:
Cliente:
Terapeuta:
OK. Bem, o que eu quero que você faça é que realmente
desenvolva uma forte crença de que os universitários devem usar
meias com estampa de losangos. Sinta verdadeiramente isso.
Realmente se mobilize com isso!
Não consigo.
Bem, tente de verdade. Sinta intensamente isso. Está
funcionando?
Não.
OK. Agora, quero que você imagine que, mesmo que não
consiga sentir fortemente isso, você vai agir de alguma forma que
torne as meias com estampa de losangos importantes para os
universitários. Vamos pensar em algumas maneiras. Você poderia,
digamos, percorrer os dormitórios que têm baixas porcentagens de
usuários de meias com estampa de losangos. O que mais?
Eu poderia bater nos universitários que não usam.
Ótimo! O que mais?
Eu poderia oferecer gratuitamente aos universitários as meias com
estampa de losangos.
Ótimo. E note uma coisa: embora essas coisas possam ser ações
tolas, você poderia realizá-las com facilidade.
E seria lembrado para sempre como aquele cara idiota que perdeu
seu tempo se preocupando com meias com estampa de losangos!
Sim, e, talvez, devido ao seu compromisso com isso, seria
lembrado como a pessoa responsável por trazer as meias com
estampa de losangos de volta à moda. Mas note isto: se você se
comportasse assim, ninguém jamais saberia que você não tem
fortes sentimentos em relação a meias com estampa de losangos.
Tudo o que eles veriam seriam suas pegadas... suas ações.
OK.
Agora, eis a questão. Se fizesse isso, você estaria de fato
tornando as meias com estampa de losangos importantes na sua
Cliente:
Terapeuta:
vida?
Com certeza.
OK. Então, o que se coloca entre você e a ação com base em
coisas que você realmente considera importantes? Não pode ser os
sentimentos, se eles não são críticos nem quando estamos lidando
com algo tão trivial.
Aqui, o terapeuta em ACT está focando na valorização da ação. Esforços
para o controle consciente funcionam na arena do comportamento, mas são
um problema na arena das experiências privadas. Faz muito mais sentido
focar no que pode ser regulado diretamente (comportamento manifesto) do
que em eventos que não podem ser facilmente controlados (eventos
privados). Iniciando por uma questão trivial, o cliente pode ver que escolher
considerar alguma coisa como importante não é necessariamente uma
questão emocional. Essa percepção pode facilitar um pouco a conversa
sobre material pessoalmente mais relevante sem associar sentimentos e
resultados de valores.
Valorização como escolha
Valores são úteis porque ajudam os humanos a escolher entre as
alternativas. Nos humanos, a escolha entre as alternativas quase sempre
ocorre na presença do modo de solução de problemas da mente, o que é útil
para gerar razões a favor e contra um curso de ação particular. Razões são
formulações verbais de causas e efeitos. São tentativas de responder à
pergunta: “Por que eu devo ou não X?”. Como uma forma mais precisa de
falarmos sobre isso, chamamos de decisões a seleção entre alternativas
baseada em razões. As decisões são explicadas, justificadas, associadas e
guiadas por processos verbais de tomada de decisão, tais como prever,
comparar, avaliar ou pesar os prós e os contras.
Para que ocorra valorização, é essencial que valores não sejam
confundidos com decisões e julgamentos – os valores devem ser escolhas.
Uma escolha é uma seleção entre alternativas que pode ser feita com razões
(se houver razões disponíveis), mas não por razões. As escolhas não são
explicadas, justificadas, associadas ou guiadas por avaliações verbais e
julgamentos. Dizer que uma escolha não é feita por razões não quer dizer
que não haja fatos históricos que deem origem a determinada escolha.
Significa que as formulações verbais que determinada pessoa constrói em
relação a uma escolha não são a causa para que a escolha específica seja
feita. Definido dessa forma, os animais podem escolher, mas não podem
julgar. Parece improvável que os humanos, meramente porque
acrescentaram o comportamento verbal, não possam fazer o que um animal
pode fazer muito naturalmente.
A ACT procura evitar a confusão entre ação escolhida e ação
logicamente derivada. O seguinte roteiro sugerido demonstra como o
terapeuta em ACT pode abordar a questão do julgamento e escolha:
“Para lidar com essa questão da valorização, vamos fazer distinção entre
escolhas e decisões. As duas são confundidas com frequência. Uma
decisão é uma seleção entre cursos de ação alternativos feita por uma
razão. Uma ‘razão’ é uma formulação de causa e efeito ou dos prós e
contras. Quando eu digo ‘por uma razão’, pretendo dizer que a ação está
ligada à razão, guiada pela razão, explicada pela razão ou justificada pela
razão. Assim, por exemplo, você pode decidir investir em ações porque a
empresa tem boa administração, um novo produto que você acha que terá
sucesso e forte registro de crescimento. Essas razões guiam,explicam e
justificam a compra das ações. Escolhas são outra coisa. Uma escolha é
uma seleção entre alternativas que não é feita especificamente por
determinadas razões, embora em geral seja feita na presença de razões
(porque somos seres verbais).”
Para ajudar o cliente a ver a distinção entre escolhas e decisões, o
terapeuta pode primeiro explicar a distinção intelectualmente dessa maneira
e, então, colocar as duas mãos à frente, cada uma fechada como se estivesse
segurando alguma coisa, e dizer: “Rápido, escolha uma”. O clínico, então,
pergunta: “Por que você escolheu esta mão?”. Como a escolha é trivial, a
reação mais comum é “por nenhuma razão”. (Se é dada uma razão, essa
escolha trivial ou variante pode ser repetida ainda mais rapidamente para
que o cliente não tenha tempo de gerar razões.) Se o cliente não escolheu
por uma razão, o clínico pode, então, perguntar com certo espanto: “Isso é
possível? Você consegue apenas escolher coisas? E você saiu impune – o
céu não caiu?”.
O terapeuta pode, então, pedir que a pessoa faça exatamente a mesma
coisa enquanto pensa em várias razões para escolher a mão esquerda ou a
direita. Por exemplo, a pessoa pode ser encorajada a pensar “a direita é
melhor” e, então, simplesmente escolher uma ou outra. Se esse obstáculo
puder ser transposto, o clínico pode dizer que cada mão representa uma
alternativa um pouco mais importante enfrentada pelo cliente (p. ex., a mão
esquerda é “Vou comprar aquela mesa”, e a direita é “Não vou”), e o cliente
deve simplesmente escolher uma ou outra, agora com razões (já que
qualquer coisa de importância naturalmente incita uma análise das
alternativas), mas não por razões. Dessa maneira, o nível pode ser elevado
gradualmente até uma área de valores, ainda mantendo a ação como
escolha, não como julgamento.
Se a pessoa continuar levantando razões para abordar por que a escolha
está sendo feita, uma estratégia é perguntar por que cada razão é verdadeira.
Depois de repetir essa pergunta duas ou três vezes, a resposta habitual é “Eu
não sei”. Essa resposta pode, então, ocasionar um exame do quanto são
“razoáveis” tais julgamentos. O quanto pode ser razoável escolher entre
alternativas quando essas razões são apenas superficiais? Por exemplo,
suponha que perguntemos a um cliente por que ele bebe Coca-Cola em vez
de Pepsi. A resposta geralmente é algo como “Porque eu gosto do gosto”.
Se, então, perguntamos “Por que você gosta do gosto?”, geralmente a pausa
precedendo uma resposta crível será muito longa. Por fim, a resposta que
obtemos é algo como “Apenas gosto”.
Em outra variante, o cliente pode ser solicitado especificamente a fazer
uma escolha entre duas alternativas (p. ex., tipos de alimento). O terapeuta
pode, então, perguntar: “Por que você escolheu essa?”. Tal pergunta é uma
artimanha. Se a pessoa responde dando razões, e a ação ocorreu por essas
razões, então foi uma decisão, e não uma escolha. O terapeuta pode
repetidamente se recusar a aceitar a razão da pessoa como uma resposta:
“Mas eu não pedi que suas papilas gustativas escolhessem – pedi que você
escolhesse. E, além disso, você poderia ter notado que gostava desse
alimento enquanto escolhia o outro, não é verdade?”. Depois de o terapeuta
continuar a forçar essa linha de raciocínio por algum tempo, os clientes com
frequência irão mudar para respostas mais acuradas, tais como “porque
sim” ou “por nenhuma razão”, indicando que agora entendem a distinção
entre escolhas e decisões.
Essa distinção é importante na ACT não apenas porque é a única forma
de aprender como os valores funcionam, mas também porque a ACT é
sobre mudar a intenção por trás de um comportamento clinicamente
significativo que com frequência é razoável, mas ineficaz. Nesse sentido,
abertura para a experiência versus controle é, em última análise, uma
escolha, não uma decisão ou julgamento.
A escolha tem outros benefícios. Por exemplo, ajuda o cliente a evitar
paralisia quando a ação fundamentada não funciona. Igualmente, ajuda o
terapeuta a evitar ficar emaranhado no conteúdo e na lógica da história de
vida do cliente. Acima de tudo, no entanto, a distinção é necessária para que
os clientes possam se engajar em seus valores sem precisarem também
invocar justificativas e explicações que inevitavelmente os fazem recuar
para os mesmos padrões de comportamento sancionados socialmente que
levaram ao começo dos seus problemas. As únicas questões restantes são o
que fazer e o que acontece como consequência. Usadas corretamente (e não
coercitivamente), as escolhas podem ajudar o cliente a ser response-able
(ter capacidade de resposta).
As escolhas não são “livres” no sentido de não serem afetadas pela
história do indivíduo. De fato, a própria escolha é um ato historicamente
situado. As escolhas são “livres” no sentido de não haver coerção, não “ter
que” direcionar a escolha. Se o comportamento estivesse relacionado a
razões em um sentido estritamente mecânico, então a mera presença de
certas razões previsíveis constituiria as condições necessárias e suficientes
para que o comportamento ocorresse. Essa abordagem determinista da
causação é demonstravelmente falsa. Os humanos são capazes de ser
amáveis mesmo quando há boas razões para não serem. Por exemplo,
podemos considerar a criação de uma comissão de reconciliação na África
do Sul como um ato de amor em relação aos agressores e aos opressores no
passado, mesmo que haja mais do que amplas razões para demonstrar ódio
e buscar retaliação contra seus muitos atos de criminalidade racista.
Propósito está em toda parte
Terapeuta:
Propósito está sempre presente na vida do cliente. Isso não pode ser evitado,
não importa o quanto o cliente seja calado e paralisado. Por que é assim?
Porque a maior parte do comportamento é intencional, independentemente
de existir um senso de direção experienciado. O relógio da vida está sempre
avançando, e ele só vai em uma direção: de um momento de agora até o
próximo momento de agora. Qualquer comportamento histórico envolve
uma história desses momentos, e qualquer comportamento consciente e
intencional envolve também um futuro verbalmente construído. De uma
forma muito real, a maior parte do comportamento é intencional – seja
experiencialmente, seja verbalmente, ou ambos. Isso é verdadeiro mesmo
que o padrão de pensamento dominante do cliente seja: “Na verdade não
estou no comando de minha vida. Ela que me comanda. Não posso fazer
nada diferente porque estou aprisionado na minha situação”.
Embora propósito esteja em toda parte, valores (conforme os definimos)
não estão. Os clientes com frequência se sentem coagidos em suas vidas,
acreditam que são vítimas da vida ou simplesmente se sentem como se
estivessem à deriva. Quando estão vivendo sem contato com o momento
presente, eles estão, com efeito, no piloto automático. Nessas
circunstâncias, o treinamento social por si só é mais do que capaz de
organizar sequências de comportamento altamente complicadas (p. ex.,
trabalhar todos os dias, lavar roupas, assistir à televisão, ir à igreja, etc.). A
questão, portanto, não é o que o cliente está fazendo, mas como está
fazendo. Os mesmos comportamentos que são “tediosos” quando estamos
no piloto automático podem refletir vastos reservatórios de vitalidade
quando executados na busca dos valores pessoais. No diálogo a seguir, o
terapeuta em ACT tenta destacar como o comportamento do cliente pode
muito bem refletir certos propósitos – mesmo quando o cliente não tem
consciência disso. É claro que um propósito não é a mesma coisa que um
valor. É necessário um componente adicional, isto é, escolha. Contudo, o
reconhecimento de que o comportamento do cliente pode de fato refletir
certos propósitos prepara o terreno para essa discussão.
Acho que o que você está me dizendo é que você não tem
consciência das escolhas que está fazendo todos os dias. Portanto,
parece-lhe que é como se você não estivesse agindo de acordo com
algum propósito porque não tem consciência desses propósitos. Se
Cliente:
Terapeuta:
Cliente:
Terapeuta:isso realmente fosse possível, a consequência não seria que cada
dia a sua atividade fosse completamente aleatória? Você estaria
andando em círculos, se batendo nas paredes, colocando as meias
nas mãos, escovando os dentes com a escova sanitária, indo ao
lugar errado para trabalhar, etc.? Deixe-me perguntar: a sua vida é
realmente esse acaso ou apenas parece que você não está
escolhendo as suas ações?
Bem, eu não estou assim tão fora dela, mas essencialmente parece
que não estou no controle do que está acontecendo comigo. Eu não
tenho como mudar as coisas.
E escolhendo acreditar no que a sua mente está lhe dando aqui –
que você está aprisionado – você continua a agir como uma pessoa
aprisionada, certo?
Aham.
Não estou lhe perguntando se você acredita que está
aprisionado. O que estou perguntando é: você é capaz de direcionar
seu comportamento? E então eu quero saber: você é capaz de
escolher a direção?
É importante não intimidar o cliente quanto a isso, mas gentilmente
acabar com a ilusão de que não estão sendo feitas escolhas e de que os
propósitos não estão sendo atingidos. A questão é: quais propósitos?
Quando examinamos as formas como o comportamento funciona, o que ele
produz, descobrimos o seu propósito. Com frequência, nossos clientes irão
descobrir que os propósitos aos quais estão servindo são relativamente
ineficazes e proporcionam, na melhor das hipóteses, apenas alívio de curto
prazo de algum tipo de consequência aversiva. Por exemplo, uma cliente
envolvida em um casamento insatisfatório pode devidamente fazer “todas
as coisas certas” em casa para manter uma relação pacífica, embora
distante, com o marido. Esse alívio temporário é comprado a um preço
muito alto porque há pouca ou nenhuma chance de que o relacionamento
evolua para algo mais gratificante enquanto os problemas mais dolorosos
permanecerem confinados. Na ACT, tentamos transformar a discussão na
Terapeuta:
Cliente:
Terapeuta:
pergunta: se eu pudesse escolher um propósito aqui, qual propósito
escolheria?
O que você quer que sua vida signifique?
Um dos exercícios mais poderosos da ACT e que “traçam um horizonte” é
chamado O Que Você Quer Que Sua Vida Signifique? O diálogo a seguir
envolve um cliente com independência financeira que está angustiado com
sua falta de objetivo:
Se você estiver disposto, eu gostaria que fizéssemos um
exercício que pode ter alguns resultados muito interessantes e
surpreendentes ou que pode simplesmente ajudá-lo a entrar em
contato com alguma coisa que você já sabe há muito tempo. Vamos
apenas ver o que acontece.
OK, estou disposto a experimentar.
Este exercício eu chamo de O Que Você Quer Que Sua Vida
Signifique? Quero que você feche os olhos e relaxe por alguns
minutos e afaste da sua mente todas as coisas de que temos falado.
(Auxilia o cliente com a relaxação por 2 a 3 minutos.) Agora,
quero que imagine que, por algum capricho do destino, você
morreu, mas conseguiu assistir ao seu funeral em espírito. Você
está observando e ouvindo o tributo feito pela sua esposa, seus
filhos, seus amigos, as pessoas com quem você trabalhava, etc.
Imagine apenas que você esteja nessa situação e coloque-se na sala
emocionalmente. (Faz uma pausa.) OK. Agora, quero que
visualize como gostaria que essas pessoas que fizeram parte da sua
vida se lembrem de você. O que gostaria que sua esposa dissesse
sobre você como marido? Faça-a dizer isso. Realmente seja
corajoso aqui! Deixe que ela diga exatamente o que você mais
gostaria que ela dissesse se você tivesse escolha totalmente livre
sobre o que seria. (Faz uma pausa e deixa que o cliente fale.)
Agora, como gostaria que seus filhos recordassem de você como
pai? Mais uma vez, não se contenha. Se pudesse fazer eles dizerem
Cliente:
Terapeuta:
Cliente:
Terapeuta:
Cliente:
Terapeuta:
Cliente:
alguma coisa, o que seria? Mesmo que na verdade você não tenha
vivido de acordo com aquilo que gostaria, deixe que eles falem
como você mais gostaria que fosse. (Faz uma pausa e deixa que o
cliente fale.) Agora, o que gostaria que seus amigos dissessem
sobre você como amigo? Como gostaria de ser lembrado pelos seus
amigos? Deixe que eles digam todas essas coisas – e não esconda
nada! Faça com que seja dito como você mais quer. E apenas faça
uma anotação mental dessas coisas enquanto ouve o que eles
dizem. [O terapeuta pode continuar com isso até que esteja bem
claro que o cliente entrou no exercício. Então, o terapeuta ajuda o
cliente a se reorientar para a sessão, p. ex.: “Apenas imagine como
será a sala quando você voltar e, quando estiver pronto,
simplesmente abra os olhos”.]
Isso é esquisito... tentar imaginar estar morto, mas estar lá.
Algumas vezes, no passado, eu já pensei sobre morrer de repente.
Geralmente imagino o quanto todos ficariam abalados – o quanto
seria difícil para Debbie e as crianças!
Então projetar-se até o momento da sua morte parece ser uma
questão séria.
Sim, parece que todos os meus problemas meio que ficaram
pequenos! Ao mesmo tempo, eu fico muito triste comigo porque
parece que a minha vida está sendo desperdiçada.
Estou curioso... quando você ouviu os elogios, o que se
destacou entre as coisas pelas quais você queria ser lembrado?
Quando Debbie disse que eu tinha sido um marido carinhoso, fiel e
atencioso e um pai que sempre sustentou seus filhos. Chuck, a
pessoa que provavelmente eu conheço há mais tempo, disse que eu
estive ao seu lado quando ele mais precisou de mim, quando ele
parou de beber. Isso, na verdade, aconteceu anos atrás.
E alguém se levantou e disse: “Eu me lembro de Richard – ele
passou a vida inteira tentando provar que não era fruto do acaso”?
(Ri.) Não.
Terapeuta:
Cliente:
Terapeuta:
Cliente:
Terapeuta:
Terapeuta:
Cliente:
Terapeuta:
Cliente:
Terapeuta:
Alguém disse: “Aqui jaz Richard – ele ganhou mais de 2 milhões
de dólares em sua carreira e, por isso, será eternamente alguém
de valor”?
(Ri.) Não. O que você está tentando me dizer?
Nada, na verdade... apenas note que muitas coisas a respeito das
quais você se critica e contra as quais luta não têm conexão com
aquilo pelo que você quer ser lembrado. Parece que você se
contraiu impiedosamente em nome de coisas que você nem mesmo
valoriza.
Isso é muito assustador se for verdade!
Sim, é, e não tem a ver com o que é verdade! É sobre o que
funciona e o que não funciona.
Em uma variação desse exercício, o cliente pode ser solicitado a escrever
um pequeno epitáfio em uma lápide imaginária. Com frequência, esse
exercício revela amplas discrepâncias entre os valores do cliente e suas
ações atuais.
Quando as pessoas morrem, o que fica para trás não é tanto o
que elas tinham, mas o que elas significavam. Por exemplo, você já
ouviu falar de Albert Schweitzer?
Certamente. Um médico na África, certo?
Certo. Por que você deveria saber a respeito desse homem? Ele
já morreu. Provavelmente a maioria das pessoas que ele tratou está
morta. Mas ele significou alguma coisa. Então, dessa mesma
forma, imagine que você pode escrever o que quiser na sua lápide
que diga o que você significou na sua vida. O que gostaria que o
seu epitáfio dissesse, se pudesse ser absolutamente qualquer coisa?
Pense nisso por um minuto.
“Ele participou na vida e ajudou seus semelhantes.”
Ótimo… agora, deixe-me perguntar: quando você olha para o
que a sua vida significa atualmente, ela significa o quê? Você está
realmente participando na vida e ajudando seus semelhantes?
Cliente:
Terapeuta:
Terapeuta:
Cliente:
Terapeuta:
Não – não tenho certeza se consigo!
Entendo. Então... você teria um epitáfio como: “Passou sua vida
inteira se perguntando se tinha o que era preciso para vivê-la... e
morreu sem ter certeza”.
Em alguns contextos ou com alguns clientes, a utilização do exercício
Funeral ou Lápide é talvez evocativo demais de questões relacionadas à
mortalidade – o que não é o ponto aqui –, mas é fácil elaborar versões
menos evocativas. Por exemplo, em intervenções no local de trabalho, o
funeral pode ser mudado para uma festa de aposentaria, e o epitáfio na
lápide,por uma gravação na parte interna de um relógio presenteado.
Existem muitas variantes desse tema na literatura da ACT.
Intervenção “Na mosca” (Bull’s Eye11)
Uma intervenção simples, porém elegante, nesse ponto está baseada no
exercício Na mosca, desenvolvido por Tobias Lundgren e colaboradores
(2011). A maioria dos membros da nossa cultura está familiarizada com o
conceito do ponto central em um alvo, seja jogando dardos, seja jogando
arco e flecha. O objetivo desses esportes é acertar o dardo ou a flecha “na
mosca”, ou seja, no centro do alvo, onde é concedida a maior parte dos
pontos. De modo geral, são concedidos menos pontos quando o dardo ou a
flecha se afasta do centro do alvo. O terapeuta desenha rapidamente uma
série de 5 a 7 círculos concêntricos em uma folha de papel e, então, inicia a
discussão.
Então, observe que eu desenhei um alvo nesta folha de papel.
Você está familiarizado com um alvo como este?
Sim, eu jogava dardos quando criança, e utilizávamos um alvo
parecido com esse.
Bem, nós vamos usar o alvo para medir um tipo diferente de
marcação aqui – basicamente, o grau em que você está mirando a
sua vida na direção em que deseja ir. Você já descobriu que um dos
seus principais valores na vida é estar participando na vida e
Cliente:
Terapeuta:
Cliente:
Terapeuta:
também ajudando pessoas necessitadas. Lembre-se de que o centro
do alvo é chamado de “na mosca”; isso é o que você quer atingir
quando jogar os dardos, certo?
Certo, e isso não acontecia com muita frequência para mim, mas
era muito legal quando eu conseguia!
E os círculos são concêntricos e vão se ampliando, e você
recebe menos pontos por acertar o dardo nos círculos mais
externos, está lembrado? Neste momento, o que eu quero que você
faça é pensar nesse valor que você expressou e colocar uma marca
nesse alvo que reflita o grau em que você está vivendo seus valores
no momento atual. Uma marca no centro significa que você
acertou na mosca; você está participando na sua vida com a maior
intensidade possível e está vivendo o valor de ajudar pessoas
necessitadas. Uma marca afastada do centro significa que você
pode estar vivendo seus valores algumas vezes ou talvez nem um
pouco, dependendo de onde colocar a sua marca. Então, agora eu
quero que você pense sobre onde se encontra na sua vida neste
exato momento e coloque uma marca no alvo para mim. [O
terapeuta entrega uma folha de papel ao cliente, e este faz uma
marca no círculo mais externo e entrega o papel ao terapeuta.]
Então, parece que você se marcou bem longe da mosca, o que
significa que você acha que no momento não está vivendo de
acordo com seus valores – isso está correto?
Sim, isso é muito perturbador porque eu sinto que sou capaz de
mais do que isso. Apenas não estou fazendo! Colocar uma marca
no alvo é como fazer um registro de que estou falhando.
Agradeça à sua mente por esses pensamentos otimistas e
cordiais. Há um propósito muito mais importante aqui do que se
declarar um vencedor ou perdedor: é descobrir onde você
realmente está na sua vida. Você só pode começar a partir de onde
está, não de onde gostaria de estar. Portanto, por mais desagradável
que possa ser, este é um passo vital no processo de escolha de fazer
alguma coisa diferente, se isso for o que você escolher fazer.
Cliente:
Terapeuta:
OK. Então eu estou aqui fora nesse círculo e quero estar aqui
dentro nesse círculo. Como eu chego lá?
Talvez você possa pensar nisso como um processo. Você não
fica em um círculo para sempre; mesmo que acerte na mosca, você
não tem um certificado da vida que diz “Bingo! Você está no
centro e não terá que fazer mais nada para ficar aqui!”. Então, note
apenas que a sua localização no alvo irá flutuar o tempo todo; esta
é apenas uma maneira de verificar e ver onde você está; nada mais,
nada menos. Se não gostar da sua localização, poderá escolher
fazer uma coisa de modo diferente que possa movê-lo para um
círculo mais próximo da mosca. É mais ou menos como conduzir
um transatlântico: você não pode dar uma guinada rápida, mas
pode virar o leme levemente, e, com o tempo, isso fará uma grande
diferença na direção do navio.
ESCOLHENDO DIREÇÕES
VALORIZADAS: CONFIGURANDO A
DIREÇÃO DA BÚSSOLA
O processo de fazer contato experiencial muito próximo com os próprios
valores é uma das experiências clínicas mais intensas e íntimas na ACT. As
pessoas sabem intuitivamente que aquilo com que se importam mais
profundamente também é onde mais podem ser machucadas e, assim, muito
raramente podem permitir que essas áreas sejam vistas pelos outros. Depois
do trabalho com os valores, o terapeuta provavelmente se torna íntimo de
informações que nunca foram compartilhadas com mais ninguém. Usada de
forma apropriada, essa mesma intimidade pode servir como base para o
árduo trabalho terapêutico de implementar mudança de comportamento
baseada em valores.
Na ACT, o processo de avaliação dos valores serve a uma variedade de
propósitos de avaliação e intervenção. Primeiramente, o cliente pode tomar
consciência de valores suprimidos há muito tempo. Esse processo é
motivacional no sentido de que o cliente pode encontrar discrepâncias
importantes entre direções valorizadas na vida e comportamentos atuais.
Referimo-nos a essa defasagem como a discrepância “valores-
comportamento”, e ela é com frequência a força estimulante no processo de
mudança de comportamento na ACT. Segundo, discussões sobre valores, se
manejadas apropriadamente pelo terapeuta, criam um sentimento positivo
baseado em potencialidades para a conversa terapêutica. A maioria das
pessoas tem motivações altruístas na vida: elas querem ser boas amantes,
bons cônjuges, boas amigas, etc. Essas motivações são básicas para a
natureza social dos seres humanos. O processo de avaliação dos valores
pode ajudar a deslocar a conversa terapêutica do foco em falhas, déficits e
problemas para a ênfase das bases perfeitas e intocadas da vida do cliente.
Em um mundo repleto de imperfeições, os valores de uma pessoa são
perfeitos. Os valores de uma pessoa podem não ser o que outra pessoa acha
que deveriam ser, mas eles são sempre perfeitos e completos dentro da
própria pessoa. Muitos clientes chegam à terapia com um sentimento de
que, em um nível profundo, mais fundamental, eles são, de algum modo,
terrivelmente falhos. É difícil imaginar algo mais fundamental do que os
valores de uma pessoa, e pode ser empoderador e edificante descobrir que
temos uma base sem falhas. Depois de examinar os valores com um cliente,
um terapeuta ACT pode perguntar: “Há alguma coisa que está faltando em
relação a esses valores? Alguma coisa poderia ser melhorada de alguma
maneira?”. Se o cliente puder pensar em alguma coisa que possa ser
melhorada, a melhora é atingida por essa própria consciência. No sentido
básico, tudo o que o cliente cria é perfeito.
Um benefício final da construção de valores é que ele pode desencadear
uma percepção de que a vida está acontecendo agora – ela não está distante
em algum lugar no futuro. O relógio está avançando, mas não de uma forma
ruim. Por mais estranho que pareça, existe um apoio social limitado (na
melhor das hipóteses) para que pensemos constantemente em nossos
valores, em comparação com a forma como estamos vivendo a vida no
momento. Somos encorajados a deixar essa questão de lado porque seria
uma ameaça inegável à ordem social contemporânea se as massas se
mantivessem “ligadas” e começassem a realmente questionar a utilidade de
“valores” amplamente promulgados e socialmente construídos. O sabor e o
tom incomum do trabalho com os valores na ACT ajudam o cliente a ficar
1.
2.
“localizado” no presente, o que com frequência leva a discussões concretas
sobre comportamentos específicos que podem ser mudados ou modificados.
Na maior parte do tempo, esses comportamentos não serão suscitados pelo
meio social circundante, mas virão de dentro.
Os pesquisadores e praticantes da ACT desenvolveram uma ampla gama
de ferramentas para trabalhar os valores. Obras inteiras foram dedicadas ao
trabalho com valores dentroda perspectiva da ACT (p. ex., Dahl, Plumb,
Stewart, & Lundgren, 2009), e diferentes contextos e estilos clínicos
permitem diversas abordagens do trabalho com valores. Neste capítulo,
descrevemos uma abordagem clínica aplicável mais geral, mas os leitores
com necessidades mais específicas devem consultar Dahl e colaboradores
(2009) e outras fontes da ACT para abordagens alternativas menos
demoradas.
O processo de valores que descrevemos mais detalhadamente é um
processo relativamente estruturado que é útil como um tipo de exercício
ampliado (para avaliações rápidas, o Na mosca é mais útil). As etapas são:
O terapeuta descreve o processo de avaliação dos valores para o
cliente.
O cliente completa a planilha Avaliação dos Valores (veja a Figura
11.1), seja durante uma sessão, seja como uma tarefa de casa entre as
sessões. Essa forma de avaliação ajuda o cliente a “registrar” os temas
que emergiram durante o trabalho na sessão. Os valores enumerados
serão mencionados repetidamente durante o restante da ACT; portanto,
o terapeuta precisa examinar o trabalho de construção de valores com
o cliente para verificar se as principais visões do cliente são registradas
de modo acurado. Esse processo de revisão é realizado ao longo das
próximas etapas.
A seguir, apresentamos as áreas de vida que são valorizadas por algumas pessoas. Nem
todas têm os mesmos valores, e esta planilha não é um teste para ver se você tem os valores
“corretos”. Descreva seus valores como se ninguém jamais fosse ler esta planilha. Enquanto
trabalha, pense em cada área em termos dos objetivos concretos que você tem e também em
termos das direções de vida mais gerais. Assim, por exemplo, você pode valorizar o
casamento como um objetivo concreto e ser um cônjuge carinhoso como uma direção
valorizada. O primeiro exemplo, casar, é algo que pode ser concluído. O segundo exemplo,
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ser um cônjuge carinhoso, não tem fim. Você sempre pode ser um cônjuge mais carinhoso,
independentemente do quanto já seja. Você também pode trabalhar para ser um cônjuge
carinhoso mesmo que não seja casado ou não esteja em um relacionamento. Por exemplo,
pode haver maneiras de se preparar para que um relacionamento íntimo tenha maior
probabilidade de sucesso ou tenha sucesso. Trabalhe em cada um dos domínios da vida.
Alguns deles se sobrepõem. Você pode ter problemas em separar família de
casamento/relações íntimas. Faça o seu melhor para mantê-los separados. Seu terapeuta lhe
dará assistência quando vocês discutirem a avaliação dos objetivos e valores.
Numere claramente cada seção e as mantenha separadas umas das outras. Você pode não
ter objetivos valorizados em determinadas áreas. Poderá, então, pular essas áreas e discuti-
las diretamente com seu terapeuta. Também é importante anotar o que você valorizaria se
não houvesse obstáculos em seu caminho. Não estamos perguntando o que você acha que
poderia obter realisticamente ou o que você ou outras pessoas acham que você merece.
Queremos saber com o que você se importa, em quais questões gostaria de trabalhar, na
melhor de todas as situações. Enquanto preenche esta folha de trabalho, finja que ocorreu
uma mágica e que tudo é possível.
Nota: No uso clínico, acrescente espaços abaixo de cada uma destas categorias.
Relações familiares (que não sejam casamento ou parentalidade). Nesta seção,
descreva o tipo de irmão/irmã, filho/filha, pai/mãe que você deseja ser. Descreva as
qualidades que gostaria de ter nesses relacionamentos. Descreva como trataria essas
pessoas se você fosse aquele você ideal nessas várias relações.
Casamento/casais/relações íntimas. Nesta seção, faça uma descrição da pessoa
que você gostaria de ser em um relacionamento íntimo. Escreva o tipo de
relacionamento que gostaria de ter. Tente focar no seu papel nessa relação.
Parentalidade. Que tipo de pai/mãe você gostaria de ser, tanto agora como no
futuro?
Amizades/vida social. Nesta seção, escreva o que significa para você ser um bom
amigo. Se pudesse ser o melhor amigo possível, como você se comportaria em
relação aos seus amigos? Tente descrever uma amizade ideal.
Carreira/emprego. Nesta seção, descreva o tipo de trabalho que você gostaria de
fazer. Essa descrição pode ser muito específica ou muito geral. (Lembre-se, isso se
passa em um mundo ideal.) Depois de escrever sobre o tipo de trabalho que gostaria
de fazer, escreva por que ele o atrai. A seguir, discuta que tipo de trabalhador você
gostaria de ser no que diz respeito ao seu empregador e colegas. Como você
gostaria que fossem suas relações no trabalho?
Educação/treinamento/crescimento e desenvolvimento pessoal. Se você gostaria
de buscar uma instrução, formal ou informalmente, ou fazer algum treinamento
especializado, escreva sobre isso. Escreva por que esse tipo de treinamento ou
instrução o atrai.
Recreação/diversão. Discuta o tipo de vida recreativa que você gostaria de ter,
incluindo hobbies, esportes e atividades de lazer.
Espiritualidade. Não estamos necessariamente nos referindo à religião organizada
nesta seção. O que pretendemos dizer com espiritualidade é o que quer que ela
9.
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3.
signifique para você, seja ela tão simples quanto estar em comunhão com a
natureza, seja tão formal quanto a participação em um grupo religioso organizado.
Independentemente do que espiritualidade significa para você, está bem. Se esta for
uma área importante da sua vida, escreva sobre como você gostaria que ela fosse.
Como ocorre com todas as outras áreas, se esta não for uma parte importante dos
seus valores, pule para a próxima seção.
Vida em comunidade. Para algumas pessoas, a participação em assuntos da
comunidade é uma parte importante da vida. Por exemplo, algumas pessoas acham
que é importante serem voluntárias para trabalhar com desabrigados ou idosos,
influenciar legisladores governamentais em âmbito federal, estadual ou local,
tornar-se membro de um grupo comprometido com a preservação da vida selvagem
ou participar na estrutura de atendimento de um grupo de autoajuda, como os
Alcoólicos Anônimos. Se esses tipos de atividades orientadas para a comunidade
forem importantes para você, escreva sobre a direção que você gostaria de tomar
nessa área.
Autocuidados de saúde/físicos. Nesta seção, inclua seus valores relacionados à
manutenção do seu bem-estar físico. Escreva sobre questões relacionadas à saúde,
tais como sono, dieta, exercício, tabagismo e afins.
Ambiente/sustentabilidade. Nesta seção, inclua seus valores relacionados àqueles
que você pode ter na área de sustentabilidade e preocupações com o planeta, em
especial com o ambiente natural.
Arte/estética. Nesta seção, inclua seus valores relacionados a ocupações como arte,
música, literatura, artesanato ou alguma outra forma de beleza no mundo que seja
significativa para você – considerando coisas que você mesmo faz ou coisas que
outros fazem e que você aprecia.
FIGURA 11.1 Planilha Avaliação dos Valores.
O terapeuta e o cliente discutem os valores citados em cada domínio e,
juntos, geram breves narrativas dos valores para cada domínio que
simplifiquem, foquem e incluam as declarações de valores que estão
fora do formulário da planilha (veja a Figura 11.2, Formulário para
Narrativa dos Valores). Em geral, a principal tarefa do terapeuta é
ajudar o cliente a distinguir objetivos de valores e descrever os valores
em termos de direções, não meramente fins concretos. Assim, o
terapeuta aporta seu conhecimento técnico dos valores a partir de uma
perspectiva da ACT para o processo de refinamento das narrativas do
cliente para narrativas de valores que satisfaçam às exigências de
definição dos valores.
4.
O terapeuta gera uma breve narrativa para cada domínio, com base na discussão da tarefa de casa de
avaliação dos valores do cliente. Se nada for aplicável, escreva “nada”. Depois de gerar todas as
narrativas, leia cada uma para o cliente e as refine ainda mais. Continue esse processo ao mesmo
tempo em que fica atento a respostas do tipo pliance, até que você e o clientecheguem a uma breve
declaração que o cliente concorda que seja consistente com seus valores em determinado domínio.
Domínio Narrativa da direção valorizada
Relações familiares (que não sejam casamento ou parentalidade)
Casamento/casais/relações íntimas
Parentalidade (maternidade/paternidade)
Amizades/relações sociais
Carreira/emprego
Educação/treinamento/crescimento e desenvolvimento pessoal
Recreação/diversão
Espiritualidade
Vida em comunidade
Autocuidados de saúde/físicos
Ambiente/sustentabilidade
Arte/estética
FIGURA 11.2 Formulário de Narrativa dos Valores.
Quando as narrativas estiverem terminadas, o cliente gera
classificações preenchendo o Questionário da Vida Valorizada-2
(VLQ-2; Wilson et al., 2010), que é apresentado na Figura 11.3. (Pode
ser útil para o clínico, como um tipo de exercício, também fazer
posteriormente um conjunto de classificações similar.) O propósito dos
dois conjuntos de avaliações (clientes e terapeutas) é, em parte, ajudar
a identificar áreas em que o clínico e o cliente não estão se
comunicando, o que orienta quanto às áreas que podem precisar de
esclarecimento adicional por meio da discussão.
A seguir, estão as áreas da vida que são valorizadas por algumas pessoas. Estamos interessados na
sua qualidade de vida em cada uma dessas áreas. Há vários aspectos que lhe pedimos para classificar.
Faça a si mesmo as seguintes perguntas quando fizer as avaliações em cada área. Nem todos irão
valorizar todas essas áreas ou valorizá-las da mesma forma. Classifique cada área de acordo com a
sua visão pessoal.
Possibilidade: O quanto é possível que alguma coisa muito significativa aconteça nessa área da sua
vida? Classifique o quanto você acha que é possível em uma escala de 1 a 10. 1 significa que não é
possível de forma alguma, e 10 significa que é muito possível.
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Importância atual: O quanto esta área é importante neste momento na sua vida? Classifique a
importância em uma escala de 1 a 10. 1 significa que não é importante de forma alguma, e 10
significa que é muito importante.
Importância geral: O quanto esta área é importante como um todo? Classifique a importância em
uma escala de 1 a 10. 1 significa que não é importante de forma alguma, e 10 significa que é muito
importante.
Ação: O quanto você atuou a serviço desta área durante a semana passada? Classifique seu nível de
ação em uma escala de 1 a 10. 1 significa que você não foi ativo de forma alguma com este valor, e
10 significa que você foi muito ativo.
Satisfeito com o nível de ação: O quanto você está satisfeito com seu nível de ação nesta área
durante a semana passada? Classifique sua satisfação neste nível de ação em uma escala de 1 a 10. 1
significa que você não está satisfeito de forma alguma, e 10 significa que você está plenamente
satisfeito com seu nível de ação nesta área.
Preocupação: O quanto você está preocupado com a possibilidade de esta área não progredir como
você deseja? Classifique seu nível de preocupação em uma escala de 1 a 10. 1 significa que você não
está preocupado de forma alguma, e 10 significa que você está muito preocupado.
Possibilidade Importância
atual
Importância
geral
Ação Satisfeito com
ação
Preocupação
Família (que não sejam casamentos ou
parentalidade)
Casamento/casais/relação íntima
Parentalidade (maternidade/paternidade)
Amizades/vida social
Trabalho
Educação/treinamento
Recreação/diversão
Espiritualidade
Vida em comunidade
Autocuidados físicos (dieta/
exercício/sono)
Ambiente (preocupação com o planeta)
Estética (arte, música, literatura, beleza)
FIGURA 11.3 Questionário da Vida Valorizada-2. De Mindfulness for Two. Copyright 2009 Kelly G.
Wilson e Try DuFrene. Reproduzida com permissão de New Harbinger Publications, Inc.
A planilha de avaliação dos valores do cliente (da etapa 2) é
examinada em conjunto pelo terapeuta e o cliente e, então, modificada
de forma colaborativa. A função do terapeuta durante esse processo é
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esclarecer a direção inerente àquilo que podem ser objetivos concretos
valorizados.
Abordando pliance e counterpliance
O terapeuta também deve avaliar constantemente outros fatores que podem
influenciar as declarações de valores do cliente, particularmente aquelas
envolvendo pliance e counterpliance. O terapeuta deve estar alerta para,
entre outros indicadores, os seguintes sinais de que pliance e counterpliance
podem estar influenciando o processo:
Declarações de valores controladas pela presença do terapeuta,
juntamente com as suposições do cliente sobre o que pode agradar ao
terapeuta. Consequências relevantes seriam sinais da aprovação do
terapeuta e/ou a ausência da desaprovação de sua parte.
Declarações de valores controladas pela presença da cultura de modo
geral. Indicadores relevantes incluiriam a ausência de sanções culturais
e a ampla aprovação social ou prestígio generalizado.
Declarações de valores controladas por valores declarados ou
presumidos dos pais do cliente. Consequências relevantes seriam a
aprovação parental – realmente registrada e/ou verbalmente construída.
Declarações de valores que têm uma qualidade do tipo “tem que” que
pode indicar fusão ou esquiva.
Declarações de valores que são fortemente carregadas com ruminação
sobre o passado e/ou preocupação quanto ao futuro.
É difícil imaginar um cliente que tenha valores que não sejam
controlados em parte ou, às vezes, por todas essas variáveis. A questão
principal é se a remoção da influência relevante afetaria significativamente
a potência do valor como uma fonte de direção na vida. A tarefa de
avaliação não pode ser concluída em apenas uma discussão. É provável que
a questão da “posse” do valor ressurja constantemente. Algumas dessas
questões podem ser mais bem tratadas pedindo-se que o cliente fale sobre o
valor enquanto imagina a ausência de uma consequência social relevante.
Para ilustrar, considere um cliente que endossa o valor de ter bom nível
de instrução. O terapeuta pode perguntar se o nível de valorização (ou o
valor em si) mudaria se tivesse que ser feito anonimamente: “Imagine que
você tivesse a oportunidade de melhorar a sua formação, mas não pudesse
contar a ninguém sobre os diplomas que obteve. Você ainda se dedicaria a
atingir esse valor?” ou “E se sua mãe e seu pai nunca ficassem sabendo que
você buscou instrução – isso ainda teria valor para você?”. Um rumo
diferente também proporcionaria algum insight das variáveis de controle.
Então, por exemplo, o terapeuta perguntaria: “E se você tivesse que
trabalhar duro por um diploma, e sua mãe e seu pai soubessem e tivessem
orgulho disso, mas, no dia seguinte, depois de formado, você esquecesse
tudo o que aprendeu? Você ainda valorizaria o nível de instrução na mesma
medida?”. Quando o cliente considera várias consequências imaginadas,
pode ficar decepcionado ao descobrir que a aprovação parental é o “grande
catalisador”. Nesse caso, “tornar-se instruído” não é exatamente um valor,
mas um objetivo a serviço de algum outro valor (i.e., “ser amado e amar
aqueles que estão na minha vida”). Depois que esse valor é clarificado, ele é
anotado como um fim desejado. Não é incomum que alguns valores mudem
de valência no curso da terapia ou mesmo em função da avaliação inicial.
Valores ausentes
O VLQ-2 pede que o cliente gere respostas que abrangem muitos domínios
de vida separados. Com frequência, os clientes podem chegar com
formulários mostrando um ou mais domínios deixados em branco ou não
respondidos. Com clientes mais disfuncionais, todos os espaços de resposta
aos domínios podem estar vazios ou conter respostas apenas muito
superficiais. Aqui, o terapeuta precisa discutir pacientemente cada domínio
para obter respostas do cliente. Com frequência, é útil voltar ao início da
vida do cliente e procurar exemplos de sonhos, desejos ou esperanças que
desapareceram devido a eventos negativos na vida. Outras vezes, o
terapeuta pode ter de auxiliar o cliente na identificação de valores ocultos
subjacentes aos seus objetivosde vida específicos ou, ao contrário, na
geração de objetivos específicos baseados em valores bem descritos, mas
infundados.
Não é incomum que os clientes listem objetivos de vida específicos que
não podem ser atingidos. Por exemplo, uma mulher pode dizer que gostaria
de recuperar a custódia de um filho que entregou para adoção 10 anos antes.
Nesses casos, o terapeuta tenta encontrar o valor subjacente e os objetivos
que poderiam ser atingidos caso fossem se mover nessa direção. Outra
variação desse problema existe quando o cliente foca em objetivos de vida
inatingíveis como evidência de que ocorreu um dano irreparável e, no
entanto, não há resultados reais significativos disponíveis nesse domínio.
Esta última possibilidade é mais difícil de abordar clinicamente porque os
valores agora estão sendo empregados a serviço do status quo, enquanto a
perspectiva do cliente é a de que não é possível nenhuma mudança ou
apenas uma mudança superficial. Em tais circunstâncias, geralmente é útil
entrar no momento presente e fazer o cliente identificar os sentimentos
específicos que aparecem sempre que ele se depara com esse sentimento de
perda permanente. O terapeuta pode pedir que o cliente identifique o valor
na raiz da dor (p. ex., “Eu queria ser uma boa mãe e achei que meu vício em
metanfetamina acabaria prejudicando minha filha; é por isso que a entreguei
para adoção”). Algumas vezes, a fonte da dor é um valor intimamente
cultivado que o cliente perseguiu com grande custo pessoal. O terapeuta
pode ajudar o cliente a “se conectar” com a expressão desse valor sem
necessariamente assumir uma postura de Poliana sobre o que aconteceu.
INTERAÇÕES COM OUTROS
PROCESSOS CENTRAIS
Em muitos protocolos da ACT, o trabalho com os valores ocorre
tardiamente na intervenção, levando alguns a presumir que, depois que o
trabalho com aceitação e desfusão já foi feito, podemos avançar para os
valores sem dar muita atenção aos processos de mindfulness. No entanto, os
processos de mindfulness na ACT frequentemente removem barreiras
experienciais ao trabalho com valores e reforçam o contato com os valores e
a habilidade do cliente de evoluir e agir segundo os padrões de ação
valorizados.
Valores e desfusão
A atenção à desfusão é praticamente crítica no trabalho com valores. As
pessoas com frequência chegam à terapia com histórias batidas sobre seus
valores. As variantes comuns incluem conteúdo fusionado como “O mundo
não é bem assim” ou “Não importa o que você faça, o mundo vai derrubá-
lo” ou “Ninguém emprega pessoas na minha idade”. Os clientes citam sua
própria história de dificuldades como evidência de que não há sentido em
tentar agir de acordo com seus valores, por exemplo, afligindo-se por conta
de que “Meus relacionamentos sempre fracassam” ou “Meus filhos nunca
vão me dar outra chance”. Nós nos referimos a esse conteúdo negativo
como “fusão de valores”.
Inflexibilidade é o indicador característico da fusão de valores. Essa
inflexibilidade pode assumir várias formas, incluindo inação apesar de
abraçar fortemente certos valores, negação de que a pessoa até mesmo tem
valores e/ou completa recusa a considerar certos domínios como sujeitos a
valores. Outra variação da fusão de valores inclui apego rígido a um
resultado positivo particular ou forte esquiva de um resultado negativo,
provocando a perda da flexibilidade do cliente para avançar no domínio
valorizado.
Há vezes no trabalho com valores em que a fusão parece funcionar a
serviço dos valores. Essa circunstância pode ser particularmente insidiosa,
já que a fusão de valores pode, na verdade, produzir alguns bons resultados
(p. ex., “Se eu for gentil com todos, então todos serão gentis comigo, e vou
me sentir cuidado”). O problema reside na inflexibilidade e na
insensibilidade que a fusão produz. A marca de nível máximo no trabalho
com valores é a valorização desfusionada. Um valor pode ser sustentado
com leveza, mas ainda assim ser buscado vigorosamente. A vantagem do
valor desfusionado é a de que o cliente é mais capaz de perceber quando o
abandono de um ato valorizado particular é a melhor maneira de servir ao
mesmo valor em longo prazo. Algumas vezes, fazer alguma coisa que a
princípio é contrária ao valor serve funcionalmente ao valor. Permitir que os
filhos cometam alguns erros pode ser difícil para os pais, mas é vital para a
experiência de aprendizagem dos filhos. A adesão inflexível a uma regra
sobre proteger seus filhos de danos pode levar à superproteção e sufocar a
necessidade das crianças de desenvolver sua própria autonomia.
Os terapeutas podem ser tentados a prosseguir o trabalho com valores
como algo que o cliente “deve fazer”, especialmente quando existe uma
direção claramente valorizada que este último gostaria de tomar. Fazer isso
provavelmente gera ainda mais fusão de valores por parte do cliente. Se os
clientes deveriam estar dispostos a agir, então esse imperativo pode se
tornar mais uma coisa para eles se autoflagelarem – mais uma evidência de
que “Eu sou inadequado”. Em vez de pressionar o trabalho com valores, a
emergência de persistência inflexível, inação ou confusão de valores
persistente deveria estimular o terapeuta a avaliar e tratar o conteúdo
fusionado. Nesse ponto, o trabalho pode retornar aos valores.
Valores e self
A obstrução mais comum ao trabalho com valores no domínio do self é o
apego excessivo à narrativa do self conceitualizado, como com afirmações
do tipo: “É tarde demais para mim – já cometi muitos erros que não podem
ser redimidos” ou “Eu tenho alguma falha que torna impossível conseguir
atingir qualquer coisa nesse domínio” (p. ex., “Não sou suficientemente
inteligente”, “suficientemente bom”, “suficientemente entusiasmado” ou
“suficientemente agradável”). Algumas vezes, a falha não é conhecida, mas
é afirmada com grande certeza: “Não sei o que há de errado comigo, mas
veja a minha vida!”. A emergência de tais temas deve sugerir que o
terapeuta faça um trabalho que envolva fortalecer a consciência no
momento presente do paciente e o self observador. Com muita frequência, o
apego às histórias sobre si mesmo funciona para proteger o cliente de se
importar com resultados importantes na vida. As narrativas de “não tentar”,
“propenso ao fracasso” e “veja o que acontece quando alguma coisa é
importante!” devem abrir espaço para discussões sobre os sentimentos que
surgem nos exatos momentos em que as histórias aparecem e a capacidade
de olhar para as histórias sobre si mesmo como ouvinte, não como
participante.
Valores e aceitação
É comum que os indivíduos evidenciem exemplos de esquiva experiencial
relacionados a valores. Existe uma interação constante entre valores e
vulnerabilidades. Quando estamos conscientes do que alguém valoriza,
sabemos como machucá-lo. Se uma pessoa valoriza a sua consideração, o
desrespeito direcionado a ela será doloroso. Essa característica da interação
perpassa domínios valorizados. Um artista pode evitar pintar um tema ou
uma pessoa em particular por causa da dor que surgiria se ele fracassasse
em sua expressão artística. O bloqueio de um escritor frequentemente
compartilha dessa qualidade. Quando as pessoas passam por um fracasso
doloroso no relacionamento e por um consequente divórcio, elas podem
evitar situações e atividades que possam levar ao desenvolvimento de outra
relação íntima. A esquiva produz algum alívio no curto prazo, mas, com o
tempo, deixa a pessoa em descompasso com valores sobre intimidade.
Como ocorre com a fusão, o marcador para essa esquiva é a inflexibilidade
do cliente durante as discussões dessas questões na sessão e a evitação de
situações na vida nas quais poderia agir de forma mais consistente com o
valor. Quando o terapeuta vê comportamentos repetitivos, tais como falsos
começos repetidos, preocupações e ruminação relacionada à ação sobre um
valor, é hora de mudar o foco do trabalho com os valores para um foco em
intervenções orientadas para a aceitação. Às vezes, um trabalho mesmo
breve de aceitação pode liberar o cliente para agir de formas mais
consistentescom seus valores.
Valores e o momento presente
A incapacidade de avançar em uma direção valorizada frequentemente
envolve falhas nos processos do momento presente. Com clientes mais
difíceis, conversas sobre direções valorizadas se transformam na
reintrodução ruminativa de falhas passadas e/ou preocupação obsessiva
sobre o caminho a seguir ou sobre todos os obstáculos potenciais que
podem surgir. O pai divorciado pode gastar tanto tempo ruminando falhas
passadas quanto um pai que perdeu o contato com a simples doçura de ser
pai. Em tentativas repetidas de refletir sobre o passado e de se afastar de
possíveis futuros negativos, a pessoa perde oportunidades de agir segundo o
valor da paternidade no momento presente.
Quando o terapeuta nota essas falhas dos processos do momento
presente, é hora de mesclar mindfulness e intenções baseadas no momento
presente (p. ex., O que surgiu para você quando falamos a respeito dos seus
valores sobre ser pai? Você estaria disposto a apenas se aquietar e deixar
que esses sentimentos, lembranças e avaliações estejam aqui?). Fusão e
esquiva encontram muita dificuldade para sobreviver no momento presente.
Elas são mais compatíveis com o passado e o futuro e prosperam em
conversas sobre passado/futuro. É claro, conversar sobre viver os próprios
valores está inerentemente relacionado a viver, seguir em frente. Planejar o
futuro e aprender com o passado fazem parte disso. No entanto, os
terapeutas devem focar em intervenções que se movimentam flexivelmente
entre planos futuros e apreciação atenta dos domínios valorizados no
momento presente.
Valores e compromisso
Um dos objetivos do trabalho com os valores é gerar ações potenciais que
sejam consistentes com os valores da pessoa. Diante disso, é um pouco
irônico que assumir e manter compromissos pode ser um dos maiores
obstáculos para o trabalho com valores. Quando trabalhamos os valores
com os clientes, as implicações desses valores na ação também emergem.
Quando domínios valorizados foram negligenciados ou violados por um
longo tempo, a própria ideia de escolher ações nessas áreas – ou mesmo que
tais escolhas estejam prestes a acontecer – pode gerar fusão e esquiva
significativas. Como regra, os terapeutas devem despender energia
considerável na compreensão da valência psicológica dos valores antes de
passar às discussões sobre ação de compromisso. Em essência, o terapeuta
precisa entender as implicações psicológicas de fazer o cliente começar a
agir em um domínio valorizado. Como essa ação está associada à história
do cliente sobre si mesmo? Quais são as fontes potenciais de fusão se o
cliente começar a fazer movimentos nessa área? Quando os terapeutas
encontram dificuldades significativas no trabalho com valores,
Cliente:
Terapeuta:
Cliente:
Terapeuta:
Cliente:
Terapeuta:
Cliente:
Terapeuta:
frequentemente é útil retirar de cena o compromisso. A seguinte transcrição
de uma sessão mostra como uma conversa assim pode se desenvolver.
Acho que não consigo suportar outra rejeição. O divórcio foi
terrível! A ideia de convidar alguém para sair... bem, simplesmente
não consigo fazer isso!
Então, quando falamos sobre relações íntimas, você começa a
pensar em namorar?
Bem, sim, é para onde isso vai, não é? Quero dizer, quando minha
esposa me deixou, eu sabia por quê. Eu também teria me deixado
se pudesse! Eu não mudei. Isso vai acontecer de novo. E como eu
faria isso? Fazer parte de um desses serviços de namoro on-line?
Eu simplesmente... simplesmente não estou pronto.
Uau! Isso é avassalador! Enquanto conversávamos, me pareceu
que você estava sendo sufocado pela complexidade e
impossibilidade de tudo isso. Sinto-me um pouco relutante até
mesmo em perguntar alguma coisa sobre esta área... sobre
intimidade. Se você quiser que eu pare, eu paro, mas posso fazer
apenas algumas perguntas? E, se você disser “não” a qualquer
momento, eu estou com você. Iremos parar. Esse é o meu
compromisso com você. O que acontece é que parece que existe
alguma coisa no meio de toda essa dor que é importante para você,
e não quero negligenciá-la... passar por cima dela como se nada
tivesse acontecido.
Bem, sim, é claro que é importante. Não há nada mais importante
para mim.
Então, tudo bem? Tudo bem se eu fizer algumas perguntas?
Prometo que vou devagar e deixo a opção de parar em aberto a
cada etapa.
Com certeza… Quero dizer, eu tenho que enfrentar essa coisa.
Humm. Não sei. Não gosto muito de “tenho que”. Com certeza
não quero ser mais uma pessoa na sua vida que se une ao coro e diz
o que você tem que fazer. E, quanto a isso – porque é evidente para
mim o quanto isso é importante –, não sei se posso realmente
entendê-lo sem ter alguma apreciação da forma como esse valor o
move. Portanto, que tal isto – que tal se, por alguns momentos,
deixarmos de perguntar se isso é possível ou como fazer isso
acontecer. Esta é outra conversa, e podemos ter essa conversa outro
dia. Mas hoje, bem aqui e agora, você estaria disposto a apenas me
ajudar a entender o que significa intimidade para você? Não estou
querendo que dê uma explicação. O que mais me interessa é
apreciar do que entender. É mais como o que você faria com uma
pintura do que o que faria com um livro didático. O livro didático é
algo no qual você checa todos os fatos. Com a pintura, você apenas
a contempla, aprecia, passa algum tempo com ela. Você estaria
disposto a me ajudar a ver um momento de intimidade que você
conheceu ou do qual tem saudade? Como eu disse, mais tarde
podemos falar sobre o que fazer e se vai ser feita alguma coisa a
respeito. Mas, por enquanto, você estaria disposto a apenas me
ajudar a ter uma ideia do que isso significa para você?
Algumas vezes, é mais fácil entrar em contato com os valores quando a
ação de compromisso é pelo menos momentaneamente deixada de lado.
Trabalhar dessa maneira pode dosar o trabalho de aceitação e desfusão que,
por fim, tornará possível a ação de compromisso. A ACT é, na sua essência,
um tratamento comportamental. Seu objetivo final é ajudar o cliente a
desenvolver e manter uma trajetória comportamental na vida que seja vital e
valorizada. Todas as técnicas da ACT estão, em última instância,
subordinadas a ajudar o cliente a viver de acordo com seus valores
escolhidos. Essa afirmação significa que mesmo intervenções essenciais da
ACT como desfusão e aceitação são, de certo modo, secundárias. Por
exemplo, embora a ACT seja emocionalmente evocativa, ela difere de
algumas abordagens focadas na emoção na medida em que não há interesse
em confrontar experiências privadas dolorosas ou evitadas pelo seu valor
intrínseco. Em vez disso, a aceitação de pensamentos, lembranças, emoções
e outros eventos privados negativos é legítima e louvável somente na
medida em que serve aos fins que são valorizados pelo cliente. Ajudar o
cliente a identificar direções de vida valorizadas (tratadas neste capítulo) e a
implementá-las em face de obstáculos emocionais (o próximo capítulo)
direciona e dignifica o que a ACT espera dos clientes.
O QUE FAZER E O QUE NÃO FAZER
NA TERAPIA
Uso coercitivo da escolha
Existe um lado potencialmente obscuro da intimidade terapêutica que se
desenvolve quando a valorização está em questão. Com frequência ela
desloca terapeuta e cliente para o domínio dos julgamentos morais. Regras
morais são convenções sociais sobre o que é bom, enquanto valores são
escolhas pessoais sobre fins desejáveis. Para que seja o mais eficaz
possível, o terapeuta ACT deve ser capaz de trabalhar conscienciosamente
com o cliente. Alguns clientes apresentam histórias ou problemas atuais que
são moralmente repugnantes para o terapeuta, tais como violência, adição,
comportamento suicida repetitivo e molestamento infantil, só para citar
alguns. O trabalho de avaliação dos valores frequentemente expõe essas
áreas; no entanto, o terapeuta em ACT não pode ser atraído para o papel de
“detetive moral”, usando a influência social da terapia para coagir o cliente
aberta ou implicitamente a se adequar aos valores sociais amplamente
aceitos.O terapeuta faz o mesmo movimento que o cliente é solicitado a
fazer, ou seja, ver a valorização como essencialmente um exercício pessoal.
Por exemplo, ao trabalhar com um alcoolista no modelo da ACT, não
existe o pressuposto de que estar intoxicado diariamente é incompatível
com viver a vida em uma direção valorizada pelo cliente. Uma vez que
valores e direção são escolhas do cliente, na verdade é um resultado
legítimo que o cliente escolha abusar do álcool. A linguagem e cultura do
“politicamente correto”, é claro, faz parecer que esta é definitivamente a
“escolha errada” porque os interesses da sociedade não são atendidos pelo
sancionamento do alcoolismo. A terapia é uma empreitada verbal e,
portanto, está inextricavelmente entrelaçada com as funções de controle
social. O terapeuta deve evitar cair na armadilha de usar a escolha como
uma forma de culpar o cliente.
A linguagem da “livre escolha” é poderosa, mas não deve ser usada para
coagir o cliente. Essa coerção costuma ocorrer quando o terapeuta assume
uma atitude como: “Bem, é claro, se você escolher continuar bebendo, esta
é uma escolha sua. Você tem que fazer essas escolhas. Não posso fazer isso
por você. Apenas lembre que esta é a escolha que você fez quando chegar a
hora de arcar com as consequências”. Embora essa postura possa ser
tecnicamente correta (é a escolha do cliente, e somente ele pode viver as
consequências), a atitude psicológica é: “A escolha que você está fazendo
aqui, além de me decepcionar, mostra que você está moralmente errado.
Decepção e julgamento moral são coisas que o terapeuta deve notar e
conter com leveza. Essas reações constituem dados para o terapeuta. É
muito provável que o cliente tenha obtido essa mesma reação de outras
pessoas e até mesmo pode ter muitas dessas reações internamente. Observar
de forma gentil essas reações e indagar sobre elas pode, às vezes,
paradoxalmente ajudar as pessoas a fazer contato mais preciso e menos
defensivo com suas próprias escolhas. É importante ter em mente que, se
lições de moral ou julgamentos mudassem o problema com álcool, haveria
muito menos alcoolistas neste mundo.
Em raras ocasiões, um cliente pode apresentar valores que são tão
divergentes dos do terapeuta que uma relação de trabalho colaborativa não
pode ser estabelecida. Nesses casos, o terapeuta deve encaminhar o caso
para outro profissional. Na vasta maioria dos casos, no entanto, os valores
do cliente e do terapeuta são suficientemente parecidos para que não se
desenvolva uma cisão básica sobre direções de vida valorizadas.
Confundir valores com objetivos
Um problema comum no trabalho com valores é a falha do terapeuta em
detectar objetivos que são apresentados como valores pelo cliente. Por
exemplo, o cliente pode dizer: “Eu quero ser feliz”. Isso parece ser um
valor, mas não é. Ser feliz é algo que você pode ter ou não ter, como um
objeto. Um valor é uma direção – uma qualidade de ação. Por definição,
valores não podem ser adquiridos e mantidos em um estado estático – eles
devem ser vividos. Quando os objetivos são erroneamente confundidos com
valores, a incapacidade de atingir um objetivo aparentemente anula o valor.
Um modo prático de evitar essa confusão é colocar uma declaração de
objetivo ou valor produzida pelo cliente sob escrutínio: “Isso está a serviço
do quê?” ou “O que você poderia fazer se isso fosse atingido?”. Muito
frequentemente, esse exercício irá revelar o “valor oculto” que não foi
declarado.
Alguns “valores” são, na verdade, meios para um fim, caso no qual eles
não são valores de forma alguma. Um modo de pensar nos valores é como
valores como meios versus valores como fins. Valores como meios são
coisas que são valorizadas porque podem produzir certos fins. Por exemplo,
uma pessoa pode valorizar ser rica; no entanto, riqueza é valiosa porque
permite que outros valores sejam perseguidos, como segurança para si
mesmo e os filhos ou um desejo de ajudar outras pessoas menos
afortunadas. O valor oculto aqui é se importar consigo mesmo, com a
família e com os menos afortunados. Outro valor como meio comum é a
promoção da saúde pessoal. Estar saudável pode parecer melhor do que a
sua alternativa, mas o real valor na proteção da saúde é que isso nos
possibilita fazer coisas que são valorizadas na vida, tais como viajar,
conduzir sua filha ao altar no casamento dela, passar os “anos dourados”
com um parceiro de toda a vida, etc. Valores como fins, em contrapartida,
são resultados na vida que são valorizados por si só, mesmo que também
possam desencadear outros resultados valorizados. Por exemplo, podemos
valorizar a paternidade/maternidade, e isso pode produzir reconhecimento
pessoal e reconhecimento dos pares. No entanto, é improvável que
deixássemos de valorizar a paternidade/maternidade se o reconhecimento
social não estivesse disponível. Compare isso com o dinheiro como valor.
Se o dinheiro parasse de produzir bens materiais – digamos, devido à
completa desvalorização de uma moeda –, ganhar dinheiro deixaria de ser
um valor.
A esquiva experiencial é um bom exemplo. A relação entre meios e fins é
revelada se o terapeuta pergunta: “A evitação da ansiedade estaria a serviço
do quê?” ou “O que você conseguiria fazer se pudesse evitar a ansiedade?”.
O cliente pode responder que, então, seria possível viver uma vida mais
valorizada. O terapeuta poderia perguntar: “Se você não estivesse ansioso, o
que estaria fazendo que lhe diria que está vivendo uma vida mais
valorizada?”. Evitar a ansiedade é um pseudovalor, e muito do impacto da
ACT provém simplesmente de organizar isso e avançar diretamente para
ações associadas a valores. Quando os valores implícitos nas ações atuais se
tornam explícitos, o cliente com frequência os rejeita. Por exemplo, o
cliente provavelmente não escolheria um epitáfio que dissesse “Aqui jaz
Fred. Ele passou sua vida evitando a ansiedade”.
A sociedade contemporânea está dominada por um foco em resultados
semelhantes a um objeto (i.e., objetivos que são atingidos). Na maioria dos
casos, na primeira vez que o cliente completa esse exercício sobre valores, o
que ele produz se parece mais com um exercício de definição de objetivos
do que com um exercício de escolha de direções valorizadas. A função do
terapeuta é detectar essa confusão entre processo e resultado e ajudar o
cliente a conectar objetivos comportamentais específicos aos valores.
Ordem do trabalho com valores
Já enfatizamos repetidamente que a ordem na qual os processos centrais da
ACT são tratados neste livro não tem nenhuma relação com sua ordem de
aparecimento na terapia, e o trabalho com valores é um excelente estudo de
caso dessa questão. Alguns terapeutas em ACT gostam de usar o trabalho
com valores durante as sessões iniciais da terapia. A justificativa para essa
abordagem é que colocar os clientes “em contato” com seus valores, assim
como com o custo do comportamento inflexível em relação aos resultados
de vida valorizados, é uma boa maneira de motivá-los a permanecer em
terapia e fazer mudanças. Alguns problemas clínicos complexos (i.e.,
adição crônica a drogas ou álcool) são bons candidatos para essa
abordagem, especialmente quando a questão principal é manter o cliente
envolvido na terapia. Existem versões “mais suaves” de uma abordagem
completa de construção de valores, em que a sessão inicial envolve uma
conversa sobre os desejos de vida do cliente e o impacto que o
“comportamento-problema” teve sobre esses desejos. Na prática, existe uma
dinâmica fluida constante entre os processos centrais, de modo que as
discussões iniciais dos valores podem imediatamente dar lugar a uma
intervenção de momento presente (p. ex., “O que apareceu para você
quando conversamos sobre seus princípios de vida e como eles foram
afetados pela sua depressão?”). A “arte” da ACT (se é que existe) é a
habilidade de se movimentar harmoniosamente entre os processos centrais
em resposta ao que está acontecendo com o cliente na sessão.
Em geral, desencorajamos a adoção de uma abordagem do tipo
“universal” para o

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