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ENSINO DAS ARTES VISUAIS EM DIFERENTES CONTEXTOS – CENTROS CULTURAIS E PROJETOS SOCIAIS AULA 1 Prof. Fábio de Castilhos Lima A luno: D E LM A C A R O LIN A A LM E ID A S O U Z A S ILV A E m ail: souzadelm a2011@ gm ail.com 2 CONVERSA INICIAL Você já parou para pensar sobre a relação entre arte e cultura? Por vezes, nos deparamos com opiniões que expressam simplesmente que a arte faz parte da cultura de determinada sociedade. E de fato faz. Mas será que essa relação é sempre harmônica? Para respondermos a essa questão, vamos inicialmente explorar o conceito de cultura e alguns de seus desdobramentos. Veremos como as políticas culturais fomentam as manifestações artísticas em diferentes contextos. O papel desempenhado pela cultura no campo da educação também será objeto de discussão ao longo deste material. Abordaremos conceitos que envolvem aspectos da cultura na vida social, como a noção de Interculturalidade e Transculturalidade. Ao final desta leitura, você poderá estender seus diálogos acerca deste tema tão importante em nossa sociedade contemporânea. TEMA 1 – IDEIA DE CULTURA O que você entende por cultura? Diferentes definições de cultura nos fazem compreender esse termo como algo polissêmico. Isso significa que há diferentes compreensões e modos de interpretação para o termo cultura. 1.1 Conceitos de cultura O termo cultura abarca sentidos variados. Para citar alguns deles, podemos pensar em modos de vida de determinada sociedade, em costumes e tradições ensinadas e aprendidas por meio de relações sociais de geração em geração, podemos pensar também no sentido de algo que seja tido como erudito e até mesmo no conceito de cultura com base na ideia de cultivo controlado de determinada espécie. Muitas outras são as possibilidades. Que imagem vem à sua mente ao pensar na palavra cultura? Ao realizarmos uma busca com o termo cultura em um banco de imagens, podemos visualizar, de uma maneira geral, quais imagens são prioritariamente relacionadas ao termo. Abaixo, uma pequena amostra de três imagens selecionadas revela a diversidade de resultados possíveis. A luno: D E LM A C A R O LIN A A LM E ID A S O U Z A S ILV A E m ail: souzadelm a2011@ gm ail.com 3 Figuras 1, 2 e 3 – Pesquisa de imagens com o termo cultura Créditos: R. M. Nunes/Adobe Stock; Pololia/Adobe Stock; Somprasong/Shutterstock. A Figura 1 mostra, em primeiro plano, uma mulher afrodescendente em Salvador, na Bahia, Brasil, vestida com trajes tradicionais das baianas. Ao fundo, vemos artigos artesanais expostos. A Figura 2 mostra uma série de guarda- chuvas dispostos sobre a Rua Petit Champlain, no setor histórico da cidade do Quebec, no Canadá. A Figura 3 mostra uma mão com luva para procedimentos, segurando uma placa laboratorial de Petri com uma cultura de bactérias. Obviamente, a seleção de imagens aqui apontada não pretende esgotar as possibilidades, e sim ilustrar o quão multifacetado pode ser o termo. Um dos principais nomes, entre os pesquisadores, sobre o conceito de cultura é o do pesquisador galês Raymond Williams. O autor dedicou muitos anos de sua vida e obra às reflexões sociológicas acerca do conceito de cultura e seus desdobramentos. Uma de suas obras fundamentais é Cultura, originalmente publicada em 1981 (com tradução para o português em 1992). Nesta obra, Williams (1992, p. 11) busca traçar um panorama acerca do desenvolvimento histórico do termo, assim como diferentes compreensões dele: Podemos distinguir uma gama de significados desde (i) um estado mental desenvolvido - como em "pessoa de cultura", "pessoa culta", passando por (ii) os processos desse desenvolvimento - como em "interesses culturais", "atividades culturais", até (iii) os meios desses processos - como em cultura considerada como "as artes" e "o trabalho intelectual do homem". Em nossa época, (iii) é o sentido mais comum, embora todos eles sejam usuais. Isso significa, portanto, que encontraremos diferentes compreensões de cultura, dependendo do contexto no qual o termo seja empregado. A seguir, veremos outros desdobramentos e implicações desse importante conceito. A luno: D E LM A C A R O LIN A A LM E ID A S O U Z A S ILV A E m ail: souzadelm a2011@ gm ail.com 4 1.2 A centralidade da cultura Outro importante pensador no que diz respeito à cultura é o sociólogo jamaicano Stuart Hall. Para ele, é fundamental a ideia de centralidade da cultura, no qual a cultura teria uma posição central em todos os segmentos da sociedade. Nesse contexto, as sociedades se desenvolveriam de uma maneira mais justa e igualitária, por considerarem prioritariamente os aspectos culturais que as constituem. Segundo Bandeira (2017, p. 17), a "centralidade da cultura é um dos fenômenos de maior impacto para as sociedades contemporâneas, pois implica conhecer as relações possíveis tanto com as áreas sociais e da educação, quanto com a economia, o transporte e o meio ambiente". O conceito de “centralidade da cultura”, conforme proposto por Hall, parte de suas observações das relações sociais na contemporaneidade e aponta para a forma com que os acontecimentos e ambientes sociais são permeados pela cultura nas mais diferentes áreas. De forma mais concreta, o conceito pode ser testemunhado, por exemplo, de maneira crítica pela forma com que a cultura de massa é utilizada para levar o encorajamento ao consumo diretamente aos lares pelo mundo. As contribuições de Stuart Hall para os estudos da cultura apontam para uma mudança de compreensão da linguagem na comunicação (e, portanto, também nas artes visuais), chamada de virada cultural. Essa virada consiste na ideia de que ao utilizarmos a linguagem para nos referirmos a algo, não apenas fazemos uma simples referência a este, mas também contribuímos efetivamente para a forma com que este é visto e considerado pela sociedade como um todo, influenciando diretamente a própria "coisa" em si. (Hall, 1997). Isso significa, portanto, que a forma com a qual comunicamos nossas ideias seja expressando-as por meio de linguagem verbal, escrita ou visual, exige uma responsabilidade ética, ao mesmo tempo em que sugere um empoderamento das linguagens. TEMA 2 – POLÍTICAS CULTURAIS O que são políticas culturais? Você sabia que as instâncias governamentais possuem determinadas responsabilidades na gestão de bens culturais e na disseminação de manifestações culturais? De que forma você observa as políticas culturais praticadas em sua região? A luno: D E LM A C A R O LIN A A LM E ID A S O U Z A S ILV A E m ail: souzadelm a2011@ gm ail.com 5 Propiciar o acesso à cultura é um dever do Estado e exercer esse acesso é um direito dos cidadãos. Segundo a constituição brasileira, em seu Art. 215. “O Estado garantirá a todos o pleno exercício dos direitos culturais e acesso às fontes da cultura nacional, e apoiará e incentivará a valorização e a difusão das manifestações culturais” (Brasil, 1988). E ainda, complementarmente, em seu primeiro parágrafo que “o Estado protegerá as manifestações das culturas populares, indígenas e afro-brasileiras, e das de outros grupos participantes do processo civilizatório nacional'' (Brasil, 1988). Isto posto, cabe aos cidadãos exigirem das autoridades competentes que sejam propostas políticas públicas para a cultura, o que requer participação ativa nas instâncias que permitam consultas e deliberações populares. As políticas públicas para a cultura, além de atenderem à legislação vigente, também fomentam o desenvolvimento social e econômico dos cidadãos envolvidos, que usufruem dos bens públicos e que podem ser beneficiados direta ou indiretamente por meio de editais específicos para diferentes áreas da cultura. Conforme afirma Bandeira (2017, p. 15): O entendimentoda cultura como um direito fundamental das pessoas, além de importante vetor econômico e de inclusão social, possibilitou ao Estado estabelecer com a sociedade parcerias para elaborar políticas públicas que atendam aos interesses da coletividade e respeitem a diversidade cultural. Para além disso, é importante que o Estado valorize as manifestações culturais de seu povo, preservando as tradições que comunicam aspectos integrantes dos modos de vida de grupos sociais. 2.1 Cultura na esfera governamental Que órgão é responsável pela cultura na estrutura de governo do nosso país? Quais são as diferenças entre ministério e secretaria? Historicamente, os planos para a cultura no Brasil sofrem com a falta de continuidade de programas, apresentando grande variação entre governos. Veremos a seguir um pouco sobre o desenvolvimento das instâncias governamentais acerca da cultura. Conforme vimos anteriormente, a cultura desempenha um importante papel para o desenvolvimento da sociedade. Diferentes planos de governo oferecem condições distintas para o espaço que a cultura possui em suas vigências. Acompanhe a seguir as diferentes transformações pelas quais o órgão oficial da cultura passou em nosso país (adaptado de Brasil, 2021): A luno: D E LM A C A R O LIN A A LM E ID A S O U Z A S ILV A E m ail: souzadelm a2011@ gm ail.com 6 ● 1953 a 1985: fazia parte do Ministério da Educação e da Cultura (MEC). ● 1985: tornou-se Ministério da Cultura (MinC), com mais autonomia e objetivos mais específicos. Foi tido como um marco da redemocratização do país. ● 1990: foi reduzido a Secretaria da Cultura. ● 1992: retornou à condição de Ministério da Cultura. ● 2003: o Ministério teve sua estrutura fortalecida, com diretorias específicas para cada área: Gestão Interna, Gestão Estratégica e Relações Internacionais, sendo dotada de sete representações regionais para ter um melhor panorama das especificidades de cada região e teve sua estrutura organizada em seis Secretarias: Fomento e Incentivo à Cultura; Políticas Culturais; Cidadania Cultural; Audiovisual; Identidade e Diversidade Cultural e Articulação Institucional. ● 2016: o Ministério foi extinto, reduzido a Secretaria e reestabelecido a Ministério após 11 dias de muitos protestos pelo país. ● 1º de janeiro de 2019: O MinC foi extinto assim como o Ministério do Esporte e o Ministério do Desenvolvimento Social. Criou-se uma estrutura única para os três ministérios, o Ministério da Cidadania, dentro do qual há a Secretaria da Cultura. ● Novembro de 2019: a Secretaria da Cultura foi transferida do Ministério da Cidadania para o Ministério do Turismo, ao qual é subordinada. As principais diferenças entre o status de Ministério e Secretaria são, entre outras, menor autonomia nas decisões do órgão, diferença de previsões orçamentárias, tendo os ministérios maiores orçamentos aprovados que as secretarias, uma vez que estas são subordinadas àqueles. Além disso, as secretarias não possuem representatividade internacional, ao contrário dos ministérios. 2.2 Plano Nacional de Cultura Está previsto na constituição o Plano Nacional de Cultura (PNC), que constitui as bases legais para que se realizem as articulações necessárias entre as instâncias e os órgãos das esferas públicas para a consecução das melhores condições para fomentar a cultura. O intuito do Plano Nacional de Cultura é que A luno: D E LM A C A R O LIN A A LM E ID A S O U Z A S ILV A E m ail: souzadelm a2011@ gm ail.com 7 se alcancem os seguintes objetivos (Brasil, 1988, incluídos pela Emenda Constitucional n. 48, de 2005): I defesa e valorização do patrimônio cultural brasileiro; II produção, promoção e difusão de bens culturais; III formação de pessoal qualificado para a gestão da cultura em suas múltiplas dimensões; IV democratização do acesso aos bens de cultura; V valorização da diversidade étnica e regional. O Plano Nacional de Cultura estabelece as diretrizes a serem postas em prática pelos diferentes órgãos subordinados à cultura em todo o país. 2.3 Sistema Nacional de Cultura O Sistema Nacional de Cultura (SNC) existe para que o Plano Nacional de Cultura seja posto em prática pelo Estado nas três diferentes esferas (Federal, Estadual e Municipal), contando com a participação da população. Segundo nossa Constituição Federal (Brasil, 1988, incluído pela Emenda Constitucional n. 71, de 2012): O Sistema Nacional de Cultura, organizado em regime de colaboração, de forma descentralizada e participativa, institui um processo de gestão e promoção conjunta de políticas públicas de cultura, democráticas e permanentes, pactuadas entre os entes da Federação e a sociedade, tendo por objetivo promover o desenvolvimento humano, social e econômico com pleno exercício dos direitos culturais. Isso significa que o Estado tem o dever de proporcionar o acesso aos bens culturais e às políticas públicas, mas também significa que os cidadãos têm a responsabilidade de participar da elaboração das políticas públicas, bem como de exigir o cumprimento dessas políticas. TEMA 3 – CULTURA E EDUCAÇÃO Que papel desempenha a educação na relação entre arte e cultura? É importante ressaltarmos que a cultura é mediada em sala de aula, considerando a cultura em diferentes sentidos: a cultura local de onde se ensina e aprende, que está presente e é praticada pelos alunos, a cultura escolar, incluindo-se aí a figura dos professores e suas bagagens culturais e, ainda, a cultura nacional e internacional, sempre presentes na relações sociais. Veremos que a educação é uma peça-chave nessa relação, sendo utilizada de inúmeras formas para a mediação de manifestações artísticas e culturais. A luno: D E LM A C A R O LIN A A LM E ID A S O U Z A S ILV A E m ail: souzadelm a2011@ gm ail.com 8 3.1 Tridimensionalidade da cultura Quando falamos em educação e cultura, é muito importante destacarmos o papel dos projetos educacionais fomentados pelas políticas públicas. Qualquer projeto educacional que esteja inserido nesse contexto, deve considerar a tridimensionalidade da cultura. Conceber a cultura em três dimensões significa compreender e praticar, por meio das ações do projeto a que se propõe, a cultura em suas dimensões simbólica, cidadã e econômica. Mais detalhadamente, isso significa, segundo Brasil (2011, p. 8): A dimensão simbólica é aquela do “cultivo” [...] das infinitas possibilidades de criação expressas nas práticas sociais, nos modos de vida e nas visões do mundo. [...] A dimensão cidadã̃ consiste no reconhecimento do acesso à cultura como um direito, bem como da sua importância para a qualidade de vida e a autoestima de cada um. [...] Na dimensão econômica, inscreve-se o potencial da cultura como vetor de desenvolvimento. Trata-se de dar asas a uma importante fonte geradora de trabalho e renda, que tem muito a contribuir para o crescimento da economia brasileira. Portanto, a educação tem o potencial, seja em ambiente escolar, seja em outros espaços de arte e cultura, de abordar diferentes aspectos culturais, ampliando a consecução de aprendizagens significativas para a vida cotidiana. Isso acontece, por exemplo, ao trabalharmos, por meio da expressão artística, que símbolos são utilizados em cada linguagem, buscando levantar questionamentos acerca do que estes representam e como fazer uso da expressão por meio de símbolos culturalmente compreendidos, estamos considerando a dimensão simbólica da cultura. Ao levantarmos qual seria o papel de cada envolvido nos projetos em determinado contexto local, trabalhamos a responsabilidade social desses envolvidos, contemplando a dimensão cidadã. E a dimensão econômica realiza- se a partir do momento em que diferentes envolvidos percebem a possibilidade de receita real ou potencial, dentro de cada projeto, e aindaao se desenvolverem culturalmente, o que significa desenvolvimento pessoal nas esferas da vida social e do mundo do trabalho. TEMA 4 – INTERCULTURALIDADE Você conhece o termo interculturalidade? Você pode imaginar o sentido dessa palavra pensando no sentido de inter, que diz respeito à a relação entre algo, neste caso, culturas. Quer dizer que há diferentes culturas que se A luno: D E LM A C A R O LIN A A LM E ID A S O U Z A S ILV A E m ail: souzadelm a2011@ gm ail.com 9 relacionam entre si? Veremos adiante um pouco mais acerca desse importante conceito. 4.1 Culturas em relação de troca O termo interculturalidade sugere uma troca entre diferentes culturas. Mas de que forma isso acontece? Quando indivíduos ou grupos de indivíduos se relacionam, estão praticando cultura em diferentes níveis de complexidade. A interação entre indivíduos e a forma com que estes se relacionam com seus ambientes gera modos de vida, modos de relação cotidiana e, portanto, cultura. Quando indivíduos pertencentes a diferentes grupos se relacionam, há uma troca cultural, a qual podemos chamar de interculturalidade. Como sabemos, vivemos em um mundo em constante evolução, em diferentes sentidos. Os movimentos populacionais também fazem parte dessa evolução e estão presentes em nosso dia a dia. Esses movimentos ocorrem em múltiplas escalas, desde quando uma família se muda de um bairro para outro dentro da mesma cidade, dentro do próprio estado, de uma cidade para outra, de uma região para outra dentro do próprio país, até mesmo movimentos de escala global. Observe a Figura 4 e pense sobre as possibilidades de interação intercultural entre os indivíduos e a relação entre os objetos e o ambiente que os circundam. Figura 4 – Interculturalidade Créditos: Pressmaster/Shutterstock. A luno: D E LM A C A R O LIN A A LM E ID A S O U Z A S ILV A E m ail: souzadelm a2011@ gm ail.com 10 Os movimentos populacionais possuem diferentes motivações, mas ocorrem principalmente como uma busca por melhores condições de vida. Por vezes, podemos nos deparar com formas distintas em lidar com uma determinada situação, com diferentes formas de comunicar uma ideia e também com diferentes manifestações artísticas. Saber respeitar essa diversidade faz parte do repertório de qualquer cidadão, seja no convívio social em sua rua, em sua casa, em seu trabalho. Percebemos outras culturas por meio dos trânsitos populacionais pelo mundo, mas não somente. Com o avanço das Tecnologias Digitais de Informação e Comunicação, também conhecidas como TDICs, podemos nos inteirar de diferentes modos de vida pelo mundo. Entre outros interesses, podemos conhecer como diferentes povos lidam com as relações interpessoais, com questões ambientais e quais são as manifestações artísticas nas mais diferentes linguagens, como artes visuais, música, dança, teatro, cinema, apenas para citar algumas possibilidades. A cultura de massa também desempenha um papel relevante quando falamos de Interculturalidade. Essa cultura é aquilo que é produzido com um apelo comercial, para o qual se sabe que haverá público para consumir. Em geral, estamos muito expostos a ela, por meio da rádio, da televisão, de revistas, da internet, entre outros grandes meios de comunicação. Não significa que devemos ignorar essa cultura de massa, mas é importante que se saiba identificar e mediar as relações possíveis entre ela e a cultura específica do local onde se atua profissionalmente, buscando estar atento àquilo que move a curiosidade do grande público e que olhares podem ser lançados diante da cultura globalizada. Quando atuamos enquanto profissionais do campo da arte, seja como artistas, como professores de arte, ou ainda como propositores de projetos culturais, o respeito à interculturalidade é fundamental. Para além disso, nossas práticas devem não somente respeitar as diferenças, mas também fomentar a compreensão da importância desse respeito a outros envolvidos em sua atuação profissional. Isso significa respeitar aspectos fundamentais da cultura, conforme a Declaração Universal sobre a Diversidade Cultural (Unesco, 2002), como o respeito à diversidade das culturas, o desenvolvimento dos intercâmbios culturais e a evolução das novas tecnologias da informação e da comunicação. A luno: D E LM A C A R O LIN A A LM E ID A S O U Z A S ILV A E m ail: souzadelm a2011@ gm ail.com 11 TEMA 5 – TRANSCULTURALIDADE O que seria a transculturalidade? De que maneira a transculturalidade pode ser contemplada por meio do planejamento de ações socioculturais? 5.1 O trânsito de aspectos culturais Com os trânsitos populacionais que geram a percepção de outros modos de vida, de outras culturas, conforme anteriormente apresentado em Interculturalidade, observamos o fenômeno da transculturalidade. Primeiramente, vamos compreender o que é a transculturalidade. Segundo Lucchesi e Malanga (2011, p. 75): a transculturalidade configura uma nova proposta que consiste em perceber o todo (a população mundial, submetida à economia globalizada e às redes de informação) e suas relações com as partes, que são as culturas, respeitando-as e permitindo que elas dialoguem com o todo, na construção de um mundo mais equilibrado em termos de troca de conhecimentos. Podemos afirmar, portanto, que a transculturalidade é um fenômeno decorrente da interculturalidade, no qual ocorre uma troca de aspectos culturais. Dessa maneira, no contexto da transculturalidade, apreendemos aspectos de outras culturas, como símbolos e/ou modos de vida, ao mesmo tempo em que partilhamos de um aspecto de nossa cultura. Isso geraria, por si só, uma situação de ensino e aprendizagem, na qual o respeito à outra cultura é um aspecto- chave. Contudo, isso não significa que devemos simplesmente copiar a cultura vinda do contexto exterior. Ao comentar a abordagem triangular no ensino das culturas visuais, Ana Mae Barbosa (2012, p. XXXI) comenta a negação da cópia: Fomos alunos de Paulo Freire e com ele aprendemos a recusar a colonizadora cópia de modelos, mas a escolher, reconstruir, reorganizar a partir da experiência direta com a realidade, com a cultura que nos cerca, com a cultura dos outros e com uma pletora de referenciais teóricos, intelectualmente desnacionalizados, como diz Bourdieu, por nós escolhidos e não impostos pelo poder dominante. A cultura brasileira, de matriz múltipla, é um exemplo de como a construção de uma cultura pode ser fundamentada na troca de experiências e na recontextualização de costumes e tradições. No contexto da arte, o Manifesto Antropofágico, escrito por Oswald de Andrade, publicado em 1928, no ínterim do A luno: D E LM A C A R O LIN A A LM E ID A S O U Z A S ILV A E m ail: souzadelm a2011@ gm ail.com 12 modernismo, propunha de maneira figurativa "digerir" a cultura estrangeira, para transformá-la em algo genuinamente brasileiro. Um olhar descolonizado e responsável é, portanto, necessário para a atuação profissional no campo da arte, dentre as mais variadas possibilidades de criação e mediação de conteúdos. O respeito à diversidade e o protagonismo na troca de experiências culturais devem fazer parte do saber das Artes Visuais. NA PRÁTICA Qual é a cara da cultura de onde você vive? Quais são as tradições e costumes regionais? Quais são as influências externas visivelmente presentes em sua realidade? Enquanto exercício de aproximação da realidade, experimente realizar uma busca por imagens em qualquer ferramenta de busca na internet, utilizando a palavra-chave cultura e o nome do local em que você vive. Com base nas imagens encontradas, é possível lançar diferentes questionamentos acerca da compreensão de cultura. Para você, essas imagens realmente representam a cultura de onde você vive? Por que essas imagenssão os primeiros resultados da sua busca? O que você pode fazer para inserir novas compreensões de cultura ao local em que você vive? Com base nesses questionamentos, imagine estratégias para promover a cultura em sua região. Uma dica valiosa é buscar os editais de arte e cultura pensados para a sua região. Se não há, que tal mobilizar outras pessoas que poderiam participar de atividades culturais significativas em seu contexto local? FINALIZANDO Neste material de leitura, levantamos alguns questionamentos acerca da relação entre arte e cultura. Vimos que a arte, enquanto linguagem expressiva, constitui a cultura de um determinado local. Vimos também, que a arte pode apontar para diversos outros questionamentos no complexo campo da cultura. Exploramos o polissêmico conceito de cultura, ou seja, que possui vários significados e discutimos alguns de seus desdobramentos. Observamos que as políticas culturais são um dever do Estado e um direito do cidadão, sendo que ambos devem ser complementares para o funcionamento dessa relação. A luno: D E LM A C A R O LIN A A LM E ID A S O U Z A S ILV A E m ail: souzadelm a2011@ gm ail.com 13 Vimos que a cultura possui um papel importante nas ações educativas. Abordamos especificidades contemporâneas da cultura na vida social, por meio dos conceitos de Interculturalidade e transculturalidade. Esperamos que você tenha aproveitado a leitura, que realize conexões com outros conteúdos de seu curso e compartilhe suas experiências com seus pares. Nas referências, estão detalhados os materiais utilizados, caso você tenha interesse em aprofundar algum conceito aqui trabalhado. A luno: D E LM A C A R O LIN A A LM E ID A S O U Z A S ILV A E m ail: souzadelm a2011@ gm ail.com 14 REFERÊNCIAS ANDRADE, O. Manifesto antropófago e Manifesto da poesia pau-brasil. Versão com comentário e hipertextos de Raquel R. Souza. Porto Alegre: FURG. Disponível em: <https://www.ufrgs.br/cdrom/oandrade/oandrade.pdf>. Acesso em: 13 ago. 2021. BANDEIRA, D. Ensino das artes visuais em diferentes contextos: experiências educativas, culturais e formativas. Curitiba: InterSaberes, 2017. BARBOSA, A. M. Proposta ou abordagem triangular: uma breve revisão. In: A IMAGEM no ensino da arte. São Paulo: Perspectiva, 2012. BRASIL. Constituição Federal de 1998. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>. Acesso em: 13 ago. 2021. BRASIL. Ministério da Cultura. Cultura em três dimensões. 2011. Disponível em: <http://rubi.casaruibarbosa.gov.br/handle/20.500.11997/6233>. Acesso em: 13 ago. 2021. BRASIL. Portal do Sistema Nacional de Cultura. 2021. Disponível em: <http://portalsnc.cultura.gov.br/historico-2/>. Acesso em: 13 ago. 2021. HALL, S. A centralidade da cultura: notas sobre as revoluções culturais do nosso tempo. Traduzido por Ricardo Uebel, Maria Isabel Bujes e Marisa Vorraber Costa. Revista Educação & Realidade, v. 22, n. 2, 1997. MÈRCHER, L. Projetos culturais e de ensino das artes visuais em diferentes contextos. Curitiba: InterSaberes, 2018. UNESCO. Declaração universal sobre a diversidade cultural. 2002. Disponível em: <https://unesdoc.unesco.org/ark:/48223/pf0000127160>. Acesso em: 13 ago. 2021. WILLIAMS, R. Cultura. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1992. A luno: D E LM A C A R O LIN A A LM E ID A S O U Z A S ILV A E m ail: souzadelm a2011@ gm ail.com