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1. Definição e breve histórico clínico do distúrbio O hipertireoidismo é uma condição endócrina caracterizada pela produção excessiva de hormônios tireoidianos, principalmente T3 (triiodotironina) e T4 (tiroxina), pela glândula tireóide. Essa elevação hormonal leva a um estado de hipermetabolismo, com manifestações clínicas em múltiplos sistemas. A principal causa é a Doença de Graves, uma doença autoimune descrita por Robert Graves em 1835, que resulta na produção de autoanticorpos que estimulam os receptores de TSH na tireoide, levando à sua hiperatividade [2]. 2. Fisiopatologia (mecanismos envolvidos, órgãos afetados, alterações hormonais) A fisiopatologia do hipertireoidismo envolve a ativação do eixo hipotálamo-hipófise-tireoide e o estímulo excessivo à síntese e liberação dos hormônios T3 e T4. Na Doença de Graves, anticorpos conhecidos como TRAb (anticorpos anti-receptores de TSH) ligam-se aos receptores de TSH, estimulando a glândula tireóide de forma contínua [4]. Como consequência, ocorre: Sistema cardiovascular: aumento do débito cardíaco, taquicardia, palpitações; Sistema nervoso: irritabilidade, insônia, ansiedade; Sistema músculo-esquelético: fadiga, fraqueza muscular proximal; Trato gastrointestinal: aumento do peristaltismo, diarreia; Sistema ósseo: maior risco de osteopenia e osteoporose, devido ao turnover ósseo acelerado [1] [4]. 3. Manifestações clínicas As manifestações clínicas refletem o excesso de atividade metabólica. Os principais sinais e sintomas incluem: Perda de peso com apetite preservado ou aumentado; Taquicardia, palpitações; Nervosismo, irritabilidade; Tremores finos; Intolerância ao calor e sudorese excessiva; Diarreia ou hiperdefecação; Hipertireoidismo Nome dos Acadêmicos(as): Ireni Madruga da Silva e Késia de Oliveira Nome do Professor(a): Mayara Trindade Curso: Nutrição Semestre: 5º Turno: Noturno Disciplina: Fisiopatologia e Dietoterapia II Fadiga, fraqueza muscular; Irregularidades menstruais; Exoftalmia (na Doença de Graves). Esses sintomas resultam da ação aumentada dos hormônios tireoidianos sobre o metabolismo e da estimulação do sistema nervoso simpático [1][2]. 4. Diagnóstico clínico e laboratorial O diagnóstico combina avaliação clínica com exames laboratoriais e de imagem: Exames laboratoriais: TSH: suprimido ou indetectável; T4 livre e T3 livre/total: elevados; TRAb: positivo na Doença de Graves. Exames de imagem: Cintilografia com iodo radioativo: captação difusa na Doença de Graves; focal nos adenomas tóxicos. Ultrassonografia com Doppler: aumento da vascularização na Doença de Graves [5]. 5. Tratamento médico convencional O objetivo do tratamento é reduzir a produção hormonal e controlar os sintomas. As principais abordagens são: Antitireoidianos: Metimazol (primeira escolha pela menor hepatotoxicidade) Propiltiouracil (indicado no primeiro trimestre da gestação) Ambos inibem a organificação do iodo e a síntese hormonal. Iodo radioativo (I¹³¹): destruição parcial da tireóide; contraindicado em gestantes. Cirurgia (tireoidectomia parcial ou total): indicada em casos de bócio volumoso, malignidade suspeita ou contraindicação a outras terapias. Betabloqueadores (ex.: propranolol): alívio de sintomas como taquicardia e tremores [5]. 6. Condutas nutricionais: O acompanhamento nutricional em pacientes com hipertireoidismo é essencial para restaurar o equilíbrio metabólico, prevenir complicações clínicas e otimizar o tratamento médico. A dietoterapia visa adequar o estado nutricional frente ao aumento da taxa metabólica basal provocado pelo excesso de hormônios tireoidianos. 1. Objetivos da dietoterapia Reduzir efeitos do metabolismo acelerado; Prevenir desnutrição proteico-calórica; Corrigir deficiências nutricionais (cálcio, vitamina D, zinco, selênio); Minimizar efeitos colaterais do tratamento; Apoiar a restauração do estado eutireoideo [1][4] 2. Recomendações nutricionais baseadas em evidências Necessidades energéticas: 30 a 40 kcal/kg/dia; Proteínas: 1,2 a 1,5 g/kg/dia; Fracionamento: 5 a 6 refeições por dia; Hidratação: essencial devido à sudorese e diarreia; Micronutrientes: avaliação e possível suplementação de cálcio, vitamina D, zinco e selênio [1][4]. 3. Alimentos benéficos e contraindicações Alimentos benéficos: Cálcio: couve, brócolis, leite, tofu; Selênio: castanha-do-pará, nozes; Zinco: carnes magras, leguminosas; Antioxidantes: frutas vermelhas, vegetais verde-escuros. Contraindicações: Alimentos ricos em iodo (para pacientes com Doença de Graves ainda não tratados): algas, peixes salgados, sal iodado em excesso; Cafeína: café, chá preto, energéticos; pode piorar sintomas como ansiedade, insônia e tremores [2][4]. 4. Interações entre nutrientes e medicamentos Levotiroxina (em pacientes pós-tratamento): Absorção prejudicada por: Fibras em excesso, Cálcio, Ferro, Soja e Farelo de trigo. Recomendação: tomar em jejum, com água, 30–60 minutos antes do café da manhã. Manter intervalo de 2 horas para ingestão de alimentos ou suplementos que interfiram na absorção [5]. Metimazol: Pode ser administrado com alimentos para reduzir desconforto gastrointestinal. Uso prolongado pode interferir no metabolismo de: Zinco, Selênio e Vitamina B12. Monitorar ingestão alimentar e considerar suplementação se necessário [3]. Estudos científicos que embasam as condutas nutricionais Cardoso et al. (2022) destacam a importância de um plano alimentar individualizado, com foco na recuperação do estado nutricional, modulação de sintomas e suporte ao tratamento clínico; O Consenso da ABEM (2018) reforça que o acompanhamento multiprofissional, com atuação do nutricionista, é fundamental para o controle adequado do hipertireoidismo e a melhora da qualidade de vida do paciente; O artigo de Maldonado et al. (2015) também aponta que o suporte nutricional deve ser ajustado conforme o tipo e gravidade da disfunção tireoidiana. Referências: 1. SAMPAIO, C.; COZZOLINO, S. M. F. Bases da nutrição em doenças crônicas não transmissíveis. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2021. Disponível em: https://books.scielo.org/id/ddxwv/pdf/sampaio-9788523218744.pdf. Acesso em: 19 maio 2025. 2. MALDONADO, R.; ALVARENGA, R.; SOUZA, L. L. Hipotireoidismo e hipertireoidismo: uma breve revisão sobre as disfunções tireoidianas. ResearchGate, 2015. Disponível em: https://www.researchgate.net/publication/280490596_Hipotireoidismo_e_Hipertireoid ismo-uma_Breve_Revisao_Sobre_as_Disfuncoes_Tireoidianas. Acesso em: 19 maio 2025. 3. SILVEIRA TAVARES, F. et al. Envelhecimento tireoidiano: aspectos fisiológicos e patológicos. Investigación Clínica, Caracas, v. 34, n. 10, p. 684–688, out. 2009. Disponível em: http://ve.scielo.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0378-18442009001000004&l ng=es&nrm=iso. Acesso em: 19 maio 2025. 4. CARDOSO, A. L. et al. Distúrbios tireoidianos e paratireoidianos. In: CARDOSO, A. L. et al. Nutrição clínica funcional: dos princípios à prática em doenças crônicas não transmissíveis. São Paulo: Editora Rubio, 2022. cap. 14. Disponível em: https://books.scielo.org/id/hj25v/pdf/cardoso-9786586545494-14.pdf. Acesso em: 19 maio 2025. 5. SOCIEDADE BRASILEIRA DE ENDOCRINOLOGIA E METABOLOGIA – ABEM. Consenso brasileiro sobre doenças da tireoide. Arquivos Brasileiros de Endocrinologia e Metabologia, São Paulo, v. 62, n. 2, p. 233–252, 2018. Disponível em: https://www.scielo.br/j/abem/a/k5s3N3nf4gs8DxDsnPWBQ3r/. Acesso em: 24 maio 2025. 1. Fisiopatologia e Impacto Metabólico a) Como o excesso de hormônios tireoidianos acelera o metabolismo basal e quais as consequências nutricionais? O T3 e T4 aumentam a atividade de enzimas mitocondriais, o consumo de oxigênio celular e a termogênese, elevando significativamente a taxa metabólica basal (TMB). Isso promove maior gasto energético em repouso, resultando em perda de peso, mesmo com apetite aumentado. Consequências nutricionais incluem déficitenergético, catabolismo proteico, depleção de massa magra, e maior risco de deficiências de micronutrientes como cálcio, selênio, zinco e vitamina D [1][4]. b) Quais são as diferenças fisiopatológicas entre Doença de Graves, bócio nodular tóxico e tireoidite? Condição Mecanismo fisiopatológico Características principais Doença de Graves Autoimune: anticorpos TRAb estimulam o receptor de TSH, promovendo hiperfunção difusa Exoftalmia, bócio difuso, captação aumentada e difusa na cintilografia Bócio Nodular Tóxico Nódulo(s) autônomo(s) funcionantes que produzem hormônio independentemente do TSH Nódulo palpável, captação focal aumentada na cintilografia Tireoidite Inflamação com liberação transitória de hormônios previamente armazenados Captação diminuída na cintilografia, curso geralmente autolimitado. c) Por que pacientes com hipertireoidismo apresentam catabolismo proteico e perda de massa muscular? O excesso de T3 estimula a proteólise muscular, aumentando a degradação de proteínas e a liberação de aminoácidos para a gliconeogênese hepática. Isso, aliado ao balanço nitrogenado negativo, resulta em perda de massa magra, fraqueza muscular proximal e risco de desnutrição proteico-calórica [1][4]. 2. Avaliação Nutricional a) Quais parâmetros antropométricos são mais afetados? Justifique. Peso corporal: Redução significativa, geralmente >10% do peso habitual. IMC: Frequentemente reduzido, refletindo emagrecimento. Massa muscular: Redução evidente, especialmente em membros proximais. Dobras cutâneas e circunferências: Circunferência do braço e dobra cutânea tricipital podem indicar perda de tecido magro e gordura [1][4]. b) Como interpretar exames laboratoriais (TSH, T4 livre, T3) no contexto nutricional? TSH: Suprimido ou indetectável (1590 a 2120 kcal/dia. -Qual a distribuição ideal de macronutrientes para compensar o catabolismo? Proteínas: 1,2–1,5 g/kg/dia para compensar o catabolismo; Lipídios: 25–30% do VET, priorizando fontes insaturadas; Carboidratos: 50–60% do VET, preferindo complexos e integrais. [4][5] b) Manejo de sintomas: - Estratégias nutricionais para taquicardia e intolerância ao calor: Evitar alimentos e bebidas estimulantes: cafeína, guaraná, chá preto, chocolate; Garantir hidratação adequada e consumo de alimentos refrescantes (frutas ricas em água: melancia, laranja, melão). - Alimentação para diarreia e má absorção frequentes: Fracionamento em 5–6 refeições/dia; Evitar gorduras de difícil digestão; Reforçar alimentos ricos em fibras solúveis: banana, maçã sem casca, aveia; Avaliar suplementação de eletrólitos e micronutrientes. [1][4] c) Nutrientes-chave: - Qual o papel do cálcio e vitamina D na prevenção da osteoporose? O turnover ósseo é acelerado no hipertireoidismo, com maior reabsorção óssea e risco de osteopenia/osteoporose. A reposição adequada de cálcio (1000–1200 mg/dia) e vitamina D (600–800 UI/dia) é essencial para preservar a densidade mineral óssea [1][4]. - Deve-se suplementar o selênio em casos de orbitopatia de Graves? Estudos sugerem que a suplementação de selênio (100 mcg/dia por 6 meses) pode melhorar a qualidade de vida e reduzir sintomas oculares leves a moderados em pacientes com orbitopatia de Graves. No entanto, deve ser feita sob supervisão e com base na avaliação laboratorial. [4][5] 4. Interações Nutricionais a) Quais alimentos e nutrientes podem interferir na absorção de antitireoidianos (metimazol)? Embora o metimazol não tenha grandes interações diretas com alimentos, seu uso prolongado pode afetar a absorção de zinco, selênio e B12. Recomendação: Administrar junto às refeições para evitar náuseas, mas monitorar micronutrientes ao longo do tempo [3]. b) Como o iodo dietético afeta o curso da doença? O iodo é essencial para a produção de T3 e T4. Em pacientes com Doença de Graves, altas ingestões de iodo podem agravar o hipertireoidismo. Conduta: Reduzir consumo de alimentos muito ricos em iodo (algas marinhas, sal iodado em excesso); Em tratamento com iodo radioativo, ajustar a ingestão conforme orientação médica. [5] c) Existem alimentos que podem exacerbar os sintomas? Sim. Exemplos: Cafeína e bebidas estimulantes: potencializam sintomas como taquicardia, insônia e tremores. Alimentos condimentados e termogênicos naturais (pimenta, gengibre, canela): podem intensificar a intolerância ao calor. Alimentos ricos em iodo (algas, peixes de água salgada, laticínios em excesso): contra indicação temporária em fases ativas da doença. [1][2]