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PRINCÍPIOS DO DIREITO PENAL Direito Penal como meio de controle formalizado, que atua quando a violação a direitos e interesses se torna especialmente grave, sendo insuficiente a atuação de outros ramos do Direito para apaziguar o convívio social. Objetivo declarado do Direito Penal: proteção de bens jurídicos, isto é, valores relevantes para a vida humana individual e coletiva (Juarez Cirino dos Santos) Seleção dos bens jurídicos: critérios político-criminais (CF). Principal ponto de diferenciação do Direito Penal em relação aos demais ramos jurídicos: é a última ratio. Isto é, somente é acionado em última instância. A essa característica chamamos de fragmentariedade. Criminalização primária (ou abstrata): definição legal dos crimes e das penas as penas são instrumentos da política criminal do Estado e podem ser: • Privativas de liberdade • Restritivas de direitos • Multa Medidas de segurança (ou de proteção) • Internação hospitalar (exceção) • Tratamento ambulatorial Criminalização secundária (ou concreta) Realizada pelo sistema de justiça criminal Aplicação e execução da penal. Princípios são garantias do cidadão perante o poder punitivo estatal e estão albergados pela CF/88, em seu art. 5º. Tais princípios orientam o legislador ordinário, no sentido de se promover um Direito Penal da culpabilidade, mínimo e garantista, voltado ao respeito dos direitos humanos e da dignidade da pessoa (BITENCOURT, 2017 ordenamento). PRINCÍPIO DA ESTRITA LEGALIDADE OU DA RESERVA LEGAL Art. 5º, inc. XXXIX, da CF/88: “Não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal.” Cláusula pétrea. • Nullum crimen, nulla poena sine lege Mais importante instrumento de proteção individual Art. 1º do CP: • “Não há crime sem lei anterior que o defina. • Não há pena sem prévia cominação legal. A elaboração de normas incriminadoras é função exclusiva da lei, em sentido estrito. A lei deve definir com precisão a conduta proibida e a sanção respectiva. Reserva legal: lei em sentido formal e material (lei ordinária ou complementar). Compete privativamente à União legislar sobre Direito Penal. Matéria penal incriminadora não pode ser tratada por medida provisória (MP não é lei, e sim ato do executivo). • Contravenções penais e medidas de segurança também estão abrangidas pelo princípio da legalidade Segurança jurídica e respeito ao sistema político democrático. A LEI PENAL DEVE SER: CERTA ESCRITA ESTRITA PRÉVIA MANDADOS DE CRIMINALIZAÇÃO São matérias elencadas pela CF e em relação às quais é obrigatória a atuação do legislador ordinário. Necessidade premente de proteção a determinados bens jurídicos, muito valiosos ao convívio social pacífico. Exemplos: • 5º, XLI: “à lei punirá qualquer discriminação atentatória dos direitos e liberdades fundamentais.” (Lei 7.716/89) • Art. 5º, XLII:“à prática do racismo constitui crime inafiançável e imprescritível, sujeito à pena de reclusão, nos termos da lei.” (Lei 7.716/89) • Art. 5º, XLIII: “à lei considerará crimes inafiançáveis e insuscetíveis de graça ou anistia a prática da tortura, o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, o terrorismo e os definidos como crimes hediondos, por eles respondendo os mandantes, os executores e os que, podendo evitá-los, se omitirem;” (Lei 9.455/97, Lei 11.343/06, Lei 8.072/90) • Art. 5º, XLIV: constitui crime inafiançável e imprescritível a ação de grupos armados, civis ou militares, contra a ordem constitucional e o Estado Democrático. (CP) • Art. 227, § 4º: “a lei punirá severamente o abuso, a violência e a exploração sexual da criança e do adolescente.” (CP e ECA). Princípio da Fragmentariedade: Intimamente relacionado à legalidade e à intervenção mínima. O direito penal protege apenas valores imprescritíveis ao convívio social. não pode e não deve jurídicos tutelar todos os valores. O caráter fragmentário significa, portanto, que o direito penal somente se ocupa de uma parte dos bens jurídicos tutelados pelo ordenamento. sendo assim compreendido como tutela seletiva, relacionado à gravidade e à intensidade da ofensa. Um ilícito penal é também ilícito perante outros ramos do direito, mas a recíproca não é verdadeira. Princípio da Anterioridade • Art. 5º, XXXIX, CF: “não há crime sem lei anterior que o defina; • O crime e a pena devem estar definidos em lei prévia. A lei penal só produz efeitos a partir de sua entrada em vigor (não incide a fatos ocorridos na vacatio legis, isto é, no intervalo de tempo entre a publicação e a entrada em vigor). Salvo disposição em contrário, a vacatio legis é de 45 dias (art. 1º da LINDB) deve ser observado a data de sua publicação e data da sua entrada em vigor . Exceção: leis temporárias (vigência predeterminada no tempo, com data certa. Ex: Lei Geral da Copa do Mundo de 2014 e excepcionais (situações de anormalidade, pandemia coronavírus). São autorrevogáveis e ultra ativas, isto é, aplicam-se a fato ocorrido enquanto estavam em vigor, embora já cessada a vigência. Ultratividade: significa a aplicação de uma lei mesmo depois de revogada. Princípio da irretroatividade Art. 5º, inc. XL, da CF: a lei penal não retroagirá, salvo para beneficiar o réu. jurídica. A lei penal mais severa (novatio legis in pejus) não retroage jamais. A lei nova mais favorável (novatio legis in mellius) sempre retroagirá em benefício do réu. Exceção: leis temporárias (vigência predeterminada no tempo, com data certa. Ex: Lei Geral da Copa do Mundo de 2014 e excepcionais (situações de anormalidade, pandemia coronavírus). • São autorrevogáveis e ultra ativas, isto é, aplicam-se a fato ocorrido enquanto estavam em vigor, embora já cessada a vigência. • Ultratividade significa a aplicação de uma lei mesmo depois de revogada. Aplicação prática da retroatividade da lei penal mais favorável: Súmula 611 do STF: “Transitada em julgado a sentença condenatória, compete ao Juízo das execuções a aplicação da lei mais benigna”. Ex: Lei 13.654/18 (restrição da majorante do uso de arma no roubo). • Não há violação à irretroatividade da lei penal mais grave: Súmula 711 do STF: “A lei penal mais grave aplica-se ao crime continuado ou ao crime permanente, se a sua vigência é anterior à cessação da continuidade ou da permanência. PRINCÍPIO DA ADEQUAÇÃO SOCIAL Deve nortear, porém no brasil, o costume não revoga lei) Hans Welzel: idealizador As condutas que se consideram socialmente adequadas não se revestem de tipicidade e, por isso, não podem constituir delitos. • Descompasso entre as normas penais incriminadoras e o socialmente permitido ou aceito. • Condutas que não afrontam o sentimento social de justiça Princípio geral de interpretação (não exclui a tipicidade, nem a ilicitude). PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA Terminologia cunhada por Claus Roxin. e Klaus Tiedemann • Chama de Princípio de Bagatela. A conduta, formalmente, amolda-se a um tipo penal. Porém, não apresenta relevância concreta, material. Afasta-se a tipicidade, pois o bem jurídico tutelado não chegou a ser lesado. Causa supralegal de exclusão da tipicidade material. Não tem previsão legal no Brasil. • A tipicidade penal é composta pela tipicidade formal e tipicidade material • Tipicidade formal: juízo de subsunção do fato da vida à norma jurídica • Tipicidade material: lesão ou perigo de lesão ao bem jurídico tutelado pela norma. REQUISITOS PARA O RECONHECIMENTO DA INSIGNIFICÂNCIA • Periculosidade ausente • Reprovabilidade reduzida • Ofensividade mínima ▪ Lesão inexpressiva • São conceitos abertos, que permitem ampla margem de interpretação. • Fator de política criminal. Peculiaridades do caso concreto. APLICAÇÃO DA INSIGNIFICÂNCIA Orientação ao legislador. Súmula 502mero exaurimento. Exemplo: extorsão mediante sequestro (art. 159 do CP). Crimes qualificados pelo resultado: consumam-se com a ocorrência do resultado agravador. Exemplo: lesão corporal qualificada pelo resultado aborto (art. 129, § 2º, inc. V lesão gravíssima). Crimes permanentes: consumam-se enquanto durar a permanência, perpetuam-se no tempo. Exemplo: sequestro e cárcere privado (art. 148 do CP). TENTATIVA Conatus Tentativa • II.Tentado, quando, iniciada a execução, não se consuma por circunstâncias alheias à vontade do agente. Pena de tentativa Parágrafo único - Salvo disposição em contrário, pune-se a tentativa com a pena correspondente ao crime consumado, diminuída de um a dois terços O art. 14, inc. II, é uma norma de extensão ou tipo de extensão. Adere a um tipo da parte especial, conferindo-lhe maior abrangência. Imposição do princípio da legalidade. • Punição da tentativa Para punir a conduta tentada, não basta olhar para o tipo penal, devendo promover uma adequação típica mediata ou indireta, com base no art. 14, inc. II. Ou seja, pune-se a tentativa com a pena correspondente ao crime consumado, diminuída de 1/3 a 2/3. Parágrafo único: adoção da teoria objetiva temperada. • A pena deve ser reduzida quando o agente não consuma a infração penal, salvo disposição em contrário. Crimes de atentado ou empreendimento. Critério para punição para o juiz aferir o critério para punição do crime tentado, deverá levar em conta a proximidade da consumação (iter criminis percorrido). Isto é, quanto mais próximo o indivíduo chegou à consumação, maior será a reprimenda. • Neste caso, o indivíduo terá uma redução de 1/3, por exemplo. • Elementos caracterizadores do crime tentado 1) Conduta dolosa, isto é, com vontade livre e consciente de querer praticar a infração penal 2) Agente ingressa nos atos de execução 3) O agente não chega à consumação do crime por circunstâncias alheias à sua vontade • Não há um dolo próprio para o crime tentado. O dolo é dirigido a realizar a conduta descrita no tipo penal. • Circunstâncias alheias à vontade do agente: qualquer fato externo que influencia na interrupção da execução. Espécies de tentativa Espécies de tentativa A tentativa, quanto ao iter criminis percorrido, pode ser: • Tentativa imperfeita (inacabada) o sujeito não praticou todos os atos e executórios. • A execução é interrompida, tentativa perfeita (acabada): crime falho. • O sujeito praticou todos os atos executórios, mas não conseguiu alcançar o seu intento. • Quanto ao resultado produzido na vítima, poderá ser: • tentativa branca (incruenta): a vítima não sofre lesão. • tentativa vermelha (cruenta): a vítima é atingida pelo agente. • Quanto à possibilidade de alcançar o resultado, poderá ser: • tentativa idônea: admite punição, pois o resultado era passível de ser alcançado. • tentativa inidônea: trata-se de crime impossível, pela absoluta impropriedade do meio ou do objeto. Não poderá ser punida a conduta do agente. Delitos que não admitem tentativa • É possível a tentativa quando pudermos fracionar o iter criminis. Alguns delitos, todavia, são incompatíveis com a forma tentada. • crimes culposos: isso porque é de a tentativa não alcançar a consumação por circunstâncias alheias à vontade do agente. • Não se cogita, não se prepara um crime culposo. • Não se fala em iter criminis. No caso de crimes culposos, o resultado não é desejado, ao contrário da tentativa, em que o resultado é querido pelo agente, mas não é conseguido (exceção: culpa imprópria – art. 20, § 1º). não pode ser fracionado. Ex.: injúria verbal (art. 140 do CP). • crimes de atentado ou de empreendimento: são aqueles em que a prática da tentativa é punida com as mesmas penas do crime consumado. Ex.: evasão mediante violência contra a pessoa (art. 352 do CP - Evadir-se ou tentar evadir-se o preso ou o indivíduo submetido a medida de segurança detentiva, usando de violência contra a pessoa). • contravenções penais: o art. 4º da LCP não pune as tentativas de contravenção (lei especial prevalece sobre a lei geral). • habituais: apesar da divergência doutrinária, prevalece que nos crimes habituais ou há a reiteração dos atos, consumando o crime, ou os atos não são reiterados e não há consumação do crime habitual. • crimes preterdolosos: dolo na conduta e culpa no resultado agravador (dolo no antecedente, culpa no consequente). Em regra, é incompatível com a modalidade tentada. LFG afirma que é possível quando a frustração se dá em razão da conduta dolosa, mas a conduta culposa acontece. é incompatível com a modalidade tentada. LFG afirma que é possível quando a frustração se dá em razão da conduta dolosa, mas a conduta culposa acontece. • Ex.: médico que tenta gerar aborto na mulher. O aborto não acontece, mas a mulher morre em razão das manobras abortivas. É uma tentativa de aborto qualificado pelo resultado morte culposa. • Ex.: médico que tenta gerar aborto na mulher. O aborto não acontece, mas a mulher morre em razão das manobras abortivas. É uma tentativa de aborto qualificado pelo resultado morte culposa. • crimes unissubsistentes: não admitem tentativa, pois são praticados por um único ato. O iter criminis não pode ser fracionado. • Ex.: injúria verbal (art. 140 do CP). • crimes de atentado ou de empreendimento: são aqueles em que a prática da tentativa é punida com as mesmas penas do crime consumado. • Ex.: evasão mediante violência contra a pessoa (art. 352 do CP - Evadir- se ou tentar evadir-se o preso ou o indivíduo submetido a medida de segurança detentiva, usando de violência contra a pessoas. • crimes unissubsistentes: não admitem tentativa, pois são praticados por um único ato. O iter criminis • Exemplo: casa de prostituição (art. 229 CP; manter, por conta própria ou de terceiros, estabelecimento em que ocorra exploração sexual, haja, ou não, intuito de lucro ou mediação direta do proprietário ou gerente) A doutrina discute se seria possível a tentativa de dolo eventual. Todavia, prevalece o entendimento de que é possível, apesar da dificuldade de verificação prática. • Desistência voluntária e arrependimento eficaz • Art. 15 do CP: • O agente que, voluntariamente, desiste de prosseguir na execução ou impede que o resultado se produza, só responde pelos atos já praticados.” • Estes dois casos são denominados de tentativa abandonada. A diferença entre tais institutos e a tentativa reside no sentido de que, na tentativa, o resultado não acontece por circunstâncias alheias à vontade do agente. Na tentativa abandonada, o resultado não ocorre pela vontade do agente, de forma voluntária ou por meio de arrependimento, o que impede a consumação do delito. • Existe discussão doutrinária sobre a natureza jurídica, porém prevalece o entendimento de que se trata de causa exclusão da tipicidade. • Na desistência voluntária, o indivíduo não termina os atos executórios, podendo prosseguir, mas não quer. No arrependimento eficaz, após esgotados os atos executórios, o agente se arrepende, buscando o impedimento do resultado (exemplo: socorro eficaz após a agressão que objetivava a morte). Tanto na desistência voluntária como no arrependimento eficaz, a lei criada a chamada ponte de ouro (von Liszt). Se o indivíduo estiver no caminho do ilícito, poderá tomar o caminho de ouro, da licitude. A desistência voluntária e o arrependimento eficaz não precisam ser espontâneos, devendo apenas ser voluntários. Isto é, não precisa que a ideia parta do agente. A voluntariedade não depende de um impulso moral positivo. Pode inclusive se pautar em motivo egoísta. • Exemplo: vítima que suplica pela vida. • Aplicação da Fórmula de Frank: • Na desistência voluntária, o indivíduo não termina os atos executórios, podendo prosseguir,mas não quer. “Posso prosseguir, mas não quero.” • Se quer prosseguir, mas não pode, tem-se a tentativa. “Quero prosseguir, mas não posso. • Tanto na desistência voluntária quanto no arrependimento eficaz, o sujeito só responderá pelos atos até então praticados. A desistência voluntária e o arrependimento eficaz são incompatíveis com o crime culposo, eis que o resultado é involuntário. Na desistência voluntária e o arrependimento eficaz, no começo, o indivíduo quer chegar ao resultado, mas após o indivíduo abandona, enquanto no crime culposo o indivíduo nunca quis o resultado. Arrependimento posterior Art. 16 do CP Nos crimes cometidos sem violência ou grave ameaça à pessoa, reparado o dano ou restituída a coisa, até o recebimento da denúncia ou da queixa, por ato voluntário do agente, a pena será reduzida de um a dois terços. • Pressupõe um crime consumado. Não há alteração da tipicidade. Trata-se de causa geral e obrigatória de diminuição de pena (terceira fase da dosimetria) ou minorante. • Política criminal. Incentivo ao arrependimento, à reparação do dano em prol da vítima. Oferecimento da denúncia x recebimento da denúncia 7 Circunstância de caráter objetivo, que se comunica aos corréus (art. 30 do CP). Reparação do dano após o recebimento da denúncia: possibilidade de aplicação da atenuante prevista no art. 65, III, b, segunda parte: “procurado, por sua espontânea vontade e com eficiência, logo após o crime, evitar-lhe ou minorar- lhe as consequências, ou ter, antes do julgamento, reparado o dano;” • É cabível no furto, ainda que qualificado. • É cabível no dano, desde que não seja qualificado pelo emprego de violência ou grave ameaça à pessoa. Segundo o STJ, não se aplica ao homicídio culposo na direção de veículo automotor (art. 302 do CTB), pois o delito de homicídio não tem caráter patrimonial. AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. HOMICÍDIO CULPOSO NA DIREÇÃO DE VEÍCULO AUTOMOTOR. ARREPENDIMENTO POSTERIOR. INAPLICABILIDADE. DECISÃO MANTIDA. RECURSO IMPROVIDO. 1. Esta Corte possui firme entendimento de que, para que seja possível aplicar a causa de diminuição de pena prevista no art. 16 do Código Penal, faz-se necessário que o crime praticado seja patrimonial ou possua efeitos patrimoniais. Precedentes. 2. Inviável o reconhecimento do arrependimento posterior na hipótese de homicídio culposo na direção de veículo automotor, uma vez que o delito do art. 302 do Código de Trânsito Brasileiro não pode ser encarado como crime patrimonial ou de efeito patrimonial. Na espécie, a tutela penal abrange o bem jurídico mais importante do ordenamento jurídico, a vida, que, uma vez ceifada, jamais poderá ser restituída, reparada. Precedente. 3. Em sede de habeas corpus vigora a proibição da reformatio in pejus, princípio imanente ao processo penal (HC 126869/RS, Rel. Min. Dias Toffoli, 23.6.2015 - Informativo 791 do STF). 4. Agravo regimental improvido. (AgRg no HC 510.052/RJ, Rel. Ministro NEFI CORDEIRO, SEXTA TURMA, julgado em 17/12/2019, DJe 04/02/2020). Crime impossível Art. 17 do CP. Não se pune a tentativa quando, por ineficácia absoluta do meio ou por absoluta impropriedade do objeto, é impossível consumar-se o crime. Também chamado de tentativa inidônea, quase-crime, tentativa impossível, crime oco, tentativa irreal. O agente inicia seu plano criminoso, mas não alcança a consumação, que nunca poderá ocorrer. O agente se vale de meios absolutamente ineficazes ou volta-se contra objetos absolutamente impróprios, tornando irrealizável a consumação do crime. A ineficácia ou impropriedade devem ser absolutas. Se relativas, haverá tentativa. Adoção da teoria objetiva temperada ou moderada. Causa de exclusão da tipicidade. • Meio: é tudo aquilo utilizado pelo agente capaz de ajudá-lo a produzir o resultado por ele pretendido (Rogério Greco). Faca, revólver, veneno. • Exemplo de ineficácia absoluta do meio: tentativa de saque com cartão bancário já bloqueado; tentativa de envenenar a vítima com substância inofensiva, tentar matar com revólver desmuniciado. • Verificação da idoneidade do meio é feita no caso concreto Súmula 567 do STJ: Sistema de vigilância realizado por monitoramento eletrônico ou por existência de segurança no interior de estabelecimento comercial, por si só, não torna impossível a configuração do crime de furto. CRIMES DOLOSOS E CULPOSOS Art. 18 Diz-se o crime: Crime doloso I - Doloso, quando o agente quis o resultado ou assumiu o risco de produzi-lo; Crime culposo II - Culposo, quando o agente deu causa ao resultado por imprudência, negligência ou imperícia. Parágrafo único - Salvo os casos expressos em lei, ninguém pode ser punido por fato previsto como crime, senão quando o pratica dolosamente. CLASSIFICAÇÃO DOS CRIMES Doloso, culposo e preterdoloso • Doloso: o agente quis o resultado ou assumiu o risco de produzi-lo • Culposo: o agente deu causa ao resultado por imprudência, negligência ou imperícia • Preterdoloso ou preterintencional: o resultado total é mais gravoso do que o pretendido pelo agente. Dolo: nos termos da teoria finalista, trata-se da vontade e consciência de realizar os elementos do tipo penal. Integra o tipo penal. • A consciência é a decisão da ação (momento/elemento intelectual). O agente deve saber exatamente aquilo que faz para que seja possível atribuir o resultado a título de dolo. Exemplos: no homicídio, deve saber que mata outra pessoa. No roubo, deve saber que subtrai coisa alheia móvel. • A vontade é a decisão de querer/aceitar realizar (momento/elemento volitivo). • A coação física afasta à vontade e, portanto, a conduta. • Elemento psicológico do tipo penal. • Para a teoria finalista, o dolo é natural, isto é, não é normativo. • A consciência da ilicitude situasse no campo da culpabilidade. • Art. 18 Parágrafo único Salvo os casos expressos em lei, ninguém pode ser punido por fato previsto como crime, senão quando o pratica dolosamente. Todo crime é doloso. A punição pela prática de conduta culposa deve estar expressamente prevista em lei. Dolo é a regra. Culpa é a exceção. Exemplo: no CP, o dano, previsto no art. 163, somente é punido a título de dolo. O dano culposo é um ilícito civil. Teorias adotadas pelo CP: Teoria da vontade quanto ao dolo direto, evidenciada pela expressão “quis o resultado” O dolo é a vontade livre e consciente de querer levar a efeito a conduta prevista no tipo incriminador. Teoria do assentimento, do consentimento ou da assunção quanto ao dolo eventual, no que se refere à expressão “assumiu o risco de - produzi-lo”. O agente não quer o resultado diretamente, mas o entende como possível e o aceita. • Espécies de dolo: • Dolo direto: determinado, incondicional. A vontade do agente é direcionada a determinado resultado. Conduta direta e fatalisticamente dirigida ao resultado. Dolo por excelência. Dolo indireto: a vontade do agente não está dirigida a um resultado determinado. Divide-se em alternativo e eventual. Dolo indireto alternativo: o agente busca, indistintamente, um resultado ou outro, com igual intensidade. Exemplo: agente que atira para matar ou ferir. Responderá, conforme a teoria da vontade, pelo crime mais grave, ainda que tentado. • Dolo indireto eventual: o agente prevê uma pluralidade de resultados, mas sua intenção se dirige a um, aceitando, porém o outro. • O agente considera seriamente como possível a realização do tipo legal e se conforma com ela. • Ex: quero ferir, mas aceito matar. Critério prático para identificação do dolo eventual: • form • lado por Frank Seja assim ou de outra maneira, suceda isto ou aquilo, em qualquer caso agirei” O agente aceita o resultado como possível ou provável • Tendência jurisprudencial de identificar doloeventual em crimes graves de trânsito (ex: ‘racha’ ou ‘pega’) Art. 18 - Diz-se o crime: II - Culposo, quando o agente deu causa ao resultado por imprudência, negligência ou imperícia. Culpa é elemento normativo da conduta. Valoração no caso concreto. Em regra, são tipos penais abertos. A lei não diz expressamente no que consiste o comportamento culposo. Não há uma definição típica completa e precisa, cabendo ao magistrado aferir e completar no caso concreto. Exemplo: art. 121, § 3º diz, simplesmente: “Se o homicídio é culposo” Definição de crime culposo em tipo penal fechado: art. 180, § 3º (receptação culposa; único crime patrimonial culposo). Legislador indica as formas de culpa: “§ 3º Adquirir ou receber coisa que, por sua natureza ou pela desproporção entre o valor e o preço, ou pela condição de quem a oferece, deve presumir-se obtida por meio criminoso.” O resultado poderia ser evitado, com a devida atenção, caso o agente não tivesse agido com imprudência, negligência ou imperícia (inobservância de um dever objetivo de cuidado). O dever objetivo de cuidado é dirigido a todos, que devemos nos atentar para as regras de convivência social, ainda que não expressas ou escritas, a fim de que haja harmonia. • Modalidades de culpa: Imprudência: agente atua de forma afoita, intempestiva, irrefletida, sem a observância das cautelas necessárias. Modalidade positiva de culpa. • Prática de um ato perigoso, sem os cuidados que o caso requer. Desenvolve-se junto à ação. Exemplo: direção em excesso de velocidade, limpeza de uma arma municiada. • Negligência: ausência de precaução. Omissão de um agir cuidadoso. É deixar de fazer algo que a diligência normal impunha. Ocorre previamente à conduta. Exemplos: deixar arma ou medicamentos acessíveis a crianças, dirigir com pneus velhos, gastos. Imperícia: falta de aptidão técnica, momentânea ou não, para o exercício de arte, profissão ou ofício. • Também chamada de culpa profissional. • Pode se caracterizar com médicos, motoristas profissionais. • A imperícia diferencia-se do erro profissional, o qual exclui a culpa, pois a falha é da ciência, e não do agente. • Exemplo: avanço da ciência ainda limitado para a cura de certas doenças. As modalidades de culpa podem coexistir no mesmo fato. Exemplo: pode haver negligência e imprudência (pessoa que dirige em alta velocidade seu carro na chuva, com pneus gastos). ELEMENTOS DO CRIME CULPOSO Conduta voluntária, comissiva ou omissiva. A vontade do agente se limita à realização da conduta perigosa, e não à produção do resultado naturalístico) • Violação do dever objetivo de cuidado Imprudência, negligência ou imperícia. Regras básicas para o convívio social. A desaprovação jurídica recai sobre a forma de realização da ação ou da seleção dos meios para realizá-la (desvalor da ação). Resultado naturalístico involuntário (não querido, nem assumido pelo agente) em regra, o crime culposo é material, isto é, modifica o mundo dos fatos. Exemplo: deixar um vaso pesado e grande no parapeito de apartamento do 13º andar (Rogério Greco). Nexo causal Relação de causa e efeito entre a conduta voluntária perigosa e o resultado involuntário (art. 13 do CP – conditio sine qua non) • Tipicidade Subsunção do fato ao modelo previsto em lei. Na conduta culposa, os meios escolhidos e empregados pelo agente para atingir a finalidade lícita são inadequados ou mal utilizados. • O crime culposo deve estar previsto legalmente. Previsibilidade objetiva No crime culposo, o agente não prevê aquilo que lhe era previsível. É a possibilidade do homem médio (pessoa comum), segundo a experiência geral, prever o resultado. O agente tem possibilidade de conhecer o perigo que a sua conduta gera a um determinado bem jurídico. O que é o homem médio (homo medius, standard)? Pessoa comum, com inteligência mediana, com diligência e perspicácia normais à generalidade das pessoas. Nem gênio, nem desleixado. Nelson Hungria: “previsível é o fato cuja possível superveniência não escapa à perspicácia comum.” A culpa é elemento normativo do tipo penal, isto é, caberá ao magistrado fazer um juízo de valor, inserindo o homem médio naquele contexto em específico, para então concluir se o resultado era previsível ou não. A previsibilidade é objetiva, pois considera o fato e o conceito de homem médio. Não se analisa as condições pessoais do agente. O fato é típico e ilícito. O perfil individual do agente é aferido e valorado na culpabilidade Exemplo: agente que dirige em alta velocidade nas proximidades de escola no horário de saída das crianças, atropelando uma delas (Rogério Greco). Se o homem médio tivesse agido de forma diferente naquelas circunstâncias, a fim de evitar o resultado, é sinal de que este era previsível. Não incorrerá em culpa, por outro lado, quando a previsibilidade escapar ao homem médio. Exemplo: lancha e náufrago em alto-mar (Rogério Sanches). Ausência de previsão: em regra, nos crimes culposos, o agente não prevê um resultado objetivamente previsível pelo homem médio. Nesse caso, tem-se a culpa inconsciente ou comum. • Todavia, pode ocorrer a previsão do resultado, quando se fala da culpa consciente. • Culpa consciente é aquela em que o agente, embora prevendo o resultado, não deixa de praticar a conduta, acreditando, sinceramente, que este resultado não vai ocorrer. O resultado, embora previsto, não é assumido, nem aceito pelo agente, que confia na sua não ocorrência. ESPÉCIES DE CULPA • Culpa inconsciente ou comum: sem previsão. O agente não prevê o resultado objetivamente previsível. • Culpa consciente: o agente prevê o resultado objetivamente previsível, porém realiza a conduta acreditando sinceramente que o resultado não ocorrerá. Estágio mais avançado da culpa. Aproxima-se do dolo eventual, mas com ele não se confunde. • Culpa consciente x Dolo eventual • Na culpa, o agente não quer o resultado, nem assume o risco de produzi-lo. Sabe ser possível o resultado, mas acredita sinceramente ser capaz de evitá-lo. • No dolo eventual, o agente atua com indiferença. Prevê o resultado como possível e aceita a sua ocorrência. • Crimes de trânsito • Embriaguez ao volante = dolo eventual (?) • No dolo eventual, o agente antevê como possível o resultado e o aceita, não se importando realmente com a sua ocorrência. • Exemplos: indivíduo que se embriaga em sua festa de aniversário; motorista atrasado em alta velocidade que confiou no pedestre, que se desviaria a tempo • A distinção entre culpa consciente e dolo eventual é bastante tênue e somente poderá ser feita no caso concreto. • STF: diante da impossibilidade de se adentrar na psique do agente, deve-se analisar todas as circunstâncias objetivas do caso concreto. • Importante: • Para fins de aplicação da pena, o CP não diferencia a culpa consciente da inconsciente. • Não há compensação de culpas no Direito Penal. Cada um responde pelo resultado a que deu causa. O comportamento da vítima pode ser valorado na primeira fase de dosimetria da pena (art. 59 CP, circunstâncias judiciais). Somente a culpa exclusiva da vítima irá excluir a culpa do agente.do STJ: “Presentes a materialidade e a autoria, afigura-se típica, em relação ao crime previsto no artigo 184, parágrafo 2º, do Código Penal, a conduta de expor à venda CDs e DVDs piratas.” • A venda de CDs e DVDs “piratas” é crime, não se admitindo a aplicação da teoria da adequação social • Contravenção do jogo do bicho (art. 58 do Decreto Lei 3688/41): continua sendo punível. • O costume não tem o condão de abolir a figura típica. • O costume é interpretativo, e não abolicionista. Somente a lei produz a abolitio criminis. • O valor do objeto material não é o único parâmetro • Condições pessoais do agente devem ser analisadas: Em regra, não se aplica ao reincidente, portador de maus antecedentes e ao criminoso habitual. Análise casuística. Críticas: adoção do direito penal do autor. Desconsidera-se o fato em si, analisando-se a vida pregressa de seu autor. Condição da vítima (condições econômicas, valor sentimental do bem, consequências do crime) Não há valor máximo (teto) a ser considerado. • Análise casuística Pode ser aplicado a atos infracionais, crimes ambientais, descaminho e crimes tributários Não se aplica a insignificância: • Crimes hediondos e equiparados • Crimes cometidos com violência ou grave ameaça à pessoa • Uso de entorpecentes (posse de drogas para consumo pessoal) • Crimes contra a fé pública (moeda falsa) • Crimes contra a Administração Pública (Súmula 599- STJ) Contrabando (natureza ilícita da mercadoria importada ou exportada) Violência doméstica ou familiar contra a mulher (Lei Maria da Penha. Súmula 589 – STJ) • Furto famélico: situação comprovada de extrema penúria. Não há crime pela incidência da excludente de ilicitude consistente no estado de necessidade (art. 24 CP) Tema Repetitivo 157 da 3ª Seção do STJ, incide o princípio da insignificância aos crimes tributários federais e de descaminho quando o débito tributário verificado não ultrapassar o limite de R$ 20.000,00 (vinte mil reais), a teor do disposto no art. 20 da Lei n. 10.522/2002, com as atualizações efetivadas pelas Portarias 75 e 130, ambas do Ministério da Fazenda. PRINCÍPIO DA OFENSIVIDADE OU LESIVIDADE Tem dois aspectos: orientação à atividade de produção das leis (a conduta proibida deve conter verdadeiro conteúdo ofensivo a bens relevantes) e critério interpretativo, eis que a ofensividade ou lesividade devem ser constatadas em concreto. Somente se admite a configuração da infração penal quando o interesse já selecionado (reserva legal) sofre um ataque (ofensa) efetivo, representado por um perigo concreto ou danos. Qualitativamente: o princípio da lesividade impede a criminalização redutora das liberdades constitucionais (crença, pensamento, consciência). Quantitativamente: o princípio proíbe a cominação, aplicação ou execução de pena em casos de lesões irrelevantes (expressão do princípio da insignificância) PRINCÍPIO DE HUMANIDADE Dignidade da pessoa humana como valor superior a todos os demais. Valor fundante da ordem normativa interna. • Garantia de integridade física e moral do indivíduo preso; A proscrição de penas cruéis e infamantes, a proibição de tortura e maus-tratos nos interrogatórios policiais e a obrigação imposta ao Estado de dotar sua infraestrutura carcerária de meios e recursos que impeçam a degradação e a dessocialização dos condenados são desdobramentos do princípio da humanidade • Não se limita à proibição da cominação abstrata de penas cruéis, mas também a concreta execução cruel Art. 5º, CF • XLVIII - a pena será cumprida em estabelecimentos distintos, de acordo com a natureza do delito, a idade e o sexo do apenado; • XLIX é assegurado aos presos o respeito à integridade física e moral; • L Às presidiárias serão asseguradas condições para que possam permanecer com seus filhos durante o período de amamentação; Art. 5º, inc. XLVI, CF. A lei regulará a individualização da pena e adotará, entre outras, as seguintes: • privação ou restrição da liberdade; • perda de bens; multa; • prestação social alternativa; • suspensão ou interdição de direitos; Três fases da individualização da pena; Cominação: seleção pelo legislador das condutas a serem punidas e cominação das penas a serem aplicadas, de acordo com a importância do bem jurídico. Plano abstrato. Aplicação: incidência da pena a um agente específico, que praticou uma conduta típica, ilícita e culpável. Sistema trifásico de aplicação da pena pelo magistrado (art. 68 CP). • Plano individual e concreto. Execução: art. 5º da LEP (Lei 7.210/84). Os condenados serão classificados, segundo os seus antecedentes e personalidade, para orientar a individualização da execução penal. Mirabete: dar a cada preso as oportunidades e os elementos necessários para sua reinserção social, de acordo com as características individuais. PRINCÍPIO DA LIMITAÇÃO DAS PENAS Pena de morte é admitida no Brasil? Art. 5º, inc. XLVII, CF. Não haverá penas: de morte, salvo em caso de guerra declarada, nos termos do art. 84, XIX (fuzilamento, art. 56 do CPM); • De caráter perpetuo; • de trabalhos forçados; • de banimento; • Cruéis; Relação com os princípios da dignidade da pessoa e de humanidade. Impede o retrocesso na cominação das penas. PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE Consolidação no período iluminista. Obra “Dos delitos e das Penas” (Marquês de Beccaria). • A pena deve ser proporcional ao delito praticado. Desenvolvido pela teoria constitucional alemã Não se encontra expresso na CF, porém decorre de outros, a exemplo da individualização da pena. Juízo de ponderação entre o bem jurídico violado ou posto em perigo e a pena a ser cominada concretamente ao infrator. Relação deve ser equilibrada. Gravidade do fato versus gravidade da pena. Três desdobramentos: • Adequação • Necessidade Proporcionalidade em sentido estrito ou avaliação A pena corresponde à troca jurídica do crime medida em tempo de liberdade suprimida. Juarez Cirino dos Santos Dupla destinação: ao legislador (ao cominar as penas em abstrato) e ao magistrado Discussão presente no art. 213 do CP (condutas com diferentes níveis de gravidade enquadradas como estupro. Ex: beijo lascivo e toque) PRINCÍPIO DA RESPONSABILIDADE PESSOAL Art. 5º, XLV, CF: nenhuma pena passará da pessoa do condenado, podendo a obrigação de reparar o dano e a decretação do perdimento de bens ser, nos termos da lei, estendidas aos sucessores e contra eles executadas, até o limite do valor do patrimônio transferido; • Também conhecido como princípio da impessoalidade ou intranscendência da pena; • Somente a pessoa do condenado poderá ser submetida à sanção imposta pelo Estado. • Caráter estritamente pessoal das sanções penais. A obrigação de reparar o dano (não penal): poderá ser exigida, até as forças da herança. Pena de multa: dívida de valor; não pode ser convertida em pena privativa de liberdade. PRINCÍPIO DA PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA OU NÃO CULPABILIDADE Art. 5º, inc. LVII: “Ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória.” STF: divergência jurisprudencial. Diferentes fases. Em 07/11/2019, o STF, ao julgar as ADCs 43, 44 e 54 (Rel. Min. Marco Aurélio), retornou para a sua segunda posição e afirmou que o cumprimento da pena somente pode ter início com o esgotamento de todos os recursos. Assim, é proibida a execução provisória da pena. Dessa forma, o réu até pode ficar preso antes do trânsito em julgado, mas cautelarmente (preventivamente), e não como execução provisória da pena. • O princípio também se aplica no âmbito da execução penal. No âmbito da execução penal, a aplicação das sanções disciplinares, decorrentes da prática de faltas, exige a observância do devido processo legal e dosprincípios da culpabilidade e da individualização das condutas, não se admitindo sanções de caráter coletivo, conforme art. 45, § 3º, da Lei nº 7.210/84 (LEP). Confira-se, ainda, a jurisprudência do STJ: O princípio da culpabilidade irradia-se pela execução penal, quando do reconhecimento da prática de falta grave, que, à evidência, culmina por impactar o status libertatis do condenado. (HC-292.869/SP. Relatora Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA. SEXTA TURMA, Dje 29/10/2014). PRINCÍPIO DA VEDAÇÃO AO BIS IN IDEM • Deriva da dignidade da pessoa humana • Proibição à dupla punição pelo mesmo fato Súmula 241 do STJ: “A reincidência penal não pode ser considerada como circunstância agravante e, simultaneamente, como circunstância judicial.” Todavia, caso o sujeito seja duplamente reincidente, poderá uma delas servir como circunstância judicial e a outra como agravante. Aplicação da lei penal Art. 1º - Não há crime sem lei anterior que o defina. Não há pena sem prévia cominação legal. Princípios da estrita legalidade e da anterioridade A norma penal incriminadora deve ser instituída por lei em sentido estrito (lei complementar ou lei ordinária), de competência privativa da União, e deve ser anterior ao fato criminoso por não haver crime, nem pena, sem lei prévia que os defina, não é possível o emprego da analogia para criar um novo tipo penal ou agravar uma pena. Analogia: integração, suplementação, colmatação de uma lei. Trata-se da aplicação a um caso de lei que regula situação assemelhada., Analogia Método de pensamento comparativo de grupo de casos. Aplicação da lei penal a fatos não previstos, mas semelhantes aos previstos. Fundamento: princípio de equidade. Situações semelhantes devem receber igual tratamento. • No Direito Penal, somente se admite a analogia in bonam partem. A analogia in malam partem, isto é, aquela que agrava a situação ou prejudica o réu, não é admitida, por ofensa ao princípio da estrita legalidade. • Espécies de analogia: • In malam partem; • In bonam partem • Legal ou legis • Jurídica ou juris Analogia legis: aplica-se ao caso omisso uma lei que cuida de caso semelhante. Vale lembrar não ser admitida a aplicação, por analogia, de lei assemelhada se existe previsão específica para o caso. Não cabe ao magistrado dizer que o legislador deveria ter regulado aquela hipótese de outra forma. • Analogia juris: aplicação ao caso de um princípio geral do direito. Normas penais em branco: São aquelas que não reúnem em si todos os elementos necessários à sua aplicação. Também denominadas normas penais abertas ou cegas. Necessitam de um complemento normativo em seu preceito primário (em regra). • Preceito primário: descrição da conduta criminosa Preceito secundário: pena Art. 121. Matar alguém: (preceito primário) Pena – reclusão, de seis a vinte anos (preceito secundário) Normas penais em branco podem ser próprias (em sentido estrito ou heterogêneas), quando o complemento é dado por espécie normativa diversa da lei (portaria, por exemplo) ou impróprias (em sentido lato ou homogêneas), quando o complemento é fornecido pela própria lei. As normas penais em branco impróprias Ou homogêneas, por seu turno, dividem-se em homovitelinas e heterovitelinas. • Homovitelinas: a lei incriminadora e seu complemento encontram-se no mesmo diploma legislativo • Heterovitelinas: a lei incriminadora e seu complemento estão em diplomas diversos Norma penal em branco própria: Lei 11.343/06 (Lei de Drogas): Art. 1º Esta Lei institui o Sistema Nacional de Políticas Públicas sobre Drogas Sisnad; Prescreve medidas para prevenção do uso indevido, atenção e reinserção social de usuários e dependentes de drogas; estabelece normas para repressão à produção não autorizada e ao tráfico ilícito de drogas e define crimes. Parágrafo único. Para fins desta Lei, consideram-se como drogas as substâncias ou os produtos capazes de causar dependência, assim especificados em lei ou relacionados em listas atualizadas periodicamente pelo Poder Executivo da União. Os crimes previstos na Lei de Drogas são classificados como normas penais em branco próprias ou em sentido estrito, pois necessitam de complementação por espécie normativa diversa da lei (ato administrativo do Ministério da Sáude/ ANVISA) Norma penal em branco imprópria homovitelina Peculato. • Art. 312. Apropriar-se o funcionário público de dinheiro, valor ou qualquer outro bem móvel, público ou particular, de que tem a posse em razão do cargo, ou desviá-lo, em proveito próprio ou alheio: • Pena - reclusão, de dois a doze anos, e multa. O art. 312 se trata de norma penal em branco imprópria ou em sentido lato homovitelina, já que a definição de funcionário público é dada pelo próprio Código Penal, em seu art. 327. • Funcionário público Art. 327. Considera-se funcionário público, para os efeitos penais, quem, embora transitoriamente ou sem remuneração, exerce cargo, emprego ou função pública. • § 1º - Equipara-se a funcionário público quem exerce cargo, emprego ou função em entidade paraestatal, e quem trabalha para empresa prestadora de serviço contratada ou conveniada para a execução de atividade típica da Administração Pública. Norma penal em branco imprópria heterovitelina: Induzimento a erro essencial e ocultação de impedimento Art. 236 - Contrair casamento, induzindo em erro essencial o outro contraente, ou ocultando-lhe impedimento que não seja casamento anterior: Pena - detenção, de seis meses a dois anos. A definição dos impedimentos está no Código Civil Lei penal no tempo Art. 2º. Ninguém pode ser punido por fato que lei posterior deixa de considerar crime, cessando em virtude dela a execução e os efeitos penais da sentença condenatória. Parágrafo único. • A lei posterior, que de qualquer modo favorecer o agente, aplica-se aos fatos anteriores, ainda que decididos por sentença condenatória transitada em julgado Abolitio criminis: supressão da figura criminosa. • Causa extintiva da punibilidade (art. 107, inc. III, CP). do STF Desaparecem os efeitos penais (reincidência, maus antecedentes), permanecendo os extrapenais (efeitos civis, obrigação de reparar o dano, constituição de título executivo) • Não se fala de abolitio criminis quando o fato criminoso passa a ser disciplinado por dispositivo legal diverso (princípio da continuidade normativa ou continuidade normativo-típica). Exemplo: art. 214 do CP revogado em 2009. Superveniência de lei penal mais benéfica (lex mitior ou novatio legis in mellius) • Art. 5º, inc. XL, da CF: a lei penal não retroagirá, salvo para beneficiar o réu. A retroatividade da lei penal mais benéfica opera-se de imediato, dispensa cláusula expressa ou regulamentação e alcança inclusive os feitos já transitados em julgado. Nesse último caso, caberá ao juízo das execuções penais aplicar a lei penal mais favorável. Súmula 611. • Súmula 611 STF: Transitada em julgado a sentença condenatória, compete ao juízo das execuções a aplicação de lei mais benigna. • Art. 66 da Lei de Execução Penal (Lei nº 7.210/84) Art. 66. Compete ao Juiz da execução: I - Aplicar aos casos julgados lei posterior que de qualquer modo favorecer o condenado; Retroatividade da jurisprudência. Seria possível? • A mudança de entendimento jurisprudencial superveniente poderia retroagir para alcançar fatos praticados na vigência de entendimento diverso? A CF só se refere à retroatividade da lei. CP não disciplina. • STJ: impossibilidade de revisão criminal fundada na mudança de orientação jurisprudencial. Exceção: possibilidade da retroatividade benéfica nos casos de decisões com efeito vinculante (Súmulas Vinculantes e controle concentrado de constitucionalidade). Rogério Sanches Cunha. • Combinaçãode leis. Lex tertia. Conflito de duas leis penais no tempo, com partes favoráveis e desfavoráveis ao réu. Exemplo: aumenta-se a pena cominada em abstrato, mas há previsão de uma causa de diminuição de pena antes inexistente. Ou, ainda, aumenta-se a pena em abstrato, mas se exclui a multa. • É possível a mescla das leis? A doutrina se divide. Jurisprudência: STF e STJ atualmente entendem não ser possível a combinação de duas leis, de sorte a se extrair o resultado mais favorável ao réu. Adoção da teoria da ponderação unitária ou global. Atenção aos princípios da reserva legal e da separação de poderes. • Magistrado não pode se arvorar na condição de legislador e criar uma terceira lei. Súmula 501 do STJ: É cabível a aplicação retroativa da Lei n. 11.343/2006, desde que o resultado da incidência das suas disposições, na íntegra, seja mais favorável ao réu do que o advindo da aplicação da Lei n. 6.368/1976, sendo vedada a combinação de leis. Lei excepcional e temporária Art. 3º CP. A lei excepcional ou temporária, embora decorrido o período de sua duração ou cessadas as circunstâncias que a determinaram, aplica-se ao fato praticado durante sua vigência. • Lei temporária: vigência preestabelecida no tempo. • Termo final explícito. Exemplo: Lei Geral da Copa do Mundo de 2014 (vigência até 31 de dezembro de 2014). Lei excepcional: relacionada a situações de anormalidade institucional, a um evento transitório, calamidade. • Ambas são autor revogáveis. Possuem ultratividade: aplicam-se a fato ocorrido durante a sua vigência, embora já decorrido o prazo de duração. Tempus regit actum. • Conflito aparente de normas penais Ocorre quando, em tese, mostra-se possível aplicar a um fato dois ou mais tipos penais, ambos vigentes. Deve ser escolhida a disposição que apresenta a melhor adequação típica (tipicidade penal como perfeita adequação do fato à norma jurídica). O conflito é apenas aparente, pois desaparece com a correta interpretação, feita com a aplicação do princípio adequado. A solução do conflito aparente de leis busca manter a coerência sistemática do ordenamento e evitar o indesejável bis in idem; • Princípios aplicáveis para a solução do conflito aparente de normas penais: • Especialidade; • Subsidiariedade; • Consunção; • Alternatividade (?) Especialidade. A lei especial prevalece sobre a lei geral. A lei especial, ou específica, possui conteúdo diferenciado, particularizado. • Art. 12 - As regras gerais deste Código aplicam-se aos fatos incriminados por lei especial, se esta não dispuser de modo diverso. Exemplo: homicídio culposo na direção de veículo automotor (aplica-se o art. 302 do Código de Trânsito Brasileiro). Subsidiariedade A lei primária prevalece sobre a lei subsidiária. Relação de subsidiariedade: graus diferentes de ofensa ao bem jurídico. • A lei subsidiária é o chamado “soldado de reserva”, na expressão de Nelson Hungria. A norma subsidiária só se aplica quando o fato não se subsome a crime mais grave. Disparo de arma de fogo (Lei 10.826/03). Art. 15. Disparar arma de fogo ou acionar munição em lugar habitado ou em suas adjacências, em via pública ou em direção a ela, desde que essa conduta não tenha como finalidade a prática de outro crime. Falsa identidade. • Art. 307 - Atribuir-se ou atribuir a terceira falsa identidade para obter vantagem, em proveito próprio ou alheio, ou para causar dano a outrem: • Pena detenção, de três meses a um ano, ou multa, se o fato não constitui elemento de crime mais grave. Consunção ou absorção O fato mais amplo e grave consome, absorve, os fatos menos amplos e graves. O crime previsto por uma norma (consumida) é fase de realização do crime previsto por outra norma (consuntiva) ou é uma fase normal de transição (crime progressivo). Sanches Cunha. Objetivo: evitar a dupla punição (bis in idem) Exemplos: • progressão criminosa (alteração do dolo, com crescente lesão ao bem jurídico) e antefatos impuníveis; (violação de domicílio e furto, homicídio e porte de arma, roubo e dano ao patrimônio). Crime progressivo é diferente de progressão criminosa Crime progressivo: O agente, para alcançar o resultado do crime mais grave pretendido, passa, necessariamente, pelo crime menos grave. Exemplo: a lesão é um crime de passagem para o homicídio. Só responde pelo homicídio. Progressão criminosa: O agente substitui seu dolo, dando causa a resultado mais grave. Consuma o crime menor e depois concretiza o crime maior, contra um mesmo bem jurídico. Exemplo: deseja inicialmente lesionar a vítima. Mas, posteriormente, após a vítima já ter sido lesionada, decide matar. Só responde pelo homicídio. Alternatividade Duas acepções doutrinárias: A aplicação de uma norma a um fato exclui a aplicabilidade de outra que prevê o mesmo delito. Tipos mistos alternativos, de ação múltipla ou de conteúdo variado. Praticado pelo sujeito um ou mais núcleos, restará configurado crime único. Para a doutrina dominante, tal princípio não subsiste, já que a consunção pode resolver o conflito aparente dentro da mesma figura penal. Tempo do crime Art. 4º CP. Considera-se praticado o crime no momento da ação ou da omissão, ainda que outro seja o momento do resultado. Adoção da teoria da atividade ou da ação. Princípio da coincidência, congruência ou simultaneidade: todos os elementos do crime (fato típico, ilicitude e culpabilidade) devem estar presentes no momento da conduta. O momento do resultado não é relevante. Qual a importância? Definição da lei que vai reger o caso, imputabilidade do agente. Exemplo: adolescente com 17 anos efetua disparo de arma com intenção de matar. A vítima vai ao hospital e falece quando o agente já tinha completado 18 anos. Responderá pelo ato infracional, pois a imputabilidade se afere no momento da conduta. Súmula 711 do STF: superveniência de lei penal mais severa enquanto não cessada a continuidade ou a permanência. Aplica-se a lei nova, ainda que mais grave, já que a conduta continua sendo praticada. • Atenção: art. 111, inc. I, do CP. A prescrição da pretensão punitiva começa a correr da data da consumação do crime (teoria do resultado). Territorialidade Art. 5º CP. Aplica-se a lei brasileira, sem prejuízo de convenções, tratados e regras de direito internacional, ao crime cometido no território nacional. • Lei penal e soberania do Estado nos limites de seu território. A territorialidade é a regra, independentemente da nacionalidade do agente, da vítima ou do objeto jurídico. Exceções: brasileiro que comete crime no exterior e estrangeiro que comete crime no Brasil. Permite-se a eficácia de convenções e tratados internacionais assim, o CP adotou o princípio da territorialidade mitigada ou temperada Território Espaço em quem o Estado exerce sua soberania política. Território brasileiro por extensão: § 1º. Para os efeitos penais, consideram-se como extensão do território nacional as embarcações e aeronaves brasileiras, de natureza pública ou a serviço do governo brasileiro onde quer que se encontrem, bem como as aeronaves e as embarcações brasileiras, mercantes ou de propriedade privada, que se achem, respectivamente, no espaço aéreo correspondente ou em alto- mar. § 2º. É também aplicável a lei brasileira aos crimes praticados a bordo de aeronaves ou embarcações estrangeiras de propriedade privada, achando-se aquelas em pouso no território nacional ou em vôo no espaço aéreo correspondente, e estas em porto ou mar territorial do Brasil. A lei brasileira é aplicável, por se tratar de crime praticado em embarcação atracada em porto brasileiro: Art. 5º Aplica-se a lei brasileira, sem prejuízo de convenções, tratados e regras de direito internacional, ao crime cometido no territórionacional. § 2º. É também aplicável a lei brasileira aos crimes praticados a bordo de aeronaves ou embarcações estrangeiras de propriedade privada, achando-se aquelas em pouso no território nacional ou em voo no espaço aéreo correspondente, e estas em porto ou mar territorial do Brasil. Embarcações e aeronaves Aplicação da lei brasileira • públicas ou a serviço do governo brasileiro Sempre (estejam em território nacional ou estrangeiro). • Extensão do território nacional. • Mercantes ou particulares de bandeira brasileira; em alto-mar ou no espaço aéreo correspondente; • Estrangeiras (privadas) Apenas em território brasileiro. Lugar do crime Art. 6º. Considera-se praticado o crime no lugar em que ocorreu a ação ou omissão, no todo ou em parte, bem como onde se produziu ou deveria produzir- se o resultado. Teoria adotada pelo CP: teoria da ubiquidade (da unidade ou mista). A prática de um crime pode se desenvolver em tempos e lugares diversos Pluralidade de países (pluralidade de comarcas = questão de competência). Crime à distância para a incidência da lei brasileira, basta a prática de um único ato executório no Brasil, ou então que ocorra o resultado. A teoria não se importa com os atos preparatórios ou de exaurimento. Extraterritorialidade Aplicação da lei brasileira a crimes cometidos no exterior pode ser incondicionada ou condicionada não se aplica às contravenções penais, isto é, contravenções praticadas no estrangeiro não estão sujeitas à aplicação da lei brasileira Extraterritorialidade incondicionada: • O agente é punido segundo a lei brasileira, ainda que tenha sido absolvido ou condenado no estrangeiro. A mera prática do crime já autoriza a incidência da lei brasileira, independentemente de qualquer outra condição (art. 7º, § 1º) Exceção ao princípio do ne bis in idem (proibição à dupla punição por um mesmo fato) Extraterritorialidade INCONDICIONADA Hipóteses: Art. 7º. Ficam sujeitos à lei brasileira, embora cometidos no estrangeiro: I - Os crimes: contra a vida ou a liberdade do Presidente da República; contra o patrimônio ou a fé pública da União, do Distrito Federal, de Estado, de Território, de Município, de empresa pública, sociedade de economia mista, autarquia ou fundação instituída pelo Poder Público; contra a administração pública, por quem está a seu serviço; de genocídio, quando o agente for brasileiro ou domiciliado no Brasil. Territorialidade Art. 5º CP. Aplica-se a lei brasileira, sem prejuízo de convenções, tratados e regras de direito internacional, ao crime cometido no território nacional. • Lei penal e soberania do Estado nos limites de seu território. A territorialidade é a regra, independentemente da nacionalidade do agente, da vítima ou do objeto jurídico. Exceções: brasileiro que comete crime no exterior e estrangeiro que comete crime no Brasil. • Permite-se a eficácia de convenções e tratados internacionais assim, o CP adotou o princípio da territorialidade mitigada ou temperada Espaço em quem o Estado exerce sua soberania política. Território brasileiro por extensão: § 1º. Para os efeitos penais, consideram-se como extensão do território nacional as embarcações e aeronaves brasileiras, de natureza pública ou a serviço do governo brasileiro onde quer que se encontrem, bem como as aeronaves e as embarcações brasileiras, mercantes ou de propriedade privada, que se achem, respectivamente, no espaço aéreo correspondente ou em alto- mar. § 2º. É também aplicável a lei brasileira aos crimes praticados a bordo de aeronaves ou embarcações estrangeiras de propriedade privada, achando-se aquelas em pouso no território nacional ou em voo no espaço aéreo correspondente, e estas em porto ou mar territorial do Brasil A lei brasileira é aplicável, por se tratar de crime praticado em embarcação atracada em porto brasileiro: • Art. 5º. Aplica-se a lei brasileira, sem prejuízo de convenções, tratados e regras de direito internacional, ao crime cometido no território nacional. § 2º. É também aplicável a lei brasileira aos crimes praticados a bordo de aeronaves ou embarcações estrangeiras de propriedade privada, achando-se aquelas em pouso no território nacional ou em voo no espaço aéreo correspondente, e estas em porto ou mar territorial do Brasil. Embarcações e aeronaves Aplicação da brasileira Públicas ou a serviço do governo brasileiro Sempre (estejam em território nacional ou estrangeiro). Extensão do território nacional. Mercantes ou particulares de bandeira brasileira em alto-mar ou no espaço aéreo correspondente Estrangeiras (privadas) apenas em território brasileiro. Lugar do Crime Art. 6º. Considera-se praticado o crime no lugar em que ocorreu a ação ou omissão, no todo ou em parte, bem como onde se produziu ou deveria produzir-se o resultado. Teoria adotada pelo CP: teoria da ubiquidade (da unidade ou mista). A prática de um crime pode se desenvolver em tempos e lugares diversos Pluralidade de países (pluralidade de comarcas = questão de competência). Crime à distância para a incidência da lei brasileira, basta a prática de um único ato executório no Brasil, ou então que ocorra o resultado. • A teoria não se importa com os atos preparatórios ou de exaurimento. Aplicação da lei brasileira a crimes cometidos no exterior pode ser incondicionada ou condicionada não se aplica às contravenções penais, isto é, contravenções praticadas no estrangeiro não estão sujeitas à aplicação da lei brasileira Extraterritorialidade incondicionada: O agente é punido segundo a lei brasileira, ainda que tenha sido absolvido ou condenado no estrangeiro. A mera prática do crime já autoriza a incidência da lei brasileira, independentemente de qualquer outra condição (art. 7º, § 1º) • Exceção ao princípio do ne bis in idem (proibição à dupla punição por um mesmo fato). INCONDICIONADA Hipóteses: Art. 7º Ficam sujeitos à lei brasileira, embora cometidos no estrangeiro: I Os crimes: contra a vida ou a liberdade do Presidente da República; Extraterritorialidade CONDICIONADA Art. 7º, inc. II Art. 7º Ficam sujeitos à lei brasileira, embora cometidos no estrangeiro: II - Os crimes: a) que, por tratado ou convenção, o Brasil se obrigou a reprimir; (princípio da justiça universal) b) praticados por brasileiro; (princípio da nacionalidade ativa) c) praticados em aeronaves ou embarcações brasileiras, mercantes ou de propriedade privada, quando em território estrangeiro e aí não sejam julgados (princípio da representação, pavilhão, bandeira) • contra o patrimônio ou a fé pública da União, do Distrito Federal, de Estado, de Território, de Município, de empresa pública, sociedade de economia mista, autarquia ou fundação instituída pelo Poder Público; • contra a administração pública, por quem está a seu serviço; d) de genocídio, quando o agente for brasileiro ou domiciliado no Brasil. Num caso de violência doméstica, a alínea “a” também incide, pois o delito de lesão corporal em situação de violência contra a mulher é objeto do art. 7º da Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher, a Convenção de Belém do Pará, de 1994, promulgada no Brasil pelo Decreto 1.973/1996. • Condições cumulativas, isto é, devem estar todas presentes; • conforme o disposto no § 2º 2º - Nos casos do inciso II, a aplicação da lei brasileira depende do concurso das seguintes condições: • entrar o agente no território nacional; • ser o fato punível também no país em que foi praticado; • estar o crime incluído entre aqueles pelos quais a lei brasileira autoriza a extradição; • não ter sido o agente absolvido no estrangeiro ou não ter aí cumprido a pena; • não ter sido o agente perdoado no estrangeiroou, por outro motivo, não estar extinta a punibilidade, segundo a lei mais favorável. Imunidades • Imunidades diplomáticas e de chefes de governos estrangeiros • Fundamento no direito internacional, no princípio da reciprocidade • A imunidade é funcional, e não pessoal • O diplomata goza de imunidade da jurisdição penal, para qualquer espécie de delito • Estende-se a funcionários de organizações internacionais, quando em serviço, e familiares. A imunidade é irrenunciável pelo ocupante da função • Embaixada é extensão do território que representa? • Não há regra específica no CP • Embora sejam invioláveis, segundo a Convenção de Viena, não • são extensão do território do país estrangeiro. • A embaixada da Itália no Brasil é território brasileiro e ao crime • nela praticado será aplicada a lei brasileira, salvo a incidência de • convenção, tratado ou regra de direito internacional. • Eficácia da sentença estrangeira Art. 9º A sentença estrangeira, quando a aplicação da lei brasileira produz na espécie as mesmas consequências, pode ser homologada no Brasil para: I - Obrigar o condenado à reparação do dano, a restituições e a outros efeitos civis; II - Sujeitá-lo a medida de segurança. Parágrafo único - A homologação depende: para os efeitos previstos no inciso I, de pedido da parte interessada; para os outros efeitos, da existência de tratado de extradição com o país de cuja autoridade judiciária emanou a sentença, ou, na falta de tratado, de requisição do Ministro da Justiça Sentença como ato de soberania de um Estado Necessidade de homologação para que tenha validade no território nacional, como título executivo judicial A homologação é de competência do STJ (art. 105, inc. I, alínea i) Súmula 420 do STF: deve haver prova do trânsito em julgado para fins de homologação Art. 63 do CP: não há necessidade de homologação para fins de reincidência Contagem de prazos Art. 10. • O dia do começo inclui-se no cômputo do prazo. • Contam-se os dias, os meses e os anos pelo calendário comum. • Termo inicial do prazo: a quo • Termo final do prazo: ad quem • Nos prazos penais, o dia do início é computado, sendo desprezadas as frações. Exemplos: prisão, prescrição, decadência, livramento condicional. Art. 11. Desprezam-se, nas penas privativas de liberdade e nas restritivas de direitos, as frações de dia, e, na pena de multa, as frações de cruzeiro. Os prazos penais são improrrogáveis para o primeiro dia útil subsequente. Exemplo: prazo decadencial para oferecimento de queixa-crime. A contagem dos meses não leva em consideração a quantidade de dias. Exemplo: pena de 1 mês iniciada em 10 de fevereiro terminará de ser cumprida em 09 de março. Legislação especial Art. 12 - As regras gerais deste Código aplicam-se aos fatos incriminados por lei especial, se esta não dispuser de modo diverso. Conceito analítico de crime A teoria do delito trabalha com três conceitos fundamentais: tipicidade, ilicitude e culpabilidade. O crime é um todo indivisível, porém a aferição é dissecada em elementos. Sistema tripartido de fato punível: segundo a doutrina majoritária, a punibilidade não constitui elemento do crime, mas sim sua consequência. • O crime existe independentemente da punibilidade. • Há entre as três categorias uma relação de sucessão e prejudicialidade. • Assim, a culpabilidade pressupõe a ilicitude e está a tipicidade. • Tipicidade: perfeita adequação do fato da vida à norma jurídica. Ilicitude: Ação contrária ao direito, realizada sem o amparo de uma causa justificante (legítima defesa, estado de necessidade, estrito cumprimento do dever legal ou exercício regular do direito). A ação típica e antijurídica constitui o chamado injusto típico. Culpabilidade: juízo de reprovação sobre o autor de um fato típico e ilícito, por lhe ser possível e exigível um comportamento diverso, isto é, conforme o direito. Fato típico e seus elementos É o fato humano (ou praticado por pessoa jurídica, nas hipóteses de crimes ambientais) que se amolda, perfeitamente, aos elementos descritos pelo tipo penal. • Quatro elementos (crimes materiais e consumados): CONDUTA (dolosa ou culposa; comissiva ou omissiva) RESULTADO NATURALÍSTICO NEXO CAUSAL (material ou normativo – imputação objetiva) TIPICIDADE (formal, material, conglobante) Crime material é aquele em que o tipo penal descreve uma conduta e o respectivo resultado naturalístico (modificação no mundo dos fatos), sem o qual não se consuma o delito. Nos crimes tentados, formais e de mera conduta, os elementos do fato típico resumem-se à conduta e à tipicidade. Na tentativa, o resultado não ocorre por circunstâncias alheias à vontade do agente. Nos delitos formais, o resultado pode até ocorrer, mas não é necessário para a consumação (corrupção de menores, extorsão mediante sequestro). Já nos crimes de mera conduta não há resultado naturalístico. O tipo descreve apenas uma conduta (omissão de socorro, ato obsceno, violação de domicílio). Conduta Pode se exteriorizar por uma ação ou uma omissão A ação exige um fazer. A omissão tem duas perspectivas: o não fazer, ou o fazer diferente do que lhe impunha um dever jurídico de agir. O conceito doutrinário de conduta é um dos principais pontos de discussão da teoria do crime. Várias teorias foram elaboradas com o fim de delimitar e estabelecer o que é a conduta para fins penais. Evolução das teorias • Causalismo (clássica ou naturalismo) • Neokantismo (neoclássica) • Finalismo • Social da • Funcionalismo (ou pós-finalismo). Teoria causal Também chamada de naturalista, mecanicista ou clássica. O Direito é submetido ao método próprio das ciências naturais, regidas pela lei da causalidade (relação causa-efeito) • Positivismo científico. Tratamento exageradamente formal ao comportamento humano. Início séc. XIX. Von Liszt, Beling A conduta é um processo puramente causal, naturalístico, como movimento corporal e modificadora do mundo exterior. Não há vontade quanto à produção do resultado. • O tipo é a descrição objetiva de uma modificação no mundo exterior. A antijuridicidade é a contrariedade a uma norma do direito e a culpabilidade é a relação psíquica entre o agente e o fato. Tripartite. • Concepção psicológica da culpabilidade • Desvalor do resultado (“fotografia do resultado”) • Principal defeito: separação entre a conduta e o elemento volitivo. • A caracterização da conduta criminosa depende somente de o agente produzir um resultado previsto em lei como infração penal. • Como explicar os crimes omissivos? Como explicar os delitos sem resultado (formais e de mera conduta)? • A teoria causal adota a responsabilidade penal objetiva, isto é, sem intenção? • Não. A intenção é considerada, porém no âmbito da culpabilidade. • Culpabilidade como gênero, dentro do qual dolo e culpa são espécies. • Daí decorre a impossibilidade de distinção entre condutas dolosas e culposas, vez que ao analisar a conduta, a teoria clássica ou causal não faz nenhuma pesquisa sobre a intenção do agente. Teoria Neokanantista • Também chamada de neoclássica e causal-valorativa. • Final do séc. XIX, início séc. XX. • Expoentes: Gustav Radbruch, Mezger Positivistas: prioridade ao ser. Neokantistas: prioridade ao dever ser. • Vão além das definições formais e explicações puramente causais • Introdução de considerações axiológicas e do conceito de conduta omissiva • Conceituação dos elementos da culpabilidade (como juízo de reprovabilidade). • Dolo e culpa continuam alocados na culpabilidade. Teoria finalista Adotada pelo Código Penal. Concebe o crime como fato típico e antijurídico. A culpabilidade diz respeito à reprovabilidadeda conduta. O dolo, que integrava o juízo de culpabilidade, passa a ser elemento estruturante do fato típico. • Correção das contradições da teoria causal • Desenvolvida por Welzel entre 1930 e 1960 • A ação humana é exercício de atividade final. • A ação é um acontecer final e não puramente causal. A conduta não pode ser dissociada da intenção. • O caráter final baseia-se em que o homem pode prever, dentro de certos limites, as consequências possíveis de sua conduta. • “A finalidade é vidente e a causalidade é cega.” Retirada de todos os elementos subjetivos da culpabilidade, que passa a ter uma concepção puramente normativa. • Desvalor da ação • O dolo é natural (sem valoração). • Elementos: consciência e vontade. Com o finalismo, dolo e culpa deslocam-se da culpabilidade para a tipicidade, já que é a finalidade da ação, o dolo, que dirá, por exemplo, se estamos diante de um crime de tentativa de homicídio ou de lesão corporal (se a intenção é matar, homicídio; se a intenção é apenas ferir, lesão corporal). • A teoria final da ação eliminou a separação entre a vontade e seu conteúdo, isto é, eliminou a separação dos aspectos objetivos e subjetivos da ação. O finalismo permitiu a distinção entre delitos dolosos e culposos, o que não era possível pela teoria causal como explicar a estrutura dos crimes culposos, à luz da teoria finalista, já que a intenção do agente é dirigida a um fim conforme o direito? Nos crimes culposos, a reprovação não recai na finalidade do agente, mas sim nos meios que ele elegeu para a consecução de um fim (agir imprudente, negligente ou imperito). Funcionalismo ou pós-finalismo Causalismo e finalismo partem de um conceito pré-jurídico de conduta, isto é, que pertence ao mundo da realidade. Conceito ontológico de ação já o funcionalismo relega o conceito de ação a segundo plano. • Preocupação pragmática. • Ênfase nas funções político-criminais do Direito Penal: prevenção geral e especial. Teleologia da norma. • prática, pragmática. Elaboração de conceitos com base em juízos de valor vinculam-se à teoria da imputação objetiva • (crítica ao conceito tradicional de conduta) • Teorias relativas ou prevencionistas sobre a função do Direito Penal • O fim da pena é a prevenção de novos delitos • Modelos funcionalistas (teleológicos-funcionais) • Década de 1970. Claus Roxin. Reação ao ontologismo e à excessiva abstração do finalismo. • Preocupação Orientação da teoria do delito e da pena segundo as funções político-criminais do Direito Penal • Tipicidade enriquecida com o conceito de imputação objetiva (risco permitido) • Roxin: Escola de Munique. • Funcionalismo ou normativismo teleológico (moderado) • Jakobs: Escola de Bonn. • Funcionalismo ou normativismo sistêmico (radical). Conduta • Somente o ser humano pratica condutas relevantes. Pode se valer de animais como instrumento. • Em tema de crimes ambientais, as pessoas jurídicas também praticam condutas (e só neste caso). • A conduta é o movimento humano voluntário, dominável pela vontade (Sanches Cunha). • Somente a conduta voluntária interessa ao Direito Penal. • Apenas as condutas que se materializam no mundo exterior interessam ao Direito Penal. O simples cogitar (querer interno) não pode ser jamais punido • Excluem a conduta: caso fortuito e força maior (acontecimentos imprevisíveis que fogem ao controle humano). • Se não há vontade, não há dolo, nem culpa • Caso fortuito: acontecimento imprevisível e inevitável provocado pelo homem ou com causa desconhecida (ex: cabo de energia que se rompe e provoca explosão) • Força maior: acontecimento imprevisível e inevitável decorrente da natureza (ex: enchente, raio que provoca incêndio) • Excluem a conduta: atos ou movimentos reflexos, coação física irresistível, sonambulismo e hipnose Coação física irresistível (vis absolutas) • O agente, em razão de força física externa, não se movimenta de acordo com a própria vontade. Não há conduta, pois não há vontade. Se irresistível, exclui a conduta (fato típico). • Não se confunde com a coação moral irresistível (vis compulsivas) • Na coação moral irresistível, há grave ameaça. Há conduta, porém praticada de forma viciada, não livre. Se irresistível, afasta a culpabilidade. • Resultado • Consequência da conduta • Pode ser jurídico (normativo): exposição do bem jurídico tutelado a perigo. Violação da lei penal. • Ou material (naturalístico): modificação do mundo exterior causada pela conduta. • Nem todo crime tem resultado naturalístico (crimes formais ou de consumação antecipada e crimes de mera conduta). • Diante das espécies de resultado, é possível afirmar que um crime sempre possui um resultado, jurídico ou normativo. • Quanto ao resultado normativo, os delitos podem ser classificados em de dano (ou de lesão) e de perigo. Crime de dano ou de lesão: há efetiva lesão ao bem jurídico tutelado. • Não ocorrendo a lesão, verifica-se a tentativa ou um indiferente penal. Exemplo: homicídio, furto, roubo. • Crime de perigo: dispensa a efetiva lesão, bastando a exposição do bem jurídico a perigo. Subdivide-se em perigo abstrato ou concreto. • Quanto ao resultado normativo, os delitos podem ser classificados em de dano (ou de lesão) e de perigo. • Crime de dano ou de lesão: há efetiva lesão ao bem jurídico tutelado. Não ocorrendo a lesão, verifica-se a tentativa ou um indiferente penal. • Exemplo: homicídio, furto, roubo. Crime de perigo: dispensa a efetiva lesão, bastando a exposição do bem jurídico a perigo. RELAÇÃO DE CAUSALIDADE NEXO CAUSAL • Vínculo entre a conduta e o resultado. • Art. 13 do Código Penal: o resultado, de que depende a existência do crime, somente é imputável a quem lhe deu causa. Considera-se causa a ação ou omissão sem a qual o resultado não teria ocorrido. • Resultado naturalístico. • Pertinência do estudo aos crimes materiais. • Teoria adotada pelo CP (regra): equivalência dos antecedentes causais (causalidade simples, condição simples, equivalência das condições ou conditio sine qua non). • Tudo o que contribui, em concreto, para o resultado, é causa. • Como saber se determinada conduta é ou não causa do evento: método de eliminação hipotética, de Thyrén (1894) Método ou processo de eliminação hipotética: supressão mental de determinada conduta. • Se o resultado naturalístico não ocorrer, é porque era também sua causa. • Problema (crítica): o método acarreta o regresso ao infinito • Daí porque a responsabilização demanda o dolo ou a culpa. Causalidade psíquica. • Exemplo: comércio lícito de armas • Logo, a imputação de crime exige a causalidade objetiva e a causalidade psíquica A existência ou não do nexo causal tem relevância apenas para os crimes materiais (de ação e resultado), visto que, para os crimes formais (consumação antecipada), de mera conduta (sem resultado) e omissivos próprios (que não dependem de resultado), o resultado naturalístico é irrelevante. • A produção do resultado é mero exaurimento de um crime já consumado. RELEVÂNCIA DA OMISSÃO • Art. 13, § 2º, do CP: “ A omissão é penalmente relevante quando o omitente devia e podia agir para evitar o resultado.” Aplicação aos crimes omissivos impróprios, ou comissivos por omissão, isto é, aqueles em que o tipo penal descreve uma ação, mas o agente deixa de agir, embora pudesse e devesse agir para impedir a produção do resultado. Portanto, a omissão, em regra, não será típica, por não estar prevista como tipo penal. Somente será penalmente relevante a omissão quando presente o dever de agir. • O CP adota, assim, a teoria normativa. A omissão só terá relevância quando existir o dever de agir. Exemplos de crimes omissivos próprios: Omissão de socorro Art. 135 - Deixarde prestar assistência, quando possível fazê-lo sem risco pessoal, à criança abandonada ou extraviada, ou à pessoa inválida ou ferida, ao desamparo ou em grave e iminente perigo; ou não pedir, nesses casos, o socorro da autoridade pública Omissão de notificação de doença Art. 269 Deixar o médico de denunciar à autoridade pública doença cuja notificação é compulsória. DEVER DE AGIR O dever de agir, conforme as alíneas do § 2º, art. 13, do CP, incumbe a quem (critério legal): • Tenha por lei obrigação de cuidado, proteção ou vigilância • De outra forma, assumiu a responsabilidade de impedir o resultado • Com seu comportamento anterior, criou o risco da ocorrência do resultado Não é suficiente o dever de agir. Exige-se, para a caracterização da omissão penalmente relevante, que o sujeito pudesse agir para evitar o resultado. Poder agir: possibilidade real e efetiva de alguém, na situação concreta e de acordo com o padrão do homem médio, evitar o resultado. • Tenha por lei obrigação de cuidado, proteção ou vigilância • Pais em relação aos filhos menores (mãe deve amamentar o filho) • Policiais, bombeiros • Lei em sentido amplo • Garantidor legal stricto sensu De outra forma, assumiu a responsabilidade de impedir o resultado Garante: a posição de garante surge para todo aquele que, por ato voluntário, capta a confiança dos possíveis afetados por resultados perigosos, a título oneroso ou não professores (de natação, por exemplo), cuidadores (idoso que engasga), enfermeiros, babás (criança afogada no banho) Com seu comportamento anterior, criou o risco da ocorrência do resultado. Ingerência ou situação precedente (amigo que joga outro na piscina) Crime omissivo impróprio. Estupro de vulnerável. Informativo 681 STJ. Estupro de vulnerável. • Irmã da vítima. Conduta omissiva imprópria. Atipicidade. Inocorrência. Possível assunção do papel de garantidor. • Art. 13, § 2º, "b" e "c", do Código Penal. A irmã de vítima do crime de estupro de vulnerável responde por conduta omissiva imprópria se assume o papel de garantidora. Os crimes omissos impróprios, de acordo com a doutrina, são aqueles que "(...) envolvem um não fazer, que implica a falta do dever legal de agir, contribuindo, pois, para causar o resultado. Não têm tipos específicos, gerando uma tipicidade por extensão. Para que alguém responda por um delito omissivo impróprio é preciso que tenha o dever de agir, imposto por lei, deixando de atuar, dolosa ou culposamente, auxiliando na produção do resultado. " • Nas aulas anteriores: • Fato típico e seus elementos • Conduta (ação/omissão; dolosa/culposa), resultado, nexo causal, tipicidade. • Nexo causal: • Elo necessário que une a conduta praticada ao resultado por ela produzido. Se não houver esse vínculo que liga o resultado à conduta, não há relação de causalidade e o resultado não poderá ser atribuído ao agente (Rogério Greco). • Art. 13 do Código Penal: o resultado, de que depende a existência do crime, somente é imputável a quem lhe deu causa. Considera-se causa a ação ou omissão sem a qual o resultado não teria ocorrido. O resultado pode ser naturalístico (modificação no mundo exterior) ou jurídico (lesão ou perigo de lesão a um bem tutelado pela norma penal) todo crime tem resultado jurídico, mas nem todo crime tem resultado naturalístico. Resultado naturalístico. Pertinência do estudo aos crimes materiais. Teoria adotada pelo CP (regra): equivalência dos antecedentes causais (causalidade simples, condição simples, equivalência das condições ou conditio sine qua non). Von Buri. Tudo o que contribui, em concreto, para o resultado, é causa. Todos os fatos que antecedem o resultado se equivalem, desde que indispensáveis à sua ocorrência; • Como saber se determinada conduta é ou não causa do evento: método de eliminação hipotética, de Thyrén (1894). • Método ou processo de eliminação hipotética: supressão mental de determinada conduta. Se o resultado naturalístico não ocorrer ou houver uma modificação no resultado, é porque era também sua causa. • Problema (crítica) à teoria da equivalência dos antecedentes causais: o método acarreta o regresso ao infinito. • Daí porque a responsabilização demanda o dolo ou a culpa. Causalidade psíquica. A cadeia causal deve ser interrompida quando não há dolo ou culpa. • Concausas • Concausas: mais de uma causa convergindo para o resultado. Causa externa à vontade do autor e que contribui para o resultado. • Podem ser dependentes ou independentes • Dependente: não é capaz de produzir o resultado por si própria • A concausa dependente não exclui a relação de causalidade • Independente: capaz de produzir, por si só, o resultado. Pode ser absoluta ou relativa CONCAUSAS ABSOLUTAMENTE INDEPENDENTES Não se originam na conduta do agente, isto é, são absolutamente desvinculadas Produzem por si sós o resultado naturalístico Podem ser preexistentes, concomitantes ou supervenientes • Causa preexistente absolutamente independente: ocorre antes da conduta do agente. Exemplo: indivíduo ingere veneno, com intenção suicida, e depois recebe disparo de arma de fogo. • A morte ocorre em razão do envenenamento. • A ingestão do veneno é preexistente ao disparo. Se o disparo não tivesse ocorrido, ainda assim o indivíduo teria falecido? Sim, pois havia ingerido o veneno (eliminação hipotética do disparo). Logo, o disparo não é causa do resultado, mas o agente deverá ser responsabilizado pelo seu dolo, isto é, pela tentativa de homicídio. Causa concomitante absolutamente independente: ocorre simultaneamente à conduta do agente (no mesmo instante, paralelamente). • Exemplo: A e B atiram contra C. Não atuam em coautoria. O projétil de B atinge o coração de C e a mata. A atinge somente o braço. Eliminando-se a conduta de A, a morte de C ocorreria da mesma forma? Sim, pois foi o projétil de B que atingiu C fatalmente. • Logo, a conduta de A não é causa do resultado e responderá conforme seu dolo, isto é, pela tentativa de homicídio. Mais um exemplo: Maria, por volta das 20h, ministra, insidiosamente, veneno a seu marido, com intenção de matar. Na mesma hora, o marido recebe um disparo de arma de fogo, que o mata. O atirador responde pelo homicídio consumado. Maria responderá pela tentativa de homicídio. Se eliminarmos a conduta de Maria, o resultado ocorreria da mesma forma (Rogério Sanches). Causa superveniente absolutamente independente: ocorre posteriormente à conduta do agente. Exemplo: A atira em B com intenção de matar. B sofre um grave ferimento. • Após o disparo, o prédio em que ambos estavam sofre uma explosão e B falece em razão das queimaduras. A supressão mental do disparo leva à conclusão que o resultado teria ocorrido da mesma forma, pois a morte de B decorreu da explosão. • A conduta de A não é causa do resultado e, assim, somente responderá por seu dolo, isto é, a tentativa de homicídio. • Mais um exemplo: Maria, por volta das 20h, ministra veneno insidiosamente a seu marido, com intenção de matar. • Antes mesmo de o veneno fazer efeito, cai um lustre na cabeça do marido, que estava deitado no sofá. • A morte decorre do traumatismo craniano. • Maria responderá pela tentativa de homicídio (Rogério Sanches). • Conclusão: as causas independentes quebram a relação de causalidade (causalidade antecipadora) • Consequência, em relação a todas as modalidades: o resultado ocorre independentemente da conduta do agente. Devem ser a ele imputados apenas os atos praticados na medida de sua intenção e não o resultado. • Eliminação hipotética da conduta do agente: o resultado teria ocorrido da mesma maneira. Exemplo: A efetua um disparo contra B e, no exato momento, B é atropelado por uma carreta. B falece em decorrência do atropelamento.Concausa absolutamente independente concomitante. A responderá por tentativa de homicídio. Tratando-se de concausa absolutamente independente, não importa a espécie, o comportamento paralelo será sempre punido na forma tentada. CONCAUSAS RELATIVAMENTE INDEPENDENTES Somente tem a possibilidade de produzir o resultado se for conjugada a uma conduta do agente. Originam-se da própria conduta praticada pelo agente. Não existiriam sem a atuação criminosa. Por isso são chamadas relativamente independentes. Podem ser preexistentes, concomitantes ou supervenientes Causa relativamente independente preexistente: já existia antes do comportamento do agente e, quando a ele conjugada, surge uma relação de complexidade que produz o resultado. Exemplo: • A desfere um disparo em B. O ferimento se agrava em razão de condição de saúde prévia da vítima, que não tem capacidade de coagular o sangue (hemofilia). Causa relativamente independente preexistente. • A, sabedor que B é hemofílico, desfere golpe de faca com intenção de matar. O golpe atinge região não letal, mas a condição fisiológica da vítima acarreta a morte. A responderá pelo resultado morte, considerando o dolo de matar e que sabia da hemofilia. Se eu elimino o comportamento de A, B não morreria. • Se A, sabedor da hemofilia, aplica o golpe apenas com a intenção de lesionar, mas a morte sobrevém, responderá pela lesão corporal seguida de morte, já que a morte estava no campo de previsibilidade (art. 19 do CP). • Se A não era sabedor da hemofilia, não poderá responder pelo resultado morte, considerando que não se pode consagrar a responsabilização penal objetiva. • Causa relativamente independente concomitante: é simultânea à conduta do agente. • Exemplo: A dispara um tiro em B, que se apavora e, no exato instante, sofre um ataque cardíaco. • Tanto o disparo quanto o ataque são, conjuntamente, causadores do resultado morte. O agente responderá pelo homicídio consumado. • Até esse ponto, as análises seguem o caput do art. 13 (teoria da equivalência dos antecedentes causais), e o resultado é imputado ao agente segundo o seu dolo. • O contexto muda a partir das concausas relativamente independentes supervenientes. INTERNO CONCAUSAS RELATIVAMENTEINDEPENDENDENTES SUPERVENIENTES • Situação tratada pelo art. 13, § 1º, do CP • § 1º - A superveniência de causa relativamente independente exclui a imputação quando, por si só, produziu o resultado; os fatos anteriores, entretanto, imputam-se a quem os praticou • Causa que ocorre posteriormente à conduta do agente e que com ela tem ligação. • Exemplos: 1) pessoa que, em razão de facadas, é internada. No hospital, contrai infecção hospitalar e falece. 2) indivíduo que, ferido por disparos, é transportado em ambulância, sofrendo acidente e falecendo em razão deste. Adotando-se a teoria da conditio sine qua non aos exemplos acima, o resultado naturalístico seria imputado ao agente. • O art. 13 adota a teoria da equivalência dos antecedentes ou da condição simples, como regra. • Porém, no § 1º do art. 13 temos a adoção da teoria da causalidade adequada. Conduta idônea a gerar o resultado. A contribuição deve ser eficaz. Regularidade estatística, com a exclusão de acontecimentos extraordinários, fortuitos. • Segundo a teoria da causalidade adequada, somente haverá imputação do resultado se a conduta do agente, segundo a experiência comum, for a mais adequada para a produção do evento. • “A superveniência de causa relativamente independente exclui a imputação quando, por si só, produziu o resultado; os fatos anteriores, entretanto, imputam- se a quem os praticou.” Significado da expressão “por si só”: significa que somente aqueles resultados que se encontrarem como um desdobramento natural da ação, ou seja, na linha de desdobramento físico, é que poderão ser imputados ao agente (Rogério Greco) • Exemplo da ambulância: João dispara contra Pedro, com intenção de matar. Pedro é socorrido por uma ambulância que se envolve em acidente de trânsito. Pedro morre em razão da colisão, preso às ferragens. João responderá pela tentativa de homicídio, pois a morte em acidente automobilístico não está na linha de desdobramento natural daquele que foi alvejado por disparos de arma de fogo. O acidente é um evento imprevisível, que inaugura um novo curso causal. O acidente, por si só, causa o resultado e, segundo a experiência de vida, é improvável. • Portanto, se a concausa relativamente independente superveniente, por si só, produziria o resultado, o agente só responderá pelos atos até então praticados (rompimento do nexo causal, teoria da causalidade adequada) • Se, no entanto, a causa relativamente independente superveniente não produziria, por si só, o resultado, a consequência é a adoção da teoria da conditio sine qua non, respondendo o agente pelo resultado naturalístico. O resultado somente poderá ser imputado ao agente se estiver na mesma linha de desdobramento natural da ação. • Quando a causa relativamente independente superveniente, por si só, vier a produzir o resultado, por não estar no mesmo plano de desdobramento físico, o agente só responderá pelo seu dolo. Isso porque há um rompimento na cadeia causal, não podendo o agente responder por um resultado que não foi uma consequência natural de sua conduta inicial (Greco). Iter Criminis • Consumação e tentativa Iter criminis • Iter criminis é o caminho do crime. • É o conjunto de fases que vão se suceder, cronologicamente, no caminho do delito. • São fases do crime: cogitação: é a ideia do crime que surge na cabeça do agente, de foro íntimo, produto da imaginação. • É sempre impunível. • atos preparatórios: o sujeito cria condições para realização da conduta delituosa idealizada. • O agente começa a preparar terreno para cometer o crime. • Ex.: compra da arma. • Esta fase preparatória, em regra, não é punível. • atos executórios: ocorre quando o sujeito colocar em prática o seu plano. • Em regra, é a partir dessa fase que passa a ser punível a conduta. • O ato executório deve ter idoneidade, ou seja, deve ser capaz de conduzir o sujeito ativo ao resultado desejado. • consumação: é a última etapa. Ocorre quando o agente realiza todos os elementos do tipo penal. • É a subsunção do fato à norma. • Exaurimento: situa-se após a consumação, em alguns delitos. Completo esgotamento. INTERNO • A regra geral é que a cogitação e os atos preparatórios não sejam puníveis. • Todavia, em algumas situações, o legislador pune de forma autônoma condutas que poderiam ser consideradas preparatórias. • Exemplo: associação criminosa (art. 288 do CP). • Art. 288. • Associarem-se 3 (três) ou mais pessoas, para o fim específico de cometer crimes. • Reunião de caráter duradouro, com estabilidade e permanência. • A punição é antecipada. • A paz pública já é exposta a perigo com a reunião das 3 ou mais pessoas, ainda que não cometam os crimes. • Art. 14 - Diz-se o crime: Crime consumado I - Consumado, quando nele se reúnem todos os elementos de sua definição legal; nem todos os crimes possuem o mesmo momento consumativo. Crimes materiais e culposos: a consumação ocorre com a produção do resultado naturalístico (modificação no mundo dos fatos). • Exemplo: homicídio (art. 121 CP). Crimes omissivos próprios: a consumação ocorre com a abstenção do comportamento imposto ao agente. Exemplo: omissão de socorro (art. 135 CP). Crimes de mera conduta: consumam-se com o simples comportamento previsto no tipo, não se exigindo qualquer resultado naturalístico. • Exemplo: violação de domicílio (art. 150 do CP). Crimes formais: consumam-se com a prática da conduta descrita no núcleo do tipo, independentemente do resultado. • Caso o resultado seja alcançado, será considerado