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Indaial – 2023 Estratégias dE NEgociação Prof.ª Liliane de S. Vieira da Silva. 3a Edição Copyright © UNIASSELVI 2023 Elaboração: Prof.ª Liliane de S. Vieira da Silva. Revisão, Diagramação e Produção: Centro Universitário Leonardo da Vinci – UNIASSELVI Ficha catalográfica elaborada na fonte pela Biblioteca Dante Alighieri UNIASSELVI – Indaial. Impresso por: C397 CENTRO UNIVERSITÁRIO LEONARDO DA VINCI. Núcleo de Educação a Distância. SILVA, Liliane de S. Vieira da. Estratégias de Negociação. Liliane de S. Vieira da Silva. Indaial - SC: UNIASSELVI, 2023. 166p. ISBN 978-65-279-1164-7 ISBN DIGITAL: 978-65-279-1160-9 “Graduação - EaD”. Bibliotecário: João Vivaldo de Souza CRB- 9-1679 aprEsENtação A globalização, aliada ao avanço da ciência e da tecnologia, diminuíram barreiras, possibilitando um número maior de trocas e compartilhamentos de dados e informações. Ampliaram-se as relações entre pessoas, entre empresas, entre países e entre blocos comerciais, o que, consequentemente, requer dos profissionais uma expertise maior no que se refere à negociação. A visão tradicional sobre negociação quase sempre esteve relacio- nada à disputa, incutindo a ideia de que alguém deveria perder para que o outro pudesse ganhar. Atualmente, um novo paradigma emerge, em que uma nova postura de cooperação e disposição vem sendo adotada, a fim de se estabelecer relacionamentos duradouros que possibilitem vantagens para ambos os lados. Neste atual cenário, a capacidade de negociação é reconhecida como uma das dez competências do século XXI. Saber negociar tornou-se fundamental para aqueles que almejam sucesso pessoal e profissional. Tal habilidade pode ser aprendida e aperfeiçoada durante a convivência prática com as pessoas ao redor e também por meio de estudos teóricos, como é o caso dos conhecimentos que você irá adquirir por meio da leitura deste livro. Neste livro, você terá acesso às reflexões sobre o conceito de negociação, identificação de situações nos campos profissional e pessoal, cuja resolução depende de conhecimentos específicos de negociação, bem como aplicação de ferramentas e técnicas de negociação que propiciem maior eficácia nas negociações. A fim de cumprir com tais objetivos, este livro foi organizado em três unidades. O primeiro tópico da Unidade 1 visa proporcionar uma visão geral sobre negociação e sua importância no atual cenário. Assim, apresenta- se as bases conceituais da negociação e também as variáveis básicas da negociação. O segundo tópico da Unidade 1 possui como tema os Tipos de ne- gociação. Neste tópico serão abordados os tipos e os estilos de negociadores. Apresenta-se uma visão geral dos princípios básicos dos estilos adotados nas negociações. O Tópico 3 da primeira unidade discorre sobre as técnicas de negociação. Você já me conhece das outras disciplinas? Não? É calouro? Enfim, tanto para você que está chegando agora à UNIASSELVI quanto para você que já é veterano, há novidades em nosso material. Na Educação a Distância, o livro impresso, entregue a todos os acadêmicos desde 2005, é o material base da disciplina. A partir de 2017, nossos livros estão de visual novo, com um formato mais prático, que cabe na bolsa e facilita a leitura. O conteúdo continua na íntegra, mas a estrutura interna foi aperfeiçoada com nova diagramação no texto, aproveitando ao máximo o espaço da página, o que também contribui para diminuir a extração de árvores para produção de folhas de papel, por exemplo. Assim, a UNIASSELVI, preocupando-se com o impacto de nossas ações sobre o ambiente, apresenta também este livro no formato digital. Assim, você, acadêmico, tem a possibilidade de estudá-lo com versatilidade nas telas do celular, tablet ou computador. Eu mesmo, UNI, ganhei um novo layout, você me verá frequentemente e surgirei para apresentar dicas de vídeos e outras fontes de conhecimento que complementam o assunto em questão. Todos esses ajustes foram pensados a partir de relatos que recebemos nas pesquisas institucionais sobre os materiais impressos, para que você, nossa maior prioridade, possa continuar seus estudos com um material de qualidade. Aproveito o momento para convidá-lo para um bate-papo sobre o Exame Nacional de Desempenho de Estudantes – ENADE. Bons estudos! NOTA A Unidade 2 discorre, no primeiro tópico, sobre negociação e conflito. No segundo tópico, apresenta-se os conteúdos sobre negociação, conciliação, mediação e arbitragem. Por fim, apresentam-se os conceitos sobre negociação baseada em princípios. A Unidade 3 traz uma importante contextualização sobre “Oportu- nidades da Negociação”, em que são discutidos temas como a influência da cultura nas negociações e as negociações intraculturais e multiculturais. A seguir, concentramos nos desafios da negociação e a negociação estratégica. Desejo a você bons estudos! Prof.ª Liliane de S. Vieira da Silva. Olá, acadêmico! Iniciamos agora mais uma disciplina e com ela um novo conhecimento. Com o objetivo de enriquecer seu conhecimento, construímos, além do livro que está em suas mãos, uma rica trilha de aprendizagem, por meio dela você terá contato com o vídeo da disciplina, o objeto de aprendizagem, materiais complementares, entre outros, todos pensados e construídos na intenção de auxiliar seu crescimento. Acesse o QR Code, que levará ao AVA, e veja as novidades que preparamos para seu estudo. Conte conosco, estaremos juntos nesta caminhada! LEMBRETE sumário UNIDADE 1 — PRINCÍPIOS DE NEGOCIAÇÃO .......................................................................... 1 TÓPICO 1 — INTRODUÇÃO: NEGOCIAR É PRECISO ............................................................... 3 1 INTRODUÇÃO .................................................................................................................................... 3 2 NEGOCIAÇÃO .................................................................................................................................... 3 AUTOATIVIDADE ................................................................................................................................ 6 3 BASES CONCEITUAIS DA NEGOCIAÇÃO ................................................................................ 6 4 VARIÁVEIS BÁSICAS DA NEGOCIAÇÃO: TEMPO, INFORMAÇÃO E PODER ............ 16 5 PROCESSO DA NEGOCIAÇÃO .................................................................................................... 23 6 MODELOS DE NEGOCIAÇÃO ..................................................................................................... 25 RESUMO DO TÓPICO 1..................................................................................................................... 28 AUTOATIVIDADE .............................................................................................................................. 29 TÓPICO 2 — TIPOS DE NEGOCIAÇÃO ........................................................................................ 31 1 INTRODUÇÃO .................................................................................................................................. 31 2 NEGOCIAÇÃO INTEGRATIVA NEGOCIAÇÃO DISTRIBUTIVA ....................................... 31 3 ESTILOS DE NEGOCIADORES .................................................................................................... 39 RESUMO DO TÓPICO 2..................................................................................................................... 43 AUTOATIVIDADE .............................................................................................................................. 44 TÓPICO 3 — ZONA POSSÍVEL DE NEGOCIAÇÃO – ZOPA ................................................... 47 1 INTRODUÇÃO .................................................................................................................................. 47 2 ZONA POSSÍVEL DE NEGOCIAÇÃO - ZOPA ..........................................................................como cidadão, como consumidor ou cliente, ou ainda representando uma corporação. Com relação ao processo de negociação, associe os itens, utilizando o código a seguir. I- Negociação Ganha – Ganha. II- Negociação Ganha – Perde. III- Negociação Perde – Perde. IV- Negociação Perde – Ganha. Assinale a alternativa apresenta a sequência CORRETA: a) ( ) I – IV – II – III. b) ( ) III – II – I – IV. c) ( ) IV – I – III – II. d) ( ) II – III – I – IV. 31 TÓPICO 2 — UNIDADE 1 TIPOS DE NEGOCIAÇÃO 1 INTRODUÇÃO Vimos que a negociação é a ferramenta mais utilizada para solução de conflitos e que pode ser aplicada tanto para resolver conflitos que emergem no ambiente organizacional como conflitos pessoais que emergem no ambiente familiar, por exemplo. As negociações podem ocorrer em ambientes políticos, comerciais, diplomáticos, institucionais, gerenciais, jurídicos, trabalhistas, de libertação de reféns e mediação. Podem envolver aspectos materiais (dinheiro, bens etc.), já outras se referem exclusivamente a questões intangíveis (por exemplo, exigir que alguém reconheça um erro do passado e que peça desculpas. (GUIRADO, 2012). Neste tópico, você vai conhecer os tipos de negociação quanto aos objetivos e os tipos de negociação que ocorrem dentro do ambiente organizacional. É importante salientar que na internet e demais fontes, há diversos tipos de negociação, mas quando se fala em transações no mundo dos negócios, existem essencialmente duas grandes categorias: a negociação integrativa e a negociação distributiva (LEITE, 2009). 2 NEGOCIAÇÃO INTEGRATIVA NEGOCIAÇÃO DISTRIBUTIVA A negociação do tipo integrativa possui este nome porque as partes buscam equilibrar seus interesses em um acordo. Na negociação integrativa se negociam duas ou mais questões, em um ambiente competitivo ou colaborativo, no qual os negociadores procuram criar valor por meio do compartilhamento de seus interesses, para depois distribui-lo de forma a otimizar seus benefícios. (RAIFFA, RICHARDSON, METCALFE, 2002). Conforme aponta Leite (2009), a negociação integrativa é aquilo que se observa quando, num processo de troca, existe a possibilidade concreta de se ampliar o valor para ambos os lados. 32 UNIDADE 1 — PRINCÍPIOS DE NEGOCIAÇÃO FIGURA 10 – NEGOCIAÇÃO INTEGRATIVA FONTE: . Acesso em: 8 jun. 2021. Para entender melhor a negociação integrativa, vamos utilizar o exemplo proposto por Leite (2009, p. 14): A título de ilustração: suponha-se que alguém possua um terreno ava- liado em $ 300.000. Seu proprietário, que não tem urgência em rece- ber o dinheiro, faz um acordo com uma construtora que deseja erigir um prédio naquele local. Em troca, recebe a promessa de receber um apartamento de $ 500.000 quando o referido edifício estiver concluído, dentro de dois anos. Esse acordo é bom para o proprietário, na medida em que lhe proporciona um ganho de 67% sobre o valor de seu imóvel. Ao mesmo tempo, é bom também para a construtora, que reduz seu risco e não precisa de um desembolso imediato para adquirir o terreno e iniciar o empreendimento. E, se o local se valorizar durante a cons- trução e o apartamento passar a valer $ 600.000 quando o edifício ficar pronto, isso amplia ainda mais os ganhos de ambos os lados. Por outro lado, uma negociação distributiva caracteriza-se pela situação em que o ganho de um dos lados corresponde a uma perda (ou, melhor dizendo, uma redução de ganho) de igual magnitude para o outro lado (LEITE, 2009). O nome “negociação distributiva” deriva justamente do fato de que, em tal situação, o que ocorre é a distribuição de um ganho cujo total é fixo. É um tipo de negociação ganha-perde, em que as metas de uma das partes encontram-se em conflito frontal com as metas da outra parte. Os recursos – isto é, o resultado passível de ser obtido para ser rateado entre os envolvidos – são fixos e limitados. TÓPICO 2 — TIPOS DE NEGOCIAÇÃO 33 FIGURA 11 – NEGOCIAÇÃO DISTRIBUTIVA FONTE: . Acesso em: 8 jun. 2021. A diferença entre a negociação integrativa e a negociação distributiva são seus objetivos. Enquanto a primeira busca um equilíbrio/meio-termo que beneficie todos os envolvidos (ganha-ganha), a questão-chave da segunda é obter a maior vantagem (ganha-perde). De acordo com Leite (2009), a maioria das negociações combina ambos os aspectos ao mesmo tempo. Quase sempre há uma dimensão integrativa e uma dimensão distributiva: procura-se “expandir o bolo”, mas cada uma das partes se preocupa em assegurar para si uma boa fatia dele. A título de ilustração, suponha-se que uma empresa contrate uma empreiteira para construir um novo prédio, que lhe servirá como sede. Há várias possibilidades de que, se chegarem ao consenso com relação a alguns detalhes, tanto a empresa como a empreiteira conseguirão gerar benefícios para ambos os lados. São os chamados ganhos mútuos, que podem ser obtidos por diversos caminhos, tais como: • A utilização da obra como um instrumento de marketing da empreiteira e da contratante: se fizerem um esforço conjunto de divulgação pela mídia, ambas saem ganhando em termos de imagem institucional. • O cronograma financeiro pode ser programado de maneira que haja um casamento mais sintonizado entre a disponibilidade de recursos da contratante (a qual pode ter sobras de dinheiro em caixa para fazer alguns adiantamentos) e as conveniências financeiras da empreiteira (que, se fizer alguns pagamentos à vista, pode conseguir descontos significativos em compras e contratação de serviços). • Em determinados casos, certas necessidades (por exemplo, a obtenção das autorizações junto ao poder público) podem ser supridas mais rapidamente e com menor custo pela equipe de advogados da contratante do que pela empreiteira (ou vice-versa). Assim, um cuidadoso estudo conjunto pode identificar essas possíveis situações e delimitar exatamente quem se responsabiliza por qual tarefa, viabilizando significativas economias e reduções de prazos. 34 UNIDADE 1 — PRINCÍPIOS DE NEGOCIAÇÃO • Por questões fiscais e tributárias, especialmente sob a legislação brasileira, podem-se obter ganhos substanciais se certos materiais e serviços de apoio forem adquiridos diretamente pela contratante, cabendo à empreiteira apenas desempenhar os papéis de engenharia e gestão da obra. Como se vê, a lista de possibilidades para a obtenção de benefícios mútuos (negociação integrativa) é bastante ampla. No entanto, há, ainda, neste mesmo exemplo, um aspecto que provavelmente será distributivo: o preço. Por mais que a contratante e a empreiteira procurem agir como reais parceiras, buscando identificar e explorar todas as brechas que lhes permitam obter ganhos mútuos, ainda assim a discussão do preço da obra tende a ser claramente distributiva: qualquer centavo a mais no valor a pagar corresponde a uma vantagem extra para a empreiteira e uma idêntica desvantagem para a empresa contratante Leia mais sobre este assunto no artigo “Negociação distributiva: o comportamento do executivo brasileiro” do pesquisador Jaci Corrêa Leite. Por meio do link: https://bit.ly/2TrH6YK DICAS Ainda de acordo com Leite (2009), o que faz uma negociação pender mais para o lado integrativo é uma série de fatores combinados, tais como: • Existência de um relacionamento prévio, pessoal ou comercial, que fortaleça os laços entre as partes. • Perspectivas de relacionamento futuro. • Possibilidade de outros negócios correlatos, imediatos ou futuros. • Interesses coincidentes (um mesmo resultado é desejável a ambos os lados). • Interesses complementares entre as partes (o resultado positivo de uma não impede o ganho adicional da outra). • Interesses com graus de importânciadistintos entre as partes: quando se examina cada item da pauta, cada lado deseja um resultado oposto – ou seja, predomina o conflito de interesses – mas atribui diferentes prioridades para cada um dos tópicos em discussão. É oportuno notar que as negociações ocorrem em ambientes de cooperação ou de competição, conforme é possível observar na figura a seguir. TÓPICO 2 — TIPOS DE NEGOCIAÇÃO 35 FIGURA 12 – AMBIENTE DE COMPETIÇÃO E COOPERAÇÃO FONTE: . Acesso em: 8 jun. 2021. Há ainda um outro tipo de negociação, chamada de negociação criativa, diferente de uma negociação distributiva ou integrativa. Em uma negociação criativa os negociadores revelam, desde o início, os seus interesses, o objetivo é ir além de uma cooperação ganha-ganha para explorar soluções inovadoras e vantajosas para as partes. É um caso em que os envolvidos estão mais dispostos a conversar, escutar os interesses opostos e procurar maneiras criativas para satisfazer a todos. Esse é um tipo de negociação muito utilizado em problemas complexos, principalmente envolvendo relacionamento com pessoas. A Bíblia conta uma história muito conhecida, em que o Rei Salomão, buscava dirimir o conflito entre duas mulheres que alegavam serem mães da mesma criança. Em uma solução aparentemente integrativa, o Rei ordenou que se dividisse a criança em partes iguais. Assim, cada mulher ficaria com um pedaço (!). Enquanto a falsa mãe nada fez, a verdadeira mãe abriu mão de sua “parte” da criança. Ela preferia ver o filho vivo com outra mulher. Ao confrontar atitude da mãe verdadeira, em solução distributiva, o Rei ordenou que essa mulher ficasse com a criança, pois era a mãe. Isso nos mostra que nem sempre uma negociação ganha-ganha, em que todos saem ganhando, é a melhor solução. Cabe ao negociador avaliar todos os aspectos e utilizar as formas de negociação mais adequadas ao momento, que ainda podem ser combinadas. FONTE: . Acesso em: 20 fev. 2021 Como vimos a negociação está presente na vida de todas as pessoas, negocia-se em casa, o programa de televisão que todos assistirão, negocia-se no mercado e no shopping algum desconto, negocia-se no banco, empréstimos ou taxas de retorno de investimento, negocia-se a época em que se pode sair de férias, com a organização onde se trabalha, negocia-se com um colega, algum serviço que ambos terão de executar, entre muitas outras situações, onde se negocia quase que cotidianamente (BOFF, 2011). 36 UNIDADE 1 — PRINCÍPIOS DE NEGOCIAÇÃO Nas relações entre empresa e seus fornecedores, por muito tempo preva- leceu a ideia de que um teria que perder para o outro ganhar, a chamada nego- ciação ganha-perde. A ideia que se tinha era que o ganho de alguém implicaria em uma perda para o outro. Com o passar do tempo isso mudou, o comporta- mento adotado por boa parte das corporações é de parceria e cooperação visando o fortalecimento do negócio de ambas as partes, é o famoso ganha-ganha que se fundamenta na ideia de tratar o outro não como oponente, mas como parceiro. Neste aspecto, corrobora Caldana et al. (2012), ao afirmar que a visão tradicional de concorrência precisa ser ampliada para incorporar as possibilidades de parcerias e cooperação que se apresentam às empresas no mercado. Em negociações, dependendo das técnicas utilizadas, pode-se chegar a quatro desfechos: • Ganha/ganha. • Ganha/perde ou perde/ganha. • Perde/perde. • A negociação não é realizada. Observe a imagem a seguir com os tipos de fechamento que podem ocorrer em uma negociação: FIGURA 13 – RESULTADOS ESPERADOS EM NEGOCIAÇÃO FONTE: . Acesso em: 8 jun. 2021 Ganha-perde: a negociação distributiva ou de competição ocorre quando uma das partes deseja que suas metas no processo de negociação sejam plenamente atendidas sem considerar os anseias da outra parte. O valor de um bem é dividido entre dois ou mais negociadores, de modo que se um ganha os outros necessariamente perdem, também conhecida como ganha-perde (RAIFFA, RICHARDSON, METCALFE, 2002), conforme explanado anteriormente. TÓPICO 2 — TIPOS DE NEGOCIAÇÃO 37 Ganha-ganha: o novo panorama da negociação visa uma relação duradoura, tendo em vista a possibilidade de novas negociações, baseada em uma visão sistêmica em que todas as partes envolvidas saem satisfeitas, desse modo, bons negociadores criam vínculos fortalecendo a relação, o que é conhecido como negociação ganha-ganha. Em uma negociação ganha-ganha, todas as partes saem satisfeitas, pois suas metas foram supridas, pode ocorrer o que Fisher e Ury e Patton (2005) chamam de BATNA. Batna é a sigla para best alternative to a negotiated agrement, que em português significa melhor alternativa para um acordo negociado (MAPAN). Conforme aponta Leite (2009), na literatura, o conceito de melhor alternativa é conhecido por vários acrônimos: • BATNA: Best Alternative To a Negotiated Agreement. • MAANA: Melhor Alternativa À Negociação de um Acordo. • MAPAN: Melhor Alternativa Para um Acordo Negociado. • MASA: Melhor Alternativa Sem Acordo. Para entender melhor o conceito, vejamos a seguinte situação com um jogo simples, entre uma empresa e seu fornecedor, com apenas uma variável decisão, por exemplo, o preço unitário de um insumo fundamental para o processo produtivo da empresa. Do lado do fornecedor, ele deve examinar suas alternativas e responder à seguinte pergunta: “Qual é o menor e preço eu estria disposto a receber por esse produto, abaixo do qual eu preferiria não fazer negócio com esse comprador”. Do lado da empresa, ela precisa examinar suas alternativas e responder à seguinte pergunta: “Qual é maior preço eu estaria disposta a pagar por esse produto, acima do qual eu preferiria não fazer negócio com ele”. O menor preço aceitável para o fornecedor e o maior preço aceitável para o comprador são chamados de Batna. O fornecedor tem um valor para Batna, e o comprador tem outro. Se a Batna do fornecedor for maior que a Batna do comprador, não há como faz negócios, pois, para ambos, as alternativas que eles já têm devem ser melhores do que se fecharem o negócio em questão. Se a Batna do fornecedor for menor ou igual a Batna do comprador, então há possibilidade de negócio, pois qualquer solução intermediaria de preço no intervalo entre as duas Batnas é melhor ou igual, para ambos, do que as alternativas que cada um já tem. A diferença entre a Batna do comprador e a Batna do vendedor é a margem de manobra da negociação. Cada jogador fará todo o possível para se apropriar da maior parte dessa margem: o fornecedor 38 UNIDADE 1 — PRINCÍPIOS DE NEGOCIAÇÃO tentará vender pelo preço Batna do comprador, e o comprador tentará comprar pelo preço Batna do vendedor – o que só seria possível se cada um deles fosse capaz de conhecer a Batna do outro (COSTA, 2007). A forma de repartição de tal margem entre os dois jogadores não é óbvia nem simples. Ela será o resultado de uma longa negociação entre as partes, com propostas e contrapropostas de parte a parte, até que se chegue a um resultado satisfatório para ambos os jogadores. O valor final dependerá de vários fatores, tais como habilidade dos negociadores, persistência, paciência e até, por que não dizer, manobras de emulação ou blefes. Um jogador pode emular e propagar que tem uma boa alternativa (Batna), embora na verdade não a tenha, para melhorar a percepção de sua Batna pelo outro jogador e, assim, melhorar as contrapropostas dele. Dessa forma, jogadores impacientes, ou que tem pressa em fechar o negócio ou que não consegue controlar seu lado emocional, por motivos reais ou pessoais acabem ficandocom a menor parte da repartição da margem (COSTA, 2007). Disso decorre a importância de desenvolver cuidadosamente as alternativas ao não acordo, a fim de se obter a melhor Batna possível. Também é muito importante descobrir e avaliar as alternativas reais do seu oponente, para estabelecer o espaço de negociação realista e tirar dele o melhor possível, em um longo, cuidadoso e paciente processo de negociação (COSTA, 2007). Por fim, o último desfecho possível em uma negociação seria a não realização. Quando a proposta ou exigência é apresentada de maneira agressiva pode significar o fim de um processo de negociação. Isso ocorre quando uma das partes deseja muito evitar conflitos. Nesse caso a parte não está propensa a atingir seus interesses, tampouco está preocupada em fazer com que a outra parte atinja os seus, quem utiliza dessa prática age de maneira passiva, não está nem um pouco preocupada em negociar. Comumente, essa é uma estratégia perde-perde (COSTA, 2007). No contexto organizacional, observa-se três tipos de negociação: as gerenciais, as comerciais e as jurídicas, conforme explicitado na figura a seguir. FIGURA 14 – TIPOS DE NEGOCIAÇÃO TÓPICO 2 — TIPOS DE NEGOCIAÇÃO 39 FONTE: . Acesso em: 8 jun. 2021. O ambiente organizacional é vivo e dinâmico, olhando para figura é possível entender por que saber negociar é uma das competências gerenciais mais requeridos aos líderes e gestores, pois em qualquer nível que se possa atuar dentro de uma organização, certamente haverá negociação. É a partir das negociações bem-sucedidas que as empresas alcançam vantagens competitivas, ou seja, das que visam render resultados expressivos de lucratividade para as empresas, em decorrência de seus planejamentos estratégicos nos relacionamentos bem estruturados (TEIXEIRA, 2011). 3 ESTILOS DE NEGOCIADORES Cada indivíduo adota uma postura na hora de negociar, ou pelo menos um dos estilos se sobressai em sua forma de negociar. Os chamados estilos de ne- gociadores são características comportamentais que uma pessoa se utiliza em um encontro de negociação. Vamos conhecer alguns desses estilos de negociadores. É importante conhecer não somente os estilos de negociadores, mas também o estilo que adotamos quando negociamos, pois conforme aponta Wanderley (1998), entender comportamentos para poder negociar conforme o estilo do outro negociador faz uma boa diferença. Aquele que conhece o próprio estilo e respeita o do outro leva uma vantagem na negociação, pois, pode trabalhar forças e fraquezas garantindo maiores possibilidades de êxito. O estudo dos estilos de negociadores, trata da descrição de todas as características de comportamento de um indivíduo envolvido em um encontro de negociação, incluindo, a impressão inicial, as atribuições de situações vivenciadas, as questões de outras fontes não relacionadas ao conhecimento e o comportamento subsequente durante as negociações (MARTINELLI, 2002 apud GODINHO; MACIOSKI, 2005). Dentro das ciências humanas, a área de “comportamento das pessoas” se dedica ao estudo das descrições e características adotadas pelo indivíduo em negociações. Dentre as vertentes de pesquisas, busca analisar de que modo o 40 UNIDADE 1 — PRINCÍPIOS DE NEGOCIAÇÃO perfil psicológico de um negociador influencia em seu estilo de negociação, como este toma suas decisões e principalmente como reage sobre fortes tensões. Veja no quadro a seguir alguns dos autores e os estilos explorados em suas pesquisas. QUADRO 4 – AUTORES E ESTILOS EXPLORADOS Autores Estilos Jung Restritivo, ardiloso, amigável e confrontador. Teoria da tipologia das personalidades. Sparks (1992) Controle, desconsideração, deferência, confiança. Gottschalk (1974) Duro, caloroso, estilo dos números e estilo negociador. Kinston & Algie (1989) Racionalista, Empírico, Pragmático, dialético, Sistêmico, Estruturalista e Intuitivo. Marcondes (1993) Afirmação, Persuasão, ligação e atração. Wanderley (1998) Dominante, condescendente e o segundo, o formal- informal. Junqueira Catalisador, apoiador, controlador e analítico. FONTE: Adaptado de Rocha (2011) Não somente a academia, mas também as empresas estudam os perfis psicológico das pessoas, de acordo com suas características, personalidades, atitudes e estilos de vida. Conforme aponta Junqueira (1988), os estilos de negociadores podem ser agrupados em quatro estilos básicos, segundo o seu comportamento dominador ou condescendente, formal ou informal: catalisador, apoiador, controlador e analítico. Observe o quadro a seguir. TÓPICO 2 — TIPOS DE NEGOCIAÇÃO 41 QUADRO 5 – ESTILO DE NEGOCIADORES CATALISADOR CONTROLADOR APOIADOR ANALITICO Criativo, superficial, sensível a elogios. Enfatiza as tarefas, revela as pessoas em segundo plano, é muito objetivo. Bom de relacionamento, teme conflitos, interessa-se pelo bem-estar do grupo. É detalhista, preza a segurança acima de tudo, sempre tem todas as informações necessárias. • Catalisador – Também chamado de influenciador, expressivo, indutor e sociável. Esse estilo é orientado para ideias. Pessoas com esse perfil são empreendedoras, entusiasmadas, estimulantes e persuasivas. Costumam inclusive usar suas habilidades sociais para atraírem as pessoas e conseguirem realizar seus objetivos e gostam de ser reconhecidas por suas qualidades. O lado negativo desse estilo é que muitas vezes pode ser visto como superficial, exclusivista e difícil de crer, pois costuma prometer coisas que não pode cumprir, pois algumas vezes traça metas que não pode cumprir. Sob tensão, fala alto e rápido; agita-se e explode. • Apoiador – Também conhecido por cordial, afável e estável. Esse estilo está voltado para relacionamentos. É visto como uma pessoa amável, compreensiva, bom ouvinte, prestativo, que sabe trabalhar em equipe, gosta de dar apoio às outras pessoas, é leal e de confiança. Não gosta de ferir nem magoar os outros. Pessoas com esse perfil gostam de receber atenção e apreciam ser aceitos pelas pessoas. Por outro lado, muitas vezes o apoiador pode ser encarado como dissimulado, porque perde tempo e evita conflitos. Pode apresentar dificuldade para dizer não e dizer o que realmente pensa. Isso pode dar a impressão que está sendo “levado na conversa”. Contudo, sob tensão, concorda, mas depois não cumpre. Pode apresentar resistência passiva ou não se manifestar. • Controlador – Também designado por dirigente, diretivo e realizador. Geralmente são pessoas decididas, eficientes, responsáveis, rápidas e objetivas, que assumem riscos calculados. Valorizam os resultados e o cumprimento de metas, não se importando com as pessoas. Muitas vezes são vistos como insensíveis impacientes e “mandões”. Quando submetidos à tensão costumam ameaçar e tornam-se tirânicos. Pessoas com esse perfil precisam aprender a conviver com as diferenças individuais, sem fazer prejulgamentos. Precisam aprender agir com mais naturalidade e escutar os outros. • Analítico – Também denominado metódico, complacente e escrupuloso. Geralmente, são pessoas sérias, organizadas, pacientes, cuidadosas e controladas, com alta capacidade crítica. Gostam de estar a par do que acontece, procuram se apropriar dos detalhes, conhecem o trabalho e procuram aprofundar o conhecimento se especializando. Têm habilidade para avaliar FONTE: Adaptado de Junqueira (1988) 42 UNIDADE 1 — PRINCÍPIOS DE NEGOCIAÇÃO pessoas e situações. Estão voltados para procedimentos. Costumam tomar decisões somente depois de sentirem-se plenamente seguros e com garantias de que vão ter sucesso. Por outro lado, podem ser vistos como detalhistas, teimosos e pessoas que escondem o jogo não revelando informaçõesrelevantes que possuem. Podem ser tachados de indecisos e procrastinadores, pois adiam as decisões na esperança de fazer melhor e com mais segurança. Quando submetidos à tensão, calam-se e se retiram. Uma sugestão de leitura pra você, acadêmico: FISHER, R.; URY, W.; PATTON, B. Como chegar ao sim: como negociar acordos sem fazer concessões. Rio de Janeiro: Sextante, 2018 DICAS 43 RESUMO DO TÓPICO 2 Neste tópico, você aprendeu que: • O processo de negociação como atividade planejada envolve a definição fases, procedimentos e atores específicos. • Os tipos de negociação quanto aos objetivos são: integrativa e distributiva. • Nas negociações integrativas as partes buscam equilibrar seus interesses em um acordo. • Nas negociações distributivas ocorre a distribuição de um ganho cujo total é fixo. • Os tipos de negociação quando ao desfecho são: ganha-ganha; ganha-perde e perde-perde. • Os três tipos de negociação que ocorre dentro das empresas são: negociações comerciais, negociações gerencias e negociações jurídicas. • O estudo dos estilos de negociadores descreve características comportamentais de como as pessoas se comportar em ocasiões de negociação. • Existem estilos de negociadores: Catalisador; apoiador, controlador e analítico. 44 1 A negociação é uma atividade praticada pela humanidade desde sua existência, tal ação se manifesta diariamente, negociamos com os amigos, com os pais, com os vizinhos, com o cônjuge. Com relação à negociação, classifique V para as sentenças verdadeiras e F para as falsas: ( ) Os processos de negociação podem ser usados em todos os contextos onde surgem disputas. ( ) De todos os modos de gestão de conflitos, os que fazem uso das técnicas de negociação são mais flexíveis, eficientes e econômicos. ( ) A negociação é um dos principais meios utilizado pelos indivíduos para que haja acomodação para viver e trabalhar juntos. ( ) Embora a capacidade de empatia e de comunicação sejam componentes essenciais, não substituem uma negociação. Assinale a alternativa que apresenta a sequência CORRETA: a) ( ) V – V – V – F. b) ( ) V – V – V – V. c) ( ) V – F – V – F. d) ( ) V – F – F – F. 2 A negociação é objeto de estudo de diversos pesquisadores que apresentam diferentes abordagens sobre o processo. Um aspecto que diferencia essas abordagens é a distinção entre o modelo normativo, descritivo e prescritivo. Com relação aos modelos, associe os itens, utilizando o código a seguir. I- Prescritivo. II- Normativo. III- Descritiva. ( ) Esta abordagem possui o interesse em entender e descrever o comportamento dos negociadores, com o foco nos aspectos comportamentais e na forma como as decisões são tomadas efetivamente. ( ) Esta abordagem visa facilitar modelos formais da negociação a partir da hipótese de racionalidade dos negociadores, possibilitando assim a obtenção de compromissos estáveis e eficientes. ( ) Nesta abordagem o objetivo principal é determinar o comportamento dos negociadores, a fim de que se alcance bons resultados durante a negociação. AUTOATIVIDADE 45 Assinale a alternativa que apresenta a sequência CORRETA: a) ( ) I – II – III. b) ( ) III – II – I. c) ( ) II – I – III. d) ( ) I – III – II. 3 Em uma das lojas de um grande grupo têxtil, o vendedor fechou uma venda de 25 mil reais para um pequeno varejista da região. Como todo pedido acima de cinco mil reais deve ser analisado pelo corporativo da empresa, o pedido foi enviado para o setor de crédito. Após análise, verificou-se que o cliente está com nome negativado, não sendo possível a liberação do crédito. O vendedor e o gerente não querem perder essa venda que vai ajudar a loja a bater a meta, e insistem com sua matriz para que seja possível aprovação do crédito, depois de muita discussão, chega-se a uma solução: o setor de crédito aprova a venda com a condição de que o varejista ofereça uma garantia bancária que assegure o pagamento, caso o débito não seja saldado em 90 dias. A situação exposta é um exemplo de que? a) ( ) Concessão. b) ( ) Conciliação. c) ( ) Barganha. d) ( ) Mediação. 4 Há quem diga que saber negociar é uma arte. Na dinâmica empresarial, tal habilidade pode fazer toda diferença na hora de firmar acordos, parceiras, alianças e fusões. Sobre aspectos que são inerentes às negociações, analise as sentenças a seguir: I- Negociação requer preparação. II- A negociação descarta a necessidade de constituir vínculos. III- Negociação é um processo de comunicação unilateral. IV- Relacionamentos bem estruturados geram vantagens para as empresas. Assinale a alternativa CORRETA: a) ( ) As sentenças I e II estão corretas. b) ( ) As sentenças II e III estão corretas. c) ( ) Somente a sentença I está correta. d) ( ) As sentenças I e IV estão corretas. 5 Inseridas em um ambiente cada vez mais complexo, as empresas buscam por meio de negociações estratégicas melhorarem suas condições econômicas. Com relação à negociação, classifique V para as sentenças verdadeiras e F para as falsas: 46 ( ) A negociação ganha-ganha busca acordos unilaterais descartando a necessidade de constituir vínculos. ( ) A negociação ganha-perde é a mais recomendada já que ninguém negocia para perder. ( ) A negociação começa antes mesmo de um encontro formal, pois a maior parte do trabalho substancial acontece nos bastidores. ( ) Na negociação ganha-ganha apenas uma das partes sai satisfeita, as chances de novas negociações existirem e gerarem frutos se intensificam. Assinale a alternativa que apresenta a sequência CORRETA: a) ( ) F – F – V – V. b) ( ) F – F – V – F. c) ( ) F – F – V – V. d) ( ) V – V – F – F. 6 Para Wood e Colosi (1998), a negociação é um processo multidimensional, e a maior parte do trabalho substancial acontece nos bastidores, em conversas com sua própria equipe em um quarto de hotel, em telefones e mensagens, e entrevistas coletivas improvisadas. Dado este contexto, assinale a alternativa CORRETA: FONTE: WOOD, J. D.; COLOSI, T. R. As outras negociações. Revista HSM Management, Sorocaba, v. 8, p. 76-80, maio/jun. 1998. a) ( ) A negociação inicia quando todos se reúnem para este fim. b) ( ) A negociação começa antes mesmo de um encontro formal. c) ( ) A negociação busca acordos unilaterais. d) ( ) A negociação é um fim em si mesmo descartando a necessidade de constituir vínculos. 47 TÓPICO 3 — UNIDADE 1 ZONA POSSÍVEL DE NEGOCIAÇÃO – ZOPA 1 INTRODUÇÃO Negociar faz parte do dia a dia de empresários, vendedores, contadores, advogados, empreendedores e tantos outros profissionais formais e informais. Inúmeras situações denotam a importância e a necessidade, cada vez mais crescente, de se aprender a negociar (PAULA, SOUZA, 2009). Neste tópico vamos conhecer algumas das siglas utilizadas em rodadas de negociação. Uma delas é a ZOPA (Zona Possível de Acordo). Vamos aprender o que ela significa e sua utilidade nas negociações. Vamos aprender sobre a MAANA (Melhor Alternativa à Negociação de um Acordo) e também sobre a MASA (melhor alternativa sem acordo), e, por fim, aprender como elaborar um bom planejamento utilizando essas técnicas.' 2 ZONA POSSÍVEL DE NEGOCIAÇÃO - ZOPA O ato de negociar requer o uso de ferramentas adequadas estabelecidas a partir da tríade tempo, informação e poder. Como visto anteriormente, essa tríade é uma chave importantíssima nas negociações. Para exemplificar como essas variáveis se manifestam em uma negociação e suas consequências, imagine uma empresa que está com um processo seletivo em aberto para contratação de operador de empilhadeira. Poder: Se um dos candidatos à vaga estiver desempregado, ele terá menos poder de negociação. Tempo: Se a empresa estiver com uma grande demanda de produção que já acarreta prejuízos em decorrência da ausência daquele profissional a equipede recrutamento e seleção terá menos tempo para realização do processo seletivo, podendo errar na escolha do profissional. Informação: Se o candidato não realiza uma pesquisa sobre a empresa e sobre a faixa salarial daquele cargo, pode ocorrer que, ao ser questionado sobre a pretensão salarial, ele faça uma negociação ruim, ou peça um salário fora do padrão para vaga o que pode ocasionar na perda daquela oportunidade de trabalho. 48 UNIDADE 1 — PRINCÍPIOS DE NEGOCIAÇÃO Essas três variáveis devem ser ponderadas na hora de estabelecer a técnica de negociação a ser adotada. Ir para uma rodada de negociação sem uma técnica é como ir ao supermercado sem uma lista de compras. Você pode esquecer de comprar um item necessário, você pode comprar um item que não é necessário para composição da refeição, você pode não conseguir concluir o prato desejado, e isso pode acarretar prejuízos monetários, logísticos e de relacionamentos. Assim, só é possível realizar boas negociações com muito planejamento e com a utilização de técnicas corretas. Uma dessas técnicas é denominada ZOPA. De acordo com Watkins (2004, p. 39) a ZAP (zona de acordo possível) ou ZOPA (zona possível de acordo) é “a área ou faixa dentro da qual pode-se chegar a um consenso que satisfaça ambas as partes”. Em outras palavras, é o conjunto de acordos capazes de agradar aos dois lados. Toda negociação possuiu um espaço em que o contrato ou a venda se torna possível. Esse intervalo que compreende um possível acordo é a zona de possível acordo. Observe na imagem a seguir. FIGURA 15 – ZONA DE NEGOCIAÇÃO FONTE: . Acesso em: 21 jun. 2021. Segundo Fisher e Ury (1981), a ZOPA representa a medida de barganha, ou o intervalo de negociação, em que as partes estão dispostas a aceitar, em negociações comerciais. A ZOPA é a interseção entre preços máximos mínimos que um comprador está disposto a pagar contra preços máximos e mínimos que um vendedor está disposto a vender. Para compreender melhor a ZOPA, é necessário conhecer também a BATNA, acrônimo muito utilizado por autores que tratam de negociações. A BATNA, sigla em inglês para Best Alternative To a Negotiate Agreement, é conhecida na língua portuguesa como MAANA (Melhor Alternativa à Negociação de um Acordo), também pode ser encontrada como MAPAN (Melhor Alternativa Para um Acordo Negociado). TÓPICO 3 — ZONA POSSÍVEL DE NEGOCIAÇÃO – ZOPA 49 A BATNA refere-se à alternativa mais vantajosa, ou como o próprio nome diz, a melhor alternativa para a negociação. Observa-se que a outra parte também terá uma BATNA, desse modo, a diferença entre o BATNA de “A” e o BATNA de “B” será a Zona Possível de Acordo. Segundo Fisher e Ury, (1981), a BATNA é a mais significativa fonte de poder nas negociações. Recomenda-se que a BATNA seja realizada durante a fase de preparação, porque nessa fase o negociador não está envolvido pelo “calor” da discussão e terá uma visão mais racional do problema. Negociadores que possuírem BATNA mais atrativo serão menos depen- dentes da negociação e, portanto, possuirão maior poder e alcançaram melhores resultados que a outra parte (KIM, FRAGALE, 2005). Pense em um funcionário que deseja um aumento de salário. Ele terá um excelente BATNA caso tenha rece- bido uma oferta de emprego com salário maior, pois caso não consiga o aumento, poderá aceitar a oferta da outra empresa. Observe na imagem a seguir: FIGURA 16 – BATNA FONTE: . Acesso em: 21 jun. 2021. No vídeo a seguir você pode aprender ainda mais sobre BATNA: https://www. youtube.com/watch?v=eJqANPQS5pU . DICAS É importante salientar que um bom negociador deve ter também um plano B, isso significa preparar-se para o pior cenário, denominado WATNA – Worst Alternative to a Negotiated Agreement –, ou no português Pior Alternativa ao Acordo Negociado (PANA). Deve ainda considerar a hipótese de Melhor Alternativa Sem Acordo (MASA), isto é, a ação a ser seguida caso não se chegue a um acordo na negociação (WATKINS, 2007). Consiste na ação que o indivíduo irá tomar caso a negociação não atenda suas expectativas, tratando-se de um conceito dinâmico. Seria um plano B. Conhecer a MASA do outro lado também é fundamental, a fim de comparar se esta é melhor que a sua e também até que ponto o opositor irá se dispor naquela negociação (WATKINS, 2004). 50 UNIDADE 1 — PRINCÍPIOS DE NEGOCIAÇÃO Assim, a fase de preparação é considerada a etapa mais importante em que se delimita não só quais são as suas MANA e PANA, mas também quais serão as MANA e PANA da outra parte. Os especialistas sugerem criar um Brainstorming com o outro lado. Observe na imagem a seguir: FIGURA 17 – BRAINSTORMING FONTE: . Acesso em: 21 jun. 2021. Conclui-se que tanto a melhor quanto a pior alternativa à negociação, ou seja, a MANA e a PANA, consistem em método técnico para verificar as opções disponíveis às partes fora da mesa, de forma a balizar as suas expectativas e estabelecer padrões comparativos durante a negociação (URY, 2007). 51 CHAMADA RESUMO DO TÓPICO 3 Neste tópico, você aprendeu que: Ficou alguma dúvida? Construímos uma trilha de aprendizagem pensando em facilitar sua compreensão. Acesse o QR Code, que levará ao AVA, e veja as novidades que preparamos para seu estudo. • ZOPA é o acrônimo para zona possível de acordo e diz respeito à área ou faixa dentro da qual pode-se chegar a um consenso que satisfaça ambas as partes. • MAANA é a sigla para Melhor Alternativa à Negociação de um Acordo. • Negociadores que possuírem BATNA mais atrativo serão menos dependentes da negociação e, portanto, possuirão maior poder e alcançaram melhores resultados que a outra parte. • WATNA é a sigla para Worst Alternative to a Negotiated Agreement, ou no português Pior Alternativa ao Acordo Negociado (PANA). • MASA é a sigla para Melhor Alternativa Sem Acordo e trata-se da ação a ser seguida caso não se chegue a um acordo na negociação. 52 1 Não ter alternativa à negociação é ficar preso aos interesses da outra parte, por isso, para ter sucesso em negociações é importante, durante a fase de preparação, traçar possíveis cenários. Sobre negociação, assinale a alternativa CORRETA: a) ( ) MAPAN e MAANA são traduções nacionais, todas equivalentes. b) ( ) O acrônimo MANA significa mais provável alternativa à negociação do acordo. c) ( ) O acrônimo MANA significa mix de alternativa à negociação do acordo d) ( ) ZOPA é a tradução nacional para BATNA. 2 Negociação é um processo de comunicação bilateral com o objetivo de se chegar a uma decisão conjunta, tal processo inicia-se antes mesmo de se sentar à mesa para negociar. Sobre negociação, classifique V para as sentenças verdadeiras e F para as falsas: ( ) Ao definir o limite mínimo até onde se pode chagar, deve-se também pensar no que fazer caso não se chegue ao acordo. ( ) A BATNA deve ser feita durante a negociação quando se conhece os anseios da outra parte. ( ) A diferença entre o BATNA de “A” e o BATNA de “B” corresponde a Zona Possível de Acordo. ( ) ZOPA e ZAP são traduções nacionais, equivalentes. Assinale a alternativa que apresenta a sequência CORRETA: a) ( ) F - F - V - F. b) ( ) V - V - V - F. c) ( ) V - F - V - V. d) ( ) V - V - F - F. 3 A preparação da negociação é uma das fases mais importantes. Ela envolve aspectos que vão desde a escolha do local à estratégia a ser adotada. Com relação ao que compõe a etapa de preparação, assinale a alternativa CORRETA: a) ( ) EBTDA – MATRIZ GUT. b) ( ) SWOT – MANA. c) ( ) BATINA – ZOPPA. d) ( ) BATNA- ZAP. e) ( ) PDCA - DEMAIC. AUTOATIVIDADE 53 4 A BATNA (Best Alternative To a Negotiated Agreement), Melhor Alternativa àNegociação de um Acordo, foi um conceito desenvolvido por Roger Fisher e William Ury. Em português, podemos usar a nomenclatura MAANA (Melhor Alternativa à Negociação de um acordo). Diante deste contexto, disserte sobre a importância da definição da BATNA. 5 Bons negociadores não nascem prontos, são formados com a prática das relações, com estudo, técnica e muito planejamento. Umas das técnicas conhecidas pelos negociadores é denominada zona de acordo possível (ZAP). Diante deste contexto, disserte sobre essa técnica e sua eficácia nas negociações. 54 REFERÊNCIAS ACUFF, F. L. Como negociar qualquer coisa com qualquer pessoa em qualquer lugar do mundo. 2. ed. São Paulo: Senac, 2004. ACUFF, F. L. Como negociar qualquer coisa com qualquer pessoa em qualquer lugar do mundo. São Paulo: SENAC, 1998 BENJAMIN, R. The Natural History of Negotiation and Mediation: The Evolution of Negotiative Behaviors, Rituals, and Approaches. Mediate Everything Mediation, 2012. Disponível em: https://www.mediate.com/articles/ NaturalHistory.cfm. Acesso em: 11 jun. 2021. BRETT, J. M. Culture and negotiation. International journal of psychology, v. 35, n. 2, p. 97-104, 2000. BELL, D. E.; RAIFFA, H.; TVERSKY, A. Decision making: Descriptive, Normative, and Prescriptive Interactions. Cambridge, Eng.: Cambridge University Press, 1989. BOFF, R. J. 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Como chegar ao sim: negociação de acordos sem concessões. Rio de Janeiro: Imago, 2005. 55 FREITAS, M. E. de. Organização: um espaço de negociação. Revista de Administração de Empresas, v. 34, n. 5, p. 13-20, 1994. FRENCH, J. R.; RAVEN, B. H. The bases of social power. In: CARTWRIGHT, D. Studies in social power. Ann Arbor: University of Michigan, p. 150-167, 1959. GUIRADO, F. Treinamento de Negociação: desenvolvendo a competência para negociar. Brasília: Editora Senac, 2012. GODINHO, W. B.; MACIOSKI, J. M. K. Estilos de negociação: a maneira pessoal de realizar negócios internacionais. Ciência e Opinião, v. 2, n. 1/2, p. 143-65, 2005. GOLDBERG, S. et al. Dispute Resolution: Nesotiation, 1\1\edietion and Other Processes. Ed. Aspen Law and Business, 6. ed. 1992, p. 17 HIRATA, R. H. Estilos de negociação: as oito competências vencedoras. São Paulo: Saraiva, 2007. 107 p. JUNQUEIRA, L. A. C. Negociação: tecnologia e comportamento. Rio de Janeiro: COP Editora Ltda., 1988. KERSTEN, G. E. 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Dissertação (Mestrado em Engenharia e Gestão do Conhecimento) Programa de Pós-Graduação em Engenharia. Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis. 57 TEIXEIRA, A.; FIALHO, F. A. P.; SILVA, R. F. T. da. A negociação, o negociador e o perfil psicológico: um estudo teórico reflexivo com base nos pressupostos de Martinelli e Almeida (2009), Hirata (2007) e Jung em Keirsey-Bates. In: VIII Convibra Administração. 2011. Disponível em: https://s3.amazonaws.com/ educa/pucrs/Aula/1204/Artigo+para+leitura.pdf. Acesso em: 8 jun. 2021. THOMPSON, L. Mind and Heart of the Negotiator. New Jersey: Prentice Hall. 2005. URY, W. O Poder do NÃO Positivo: Como dizer NÃO e ainda chegar ao SIM. Tradução Regina Lyra. 11ª tiragem. Rio de Janeiro: Elsevier, 2007. WANDERLEY, J. Negociação total. 4. ed. São Paulo: Gente, 1998. WATKINS, M. Negociação. Rio de Janeiro: Record, 2004. WATKINS, M. Negociação. 4º ed. Rio de Janeiro: Record, 2007. 58 59 UNIDADE 2 — NEGOCIAÇÃO E CONFLITO OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM PLANO DE ESTUDOS A partir do estudo desta unidade, você deverá ser capaz de: • conhecer as definições e tipos de conflitos; • diagnosticar conflitos; • analisar as implicações dos conflitos; • aplicar técnicas de gestão de conflitos; • identificar estilos de gestão de conflitos; • administrar conflitos; • conhecer as técnicas de negociação: medicação e conciliação; • aplicar técnicas de negociação; • realizar negociações éticas. Esta unidade está dividida em três tópicos. No decorrer da unidade, você encontrará autoatividades com o objetivo de reforçar o conteúdo apresentado. TÓPICO 1 – CONFLITO TÓPICO 2 – TÉCNICASDE NEGOCIAÇÃO: CONCILIAÇÃO E MEDIAÇÃO TÓPICO 3 – NEGOCIAÇÃO BASEADA EM PRINCÍPIOS: ÉTICA NAS NEGOCIAÇÕES 60 Preparado para ampliar seus conhecimentos? Respire e vamos em frente! Procure um ambiente que facilite a concentração, assim absorverá melhor as informações. CHAMADA 61 UNIDADE 2 1 INTRODUÇÃO O conflito é inerente às relações humanas, isso significa que onde houver pessoas haverá também conflitos. Certamente, você já se envolveu em conflitos. Estes emergem nas relações entre marido e mulher, pais e filhos, empregado e empregador etc. No decorrer da leitura, você aprenderá que nem sempre o conflito é prejudicial. Em muitos casos, pode ser uma fonte de inovação, propulsor de mudanças e de transformações necessárias para o desenvolvimento humano. Dada a complexidade do tema, é normal que surjam diversos questionamentos, tais como: O que é conflito? Quais são as causas do conflito? Quando o conflito pode ser positivo? Como lidar com os conflitos? Por meio da leitura deste tópico você saberá responder a estas perguntas. Reunimos neste tópico os conceitos relacionados ao conflito, suas causas, tipos e estilos de gestão. Desejamos a você uma ótima leitura. TÓPICO 1 — CONFLITO 2 TIPOS DE CONFLITOS Antes de conhecer os tipos de conflitos, é importante conhecer os fatores que antecedem o conflito. Vamos lá! Existem inúmeras causas para que surjam os conflitos: quando há a necessidade de escolher entre situações difíceis de se conciliar, quando há um conflito de interesses, informações díspares, competição entre pessoas, forças ou ideias diferentes. Nascimento e Sayed (2002) apontam inúmeras razões para o surgimento de conflitos, a saber: • Direitos não atendidos ou não conquistados. • Mudanças externas acompanhadas por tensões ansiedade e medo. • Luta pelo poder. • Necessidade de Status. • Desejo de êxito econômico. • Exploração de terceiros (manipulação). • Necessidades individuais não atendidas. UNIDADE 2 — NEGOCIAÇÃO E CONFLITO 62 • Expectativas não atendidas. • Carência de informação, tempo e tecnologia. • Escassez de recursos. • Diferenças culturais e individuais. • Divergência de metas. • Tentativa de autonomia. • Emoções não expressas/ inadequadas. • Obrigatoriedade de consenso. • Meio ambiente adverso. • Preconceitos. As razões supracitadas podem ocorrer em: disputas por heranças, concorrência no trabalho, conflitos em divórcios, entre outros (FIGUEIREDO, 2012) No que diz respeito às ocorrências de conflitos no ambiente empresarial, é oportuno notar que há hoje várias gerações trabalhando juntas. A diversidade etária é cada vez mais comum no ambiente organizacional, o que acaba ocasionando o chamado conflito de gerações, posto que cada geração possui expectativas, ideias e opiniões diferentes. Estudos revelam que um em cada três funcionários admite que sua companhia perde pelo menos cinco horas de trabalho semanais em conflitos entre pessoas de idade diferentes. Sobre isso, acompanhe a leitura a seguir: QUATRO GERAÇÕES TRABALHANDO JUNTAS. UM FINAL FELIZ É POSSÍVEL? QUANDO QUATRO GERAÇÕES SE ENCONTRAM O RESULTADO É PRODUTIVO OU EXPLOSIVO? Camila Pati FONTE: . Acesso em: 9 jun. 2021. TÓPICO 1 — CONFLITO 63 Enquanto a geração Z, dos jovens que nasceram a partir do fim dos anos 1990, faz sua estreia no mercado de trabalho, os baby boomers – nascidos entre 1946 e 1964 – se encaminham para aposentadoria. Ligando a base – repleta de novatos – ao topo, lugar ainda bastante ocupado por veteranos, duas letras que nomeiam gerações: X (nascidos entre 1960 e 1980) e Y (nascidos entre 1981 e meados da década de 1990). Assim, a diversidade etária se faz completa no ambiente corporativo. À parte o perigo das generalizações, há distinções que procedem. Entre as principais, estão aspectos como a dificuldade maior que, em geral, baby boomers podem enfrentar com aparatos tecnológicos, em oposição à extrema facilidade dos profissionais Y e dos Z neste campo, cita Graziela Moreno, CEO da Academia da Estratégia. Com relação a comportamentos, a estabilidade tão desejada pela geração X também é oposta à impulsividade multidisciplinar dos novatos, que surgem mais individualistas e ligados a seus próprios valores pessoais, em um mundo altamente conectado. Outro exemplo é o estilo de liderança, focado em comando e controle no caso de baby boomers e dos X, e mais horizontalizado para os Y e Z. Tão diferentes e ainda assim contemporâneas de expedientes. Quando quatro gerações se encontram o resultado é produtivo ou explosivo? Especialistas consultados por EXAME.com citam aspectos que aumentam as chances de um final feliz na relação entre as quatro gerações: Entender para se adaptar Conhecer as características gerais de cada geração é essencial para ajustar a atitude. Um olhar mais profundo traz o entendimento da forma como cada grupo tende a pensar e agir. “Um bom líder entende as características das pessoas”, diz Graziela, da Academia da Estratégia. Saber o que é importante para cada um é fundamental neste processo. Independente da geração, motivadores variam muito entre profissionais. Se dinheiro representa sucesso para um, qualidade de vida ou estabilidade podem ser bem mais importantes para outros. Comunicação Na opinião de Graziela, ajustar canais de comunicação vai evitar problemas. “Para a geração X e-mail é o principal modelo. Já a geração Y não lê mais e-mails e usa outros canais para se comunicar”, diz. UNIDADE 2 — NEGOCIAÇÃO E CONFLITO 64 E seus sucessores, da Geração Z, estão aí para provar a efemeridade dos canais de comunicação: saem de cena Twitter e a home do Facebook e entram no radar Snapchat e Facebook Messenger. “Snap… o quê?”, poderia perguntar um baby boomer ao colega Z. Criar uma única linguagem privilegiando conexão digital ou trabalhando processo único comunicação é o principal desafio, de acordo com ela. Encontrar o lugar certo “Na época em que eu me formei, nos anos 1970, o importante era saber, quem mais sabia era quem tinha mais sucesso. Hoje essa qualidade vale zero, porque existe o Google, que sabe tudo”, diz Valter Pieracciani, especialista em gestão da inovação e sócio-fundador da Pieracciani Desenvolvimento de Empresas. O que sobra para os veteranos que tanto acumularam conhecimento? Sobretudo, ensinar, diz Pieracciani. Esta é a qualidade a ser destacada nos mais experientes. Já os mais jovens reinam no campo da execução. “São bons em fazer, mas poucos sabem comandar”, diz o especialista. O segredo do sucesso da diversidade, de acordo com ele, reside na correta combinação das qualidades naturais de cada geração. “É possível conseguir o engajamento perfeito com a diversificação dos papeis dentro das equipes”, diz Pieracciani. FONTE: . Acesso em: 23 mar. 2021. Você quer entender um pouco mais sobre gerações e seus conflitos? Assista ao vídeo “Muito além das gerações”, clicando no link: https://youtu.be/zwbRtLXWqR4. O palestrante deste vídeo é o comunicólogo e administrador Sidnei Oliveira, ele é mentor, escritor e consultor de carreiras. Expert em conflitos de gerações, atua na formação de mentores e no exercício da mentoria para o desenvolvimento de jovens potenciais. É autor de vários livros sobre liderança e dos best-sellers da série Geração Y. O também articulista e colunista na Exame.com, preside a Escola de Mentores e está na vice-presidência do Instituto Atlantis de Preservação Ambiental. DICAS Ainda no que se refere aos fatores que antecedem o conflito, Chiavenato (2005) aponta a Diferenciação, Recursos Compartilhados e Limitados e Interde- pendência de atividades. Vejamos com mais detalhes cada um dessesfatores. TÓPICO 1 — CONFLITO 65 • Diferenciação: cada grupo se especializa mais na busca de eficiência. Esse processo acaba diferenciando os grupos dentro da organização, que passam a ter objetivos e interesses diferentes. • Recursos compartilhados e limitados: a quantidade de recursos que circula em uma organização é fixa, limitada e deve ser compartilhada entre os diversos grupos. A percepção da necessidade e da forma como deverão ser distribuídos e alocados esses recursos podem gerar diversos conflitos. • Interdependência de atividades: ocorre quando um grupo não pode realizar a sua tarefa, a menos que o outro grupo realiza a sua. Você percebeu que um conflito pode emergir devido a vários fatores e diagnosticar a causa raiz do conflito, ou seja, qual a real motivação que promove e impulsiona este conflito é fundamental para sua resolução. Muitas vezes isso se torna complexo, pois os envolvidos tentam ocultar esta motivação, mas um senso apurado do líder pode realizar este diagnóstico. NOTA O conflito é uma realidade em nosso cotidiano, por inúmeras razões ele emerge em nossa vida, não ficando restrito às questões relacionadas ao trabalho ou a estrutura organizacional. O conflito pode surgir de diferenças individuais, entre pessoas de um mesmo grupo, entre grupos, entre diferentes níveis organizacionais e entre organizações. Em todos os casos, o conflito envolve algum desses elementos: 1. Pessoas. 2. Situações. 3. Atitudes. 4. Resultados. Na figura a seguir há um conflito entre pessoas (mãe e filha), que emergiu devido à execução de uma tarefa. UNIDADE 2 — NEGOCIAÇÃO E CONFLITO 66 FIGURA 1 – SITUAÇÃO DE CONFLITO FONTE: . Acesso em: 9 jun. 2021. Agora vamos aprender a definição do conflito. Observa-se na literatura diferentes enfoques de psicólogos, administradores e demais estudiosos das mais diversas áreas, que dedicam-se ao estudo do tema. A psicologia tem seu foco voltado ao indivíduo, seu comportamento e suas funções mentais. Como afirma o psicólogo Kurt Lewin (1935), o conflito é visto como a convergência de forças de sentidos opostos e igual intensidade, que surge quando existe atração por duas valências positivas, mas opostas (desejo de assistir a uma peça de teatro e a um filme exibidos no mesmo horário e em locais diferentes); ou duas valências negativas (enfrentar uma operação ou ter o estado de saúde agravado); ou uma positiva e outra negativa, ambas na mesma direção (desejo de pedir aumento salarial e medo de ser demitido por isso). Já a administração tem seu foco voltado ao estudo dos impactos do conflito dentro das organizações, pois, independente da área de atuação, compreender e saber lidar com o conflito é fundamental para o seu sucesso pessoal e profissional (BERG 2012). TÓPICO 1 — CONFLITO 67 A palavra conflito vem do latim conflictus, e abarca sinônimos como choque, enfrentamento, embate de pessoas, ou grupos opostos que lutam entre si, ou seja, é um embate entre duas forças. Trata-se de um estado antagônico de ideias, pessoas ou interesses e não passa, basicamente, da existência de opiniões e de situações divergentes ou incompatíveis, como veremos adiante (BERG, 2012). Robbins (1978) argumenta que o conflito é um processo que se inicia quando uma das partes se apercebe que a outra vai ou está a afetá-la negativamente em assuntos do seu interesse ou que lhe são particularmente importantes. Chiavenato (2005, p. 391) aponta que o “conflito é um processo de oposição e confronto que pode ocorrer entre indivíduos ou grupos nas organizações quando as partes exercem poder na busca de metas ou objetivos valorizados e obstruem o progresso de uma ou mais das outras metas”. Figueiredo (2012, p. 28) ressalta: O conflito surge quando existe necessidade de escolha entre situações que podem ser incompatíveis. Todas as situações de conflito são antagônicas e perturbam a ação ou a tomada de decisão por parte da pessoa ou de grupos. É um fenômeno subjetivo, muitas vezes inconsciente ou de difícil percepção. Vejamos algumas situações elencadas por Nascimento (2008), que podem levar ao surgimento de conflitos: • Experiência de frustração: é entendida como a incapacidade de atingir uma ou mais metas e/ou realizar e satisfazer seus desejos, por algum tipo de interferência ou limitação pessoal, técnica ou comportamental. • Diferenças de Personalidade: são invocadas como explicação para as desavenças tanto no ambiente familiar quanto de trabalho, que são reveladas no relacionamento diário através de algumas características indesejáveis na outra parte envolvida. • Metas diferentes: é comum estabelecermos ou recebermos metas e objetivos a serem atingidos e que podem ser diferentes dos de outras pessoas e de outros departamentos, o que nos leva à geração de tensões em busca da obtenção dos resultados desejados. • Diferenças em informações e percepções: costumeiramente tendemos a obter informações e analisá-las à luz dos nossos conhecimentos e referenciais, sem levar em conta que isso ocorre com o outro lado com quem temos de conversar e/ou apresentar as nossas ideias, e que esse outro lado tem uma forma diferente de perceber as situações. É oportuno refletir as consequências dos conflitos nas rotinas de trabalho. Situações conflituosas despendem energia e tempo, o cuidado que se deve ter é com relação aos efeitos dos conflitos. Se este for positivo, gera novas soluções, aprofunda relacionamentos e gera criatividade, contudo, se o conflito for negativo, desvia o foco dos objetivos organizacionais, além de gerar ressentimentos e insatisfações. Observe a figura a seguir: UNIDADE 2 — NEGOCIAÇÃO E CONFLITO 68 FIGURA 2 – CONFLITO POSITIVO X CONFLITO NEGATIVO FONTE: . Acesso em: 9 jun. 2021. 3 ESTILOS DE GESTÃO DE CONFLITOS Aprenderemos agora um pouco mais sobre os conflitos, suas abordagens e estilos de gestão. Os conflitos podem ser pessoais, interpessoais e organizacionais. Observa-se que no ambiente organizacional há um número cada vez maior de conflitos, e isso se deve a vários fatores, como divergência de ideias, conflito de interesse, dificuldade de relacionamento. Tudo isso faz com que a gestão de conflito ganhe cada vez mais relevância. Chiavenato (2008) cita três tipos de abordagens para solução de conflitos, a saber: a) Abordagem estrutural: recursos limitados, escassos e interdependentes, onde são percebidas condições de diferenciação, são fontes que criam conflitos. Agindo sobre algum desses elementos geradores, a situação conflitante poderá ser controlada mais facilmente. b) Abordagem de processo: essa abordagem pode envolver as partes envolvidas no conflito e pessoas de fora ou uma terceira parte, tentando amenizar um conflito de três formas: a desativação do conflito, onde uma das partes opta pela cooperação promovendo o acordo; reunião de confrontação entre as partes, em que são abertos os motivos do conflito de maneira mais direta entre os envolvidos; ou colaboração, que ocorre após passadas as etapas anteriores, com as duas partes buscando uma resolução vantajosa para todos. TÓPICO 1 — CONFLITO 69 c) Abordagem mista: envolve tanto os aspectos estruturais como os de processo, e pode ser feita através da adoção de regras para resolução de conflitos, ou criação de papéis integradores. A adoção de regras se utiliza de meios estruturais para influenciar no processo de conflito, criando regras e regulamentos que delimitem a ação das pessoas. Já a criação de papéis integradores consiste em criar terceiras partes dentro da organização, de forma que elas estejam sempre disponíveis para auxiliar na busca de soluções favoráveis dos conflitos que possam surgir. Um conflito pode atingir diferentes níveis, dependendoda importância que se dá a ele. Ignorando-o ou reprimindo-o, ele tende a crescer e a se agravar. No entanto, quando é reconhecido e as ações corretivas aplicadas imediatamente, poderá ser resolvido e transformar-se numa força positiva, capaz de mudar hábitos e nos estimular a buscar resultados mais positivos (NASCIMENTO; EL SAYED, 2002). No que diz respeito à gestão de conflitos, Robbins (2002) propõe uma sequência de ações, divididas em cinco estágios para a resolução de conflitos, observe no quadro a seguir: QUADRO 1 – PROCESSO DO CONFLITO Estágios Caracterização dos Estágios Categorias de Formação do conflito Gestão de Conflitos Estágio I Oposição Potencial ou Incompatibilidade Condições antecedentes - Comunicação. -Estrutura. -Variáveis Pessoais. Fontes do Conflito. Identificar Estágio II Cognição e Personalização -Conflito Percebido. - Conflito Sentido. Níveis de Conflito. Estágio III Intenções Intenções para administração do conflito - Competição. - Colaboração. - Compromisso. - Não enfrentamento. - Acomodação. Intenções das Partes. Compreender UNIDADE 2 — NEGOCIAÇÃO E CONFLITO 70 Estágio IV Comportamento Conflito aberto - Comportamento das partes - Reação dos outros. Comportamento das partes. Interpretar Estágio V Consequências - Melhoria do desempenho do grupo - Piora do desempenho do grupo. Consequências do conflito. Utilizar FONTE: FONTE: Adaptado de Robbins (2002) Como é possível perceber no quadro apresentado, no primeiro e segundo estágios é identificado o conflito, avaliando-se a motivação (fontes) e o nível da discordância. No terceiro estágio, compreendem-se as intenções das partes. O quarto estágio trata de interpretar o conflito por meio do comportamento, tanto dos conflitantes, quanto daqueles que estão envolvidos na atmosfera conflitiva e no quinto estágio a utilização das consequências definirão a funcionalidade ou disfuncionalidade do conflito (MOREIRA, 2012). Além de entender o estágio do conflito, é importante considerar a visão que os envolvidos possuem dele. Considerando que há duas formas de lidar com o conflito (evitando ou enfrentado), constatamos que algumas pessoas preferem evitar, negando e ignorando a existência do conflito, o que não é a melhor estratégia. Outros optam por enfrentar o conflito, tentando vencer ou unir as partes, conforme evidencia-se na figura a seguir: FIGURA 3 – FORMAS DE LIDAR COM O CONFLITO FONTE: . Acesso em: 9 jun. 2021. TÓPICO 1 — CONFLITO 71 Se tratando de pessoas, é importante compreender que não existe uma “receita” para administrar conflitos. O que a literatura propõe é de expor métodos que possam ser apropriados e efetivos dependendo da situação presenciada, dos personagens e do assunto a ser resolvido. É necessário ter várias opções à disposição e procurar escolher e aplicar os métodos necessários em cada ocasião, com inteligência (BERG, 2012). Chiavenato (2008) cita três tipos de abordagens para solução de conflitos, a saber: a) Abordagem estrutural: recursos limitados, escassos e, interdependentes, onde são percebidas condições de diferenciação, são fontes que criam conflitos. Agindo sobre algum desses elementos geradores, a situação conflitante poderá ser controlada mais facilmente. b) Abordagem de processo: essa abordagem pode envolver as partes envolvidas no conflito e pessoas de fora ou uma terceira parte, tentando amenizar um conflito de três formas: a desativação do conflito, onde uma das partes opta pela cooperação promovendo o acordo; reunião de confrontação entre as partes, em que são abertos os motivos do conflito de maneira mais direta entre os envolvidos; ou colaboração, que ocorre após passadas as etapas anteriores, com as duas partes buscando uma resolução vantajosa para todos. c) Abordagem mista: envolve tanto os aspectos estruturais como os de processo, e pode ser feita através da adoção de regras para resolução de conflitos, ou criação de papéis integradores. A adoção de regras se utiliza de meios estruturais para influenciar no processo de conflito, criando regras e regulamentos que delimitem a ação das pessoas. Já a criação de papéis integradores consiste em criar terceiras partes dentro da organização, de forma que elas estejam sempre disponíveis para auxiliar na busca de soluções favoráveis dos conflitos que possam surgir. A literatura aponta vários estilos de comportamento com que uma pessoa, ou um grupo, pode lidar com o conflito. Considera-se estes estilos como estratégias básicas para gerir uma situação conflituosa em que as partes consideram os seus interesses incompatíveis (CAETANO; VALA, 2002). No modelo de Rahim (1986), podemos pensar em duas dimensões: preocupação consigo próprio e preocupação com os outros. Ao combinar as duas dimensões, produzem-se cinco estilos específicos de gestão de conflito, conforme detalhado a seguir. 1. Evitamento (uma baixa preocupação consigo próprio e com os outros): tenta- se evitar o conflito; pode ser que se adie um assunto até que a altura seja mais apropriada, ou que simplesmente a pessoa se retire de uma situação ameaçadora. É usado quando o problema não tem importância, quando não há uma possibilidade de ganhar, quando se necessita de tempo para recolher UNIDADE 2 — NEGOCIAÇÃO E CONFLITO 72 mais informação ou quando um desacordo pode ser oneroso ou perigoso. Essa pessoa falha na tentativa de satisfazer tanto os seus próprios desejos como os desejos da outra pessoa. Pode ser criado um conflito do tipo perder-perder, no qual nenhuma parte alcança aquilo que pretende e as razões do conflito permanecem intactas. Embora o conflito pareça desaparecer, na realidade ele emergirá futuramente (RAHIM, 1986; THOMAS, 1992). 2. Acomodação (uma baixa preocupação consigo próprio e uma alta preocupação com os outros): tenta-se minimizar as diferenças e focalizar o esforço de resolução do problema nas coisas comuns às partes, a fim de satisfazer as preocupações da outra pessoa. A coexistência pacífica e o reconhecimento de interesses comuns são o seu objetivo. Funciona quando as pessoas sabem o que por parte dos gestores está errado, quando um assunto é muito importante para a outra pessoa, quando se pretende acumular créditos sociais para utilizar noutras situações ou quando manter a harmonia é o mais importante. Há um elemento de autossacrifício que pode incluir generosidade, bondade ou obediência às ordens da outra pessoa (RAHIM, 1986; THOMAS, 1992). 3. Dominação (uma alta preocupação consigo próprio e uma baixa preocupação com os outros): este estilo está associado ao comando autoritário que reflete uma preocupação em impor o seu próprio interesse. Uma pessoa que utiliza este estilo, que também pode ser chamado competitivo, faz tudo para ganhar ou alcançar o seu objetivo e, como resultado, frequentemente ignora as necessidades e expectativas da outra parte. Isto pode significar defender os seus direitos e/ou uma posição que o sujeito acha que está correta. Também é utilizado quando uma ação decisiva deve ser rapidamente imposta e em situações importantes ou impopulares, em que a urgência ou emergência são necessárias ou indispensáveis (CHIAVENATO, 1999). Se um gestor utiliza este estilo, é bem provável que esteja a aproveitar a sua posição de poder para impor a sua vontade aos subordinados e forçar a sua obediência. É uma estratégia de ganhar-perder que pode não atingir as causas profundas do conflito, podendo surgir possíveis conflitos futuros (RAHIM, 1986; THOMAS, 1992). 4. Concessão Mútua ( uma preocupação média consigo próprio e com os outros): é um estilo intermédio em que ambas as pessoas cedem em certas coisas para ganhar em outras. Ocorre quando as duas partes têm igual poder e ambos os lados querem reduzir as diferenças, ouquando as pessoas precisam de chegar a uma solução temporária sem pressão de tempo. Tende-se a criar um conflito de tipo ganhar-perder. Uma vez que nenhuma parte fica totalmente satisfeita, os antecedentes como base para futuros conflitos ficam mantidos (RAHIM, 1986; THOMAS, 1992). 5. Integração (uma alta preocupação com os outros e consigo próprio): implica uma assertividade e colaboração entre as partes, ou seja, a troca de informação de uma maneira aberta e honesta, um exame de diferenças com o fim de chegar a um acordo aceitável entre as duas partes. O foco deste estilo é a resolução de problemas, sendo o estilo mais eficaz de gestão de conflitos. É uma forma de ganhar-ganhar, no qual os assuntos são discutidos e resolvidos para benefício mútuo das partes em conflito. É alcançada através da confrontação dos assuntos e da vontade dos envolvidos em reconhecer o que está errado e TÓPICO 1 — CONFLITO 73 que merece atenção. É utilizado quando os interesses de ambos os lados são importantes, quando os pontos de vista das partes podem ser combinados para uma solução mais ampla e quando o compromisso requer consenso (CHIAVENATO, 1999; RAHIM, 1986; THOMAS, 1992). Procura soluções criativas para os problemas. Também vale ressaltar o método proposto por Kenneth Thomas e Ralph Kilmann, comumente utilizado. Conforme apresenta-se na figura a seguir, neste método há quatro estilos de administração de conflitos: competição, colaboração, afastamento e acomodação. FIGURA 4 – ESTILOS DE ADMINISTRAÇÃO DE CONFLITOS FONTE: Thomas e Kilmann (2008) Sobre as ações (competição, colaboração, afastamento e acomodação) propostas no modelo, Thomas e Kilmann (2008) explicam que: 1. Competir é assertivo e não cooperativo – um indivíduo busca seus próprios interesses às custas da outra pessoa. Este é um modo orientado para o poder, no qual você usa qualquer poder que pareça apropriado para ganhar sua própria posição - sua capacidade de argumentar, sua posição ou sanções econômicas. Competir significa “defender seus direitos”, defender uma posição que você acredita ser correta ou simplesmente tentar vencer. UNIDADE 2 — NEGOCIAÇÃO E CONFLITO 74 2. Acomodar-se não é assertivo e cooperativo - o completo oposto de competir. Ao acomodar, o indivíduo negligencia suas próprias preocupações para satisfazer as preocupações da outra pessoa; há um elemento de auto- sacrifício neste modo. A acomodação pode assumir a forma de generosidade altruísta ou caridade, obedecer à ordem de outra pessoa quando você prefere não fazê-lo, ou ceder ao ponto de vista de outra pessoa. 3. Evitar não é assertivo e não coopera – a pessoa não se preocupa com suas próprias preocupações nem com as do outro indivíduo. Portanto, ele não lida com o conflito. Evitar pode assumir a forma de se esquivar diplomaticamente de um problema, adiá-lo para um momento melhor ou simplesmente se retirar de uma situação ameaçadora. 4. Colaborar é assertivo e cooperativo – o completo oposto de evitar. Colaborar envolve uma tentativa de trabalhar com outras pessoas para encontrar alguma solução que satisfaça plenamente suas preocupações. Significa investigar um problema para identificar as necessidades e desejos subjacentes dos dois indivíduos. A colaboração entre duas pessoas pode assumir a forma de explorar um desacordo para aprender com as percepções uma da outra ou tentar encontrar uma solução criativa para um problema interpessoal. 5. O comprometimento é moderado tanto em assertividade quanto em cooperação. O objetivo é encontrar alguma solução conveniente e mutuamente aceitável que satisfaça parcialmente ambas as partes. Ele fica intermediário entre competir e acomodar. Ceder desiste de mais do que competir, mas menos do que acomodar. Da mesma forma, ele aborda um problema mais diretamente do que evitá-lo, mas não o explora com tanta profundidade quanto colaborar. Em algumas situações, transigir pode significar dividir a diferença entre as duas posições, trocar concessões ou buscar uma solução intermediária rápida. Cada um de nós é capaz de usar todos os cinco modos de tratamento de conflitos. Nenhum de nós pode ser caracterizado como tendo um único estilo de lidar com conflitos. Mas certas pessoas usam alguns modos melhor do que outros e, portanto, tendem a confiar mais nesses modos do que outros - seja por causa do temperamento ou da prática. Seu comportamento conflituoso no local de trabalho é, portanto, o resultado de suas predisposições pessoais e das exigências da situação em que você se encontra. O instrumento Thomas-Kilmann foi projetado para medir o uso dos modos de tratamento de conflitos em uma ampla variedade de grupos e configurações organizacionais. FONTE: Adaptado de . Acesso em: 24 jun. 2021. 75 Neste tópico, você aprendeu que: RESUMO DO TÓPICO 1 • O conflito é um fenômeno social multidimensional, que é parte integrante da existência humana, essencial para o processo evolutivo da humanidade e para a transformação social. • Os conflitos geralmente emergem por três fatores: diferenciação; recursos compartilhados e limitados e interdependência de atividades. • O conflito pode ter efeitos positivos ou negativos, a maneira como lidamos com ele é que determinará se o aprendizado será construtivo ou destrutivo. • O conflito pode ser funcional, quando engloba atitudes positivas ou pode ser disfuncional, quando engloba atitudes negativas. • Existem quatro formas de gerir conflitos: competição, colaboração, afastamento e acomodação. 76 1 É impossível viver sem conflitos. Vivemos em sociedade, e nas mais diversas relações que estabelecemos, seja na família ou no trabalho, em algum momento vamos ter que lidar com o conflito. Sabemos que conhecer os fatores que antecedem o conflito é um passo importante para descobrir a causa e assim ser mais assertivo em sua resolução. Sobre os fatore que antecedem o conflito, associe os itens, utilizando o código a seguir: I- Diferenciação. II- Recursos Compartilhados e Limitados. III- Interdependência de atividades. ( ) A quantidade de recursos que circula em uma organização é fixa, limitada e deve ser compartilhada entre os diversos grupos. A percepção da necessidade e da forma como deverão ser distribuídos e alocados esses recursos podem gerar diversos conflitos. ( ) Cada grupo se especializa mais na busca de eficiência. Esse processo acaba diferenciando os grupos dentro da organização, que passam a ter objetivos e interesses diferentes. ( ) Ocorre quando um grupo não pode realizar a sua tarefa, a menos que o outro grupo realiza a sua. Assinale a alternativa apresenta a sequência CORRETA: a) ( ) I – II – III. b) ( ) II – I – III. c) ( ) I – II – III. d) ( ) III – II – I. 2 Os conflitos estão presentes em diversas situações do dia a dia das pessoas. Eles podem ser divididos e vários tipos. Disserte sobre os fatores construtivos e destrutivos resultantes dos conflitos. 3 O termo “conflito” significa enfrentamento, falta de entendimento, pressupõe as diferenças de percepções a respeito de um mesmo tema. Nos mais diferentes contextos, existem várias razões para que haja o conflito, este advém de causas reais ou emocionais. Sobre o conflito, classifique V para as sentenças verdadeiras e F para as falsas. AUTOATIVIDADE 77 ( ) O conflito é um fenômeno inerente as interações humanas e, portanto, inevitável no contexto familiar e organizacional. ( ) Vários são os impactos causados pelos conflitos, por isso estes, são sempre considerados destrutivos. ( ) O conflito pode sempre ser evitado uma vez que o indivíduo se nega a participar abrindo mão de seus ideais. ( ) Diferenças individuais47 RESUMO DO TÓPICO 3..................................................................................................................... 51 AUTOATIVIDADE .............................................................................................................................. 52 REFERÊNCIAS ...................................................................................................................................... 54 UNIDADE 2 — NEGOCIAÇÃO E CONFLITO .............................................................................. 59 TÓPICO 1 — CONFLITO .................................................................................................................... 61 1 INTRODUÇÃO .................................................................................................................................. 61 2 TIPOS DE CONFLITOS ................................................................................................................... 61 3 ESTILOS DE GESTÃO DE CONFLITOS ..................................................................................... 68 RESUMO DO TÓPICO 1..................................................................................................................... 75 AUTOATIVIDADE .............................................................................................................................. 76 TÓPICO 2 — TÉCNICAS DE NEGOCIAÇÃO: CONCILIAÇÃO E MEDIAÇÃO .................. 79 1 INTRODUÇÃO .................................................................................................................................. 79 2 NEGOCIAÇÃO .................................................................................................................................. 79 3 CONCILIAÇÃO ................................................................................................................................. 82 4 MEDIAÇÃO ....................................................................................................................................... 87 RESUMO DO TÓPICO 2..................................................................................................................... 91 AUTOATIVIDADE .............................................................................................................................. 92 TÓPICO 3 — NEGOCIAÇÃO BASEADA EM PRINCÍPIOS: ÉTICA NAS NEGOCIAÇÕES ................................................................................................. 95 1 INTRODUÇÃO .................................................................................................................................. 95 2 NEGOCIAÇÃO BASEADA EM PRINCÍPIOS ............................................................................ 95 3 ÉTICA .................................................................................................................................................. 99 4 ÉTICA NAS ORGANIZAÇÕES .................................................................................................... 100 LEITURA COMPLEMENTAR .......................................................................................................... 105 RESUMO DO TÓPICO 3................................................................................................................... 109 AUTOATIVIDADE ............................................................................................................................ 110 REFERÊNCIAS .................................................................................................................................... 113 UNIDADE 3 — NEGOCIAÇÕES EM CONTEXTOS MULTICULTURAIS ............................ 117 TÓPICO 1 — NEGOCIAÇÃO: DESAFIOS E OPORTUNIDADES ......................................... 117 1 INTRODUÇÃO ................................................................................................................................ 119 2 NEGOCIAÇÃO INTERNACIONAL ...............................................................................................119 RESUMO DO TÓPICO 1................................................................................................................... 135 AUTOATIVIDADE ............................................................................................................................ 136 TÓPICO 2 — NEGOCIAÇÕES MULTICULTURAIS .................................................................. 139 1 INTRODUÇÃO ................................................................................................................................ 139 2 O IMPACTO DA CULTURA NAS NEGOCIAÇÕES ...................................................139 RESUMO DO TÓPICO 2................................................................................................................... 150 AUTOATIVIDADE ............................................................................................................................ 151 TÓPICO 3 — DESAFIOS DA NEGOCIAÇÃO ............................................................................. 153 1 INTRODUÇÃO ................................................................................................................................ 153 2 A IMPORTÂNCIA DA COMUNICAÇÃO NAS NEGOCIAÇÕES ...............................153 3 NEGOCIAÇÃO ESTRATÉGICA .................................................................................................. 156 LEITURA COMPLEMENTAR .......................................................................................................... 162 RESUMO DO TÓPICO 3................................................................................................................... 168 AUTOATIVIDADE ............................................................................................................................ 169 REFERÊNCIAS .................................................................................................................................... 172 1 UNIDADE 1 — PRINCÍPIOS DE NEGOCIAÇÃO OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM PLANO DE ESTUDOS A partir do estudo desta unidade, você deverá ser capaz de: • conhecer os princípios, definições e conceitos da negociação; • compreender as bases conceituais da negociação; • identificar o processo de negociação; • analisar as variáveis básicas da negociação; • traduzir os estilos de negociadores; • conhecer as principais técnicas de negociação; • desenvolver capacidades técnicas de negociação; • aplicar técnicas de negociação. Esta unidade está dividida em três tópicos. No decorrer da unidade, você encontrará autoatividades com o objetivo de reforçar o conteúdo apresentado. TÓPICO 1 – INTRODUÇÃO: NEGOCIAR É PRECISO TÓPICO 2 – TIPOS DE NEGOCIAÇÃO TÓPICO 3 – ZONA POSSÍVEL DE NEGOCIAÇÃO – ZOPA 2 Preparado para ampliar seus conhecimentos? Respire e vamos em frente! Procure um ambiente que facilite a concentração, assim absorverá melhor as informações. CHAMADA 3 TÓPICO 1 — UNIDADE 1 INTRODUÇÃO: NEGOCIAR É PRECISO 1 INTRODUÇÃO Olá, acadêmico! A partir de agora vamos adentrar no universo da negociação, examinando seu conceito, identificando as fases que compõe este processo, as abordagens, tipos de negociação e os estilos de negociadores. O tema negociação é de fundamental importância, uma vez que estamos o tempo todo negociando. Para algumas pessoas, a negociação é uma arte, para outras, é uma habilidade adquirida por meio da prática e de estudos. O que você pensa sobre isso? Considera a negociação uma arte ou uma habilidade? De modo geral, a negociação como área de estudo compreende as técni- cas, abordagem e estratégias utilizadas em negociações, mas também está rela- cionada à comunicação, inteligência emocional e argumentação, como veremos a parti de agora. 2 NEGOCIAÇÃO Negociar é preciso? Se o título deste tópico fosse uma indagação, qual seria sua resposta? Vejamos alguns fatores quee culturais, mudanças, escassez de recursos, são fatores que conduz ao conflito. Assinale a alternativa que apresenta a sequência CORRETA: a) ( ) V – F – V – V. b) ( ) F – F – F – F. c) ( ) V – F – F – V. d) ( ) V – V – F – V. 4 (Adaptado de ENADE, 2018) O diretor de uma cadeia de lojas de departamento, para aumentar as vendas, decide fazer uma liquidação de calçados. Tal departamento fica localizado no fundo do segundo andar da loja e o diretor acredita que os clientes comprarão outros produtos no trajeto até lá. O diretor optou por fazer uma liquidação expressiva, do tipo “pague 1 e leve 2”, para conseguir atrair os clientes até o departamento, que é o mais distante da entrada da loja. No entanto, o gerente do departamento de calçados discorda da opção do diretor, pois tem como meta vender o maior número de calçados possível, porque as comissões dos vendedores dependem do valor total de vendas. Qual é a fonte desse conflito organizacional? FONTE: . Acesso em: 6 jul. 2021. a) ( ) incongruência da estrutura da empresa. b) ( ) falha de comunicação e a interpretação equivocada da informação. c) ( ) divergência sobre os critérios de departamentalização da loja. d) ( ) diferença entre as metas da direção e do departamento de calçados. e) ( ) competição pelos recursos entre a direção e o departamento de calçados. 5 Criado pelos doutores Kenneth Thomas e Ralph Kilmann, o Instrumento Thomas-Kilmann (TKI) foi projetado para medir o comportamento de uma pessoa em situações de conflito. Esse instrumento é usado por consultores de Recursos Humanos (RH) e Desenvolvimento Organizacional (OD) como um catalisador para abrir discussões sobre questões difíceis e facilitar o aprendizado sobre como os modos de tratamento de conflitos afetam a dinâmica pessoal e organizacional. Conforme é possível observar na figura a seguir, em situações de conflito, um indivíduo pode adotar comportamentos que permeiam duas dimensões: (1) assertividade, a medida em que a pessoa tenta satisfazer suas próprias preocupações, e (2) cooperatividade, a medida em que a pessoa tenta satisfazer as preocupações do outro. 78 FONTE: . Acesso em: 24 jun. 2021. Diante deste contexto, disserte sobre os cinco modos de respostas adotados em situações de conflito. 79 UNIDADE 2 1 INTRODUÇÃO Caro acadêmico, neste tópico vamos continuar a discussão sobre negociação. Há várias formas de enfrentamento ao conflito. Na área do direito, denomina-se este processo como Métodos Adequados para Solução de Conflitos (MASCs). Os principais métodos adequados de solução de conflitos são: Negociação, Autocomposição, Conciliação, Mediação e Arbitragem. A escolha sobre qual método adotar deve considerar uma série de fatores, como tipo de disputa, vínculo entre as partes, nível de conflito etc. No decorrer da leitura, vamos aprender sobre conciliação e mediação, duas técnicas de negociação muito utilizadas hodiernamente. TÓPICO 2 — TÉCNICAS DE NEGOCIAÇÃO: CONCILIAÇÃO E MEDIAÇÃO 2 NEGOCIAÇÃO A negociação é, sem dúvidas, uma das técnicas de resolução de conflitos mais utilizadas e a que guarda maiores possibilidades de reduzir o stress que os conflitos organizacionais provocam (FREITAS, 1994). Para discorrer sobre as etapas da negociação, vamos nos apropriar da abordagem de ganhos mútuos, ou MGA (Mutal Gains Approach), modelo de processo criado pelo CBI (Consensus Building Institute), organização sem fins lucrativos fundada em Cambridge por profissionais das áreas de negociação e resolução de conflitos, entre eles o Professor Lawrence Susskind, do Program on Negotiation at Harvard Law School e do MIT-Harvard Public Disputes Program, que foi o criador das quatro etapas: preparação, criação de valor, distribuição de valor e acompanhamento (MOVIUS; SUSSKIND, 2010), conforme apresenta-se na imagem a seguir. FIGURA 5 – ETAPAS DA NEGOCIAÇÃO FONTE: . Acesso em: 9 jun. 2021. 80 UNIDADE 2 — NEGOCIAÇÃO E CONFLITO De acordo com Duzert, Spinnola e Brandão (2010), o foco central da abordagem de ganhos mútuos está nos interesses e não nas posições. Esta abordagem se difere das demais por ser um conjunto de princípios e estratégias que permite: a) Maximizar as chances de uma das partes em encontrar seus interesses. b) Criar e manter um bom relacionamento entre as partes que estão negociando. A preparação refere-se ao que se faz antes de iniciar o processo de negociação. Essa, sem dúvida, é uma das etapas mais importante da negociação. Sabe-se que toda negociação exige tempo e energia, portanto, é necessário dimensionar o tempo, reunir informações e levantar alternativas. Criação de valor refere-se ao se faz para explorar (compreender) os interesses de ambas as partes. Criar valor significa buscar soluções e acordos. Nesta etapa, é importante suspender as críticas para enriquecer as possibilidades, a fim discutir as opções de ganhos mútuos. Distribuição de valor refere-se ao que se faz para alcançar um acordo a partir da distribuição das opções definidas na criação de valor. É a etapa mais assertiva da negociação, em que acontecem os jogos de poder, comunicação e influência. Implementação/Monitoramento refere-se ao que se faz para implementar e acompanhar a efetivação dos acordos (DUZERT; SPINNOLA; BRANDÃO, 2010). Bons negociadores sabem que a negociação não termina quando o acordo é concretizado. Agora, no quadro a seguir, analise as características das quatros etapas do processo de negociação. QUADRO 2 – CARACTERÍSTICA DAS ETAPAS DO PROCESSO DE NEGOCIAÇÃO Preparação Criação de valor Distribuição de valor Implementação/ Monitoramento Deixe claro as suas atribuições e defina sua equipe. Explore os interesses de ambos os lados. Se comporte de maneira que crie confiança. Entre em acordo para monitoramento das decisões adotadas. TÓPICO 2 — TÉCNICAS DE NEGOCIAÇÃO: CONCILIAÇÃO E MEDIAÇÃO 81 Estimule sua BATNA e dos outros participantes. Suspenda a crítica. Crie sem compromisso e sem preconceito. Discuta padrões e critérios para dividir o bolo. Facilite a sustentação dos compromissos. Aperfeiçoe a sua BATNA. Use a neutralidade para sugerir possíveis formas de distribuição. Alinhe os incentivos e controles organizacionais. Identifique seus interesses e os interesses das outras partes. Gere opções que façam o bolo aumentar. Continue trabalhando para melhorar o relacionamento. Prepare sugestões de alternativas de ganhos mútuos. Use a neutralidade para melhorar a situação. Projete acordos próximos que se reforcem. Use a neutralidade para resolver desacordos. Busque soluções conjuntas. Elabore um contrato definindo direitos, deveres e penalidades. FONTE: Duzert (2007, p. 74) Ainda, vale citar que Duzert (2007) se utiliza das quatro etapas do processo de negociação para compor a matriz de negociações complexas considerando os elementos, formas e indicadores de avaliação em cada uma das etapas. Observe no quadro a seguir. 82 UNIDADE 2 — NEGOCIAÇÃO E CONFLITO QUADRO 3 – MATRIZ DE NEGOCIAÇÕES COMPLEXAS FONTE: Duzert (2007, p. 74) Como é possível observar na Matriz de Negociações Complexas, Duzert (2007) identifica dez elementos que influenciam direta ou indiretamente um processo de negociação. 3 CONCILIAÇÃO Sobre os métodos de resolução de disputas, pode-se citar a arbitragem, a mediação, a negociação e a conciliação. Este último, tema central deste subtópico. A conciliação é uma técnica utilizada na resolução de disputas em que há a figura de um terceiro, “o conciliador”, responsávelpor escutar as partes a fim de estimulá-los a chegarem num acordo. O conciliador sugere e propõe soluções para o conflito, cabendo às partes aceitarem ou não essa proposta. Geralmente, a conciliação é sugerida em situações de natureza temporária e circunstancial, conforme aponta Vezzula (2001, p. 43): “a conciliação como técnica é de grande utilidade nos problemas que não envolvem relacionamento entre as partes, o que permite trabalhar sobre a apresentação superficial (verdade formal ou posição) para alcançar uma solução de compromisso sem repercussão especial no futuro de suas vidas”. Desse modo, o conciliador “atuará preferencialmente” nos casos em que não houver vínculo anterior entre as partes e poderá fazer sugestões de soluções. Essas são as principais diferenças entre os métodos conciliação e mediação. Na conciliação é possível sugerir soluções, sendo oportuna quando não há vínculo anterior entre as partes. Já a mediação é sugerida quando há vínculo entre as partes, sendo estes responsáveis por propor soluções adequadas. TÓPICO 2 — TÉCNICAS DE NEGOCIAÇÃO: CONCILIAÇÃO E MEDIAÇÃO 83 Por meio da negociação desenvolve-se outras competências, inclusive o autoconhecimento e a inteligência emocional. As habilidades desenvolvidas com a negociação preparam o profissional para gerenciamento de demandas e gestão de conflitos, em diferentes contextos, seja na escola, na empresa, delegacia, hospital, ou poder judiciário. Sales (2016, p. 945) aponta que: A abrangência da essência dessas habilidades é maior do que o local onde ela será desenvolvida. Assim, ela assume uma característica de desenvolvimento de habilidades transversais para pessoas que atuarão na gestão dos conflitos de pessoas. Podem ser desenvolvidas no dia a dia pelos indivíduos que vivenciam conflitos e tomam decisões diariamente ou por terceiros para facilitar essa resolução – mediador em vários espaços numa sociedade. E será desenvolvida onde quer que esses indivíduos estejam transformando os ambientes. Você se considera um bom negociador? Conhece alguém que se destaca na arte da negociação? Quais são as habilidades e competências que qualificam alguém como um bom negociador? Há pessoas que se destacam na arte da negociação, profissionais que ao longo de sua carreira conquistaram credibilidade e confiança ao lidar com situações difíceis, delicadas e complexas. Podemos citar o antropólogo e professor da Universidade de Harvard William Ury. William Ury foi responsável por solucionar uma das maiores brigas societárias da história do Brasil. O confronto entre os empresários Lars Olofsson (Carrefour), Abílio Diniz (grupo Pão de Açúcar) e Jean-Charles Naori (Grupo francês Casino) já durava dois anos e foi considerado pelo jornal Financial Times como um dos maiores confrontos transcontinentais de negócios da história. Acompanhe o desfecho no texto a seguir. FIGURA 6 – CONFLITO ABÍLIO DINIZ X CASINO FONTE: . Acesso em: 9 jun. 2021. 84 UNIDADE 2 — NEGOCIAÇÃO E CONFLITO O conflito Abílio x Casino (a 5ª maior rede de supermercados da França) foi considerado pelo jornal Financial Times como um dos maiores confrontos transcontinentais de negócios da história. Estavam em curso dois grandes casos de arbitragem internacional, além de uma complexa ação judicial. O conflito já durava mais de dois anos e poderia durar mais oito anos. Estima-se que a disputa já havia consumido 500 milhões de reais e não se tinha uma ideia de quanto mais poderia custar. Essa era a situação quando o antropólogo e professor da Universidade de Harvard William Ury, foi convidado por Abílio para tentar solucionar a disputa. Ury trabalhou como negociador e o acordo foi assinado no dia 6 de setembro 2013. Esse caso mostra como William Ury conseguiu solucionar em cinco dias (com negociações no Brasil e na França) um caso aparentemente sem solução negociada. Para solucionar a diputa, Wliliam Ury utilizou o método Negociação com Base em Princípios desenvolvidos no Program on Negotiation da Universidade de Harvard. Vamos saber como foi a solução. O grupo pão de açúcar O Grupo Pão de Açúcar foi fundado em 1948 por Valentim Diniz (pai de Abílio) e se tornou a maior empresa de distribuição do Brasil. Em maio de 2005, a rede francesa Casino pagou 900 milhões de dólares para dividir o controle do Pão de Açúcar com a garantia de ter o controle do grupo no futuro. O acordo também previa que seriam investidos mais de 2,5 bilhões de reais na abertura de 40 hipermercados e 120 supermercados nos próximos 4 anos. O Casino cumpriu sua parte no acordo, alavancando o crescimento vertiginoso do Pão de Açúcar. O acordo previa também que o Casino teria a opção de aumentar sua participação gradativamente na holding e até deter a maioria das ações com direito a voto em junho de 2012. Assim, Abílio perderia o controle do Grupo a partir dessa data. Abilio Diniz continuou a ser o presidente do Conselho e também foi nomeado presidente do Conselho da holding Wilkes, que controlava a empresa na época. No início de 2011, Abílio tentou rever os termos do contrato com o Casino, mas não teve sucesso. Em junho de 2011, Abílio e o banco BTG Pactual tentaram (em segredo) unir as operações do Pão de Açúcar e do Carrefour no Brasil (principal concorrente do Casino na França), com o intuito de o empresário não perder o controle do grupo. A operação fracassou e causou mal-estar entre os dois sócios que, na época, chegaram a trocar farpas publicamente sobre o assunto. O Casino classificou o negócio como ilegal e hostil. Segundo os franceses, a manobra de Abílio foi uma tentativa de não perder controle do Grupo Pão de Açúcar. O detalhe que deixou furioso o presidente do Casino, Jean-Charles Naouri, foi o de saber da manobra somente pela imprensa francesa. A partir daí, o que se seguiu foi uma troca de farpas de parte a parte por meio da imprensa. De um lado, os franceses diziam que a confiança havia sido quebrada. De outro, Abílio defendia que a intenção era benéfica para o grupo. O resultado foi a abertura de um pedido de arbitragem na Câmara Internacional de Comércio, em Paris, por parte do Casino. TÓPICO 2 — TÉCNICAS DE NEGOCIAÇÃO: CONCILIAÇÃO E MEDIAÇÃO 85 Cadeira perdida e a continuação do conflito Em junho de 2012, Abílio transferiu para o Casino o controle do Grupo Pão de Açúcar, conforme previsto no acordo de acionistas. Ele continuou, entretanto, como o segundo maior acionista da Wilkes Participações (controladora) e presidente do conselho do Pão de Açúcar. Em dezembro de 2012, Abílio Diniz abriu um processo arbitral contra o Casino para que o sócio “se abstenha de praticar ações que violem o cargo de Abílio Diniz como presidente do Conselho de Administração do Grupo Pão de Açúcar“. Segundo round e todos estavam perdendo Em fevereiro de 2013, Abílio é indicado o cargo de presidente do conselho de administração da BRF (Sadia + Perdigão), cargo que ele assume em abril. Esta nova situação enfurece novamente o sócio francês: o fato de a BRF ser uma das principais fornecedoras do Grupo Pão de Açúcar poderia gerar conflitos de interesses, dizia Jean-Charles Naoury, presidente do Casino. Ao longo dos quase três anos de batalha entre Diniz e Naoury, todos estavam perdendo. Perdia Abílio, perdia Jean-Charles, perdiam os profissionais das empresas, perdiam os investidores e perdiam todos os clientes e fornecedores que se viam diante de um cenário nebuloso e imprevisível. Ninguém aceitava ceder e a batalha se tornava cada vez mais tensa, afetando os milhares de profissionais do Grupo Pão de Açúcar que ficavam cada vez mais inseguros e incertos acerca de seu próprio futuro. Abílio e Naoury não cediam e estavam muito mais focados nas posições pessoais do que nos interessesdas duas empresas. Para se ter uma ideia do desgaste, enquanto o Casino montava sua estratégia em Paris, se preparando para constantes viagens à São Paulo, advogados de Abílio se dividiam em reuniões com escritórios no exterior, como Nova Iorque, na preparação da defesa. E ninguém sabia onde isso iria parar. Este era o cenário quando o negociador norte-americano William Ury foi convidado por Abílio a ajudar a solucionar o conflito. A contratação de William Ury e a solução em cinco dias A ideia da contratação de Ury partiu da esposa de Abílio, Geise Diniz, que participou de alguns seminários organizados pela HSM em São Paulo onde William Ury é presença constante. Há mais de 30 anos, o trabalho do antropólogo e professor de Harvard é resolver conflitos através da negociação. Ury está habituado a solucionar guerras civis, brigas empresariais e conflitos familiares e afirma que "negociar é uma oportunidade de encontrar soluções criativas em conjunto". Ele conta o que a 86 UNIDADE 2 — NEGOCIAÇÃO E CONFLITO maioria das pessoas pensam quando se fala em negociação: elas dizem “quero chegar ao acordo, mas como fazer isso com aquela pessoa difícil, ou quando o outro lado não quer?” William Ury responde: “Eu me especializei nisso, negociação em situações difíceis, com pessoas difíceis”. Ury veio ao Brasil em maio de 2013. Uma das suas primeiras exigências foi conhecer Abílio Diniz da forma mais ampla possível para entender quais eram os seus interesses reais naquela negociação específica. Reuniram-se inicialmente na casa de Diniz, em São Paulo, e depois na casa de Abílio, na Praia da Baleia, em São Paulo. Ury conta uma das conversas com Abílio em seu livro Como chegar aos Sim com Você Mesmo. Essa conversa definiu o que realmente Abílio desejava (o seu real interesse). Leia o que Ury diz: “O primeiro passo de Abílio para resolver a disputa deveria ser definir suas verdadeiras prioridades. Perguntei-lhe então: o que você realmente quer? Sua primeira reação foi me apresentar uma lista de desejos: ele queria vender suas ações a um determinado preço, eliminar uma cláusula de não competição com vigência de três anos (que o impedia de adquirir supermercados) e outros itens como a manutenção da sede do Grupo Pão de Açúcar, além de manter outros imóveis. Pressionei-o: entendo que você queira todos esses itens concretos, mas o que essas coisas vão acrescentar a um homem que parece ter tudo? Você é um dos homens mais ricos do Brasil! Pense bem: o que, nesse momento, que você mais quer na vida? Abílio pensou e respondeu: liberdade, quero minha liberdade! Liberdade para ter mais tempo com a família e liberdade para realizar meus sonhos de negócios”. Essa pergunta foi decisiva: Ury perguntou, o que você realmente quer? Ury com a sua experiência como negociador mostrou para Abílio que ele queria liberdade e não bens. Até a conversa esclarecedora com Ury, Abílio não sabia o que realmente queria! A liberdade passou a nortear a negociação e o acordo foi alcançado em cinco dias. Uma negociação relâmpago e sigilosa costurada em apenas cinco dias (entre 2 e 6 de setembro de 2013), entre Paris e São Paulo, acompanhada de perto por só uma dúzia de pessoas, concluiu o processo. Os termos são de uma simplicidade espantosa: apenas sete itens descritos em 2 páginas. De forma geral, Abílio trocou suas ações ordinárias por preferenciais, sem direito a voto e renunciou à presidência do conselho de administração do Pão de Açúcar. Naouri, por sua vez, abriu mão da cláusula de não competição, abrindo novas oportunidades para Diniz. Os dois encerraram também os procedimentos arbitrais em curso. FONTE: . Acesso em: 11 mar. 2021. TÓPICO 2 — TÉCNICAS DE NEGOCIAÇÃO: CONCILIAÇÃO E MEDIAÇÃO 87 Por meio da leitura complementar que relata o conflito envolvendo o empresário brasileiro Abílio Diniz, é possível concluir que quanto mais um conflito se estende, piores são as consequências e prejuízos emocionais e financeiros. Tendo em vista essa leitura, reflita sobre a técnica utilizada por William Ury. Você pode reunir-se com seus colegas para discutir o caso. NOTA 4 MEDIAÇÃO Como você pôde perceber, existem diversas formas de se lidar com o conflito. Há quem prefira fugir dele, negligenciando sua existência, o que pode agravar ainda mais a situação. Há outros que preferem enfrentar o conflito, adotando a técnica que considere mais oportuna para o momento. Sobre as formas de se lidar com o conflito, observe a figura a seguir: FIGURA 7 – FORMAS DE LIDAR COM O CONFLITO FONTE: . Acesso em: 9 jun. 2021. Ao enfrentar um conflito, pode-se adotar diversas técnicas, umas delas é a mediação. A mediação é uma das técnicas de negociação que ocorre em casos específicos, em que as partes já não conseguem resolver a situação. Então, é necessária a figura de uma terceira pessoa imparcial que irá facilitar o diálogo e mediar a situação. Conforme aponta Sales (2016, p. 942), a “mediação de conflitos pode ser conceituada como meio de solução de conflitos, na qual um terceiro imparcial – mediador – auxilia o diálogo consensual, inclusivo e colaborativo entre as partes, que são responsáveis pela decisão construída”. 88 UNIDADE 2 — NEGOCIAÇÃO E CONFLITO A mediação de conflitos é uma técnica de negociação que busca demonstrar às partes envolvidas a possibilidade de perceber o conflito como algo natural, como oportunidade de crescimento e de mudança positiva. Na legislação brasileira, a mediação de conflitos está prevista na Lei nº 13.140, de junho de 2015 (conhecida como Lei de Mediação). Nela, está escrito que “considera-se mediação a atividade técnica exercida por terceiro imparcial sem poder decisório, que, escolhido ou aceito pelas partes, as auxilia e estimula a identificar ou desenvolver soluções consensuais para a controvérsia” (BRASIL, 2015). O Art. 2º dessa mesma lei descreve que a mediação será orientada pelos seguintes princípios: I – imparcialidade do mediador; II – isonomia entre as partes; III – oralidade; IV – informalidade; V – autonomia da vontade das partes; VI – busca do consenso; VII – confidencialidade; VIII – boa-fé (BRASIL, 2015). Para se aprofundar ainda mais neste assunto, acesse a lei da mediação, nº 13.140, através do link: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2015-2018/2015/Lei/ L13140.htm. DICAS Observe que apesar da existência de uma terceira pessoa, a responsabilidade da decisão continua sendo dos envolvidos no conflito, o mediador apenas auxilia as partes a chegarem em um consenso. Para compreender melhor como essa técnica é aplicada, veja o caso a seguir: Certo dia, o pai chegou em casa e encontrou seus filhos João e Maria brigando por uma laranja. Só havia uma laranja na casa, ou seja, era um recurso escasso e ninguém queria ceder. João dizia que queria a laranja. Maria dizia que queria a laranja. O pai então pensou uma forma de resolver aquele conflito entre os filhos. Falou: “vou resolver este problema já que não conseguem chegar a uma solução”. Os filhos ficaram atentos para decisão do pai: “João, corte a laranja e TÓPICO 2 — TÉCNICAS DE NEGOCIAÇÃO: CONCILIAÇÃO E MEDIAÇÃO 89 No caso em questão, o pai foi o mediador, mas apesar do esforço, percebeu que que a estratégia adotada não foi assertiva, posto que Maria queria a casca da laranja e João o suco. Apesar de cessado o conflito, o pai observou que se tivesse ouvido os anseios das partes poderia ter adotado uma solução melhor. Por fim, sintetiza-se na figura a seguir as técnicas de mediação, conciliação e arbitragem. Maria escolha o primeiro pedaço”. João não queria que Maria levasse um milímetro a mais da laranja e por isso mediu o local exato que iria cortar a laranja. Partiu bem no meio. Sabia que se partisse 60% x 40%, Mariateria o poder da escolha e pegaria o maior pedaço. Para evitar isso, João cortou bem no meio. Certinho. Maria, olhando os dois pedaços tão iguais, escolheu um. João então ficou com a outra metade da laranja. Cada um saiu para um lado e o problema foi resolvido. Pergunto ao leitor, o pai resolveu o conflito? Foi uma solução inteligente? E, por último, foi a melhor solução possível com o recurso disponível? A princípio, parece ser uma solução inteligente e a melhor possível com o recurso disponível. Mas o pai, desconfiado, seguiu João até o quintal da casa, onde viu o filho espremendo a laranja e tomando o suco. Depois, João jogou a casca fora. Na sequência, o pai encontrou Maria na cozinha da casa. A filha raspava a casca da laranja e enfeitava o bolo de aniversário da avó. Maria só usou a casca da laranja e jogou o restante fora. FONTE: . Aces- so em: 7 fev. 2021. 90 UNIDADE 2 — NEGOCIAÇÃO E CONFLITO FIGURA 8 – MEDIAÇÃO, CONCILIAÇÃO E ARBITRAGEM FONTE: . Acesso em: 9 jun. 2021. Como é possível observar no primeiro método de resolução, o mediador facilita o diálogo entras as partes, mas são elas que apresentam as soluções. Na conciliação, há uma participação mais efetiva do conciliador, que pode sugerir soluções. Já na arbitragem, as partes indicam árbitros que iram propor soluções para o caso ao invés de levá-lo ao judiciário. 91 RESUMO DO TÓPICO 2 Neste tópico, você aprendeu que: • Uma negociação pode ser composta por quatro etapas: preparação, criação de valor, distribuição de valor e acompanhamento. • Há diversos métodos de gestão de conflitos, a saber: a arbitragem, a mediação, a negociação e a conciliação. • Na arbitragem, os árbitros são indicados pelas partes e dão a solução para o caso ao invés de levá-lo ao judiciário. • A conciliação é uma técnica utilizada na resolução de disputas em que há a figura de um terceiro, “o conciliador”, responsável por escutar as partes a fim de estimulá-los a chegarem num acordo. O conciliador sugere e propõe soluções para o conflito, cabendo às partes aceitarem ou não essa proposta. • A mediação é a atividade técnica exercida por terceiro imparcial sem poder decisório, que, escolhido ou aceito pelas partes, as auxilia e estimula a identificar ou desenvolver soluções consensuais para a controvérsia. 92 1 (ENADE, 2018) Há duas abordagens para a negociação, a distributiva e a integrativa. O que as diferenciam são as metas, a motivação, o foco, os interesses, o compartilhamento de informações e a duração do relacionamento. Além dessas abordagens, a questão cultural também influencia as negociações. Um estudo que comparou os negociadores norte-americanos com os japoneses mostrou que, enquanto as ofertas iniciais feitas pelos gestores norte-americanos levavam ao efeito de ancoragem, observada na negociação distributiva, as ofertas iniciais feitas pelos negociadores japoneses levavam ao maior compartilhamento de informações e a melhores resultados, características observadas na negociação integrativa. ROBBINS, S. P.; JUDGE, T. A. Fundamentos do Comportamento Organizacional. 12 ed. São Paulo: Pearson Education do Brasil, 2014 (adaptado) FONTE: . Acesso em: 6 jul. 2021. Segundo esse estudo, o modo de negociação norte-americano se caracteriza por: a) ( ) Motivação de ganhos mútuos na negociação. b) ( ) Relacionamento de curto prazo entre as partes. c) ( ) Congruência de interesses da negociação. d) ( ) Alto compartilhamento de informações. e) ( ) Metas que visam expandir o “bolo”. 2 (Adaptado ENADE, 2018) Uma vez que as empresas são compostas por pessoas com diversas opiniões e personalidades, é esperado que existam conflitos dentro das organizações. No ambiente organizacional, os conflitos podem tanto causar impactos negativos como representar oportunidades de crescimento, mudanças e melhorias. Considerando as informações do texto, classifique V para as sentenças verdadeiras e F para as falsas. ( ) O líder deve minimizar as diferenças entre as partes oponentes, enfatizando seus interesses comuns, a fim de alterar os comportamentos causadores de conflitos na empresa. ( ) Quando o conflito se dá entre grupos, o líder deve propor uma discussão fechada com cada grupo separadamente, com o objetivo de resolver as divergências entre eles. ( ) Em se tratando de conflito grupal, o líder não deve intervir deixando a critério de cada um a responsabilidade pela gestão do conflito. AUTOATIVIDADE 93 ( ) O líder deve manter-se imparcial ao perceber que está diante de uma situação em que não há vencedores ou vencidos, sempre demonstrando disponibilidade e disposição ajudar na solução do conflito. FONTE: . Acesso em: 6 jul. 2021. Assinale a alternativa que apresenta a sequência CORRETA: a) ( ) V – F – V – V. b) ( ) F – F – F – F. c) ( ) V – F – F – V. d) ( ) V – V – F – V. 3 Existem diversos métodos de gestão conflito a escolha de qual método adotar vária de acordo com a situação e o estágio do conflito. Sobre a técnica de mediação, assinale a alternativa CORRETA: a) ( ) Há a presença de uma terceira pessoa que participa e se responsabiliza pelas decisões dos envolvidos b) ( ) Há a presença de um terceiro envolvido parcial que auxilia o diálogo e as decisões. c) ( ) Há a presença de uma terceira pessoa imparcial que facilita o diálogo. d) ( ) Há a presença de uma terceira pessoa, mas a responsabilidade da decisão continua sendo dos envolvidos no conflito. 4 Na legislação brasileira, a mediação de conflitos está prevista na Lei nº 13.140, de junho de 2015 (conhecida como Lei de Mediação). Disserte sobre os oitos princípios descrito nesta lei e que orienta a mediação. 5 Sobre os métodos de gestão de conflitos, pode-se citar a arbitragem, a mediação, a negociação e a conciliação. Disserte sobre pelo menos duas dessas técnicas. 94 95 UNIDADE 2 1 INTRODUÇÃO Neste tópico, apresentam-se os conteúdos sobre negociação baseada em princípios. Vamos conhecer um método de negociação comumente utilizado, que foi desenvolvido no programa da universidade de Havard chamado de “negociação baseada em princípios”. Também podendo ser encontrado na literatura como método Havard, essa metodologia está fundamentada sobre quatro pilares: pessoas, interesses, opções e critérios. Tais critérios visam o estabelecimento de negociações com ganhos mútuos. Também vamos conhecer os conceitos sobre ética. Sabemos que no Brasil muito se fala em ética, e a discussão sobre o tema é bem-vinda, pois auxilia na compreensão e descontrói paradigmas errôneos. Por isso, neste tópico você vai aprender como a ética tem sido abordada no ambiente empresarial e no contexto das negociações. TÓPICO 3 — NEGOCIAÇÃO BASEADA EM PRINCÍPIOS: ÉTICA NAS NEGOCIAÇÕES 2 NEGOCIAÇÃO BASEADA EM PRINCÍPIOS Há duas formas básicas de negociação, a primeira é afável e gentil. As partes estão dispostas a ceder, pois querem evitar conflitos. A segunda é o oposto, trata-se de uma negociação dura, pois deseja-se vencer a qualquer preço. Na primeira, os negociadores agem com benevolência, realizando inúmeras concessões, a fim de evitar o conflito. A segunda, com rigor e assertividade, que induz um comportamento áspero, de quem deseja vencer a qualquer custo, sem abrir mão da sua posição, o que prejudica a realização do acordo e futuros relacionamentos entre os negociadores. A ideia da Escola de Negociação de Harvard foi justamente conciliar essas duas maneiras de negociar, desenvolvendoe difundindo uma nova forma de agir: a negociação baseada em princípios, a qual se baseia no conceito do “ganha-ganha”. Observe a quadro a seguir: 96 UNIDADE 2 — NEGOCIAÇÃO E CONFLITO QUADRO 4 – NEGOCIAÇÃO GENTIL X DURA E BASEADA EM PRINCÍPIOS FONTE: Adaptado de . Acesso em: 9 jun. 2021. O programa de negociação de Havard é um dos principais centros do mundo no estudo e produção científica sobre negociação. O programa desenvolveu um método batizado de “negociação baseada em princípios”, também chamado de negociação colaborativa. Nesse método, busca-se um resultado mais justo possível. Para isso, as posições das partes em conflito são deixadas de lado e concentra-se apenas nos interesses. O método Harvard de negociação é descrito no livro “Como Chegar ao Sim”, de autoria dos professores Bruce Patton, Roger Fisher e Willian L. Ury. O método possui quatro técnicas, como exposto no quadro a seguir: QUADRO 5 – NEGOCIAÇÃO BASEADA EM PRINCÍPIOS TÉCNICA DESCRIÇÃO PESSOAS Separe as pessoas do problema. INTERESSES Concentre-se nos interesses não nas posições. OPÇÕES Crie uma variedade de possibilidades antes de decidir o que fazer. CRITÉRIOS Insista em que o resultado tenha por base algum padrão. FONTE: Adaptado de Fisher, Ury e Patton (2005, p. 28) TÓPICO 3 — NEGOCIAÇÃO BASEADA EM PRINCÍPIOS: ÉTICA NAS NEGOCIAÇÕES 97 O primeiro passo é separar as pessoas do problema. Para boa parte das pessoas, essa primeira premissa é a mais difícil de ser superada em uma negociação, pois muitas vezes se confunde o problema com a pessoa e, não raras vezes, o problema é a própria pessoa. Na sequência, deve-se concentrar nos interesses em jogo, não em posições. Apenas quando o negociador conseguir compreender os reais interesses do oponente será possível atender os seus desejos sem prejudicar o próprio objetivo. Na terceira etapa deve-se criar uma variedade de possibilidades de ganhos mútuos. Para que isso ocorra, deve-se ouvir as partes. Muitas pessoas pensam que a escuta gera uma presunção de concordância ou fraqueza, o que não é verdade. Deve-se, assim, estimular que o outro fale. Ademais, não se deve fingir que está escutando quando na realidade está se preparando para rebater os argumentos da outra parte. Saber escutar é um elemento chave para um bom negociador. Por fim, deve-se trabalhar com base em critérios claros e objetivos. É importante munir de conhecimento teóricos e práticos sobre as técnicas de negociação. Vale ressaltar que uma boa negociação deve levar em conta três critérios: deve produzir um acordo sensato, ser eficiente e melhorar o relacionamento entre as pessoas. Os autores ainda propõem três fases em que esses quatro elementos (pessoas, interesses, opções e critérios) devem ser usados. 1- A análise, na qual se faz o diagnóstico da situação, reúne informações, organiza-as e reflete-as. Nela, você leva em conta a percepção, sentimentos e emoções das pessoas envolvidas, identifica os seus interesses e da outra parte, as falhas na comunicação, toma conhecimento das opções já apresentadas e busca os critérios objetivos que podem ajudar na negociação. 2- Após o diagnóstico, se passa ao estágio de planejamento no qual se decide o que será feito na negociação. Como será desenvolvida a negociação, levando em conta a análise que foi feita? Dentre os interesses identificados, quais os mais importantes? Quais seriam os objetivos mais realistas? Nestor ponto, também é necessário produzir opções e critérios adicionais para facilitar o processo decisório. 3- A seguir, se passa ao estágio de discussão, no qual as partes se comunicam diretamente. Neste ponto, é importante que o ambiente seja favorável ao diálogo e que todos tenham a oportunidade de expressar os seus sentimentos e interesses. Cada lado deve buscar compreender os interesses e as necessidades do outro. Caso isso ocorra, ambos poderão trabalhar em conjunto para gerar opções de ganho mútuo, buscando firmar um acordo com base em padrões objetivos para conciliar os interesses. FONTE: . Acesso em: 24 mar. 2021. 98 UNIDADE 2 — NEGOCIAÇÃO E CONFLITO O método Harvard de negociação é amplamente utilizado por profissionais das mais diversas áreas, que atuam como gestores, facilitadores e mediadores, na busca de acordos justos que favoreçam uma relação sadia de longo prazo. Esse método é oportuno, sobretudo em situações complexas como as que envolvem catástrofes, acidentes, tragédias, brigas entre sócios e disputa por heranças. Conflitos familiares exigem técnicas de negociações específicas, que devem ser realizadas por profissionais capacitados. No estudo de Sigaki (2011), o autor propõe a matriz de negociações complexas, composta por quatro etapas: preparação, criação de valor, distribuição de valor e na última etapa a implementação e monitoramento, conforme apresenta- se no quadro a seguir: QUADRO 6 – MATRIZ DE NEGOCIAÇÕES COMPLEXAS FONTE: Sigaki (2011, p. 20) A Matriz de Negociações Complexas está estruturada a partir da abordagem de ganhos mútuos e reúne quatro etapas do processo de negociação, contendo dez elementos, dez formas e dez indicadores de avaliação, conforme ilustrado na imagem anterior. De acordo com Sigaki (2011, p.21): A etapa de criação de valor, refere-se ao que se faz para compreender os interesses de ambas as partes, para isso haverá a proposta de valor e deverá se adaptar às necessidades e aos desejos identificados por ambas as partes, tanto o interlocutor quando o negociador, com base nas opções apresentadas. Na etapa da distribuição de valor é onde ocorre a negociação propriamente dita, pois são nessa fase que são divididas as opções entre as partes de acordo com as prioridades de interesses, sempre buscando um resultado que satisfaça as duas partes. O comprometimento advindo da busca conjunta de dados favorece a criação de um clima de confiança, ampliando as possibilidades de negócios conjuntos. Essa é uma etapa importante para a negociação, pois é onde acontecem os jogos de potes, comunicação e influência. Na etapa de implementação e monitoramento, refere-se ao que se faz para implementar e acompanhar a efetivação de acordos. Essa etapa deve servir para a manutenção do relacionamento entre as partes. TÓPICO 3 — NEGOCIAÇÃO BASEADA EM PRINCÍPIOS: ÉTICA NAS NEGOCIAÇÕES 99 3 ÉTICA A ética é um tema explorado há muito tempo. Filósofos como Aristóteles, Platão, Kant, Heidegger se propuseram a discutir o tema, tendo-o feito com muita propriedade. O termo anteriormente reservado ao mais árduo labor filosófico e praticamente desconhecido do grande público, hoje é discutido nas várias esferas da sociedade. Enquanto disciplina teórica, estuda os códigos de valores que determinam o comportamento que influenciam na tomada de decisão dos indivíduos num determinado contexto. A ética preocupa-se em estabelecer padrões sobre o que é bom ou mau na conduta humana. A ética “tem sido entendida como a ciência da conduta humana perante o ser e seus semelhantes” (SÁ, 2001, p. 15). De acordo com Vaz (2002, p. 56), a “ética se constitui como ciência dos costumes transmitidos na sociedade, dos estilos permanentes do agir dos indivíduos (hábitos), bem como da comprovação crítica dos novos valores que a evolução da sociedade faz surgir”. Para Argandoña (1994, p. 21), “a ética é uma ciência que tem por objetivo a excelência, não uma ciência dos mínimos, pretende não só o seu próprio bem, mas o bem de todos. A ética trata de ações dignas ou indignas do homem, ações que se relacionam com a moral e que tem como fundamento os valores da sua conduta”. Observa-se que o cerne da ética é a dignidade humana, a igualdade,o direito, a realização e a felicidade do indivíduo na sua vocação pessoal, organizacional e comunitária (REGO, MOREIRA, 2003). A ética manifesta-se na tomada de decisão, nos orienta a tomar decisões justas, tanto a nível pessoal como organizacional. No interior da empresa, procura- se fazer com que seus membros sintam-se parte integrante da organização, ajudando na construção de um projeto da empresa aderindo à cultura que lhes é proposta (ENRIQUEZ, 1997). Quer aprender mais sobre ética? Assista o vídeo “Ética é questão de opinião?”, com o professor e filósofo Mario Sérgio Cortella, clicando no link a seguir: https://youtu.be/ IDJ2mwSZPNs DICAS 100 UNIDADE 2 — NEGOCIAÇÃO E CONFLITO 4 ÉTICA NAS ORGANIZAÇÕES Há uma forte pressão para que temas como responsabilidade social, ética e sustentabilidade façam parte das práticas empresariais, e isso se deve a diversos fatores: o primeiro deles diz respeito à reputação corporativa, por isso, o forte apelo à ética nos negócios; o segundo é a globalização, o terceiro fator diz respeito às iniciativas internacionais que promovem a Responsabilidade Social das Corporações (RSC), apoiadas por órgãos internacionais como as Nações Unidas (Pacto Global) e também o reconhecimento global por índices e padrões que medem RSC, como o índice Dow Jones de Sustentabilidade (MELÉ, 2009). A Responsabilidade Social das Corporações (RSC) se atenta plenamente a toda gama de obrigações imputadas ao negócio pela sociedade, que podem ser divididas em quatro categorias: econômica. legal. ética e social (CARROLL, 1979). DICAS FIGURA 9 – RSC FONTE: . Acesso em: 9 jun. 2021. Segundo Morin (2005), a ética manifesta-se como uma exigência moral e provém de fontes externas, tais como cultura, crenças e normas de uma comunidade. No contexto das organizações, a inserção do tema se deve ao ambiente cada vez mais globalizado, o que faz com que as corporações não vivam isoladas dos problemas que as cercam, de maneira que é impossível ignorar uma sociedade que aprecia valores, e que, por conseguinte, exige uma atuação com TÓPICO 3 — NEGOCIAÇÃO BASEADA EM PRINCÍPIOS: ÉTICA NAS NEGOCIAÇÕES 101 responsabilidade ética por parte das organizações. Neste aspecto, Cruz (2009) salienta que o Comportamento Ético Empresarial, baseado na interpretação epistemológica da ética, relaciona-se a uma postura adotada por uma organização em que se considera um conjunto de aspectos legais internos ou externos (vigentes ou não em uma legislação), que podem contribuir para o bem-estar da sociedade, do meio ambiente e de mais stakeholders. Stakeholder é um termo em inglês amplamente utilizado para designar cada parte interessada, ou seja, qualquer grupo ou indivíduo que possa afetar ou ser afetado pelos objetivos da organização, incluindo tanto aqueles que investem financeiramente na organização como aqueles que influenciam, de outras formas, ou sofrem as consequências das ações da organização (GONZÁLEZ, 2012). NOTA Geralmente, as corporações manifestam seus padrões éticos no perfil institucional (Missão, Visão e Valores), e disseminam esses padrões por meio de formações, cursos, reuniões, palestras, manuais/códigos de condutas, compartilhados com os colaboradores e também com terceiros, a exemplo de fornecedores. Nesses documentos, são delineadas as atitudes que mais se aproximam ou se afastam de um comportamento tido como ideal. Essa é uma forma de padronizar ações diante de situações como recebimento de brindes de fornecedores, denuncias, subornos, fraudes, conflitos de interesses, lavagem de dinheiro etc. Vale ressaltar que no Brasil existe a constituição de Códigos de Ética empresariais para determinadas profissões. Esses códigos contêm os padrões morais que os profissionais devem aceitar e observar. Ademais, têm como objetivo regular as relações entre os membros dessa categoria, bem como entre ela e a sociedade, de maneira impositiva. Assim, a ética profissional passa a ser, desde sua regulamentação, um conjunto de prescrições de conduta. Deixam, portanto, de ser normas puramente éticas, para serem normas jurídicas de direito administrativo, das quais, o descumprimento de seus mandamentos, decorrem sanções administrativas (advertência; suspensão; dentre outras punições) (ALVES et al., 2007). Dentro e fora da empresa, a postura do colaborador tem sido observada. Você deve lembrar do caso dos brasileiros que durante copa do mundo na Rússia foram flagrados pedindo que estrangeiras repetissem frases de cunho sexual em português. Após a repercussão dos vídeos eles foram demitidos das empresas onde trabalhavam. 102 UNIDADE 2 — NEGOCIAÇÃO E CONFLITO Mesmo nas redes sociais, as empresas estão de olho no comportamento de seus funcionários. Em 2018, uma jovem que havia passado num processo seletivo para estagiar na NASA usou o Twitter para comemorar o novo emprego. A jovem foi repreendida pelo linguajar utilizado no post por um ex-engenheiro e consultor da agência, Homer Hickam. Sem saber quem ele era, a estagiária da NASA respondeu o conselheiro com ofensas e logo depois foi demitida. De acordo com Argandoña (1999), o estudo da ética nas organizações é crescente devido a uma série de fatores, a saber: • A crescente aceitação de premissas liberais que enfatizam a desregulamentação e o livre mercado demandam, em contrapartida, um enquadramento legal, institucional e ético, mas claramente definido. • O aparecimento de novos problemas econômicos de grande relevância moral; o meio ambiente, o desemprego prolongado, o protecionismo, novas formas de competição, a crise do Estado de Bem-estar, uma maior conscientização das externalidades, tudo isso num ambiente onde a intervenção governamental deixou de ser a solução ideal. • Uma série de eventos que levaram a reconsiderar a dimensão ética nos negócios; Exxon Valdez, Chernobyl, Bhopal etc. • No campo da administração, novas teorias mais humanísticas dão maior significado a dimensão ética (“Small is a beautiful”, “busca de excelência”, “modelo japonês e virtudes”). A observância da ética no contexto empresarial está diretamente ligada aos aspectos processuais e de tomada de decisão. Os autores Andrade, Alyrio e Macedo (2007, p. 18) relacionam quatro tipos de comportamentos éticos e legais existentes nas empresas: • “Há comportamentos que não sejam nem éticos e nem legais. • Há comportamentos que são éticos, mas não legais. • Há comportamentos considerados legais, mas não éticos. • Há comportamentos legais e éticos, segundo padrões estabelecidos”. Você aprendeu que a forma pela qual a empresa determina sua função, sua missão, sua organização interna, enfim, os valores pelas quais se fundamenta, refletem na forma de trabalho, e claro, nas negociações. No entanto, será que apenas o ambiente irá determinar se uma pessoa agirá de forma ética ou não? É notório que a cultura que envolve a empresa influencia no comportamento e na tomada de decisões. Esses códigos de valores têm por base um corpo tendencialmente consensual de condutas e princípios moralmente aceitos, que determinam o que deve ou não deve ser feito em função do que é considerado certo ou errado. TÓPICO 3 — NEGOCIAÇÃO BASEADA EM PRINCÍPIOS: ÉTICA NAS NEGOCIAÇÕES 103 Nas negociações e tomadas de decisão, o limite entre o que é ou não ético fundamenta-se não apenas no ambiente no qual a pessoa está inserida, mas também nos valores que ela carrega. A questão fundamental aos negociadores é saber quais os comportamentos são considerados como éticos. Será que em uma negociação deve-se dizer a verdade sempre, ou há momentos em que não dizer a verdade é uma conduta aceitável (ou mesmonecessária)? A maioria das questões éticas está relacionada com o grau de honestidade, de abertura e de sinceridade que o negociador deve ter na sua relação com o seu oponente. Mello (2005) identifica três tipos de postura básica em negociações: a) A postura do jogador – negociadores que adotam essa postura consideram que a negociação, principalmente quando envolve aspectos comerciais e financeiros, é um jogo com suas regras próprias sem nenhuma relação com as regras sociais. No entanto, tudo tem um limite: como num jogo de cartas, é permitido blefar e enganar, mas não é permitido quebrar as regras do jogo. Isso significa dizer que todos devem conhecer as regras do jogo – o que nem sempre é verdadeiro; é difícil determinar onde termina o blefe e começa a fraude; quase nunca leva a resultados satisfatórios para as partes envolvidas e os negociadores podem sair com as reputações prejudicadas. b) Postura idealista – considera que a negociação é um aspecto da vida social. Logo, se socialmente é errado blefar e enganar, igualmente é incorreta a utilização desses artifícios na negociação. Contudo, esse tipo de postura pode levar a problemas se o outro negociador tiver o comportamento de jogador. Da mesma forma, seus padrões éticos elevados podem impedir que se chegue a um acordo, ainda mais se o negociador estiver defendendo a posição de uma parte com comportamento não ético. c) Postura pragmatista – é uma postura intermediária entre as duas anteriores. Considera que às vezes é importante o blefe e a dissimulação, mas também preza o comportamento ético nas negociações. Negociadores com essa postura são tidos como mais prudentes e os estudiosos consideram que essa postura reúne as vantagens das outras duas posturas anteriores. Vimos na primeira unidade que a negociação é uma atividade dependente da informação. Neste aspecto, uma ambivalência pode ocorrer, pois as partes podem sentir-se tentadas a maximizar os seus interesses individuais em detrimento dos interesses contrários, e assim ocultar o máximo de informação possível. Segundo Kelley (1966), isso resulta em dois dilemas negociais: (1) o dilema da confiança e (2) o dilema da honestidade. • O dilema da confiança refere-se ao quanto se deve acreditar no que a outra parte transmite. Se acredita em tudo, então a outra parte pode aproveitar-se da situação. Se não se acredita em nada, dificilmente se poderá chegar a um acordo. 104 UNIDADE 2 — NEGOCIAÇÃO E CONFLITO • O dilema da honestidade refere-se à autenticidade da informação transmitida durante o processo negocial. Por um lado, se dissermos toda a verdade sobre as nossas prioridades, interesses e o mínimo que estamos dispostos a aceitar, dificilmente poderemos fazer melhor que esse mínimo. Por outro lado, se ocultarmos e mentirmos sobre as nossas reais motivações poderemos chegar a um impasse. FONTE: Adaptado de . Acesso em: 25 mar. 2021. Sobral (2009), em seu estudo intitulado “O julgamento moral de dilemas éticos em negociação”, afirma que a negociação é uma das práticas empresariais mais interessantes para estudar a honestidade e a ética. De acordo com o autor, em negociações, as pessoas procuram conciliar interesses concorrentes sem que para isso tenham que sacrificar seus interesses individuais, e que por isso, podem sentir-se tentadas a adotar um comportamento defensivo, furtivo e, em alguns casos, manipulador e desonesto. Observe no quadro a seguir. QUADRO 7 – ÉTICAS NAS NEGOCIAÇÕES AUTOR JUSTIFICATIVA BARRY; ROBINSON, 2002 Porque é uma área rica em dilemas éticos. BELLENGER, 1998 Porque é uma prática central ao funcionamento de todas as interações humanas. CARSON, 1993; DEES; CRAMTON, 1991; LEWICKI; ROBINSON, 1998 Porque algumas formas de desonestidade podem ser apropriadas e mesmo necessárias para se ser um negociador eficaz FONTE: Adaptado de Sobral (2009, p. 6.) No quadro exposto você pôde perceber que há autores que consideram que alguns comportamentos desonestos são apropriados ou mesmo necessários para uma negociação efetiva. Observamos que há muita discussão sobre até que ponto um comportamento pode ser ético ou não em uma negociação. Considera-se que a comunicação é desonesta quando uma das partes mente ou omite informações. TÓPICO 3 — NEGOCIAÇÃO BASEADA EM PRINCÍPIOS: ÉTICA NAS NEGOCIAÇÕES 105 LEITURA COMPLEMENTAR TÉCNICAS DE MEDIAÇÃO DE CONFLITOS E TÉCNICA DA REFORMULAÇÃO – NOVO PARADIGMA E NOVA FORMAÇÃO PARA OS PROFISSIONAIS DO DIREITO Lilia Maia de Morais Sales A doutora Lilia Maia de Morais Sales realizou um levantamento bibliográfico, tendo como base também sua experiência na área e apontou em seu estudo “Técnicas de Mediação de Conflitos e Técnica da Reformulação – Novo Paradigma e nova formação para os profissionais do Direito” 13 técnicas ou habilidades a serem desenvolvidas para mediar ou negociar questões. Vejamos quais são elas: 1) Escuta ativa. 2) Perguntas abertas. 3) Estimular a empatia. 4) Anotações. 5) Resumo. 6) Paráfrase – melhor compreensão. 7) Reformulação – aspecto positivo. 8) Separar Pessoas dos Problemas. 9) Concentrar nos interesses e nos valores e não nas posições. 10) Estimule identificação de ganhos múltiplos. 11) Insista em usar critérios objetivos quando necessário – objetivar o subjetivo. 12) Teste de realidade. 13) Gerenciamento positivo das emoções (apreciação, afiliação, autonomia, status, papel). A Escuta Ativa significa a vontade e a capacidade de escutar e compreender a mensagem inteira (verbal, simbólica e não verbal). Conduzir o diálogo com serenidade, possibilitando que as partes conversem e expressem todas as suas intenções. A escuta ativa relaciona-se mais com a compreensão do que com a audição que observa. As perguntas abertas são perguntas que estimulam a fala do maior número de informações e qualidade dessas informações. Facilitam a apresentação de várias situações e sentimentos, o que favorece maior observação e compreensão do problema. Perguntas como: fale-me sobre essa situação; conte-me sobre como foi sua experiência com; explique um pouco mais sobre, fale sobre sua impressão referente a esse fato, sobre essa situação; trazem para o contexto dos conflitos uma riqueza de detalhes e temas que são importantes para as partes e são uma matéria-prima rica para o mediador. 106 UNIDADE 2 — NEGOCIAÇÃO E CONFLITO O estímulo à empatia significa a técnica por meio da qual o mediador estimula as pessoas colocarem-se no lugar do outro. Com um maior número de informações que são apresentadas durante o diálogo (com a identificação de pontos importantes para as partes), o mediador busca facilitar a prática de se olhar o mundo/conflito/momento pelos olhos da outra pessoa, buscando a compreensão do fato sob outra perspectiva, estabelecendo uma comunicação antes inexistente ou muito frágil, estimulando uma comunicação efetiva, abrindo mais espaço para a compreensão do problema. Por exemplo, o que para um pode ser respeito, para outro pode representar humilhação; para o que para um representa muito, para outro representa pouco. Quando a pessoa percebe a situação ‘pelo olhar do outro’, passa a entender atitudes e reações que antes não compreendia e uma comunicação diferente da anterior começa a ser estabelecida. A técnica da anotação é importante para que o mediador registre e lembre o que foi dito, destaque os assuntos que merecem aprofundamento, facilite o resumo posterior de cada informação recebida. Essa técnica estimula os assuntos importante, sejam percebidos e efetivamente refletidos, discutidos, possibilitando uma comunicação efetiva e de sucesso. As partes devem ser avisadas que anotações serão feitas para facilitar a compreensão da situação. O mediador deve mantercontato visual, demonstrando respeito e atenção e deve anotar o mínimo possível para evitar ficar de cabeça baixa e tornar a técnica um obstáculo à comunicação. As anotações devem ser referentes aos fatos, aos momentos de emoção e aos momentos de emoção vivenciados. A atenção deve ser voltada para as partes e não para as anotações. As anotações ajudarão a técnica do resumo. A partir dos relatos dos fatos, argumentos, sentimentos apresentados pelas pessoas, o mediador deve resumir pontos importantes. O resumo facilita o processo adequado de construção de consenso por quatro motivos principais: 1) a certeza para o mediador de que está compreendendo a situação; 2) oferece segurança às pessoas de que estão sendo ouvidas; 3) as partes sentem-se valorizadas; 4) permite que o mediador tenha a certeza de que as pessoas entendem o que estão afirmando. A paráfrase é uma técnica que significa repetir o que foi dito com palavras que facilitam a sistematização do que foi relatado, assunto por assunto, muitas vezes conseguido retirar da fala frases e palavras ditas de desafeto ou rancor que dificultam o diálogo. A paráfrase ajuda as partes a compreenderem melhor os assuntos relatados, reorganizando as ideias e criando uma ponte para possíveis soluções. As quatro próximas técnicas são conhecidas como a metodologia criada por Roger Fisher, William Ury e Bruce Patton para a negociação, apresentadas no quadro a seguir: TÓPICO 3 — NEGOCIAÇÃO BASEADA EM PRINCÍPIOS: ÉTICA NAS NEGOCIAÇÕES 107 PESSOAS Separe as pessoas do problema. INTERESSES Concentre-se nos interesses não nas posições. OPÇÕES Crie uma variedade de possibilidades antes de decidir o que fazer. CRITÉRIOS Insista em que o resultado tenha por base algum padrão. FONTE: Adaptado Ury (2005, p. 28) As pessoas possuem sentimentos, valores, crenças, preconcepções que influenciam no momento da mediação, especialmente no que toca ao relacionamento com a outra parte. Nos conflitos que envolvem relacionamentos de qualquer ordem (familiar, empresarial), há interesses tanto no objeto da discussão como no relacionamento. Muitas vezes esse objeto/interesse da discussão confunde-se com a relação, o que é comum, dado os sentimentos envolvidos. Quando há essa confusão, o mediador deve estar apto, primeiro, para perceber essa confusão e, segundo, para separar a relação das pessoas, do problema (interesse de substância ou objeto da discussão) para ir identificando quais os pontos mais importantes em questão. O mediador deve discutir o presente com vistas para o futuro. Como as discussões no presente podem permitir um momento de maior tranquilidade no futuro? Concentrar-se nos interesses e não nas posições significa que o mediador deve procurar, o que é realmente o cerne do problema. Qual o propósito de cada um. Posição é o que se diz que se quer; interesse é o que realmente se quer. Posições opostas não significam interesses contrários. As perguntas adequadas auxiliam o encontro dos reais interesses: fale-me sobre sua necessidade? O que te motiva? O que é importante para você? Enfim, deve o mediador questionar, possibilitando a autorreflexão e novas respostas. A elaboração de ganhos mútuos é uma técnica que estimula o sentimento de cooperação. Quando as pessoas enfrentam uma situação de conflito, elas vivenciam alguns sentimentos: a) entendem que sua opinião é a correta e deve prevalecer, sendo a única possibilidade de solução; b) sentem-se ameaçadas pelo outro, dificultando a escuta e a comunicação efetiva; c) acreditam que os interesses são opostos, estimulando a competitividade; d) acreditam que os interesses do outro são contrários aos seus e que, consequentemente, irão lhe prejudicar. A partir do diálogo, uma vez identificados os interesses, estimula-se o encontro de várias soluções, muitas vezes diferentes das soluções inicialmente propostas. Quando as pessoas iniciam uma discussão, elas estão vivenciando um momento adverso que as fazem apresentar determinadas soluções. Depois de estabelecida uma nova forma se comunicação, na qual passam a ser percebidos os reais interesses, as pessoas identificam pontos de convergência que permitem a 108 UNIDADE 2 — NEGOCIAÇÃO E CONFLITO cooperação. Há interesse comum no bem-estar do filho? Há interesse em comum no bom desempenho da empresa? Há interesse em comum que determinado projeto iniciado chegue a sua conclusão de forma satisfatória? Há interesse de se manter o aluguel de uma casa? São várias as situações de conflito que, uma vez detectados os interesses em comum, devem ser estabelecidos como metas. Daí, deve ser questionado como oferecer propostas de ganhos mútuos – ganha-ganha –, já que existem interesses em comum. Estabelecer critérios objetivos representa uma técnica que auxilia clarificar os reais interesses e buscar situações concretas, dados concretos que ajudem na solução. Teste de realidade é a técnica utilizada para avaliar se o consenso encontrado será efetivamente cumprido. São perguntas para saber sobre a operacionalização da decisão. Esse questionamento permite a pessoa colocar a decisão tomada no contexto da realidade de sua vida. A partir do momento que sair da reunião de mediação e precisar cumprir o que foi acordado, será possível? Por fim, o gerenciamento das emoções aqui apresentado como técnica para a mediação representa a teoria formulada por Daniel Shapiro e Roger Fisher como ferramentas para negociadores encontrarem consenso em suas negociações, reconhecendo e valorizando as emoções. Ele orienta que em qualquer negociação as emoções estarão presentes e que é possível gerenciá-las, valorizando-as, para facilitar o consenso entre as partes. São elas: a) estimular apreciação – todos gostamos de ser ouvidos, valorizados, compreendidos. É o reconhecimento e a valorização das partes – escutar e se interessar pelo o que está sendo dito. As pessoas normalmente colocam suas situações como mais importantes do que as dos que estão ouvindo; b) promover a afiliação – tornar o adversário em parceiro – estímulo a pontos convergentes; c) respeito à autonomia – estimule o poder de decisão das pessoas; d) estimule o reconhecimento do status – mostre que as pessoas são importantes e possuem forte impacto naquela decisão; e) estimule que as ambas partes tenham um papel importante e fundamental na discussão. Reformular situações de forma crítica (pensamento crítico) e encontrar soluções por meio de uma perspectiva positiva (Reframing) representam uma das técnicas mais importantes na gestão de conflitos. Significa estimular as pessoas a conseguirem perceber na situação vivenciada de forma crítica, um enfoque positivo na crise uma oportunidade. FONTE: Adaptado de SALES, L. M. de M. Técnicas de Mediação de Conflitos e Técnica da Refor- mulação – Novo Paradigma e nova formação para os profissionais do Direito. Novos Estudos Jurídicos, v. 21, n. 3, p. 940-958, 2016. 109 RESUMO DO TÓPICO 3 Neste tópico, você aprendeu que: • Existem vários Métodos Adequados para Solução de Conflitos (MASCs). Dentre eles, destacam-se a negociação, conciliação e mediação. • O processo de negociação mútua é composto por quatro etapas: preparação, criação de valor, distribuição de valor e acompanhamento. • A conciliação é geralmente utilizada na resolução de disputas em que há a figura de um terceiro, “o conciliador”, responsável por escutar as partes a fim de estimulá-los a chegarem num acordo. O conciliador sugere e propõe soluções para o conflito, cabendo às partes aceitarem ou não essa proposta. • A mediação ocorre em casos específicos, em que as partes já não conseguem resolver a situação. Então, é necessária a figura de uma terceira pessoa, imparcial, que irá facilitar o diálogo e mediar a situação. • A ética pode ser definidacomo ciência dos costumes transmitidos na sociedade, dos estilos permanentes do agir dos indivíduos (hábitos), bem como da comprovação crítica dos novos valores que a evolução da sociedade faz surgir. • A negociação é uma variável indicadora do clima ético de uma empresa, posto que a forma pela qual a empresa determina sua função, sua missão, sua organização interna e os valores pelas quais se norteia refletem na tomada de decisão e na forma de negociar. Ficou alguma dúvida? Construímos uma trilha de aprendizagem pensando em facilitar sua compreensão. Acesse o QR Code, que levará ao AVA, e veja as novidades que preparamos para seu estudo. CHAMADA 110 1 Existem muitos métodos adequados para Solução de Conflitos (MASCs). A escolha sobre qual método adotar deve considerar uma série de fatores, como tipo de disputa, o vínculo entre as partes, nível de conflito etc. Disserte sobre a diferença entre os métodos mediação e conciliação. 2 A Accenture Multinacional, especializada em consultoria de gestão e tecnologia da informação, realizou uma pesquisa por meio de entrevistas com quatrocentos executivos, sobre quais as tendências mundiais no tocante às habilidades necessárias para o mercado de trabalho. Como resultado, apontou que a capacidade de resolver conflitos aparece como a mais importante habilidade apresentada pelas empresas, seguida por liderança, comunicação, tecnologia, trabalho em equipe, conhecimento técnico, pensamento criativo, analítico, gerenciamento de projetos e outros. Tendo em vista os resultados da pesquisa, classifique V para as sentenças verdadeiras e F para as falsas. FONTE: SALES, Lilia Maia de Morais. Técnicas de Mediação de Conflitos e Técnica da Reformulação–Novo Paradigma e nova formação para os profissionais do Direito. Novos Estudos Jurídicos, v. 21, n. 3, p. 940-958, 2016. ( ) Saber negociar tornou-se um imperativo do presente século dado a quantidade de relações que se estabelecem por diversos canais de comunicação. ( ) A busca por profissionais com habilidades em negociação e gestão de conflitos é crescente, posto que, o sucesso ou insucesso em negociações surte efeito no desempenho competitivo da empresa. ( ) No mercado há uma carência de profissionais com perfil de negociação, não obstante, são raras as organizações que desenvolvem programas e treinamentos internos que fomentem essas características em seus colaboradores. ( ) Devido à globalização as relações entre pessoas, entre empresas, entre países, entre grupos econômicos ampliaram-se, neste contexto, saber negociar e administrar conflitos, tornou-se competência essencial para líderes e gestores. Assinale a alternativa que apresenta a sequência CORRETA: a) ( ) V – F – V – V. b) ( ) V – V – F – F. c) ( ) F – F – V – V. d) ( ) V – V – V – V. AUTOATIVIDADE 111 3 A gestão de conflitos consiste na escolha da melhor estratégia para solução de conflito, considerando a melhor ferramenta a ser utilizada de acordo com cada caso. Dado este contexto, assinale a alternativa CORRETA correspondente à existência de uma terceira pessoa alheia ao conflito, que atua como uma espécie de “facilitador”, sem interferir na decisão final das partes. a) ( ) Mediador. b) ( ) Arbitro. c) ( ) Consultor. d) ( ) Conciliador. 4 A ética deve ser a base de toda a atividade, seja ela econômica, política ou social. Por diversos motivos, a preocupação com tema vem crescendo em todas as esferas da sociedade. Sobre a ética, analise as sentenças a seguir: I- Empresas que tem seu nome envolvido em escândalos veem suas ações na bolsa de valores despencarem o que pode levar ao seu fechamento. II- A crescente aceitação de ideias liberais enfatiza a desregulamentação e o livre mercado o que reque um enquadramento legal, institucional e ético claramente definidos. III- A ética está sendo muito discutida justamente pela falta de ética, amplamente divulgada pela mídia nacional e internacional, esquema de corrupção, imoralidade, vícios, cartel. IV- O comportamento e as ações da vida pessoal de um funcionário não possuem relação com a empresa, por isso não impactam a imagem da organização. Assinale a alternativa CORRETA: a) ( ) As sentenças I, II e IV estão corretas. b) ( ) Somente a sentença III está correta. c) ( ) As sentenças II e IV estão corretas. d) ( ) As sentenças I, II e III estão corretas. 5 (INEP, 2012 ENADE – Tecnologia em Gestão de Recursos Humanos) As negociações são uma parte crítica da dinâmica do varejo – fazemos um número cada vez maior delas todos os dias, numa velocidade crescente. Cada negociação mexe com os estoques, com a logística e com as margens. Nós nos relacionamos com cerca de 5000 fornecedores. Por essas razões, nossas negociações precisam ser padronizadas tanto quanto possível. Não podemos deixar que cada comprador tenha uma abordagem ou um objetivo diferente, ou que meu estilo pessoal dite o do grupo. Também não podemos abrir mão da ética e da transparência – todas as condições envolvidas precisam ser absolutamente claras. Surgiu daí a decisão de criar um estilo corporativo de negociação, com base no qual estamos treinando nossos profissionais. No treinamento, mostramos que eles devem orientar-se não pelo emocional ou pela força, mas pelo planejamento. Sem planejamento, você não tem tempo para conhecer melhor quem está do outro lado e 112 não consegue partir para a negociação munido de todas as informações necessárias. Mas treinar não significa criar comportamentos mecânicos. Os contextos mudam, e o negociador precisa saber escolher as ferramentas adequadas a cada caso, como se fosse um jogador de golfe selecionando o taco certo para aquela jogada. FONTE: BETHLEM, H. A arte do aperto de mãos. Revista Exa me. 22 abr. 2003. Disponível em: http://exame.abril.com.br/revista- exame/edicoes/0790/noticias. Acesso em: 12 jul. 2012. Considerando as orientações descritas no texto, analise as sentenças a seguir: I- A criação de um estilo corporativo de negociação, na empresa descrita, pauta-se em estabelecer convicções éticas e promover treinamentos com o objetivo de fazer com que os negociadores optem por decisões racionais baseadas na identificação das questões em pauta na negociação e da priorização delas, na construção de um leque de acordos alternativos e no desenvolvimento de estratégias e táticas. II- A analogia entre o jogador de golfe e o negociador aponta para a ideia de que não existe um padrão ideal para se aplicar ao comportamento do negociador. No entanto, é possível estabelecer estilos que, de certo modo, resultam em encaminhamento da negociação em consonância com os valores e objetivos organizacionais. III- De acordo com o texto, a questão ética, priorizada pela organização descrita, foi um motivo importante para a implementação do treinamento em negociações na referida empresa. No entanto, sabe-se que é impossível promover um treinamento em ética, pois a ética de um negociador corresponde a sua ética pessoal. Assinale a alternativa CORRETA: a) ( ) Somente a sentença I está correta. b) ( ) As sentenças I e II estão corretas. c) ( ) Somente a sentença III está correta. d) ( ) As sentenças II e III estão corretas. 113 REFERÊNCIAS ALVES, F. J. D. S. et al. Um estudo empírico sobre a importância do código de ética profissional para o contabilista. Revista Contabilidade & Finanças, v. 18, n. SPE, p. 58-68, 2007. ANDRADE, R. O. B.; ALYRIO, R. D.; MACEDO, M. A. da S. Princípios de negociação: ferramentas e gestão. 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Florianópolis: Instituto de Mediação e Arbitragem do Brasil, 2001. 117 UNIDADE 3 — NEGOCIAÇÕES EM CONTEXTOS MULTICULTURAIS OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM PLANO DE ESTUDOS A partir do estudo desta unidade, você deverá ser capaz de: • conhecer o conceito de negociação internacional; • identificar os fatores que promoveram as negociações no âmbito internacional; • examinar os fatores culturais que impactam as negociações internacionais; • realizar negociações estratégicas; • criar o BATNA e a ZOPA; • reconhecer a importância da comunicação; • realizar negociações integrativas e distributivas; Esta unidade está dividida em três tópicos. No decorrer da unidade, você encontrará autoatividades com o objetivo de reforçar o conteúdo apresentado. TÓPICO 1 – NEGOCIAÇÃO: DESAFIOS E OPORTUNIDADES TÓPICO 2 – NEGOCIAÇÃO MULTICULTURAL TÓPICO 3 – DESAFIOS DA NEGOCIAÇÃO 118 Preparado para ampliar seus conhecimentos? Respire e vamos em frente! Procure um ambiente que facilite a concentração, assim absorverá melhor as informações. CHAMADA 119 UNIDADE 3 1 INTRODUÇÃO Acadêmico, você chegou à última etapa deste livro. Vimos, no decorrer da leitura das Unidades 1 e 2, os conceitos fundamentais sobre conflito e negociação e a importância desses temas no atual cenário. Vimos que a negociação pode ocorrer nas áreas de interesse público ou privado no âmbito doméstico. A partir de agora, veremos como as negociações ocorrem no âmbito internacional. Nesta unidade, ampliaremos o nosso campo de visão e aprenderemos a negociação em ambientes multiculturais. Examinaremos os aspectos que influenciam e promovem as negociações internacionais, identificando as variáveis envolvidas neste processo. Então, vamos lá! TÓPICO 1 — NEGOCIAÇÃO: DESAFIOS E OPORTUNIDADES 2 NEGOCIAÇÃO INTERNACIONAL Ao abordar o tema negociação internacional, inúmeras questões podem ser levantadas, tais como: quais são as diferenças da negociação doméstica para a negociação internacional? Será que a cultura impacta no comportamento do negociador? Outro importante questionamento é: será que as mesmas estratégias adotas em negociações domésticas podem ser aplicadas em negociações internacionais? Esses e outros apontamentos serão discutidos nesta unidade, porém, essa discussão não se limita ao conteúdo presente neste livro, dado a complexidade do temapodem não somente esclarecer possíveis dúvidas, mas também nos fazer refletir a importância da negociação. FIGURA 1 – NEGOCIAÇÃO FONTE: . Acesso em: 8 jun. 2021. UNIDADE 1 — PRINCÍPIOS DE NEGOCIAÇÃO 4 A partir de 1901, a paz foi instaurada como uma das cinco categorias do prêmio Nobel. Tal fato representa o reconhecimento do bem causado pelas ações de indivíduos ou organizações que, conforme o testamento de Alfred Nobel (1895), fazem "o maior ou melhor trabalho pela fraternidade entre as nações, pela abolição ou redução de exércitos permanentes e pela realização e promoção de congressos de paz". Os ganhadores do prêmio foram responsáveis por estabelecer acordos de paz entre países, eliminação de armas químicas, resolução de conflitos, luta pela democracia e direitos humanos. O principal instrumento para o alcance desses feitos foi justamente a negociação. O trabalho de negociação pode solucionar diversos conflitos, como: • Acordos de paz entre nações. • Resoluções em casos de sequestros. • Acordos sindicais. • O fim de greves em órgãos públicos. • Aquisição ou fusões de empresas. Você deve se lembrar da greve dos caminhoneiros, em 2018, também chamada de Crise do Diesel. Como mais de 60% dos itens no país são transportados por meio do modal rodoviário, a paralisação da categoria causou um grande caos, causando diversos problemas, como: • Falta de combustíveis nos postos. • Aeroportos operando em estado crítico; vários voos cancelados. • Falta de abastecimento de alimentos em várias regiões e consequente aumento nos preços dos produtos alimentícios remanescentes. • Impacto nas exportações. • Suspensão de aulas em escolas e universidades. • Segunda fase da prova da OAB suspensa. • Relatos de falta de produtos em supermercados, principalmente hortifrutigranjeiros. • Suspensão de procedimentos em hospitais por conta de falta de medicamentos. • Paralisação de produções em fábrica. • Descarte de leite por parte de produtores por ser um alimento perecível. • Risco de desabastecimento de água potável no Distrito Federal por falta de insumos para o tratamento. A greve que culminou em uma das maiores crises de abastecimento já vista no país só chegou ao fim depois de muita negociação. Um outro evento, que ocorreu em 1981, nos Estados Unidos, também foi a greve dos controladores de voo. Logo no início do primeiro mandato do presidente norte-americano Ronald Reagan, a greve convocada pelo sindicato da categoria teve a adesão de cerca de 13 mil empregados, mas foi rapidamente controlada. TÓPICO 1 — INTRODUÇÃO: NEGOCIAR É PRECISO 5 Com um plano B estabelecido, Reagan deu um ultimato de 48 horas para a categoria voltar à ativa, enquanto o secretário de Transportes, Drew Lewis convocava operadores aposentados, militares da Força Aérea, para assumir o trabalho dos grevistas que foram substituídos. Observa-se que a negociação está para além das transações comerciais, sendo utilizada para manter a ordem, a segurança, a fluidez da economia, a paz e, por que não dizer, a vida. Como exemplo, observe o texto a seguir: Um homem foi injustamente acusado de ter assassinado uma mulher. O verdadeiro autor do crime era uma pessoa influente no reino, e por isso desde o primeiro momento se procurou um “bode expiatório” para acobertar o assassino. O homem acusado foi levado à julgamento. O resultado já era sabido por todos: a forca. Ele sabia que tudo iria ser feito para condená-lo e que teria poucas chances de sair vivo dessa história. O juiz, que também estava combinado para levar o pobre homem à morte, simulou um julgamento justo, fazendo uma proposta ao acusado. Disse o juiz: Sou de uma profunda religiosidade e por isso vou deixar sua sorte nas mãos do Senhor, vou escrever num pedaço de papel a palavra INOCENTE e no outro pedaço a palavra CULPADO. Você irá sortear um dos papéis e aquele que sair, será o veredicto. O Senhor decidirá seu destino! – determinou o juiz. Sem que o acusado percebesse, o juiz preparou os dois papéis, mas em ambos escreveu CULPADO, de maneira que naquele instante não existia nenhuma chance do acusado se livrar da forca. Não havia alternativas para o homem. O juiz colocou os dois papéis em uma mesa e mandou o acusado escolher um. O homem parou por alguns instantes, pensou e aproximou-se da mesa desconfiado. Pegou um dos papéis e rapidamente colocou-o na boca e engoliu. Os presentes no julgamento reagiram surpresos e indignados com a atitude do homem. Mas o que você fez? E agora? Como vamos saber qual será seu veredicto? Não será difícil! – respondeu o homem. Basta olhar o outro pedaço de papel que sobrou e saberemos que acabei engolindo o contrário. FONTE: . Acesso em: 8 jun. 2021. UNIDADE 1 — PRINCÍPIOS DE NEGOCIAÇÃO 6 AUTOATIVIDADE O texto que você acabou de ler demonstra o quanto a negociação é necessária, pois em muitos casos é impossível não negociar. Comente sobre qual foi a estratégia mais inusitada que você já teve que usar para alcançar êxito em uma negociação. 3 BASES CONCEITUAIS DA NEGOCIAÇÃO Antes de discutir as bases conceituais da negociação, é importante salientar o que não é negociação. Negociar não é impor nem desprezar, não é seduzir muito menos ludibriar. Segundo Hirata (2007), só existe negociação efetivamente quando a relação entre as pessoas envolvidas é de interdependência, caso contrário, a relação que se estabelece é de barganha. Barganha ou berganha, que tem origem na palavra inglesa bargain, é um processo no qual são feitos acordos por meio da troca. A palavra possui um sentido pe- jorativo. Poder de barganha se refere à negociação de influência ou vantagens que ocorre comumente de forma moralmente condenável. NOTA Acuff (2004, p. 28) enfatiza que a “negociação é um processo de comunicação de mão dupla cujo objetivo é chegar a um acordo mútuo sobre necessidades e opiniões divergentes. Negociar significa persuadir, ao invés de usar força bruta. Ademais, negociar quer dizer que o outro lado sentir-se-á satisfeito com o resultado da negociação”. Persuadir significa conduzir alguém a crer ou aceitar uma ideia ou pro- posta, significa convencer. O poder de persuasão é, sem dúvidas, uma habilidade fundamental a todo negociador. Um advogado, por exemplo, com tal habilidade consegue solucionar conflitos por meios consensuais, poupando tempo, além de representar melhor os interesses das partes. Ainda, pode-se afirmar que de todos os modos de gestão de conflitos, os que fazem uso das técnicas de negociação são mais flexíveis, eficientes e econômicos (BENJAMIN, 2012). TÓPICO 1 — INTRODUÇÃO: NEGOCIAR É PRECISO 7 A negociação, é, portanto, um processo social presente no cotidiano de todo indivíduo. São filhos que negociam com os pais, diplomatas que negociam acordos com outras nações, empresas que negociam com outras empresas, compradores que negociam com vendedores, patrões e funcionários que negociam acordos coletivos. As pessoas negociam até mesmo quando não o pensam estar fazendo. No âmbito organizacional, a negociação é parte fundamental das atividades do dia a dia dos executivos, diretores, líderes e gestores. Thompson (2005) elenca cinco razões-chave para que a negociação assuma uma importância crescente no mundo empresarial. Veja a seguir: • A Natureza Dinâmica do Negócio: a mobilidade e a flexibilidade são hoje fatores imperativos no contexto atual do mercado de trabalho. Este dinamismo faz com que as pessoas tenham que negociar e renegociar durante a sua vida e ao longo de toda a sua carreira profissional. As pessoas têm que continuamente criar possibilidades, integrar os seus interesses com os dos outros e reconhecer a permanente concorrência dentro e entre as empresas. • A interdependência: a crescente interdependência dase as constantes transformações do mundo. Caro acadêmico, reúna-se com seus colegas e liste possíveis respostas para os questionamentos supracitados. Esta tarefa visa identificar o grau de conhecimento que vocês possuem sobre o tema. DICAS UNIDADE 3 — NEGOCIAÇÕES EM CONTEXTOS MULTICULTURAIS 120 As negociações internacionais podem ser definidas como transações que ocorrem entre instituições de diferentes países, que podem abranger diferentes campos, como: militar, econômico, psicossocial e político (RACY, 2006). Observa- se, neste tipo de negociação, um grau de complexidade muito maior que as negociações domésticas, uma vez que o número de variáveis envolvidas é bem maior (MARTINELLI; VENTURA; MACHADO, 2008). Diplomatas e negociadores afirmam que além de uma ciência, a negociação internacional é também uma arte, parte importante da tradicional prática humana (RAIFFA; RICHARDSON; METCALFE, 2002). É considerada uma negociação internacional todo tipo de negociação em que as partes provenientes de diferentes países sentam-se face a face (ou on-line) para negociar um acordo de negócio, envolvendo qualquer tipo de transação internacional, como a venda de produtos para um comprador estrangeiro, formação de Joint Venture entre empresas de diferentes nacionalidades para dividir canais de distribuição em um terceiro país, fusões, aquisições e licenciamento entre empresas de diferentes nacionalidades (PHATAK; HABIB, 1996). A negociação internacional vai além da troca de mercadoria e serviços com outro país. Segundo Oliveira e Granato (2017, p. 2): A negociação internacional compreende também a interação e a socialização entre os povos, o que exige dos negociadores um conhecimento específico sobre aspectos culturais dos países onde estão sendo criadas condições para uma negociação, considerando que diante da existência de uma grande variedade cultural os costumes, visões de mundo, formas de agir e de se relacionar diferem uns dos outros. Agora que você já conheceu o conceito de negociação internacional, vamos refletir dois dos principais fatores que têm promovido as negociações no âmbito internacional, a saber: a globalização e a internacionalização. Você sabe o que é globalização? Tem noção de como esse fenômeno impacta no seu dia a dia? Vejamos o que Mello (1999, p. 165) afirma sobre o tema: A globalização deve ser entendida como um processo, um padrão histórico de mudança estrutural, mais do que uma transformação política e social já plenamente realizada. Ela é um fenômeno ao mesmo tempo amplo e limitado: amplo, porque ela cobre transformações políticas, econômicas e culturais; limitado, porque não se trata de um processo completo e terminado, e ele não afeta a todos da mesma maneira. O processo de globalização é caracterizado pela intensa mudança estrutural da economia internacional, com o peso crescente de transações e conexões organizacionais que ultrapassam a fronteira dos Estados. Observa-se que o processo de globalização passa por algumas fases, destacadas no quadro a seguir. TÓPICO 1 — NEGOCIAÇÃO: DESAFIOS E OPORTUNIDADES 121 QUADRO 1 – FASES DA GLOBALIZAÇÃO Fase da Globalização Período Aproximado Fatores desencadeadores Principais características Primeira fase 1830 até o final da década de 1800, com pico em 1880 Introdução das ferrovias e o transporte marítimo. Aumento da manufatura: comércio através das fronteiras de commodities, em grande parte por trading companies. Segunda fase 1900 a 1930 Aumento da produção de eletricidade e aço. Surgimento e domínio das primeiras empresas multinacionais (principalmente europeias e norte- americanas) nos setores industrial, extrativista e agrícola Terceira fase 1948 à década de 1970 Formação do Acordo Geral sobre Tarifas e Comércio (GATT, do inglês General Agreement on Tariff and Trade); fim da Segunda Guerra Mundial; Plano Marshall para reconstrução da Europa. Esforço concentrado da parte dos países industrializados ocidentais para redução gradual de barreiras ao comércio; crescimento das multinacionais japonesas; comércio entre países de bens de marca; fluxo entre países de moeda em paralelo ao desenvolvimento de mercados globais de capital. UNIDADE 3 — NEGOCIAÇÕES EM CONTEXTOS MULTICULTURAIS 122 Quarta fase Década de 1980 até o presente Expressivos avanços nas tecnologias de informação, comunicações, manufatura e consulta; privatização de empresas estatais em países em transição; notável crescimento econômico nos mercados emergentes. Taxa de crescimento sem precedentes no comércio entre fronteiras de bens e serviços e capital; participação nos negócios internacionais de empresas de pequeno e grande porte, originárias de vários países; foco nos mercados emergentes para atividades de exportação, IDE e suprimento. FONTE: Erbesdobler (2015) apud Teixeira (2018, p. 179) Mendes (2020) enfatiza que com a globalização e evolução do comércio e das empresas, o mercado mundial começa a entrar em uma expansão comercial, exigindo aperfeiçoamento dos setores das companhias. Essas necessitam cada vez mais de profissionais capacitados e qualificados para atuar em áreas que maximizam seus lucros com os menores gastos possíveis. Nesse contexto, o negociador tem um papel importante, possibilitando a expansão de sua empresa no mercado, conquistando reconhecimento além das fronteiras. Quer saber mais sobre esse tema tão importante? Assista no Youtube ao vídeo intitulado “O que é globalização”. Basta clicar no link a seguir: https://www.youtube.com/ watch?v=h5WjNMGztvE. DICAS Você já parou para pensar como a globalização afeta o seu dia a dia? Se analisarmos as propagandas e embalagens dos produtos que consumimos diariamente, veremos que boa parte deles são de empresas que operam e/ou comercializam seus produtos também em outras nações. TÓPICO 1 — NEGOCIAÇÃO: DESAFIOS E OPORTUNIDADES 123 FIGURA 1 – EXEMPLOS DE MULTINACIONAIS FONTE: . Acesso em: 7 jul. 2021. Vale ressaltar que não é necessário que uma empresa possua uma unidade instalada em outro país para comercializar ali seus produtos. Por meio do comércio eletrônico (e-commerce), o consumidor pode estar localizado em um país e o prestador em outro. São notórias as profundas transformações causadas pela internet. É cada vez mais comum a prática do home office, por exemplo, em que um profissional pode residir em um país e trabalhar em uma empresa que possui a sua sede em outro, ou outra região. Agora, imagine a seguinte questão: se um consumidor compra um produto de uma empresa estrangeira e por algum motivo se sente lesado, qual legislação ele deve recorrer? A legislação do país em que ele reside ou do país em que a empresa possui sua sede? A despeito disso, a OMC (Organização Mundial do Comércio) vem organizando rodas de negociações, a fim de que os países estabeleçam regras de tributação que assegure os direitos do consumidor em situações como na compra de bens e serviços em países distintos do seu. Esse tema vem sendo tratado há pelo menos duas décadas. Certamente, esse é um dos desafios de um mundo globalizado e cada vez mais digitalizado. As rodadas de negociação promovidas pela OMC buscam promover o diálogo e o estabelecimento de acordos, contudo, no caso em que tratam da tributação e regras para o comércio internacional, estas já se estendem por um longo período. UNIDADE 3 — NEGOCIAÇÕES EM CONTEXTOS MULTICULTURAIS 124 A Organização Mundial do Comércio (OMC) possui atualmente 164 membros e nasceu como resultado de negociações da Rodada Uruguai (1986-1994). NOTA As negociações comerciaispodem ser classificadas em negociação bilateral, multilateral e negociações regionais, como veremos a seguir. Os tratados ou acordos bilaterais são contratos negociados entre dois países, sobre diferentes temas. De acordo com Lopes e Carvalho (2010, p. 644), os acordos bilaterais de comércio tornaram-se uma tendência mundial, explicada como reação às dificuldades experimentadas por diferentes tipos de países para fazer valer seus interesses em negociações no âmbito do multilateralismo defendido pelo Acordo Geral sobre Tarifas e Comércio (em inglês, General Agreement on Tariffs and Trade (GATT)) e pela Organização Mundial do Comércio (OMC). Por sua vez, os acordos ou tratados multilaterais são alianças firmadas entre três ou mais países chamados de signatários, geralmente, esses acordos possuem caráter econômico ou político. As negociações multilaterais tendem a ser mais complexas do que em processos bilaterais, essencialmente, porque esses processos são caracterizados pela multiplicidade de partes e de assunto. Neste contexto, os acordos tendem a ser alcançados por meio de consenso (SARFATI, 2006). Ainda no que diz respeito aos acordos, observa-se um processo gradual de integração e cooperação entre os países o que pode culminar na formação de blocos econômico (quando dois ou mais países se unem com mesmo propósito) pode-se citar, como exemplo, a união europeia – o maior bloco econômico do mundo. TÓPICO 1 — NEGOCIAÇÃO: DESAFIOS E OPORTUNIDADES 125 FIGURA 2 – UNIÃO EUROPEIA FONTE: . Acesso em: 7 jul. 2021. Outro exemplo é a emenda de Kigali, firmada a fim de reduzir a emissão de gases do efeito estufa. Este acordo segue o legado do Protocolo de Montreal e delimita ações como: diminuição do uso de hidrofluorcarbonetos (HFC), redução dos gases do efeito estufa etc. Enquanto os acordos bilaterais dizem respeito às relações econômicas, socioculturais, ambientais e políticas entre dois países, os acordos multilaterais são os que envolvem três ou mais Estados. Exemplos de acordos multilaterais amplamente conhecidos: – Tratado de Não Proliferação de Armas Nucleares Firmado em 1968 por vários países, entrando em vigor em 1970, o Tratado de Não Proliferação de Armas Nucleares é composto por 189 países. O objetivo é impedir o uso de tecnologia na produção de armas nucleares. Não participam deste acordo Israel, Paquistão, Índia e Coreia do Norte. – Mercosul Mercado Comum do Sul é uma organização intergovernamental fundada a partir do Tratado de Assunção de 1991. Estabelece uma integração, inicialmente, econômica configurada atualmente em uma união aduaneira, na qual há livre comércio intrazona e política comercial comum entre os países-membros. DICAS UNIDADE 3 — NEGOCIAÇÕES EM CONTEXTOS MULTICULTURAIS 126 ACORDOS BILATERAIS E MULTILATERAIS FONTE: . Acesso em: 7 jul. 2021. Pode-se afirmar que é por meio da internacionalização que as empresas conseguem ampliar sua representatividade e também seus lucros. Machado (2014) afirma que a internacionalização de uma empresa, além de fomentar os ganhos financeiros, melhora sua imagem, proporciona reconhecimento em nível mundial e o desenvolvimento econômico. Neste contexto, o concorrente não é apenas a empresa localizada próximo à companhia, mas o mundo inteiro. Com efeito, o grau de complexidade aumenta e o nível de detalhamentos que os empresários devem considerar e dominar também (leis, impostos, cultura, marca, política, governo, meio ambiente). Vale trazer o conceito de internacionalização proposto por Oliveira (2010, p. 95): Por internacionalização considera-se a obtenção de parte ou totalidade do faturamento a partir de operações internacionais, seja pela exportação, pelo licenciamento, com alianças estratégicas, aquisições de empresas em outros países ou construção de subsidiárias próprias. Do ponto de vista dos países em desenvolvimento, este é um tema que deve assumir papel cada vez mais relevante no ambiente de negócios, na medida em que parece haver grande potencial não realizado de internacionalização por parte de empresas oriundas de importantes economias emergentes como Índia, México e Brasil. Ampliando ainda mais a discussão, é possível enquadrar as empresas em vários estágios: empresa doméstica, multidoméstica, internacional, multinacional, global e transnacional. Observe com mais detalhes essa configuração no quadro a seguir: TÓPICO 1 — NEGOCIAÇÃO: DESAFIOS E OPORTUNIDADES 127 QUADRO 2 – CARACTERÍSTICAS DE EMPRESAS MULTINACIONAIS FONTE: Adaptado de Bartlett e Ghoshal (2000, s. p.) A configuração apresentada no quadro é proposta por Bartlett e Ghoshal (200), os autores propõem quatro categorias específicas representadas pela empresa Multinacional, Global, Internacional e Transnacional. A configuração apresentada por Bartlett e Ghoshal (2000) traz uma realidade de desenvolvimento em conjunto no que diz respeito à empresa transnacional, em que há presença da ação local em sua estratégia. A configuração de empresa multinacional representa a importância de cada unidade da empresa, havendo também um foco nas ações locais. No entanto, no que diz respeito às empresas globais e internacionais, percebe-se uma valorização da empresa mãe da organização, em que há um direcionamento de suas ações conforme a sua realidade. Neste sentido, as localidades subsidiárias do negócio não são consideradas de acordo com suas especificidades. Características Multinacional Global Internacional Transnacional Configuração de ativos e recursos Descentralizado e nacionalmente autossuficiente Centralizado e em escala global Fontes de competências essenciais centralizadas, outras descentralizadas Disperso, independente e especializado Função das operações no exterior Identificação e exploração de oportunidades locais Implementação das estratégias da empresa mãe Adaptação e desenvolvimento das competências da empresa mãe Diferenciadas por unidades nacionais de operações mundiais integradas Desenvolvimento e difusão do conhecimento Conhecimento desenvolvido e mantido no interior de cada unidade Conhecimento desenvolvido e mantido no centro Conhecimento desenvolvido no centro e transferido para unidades no exterior Desenvolvimento do conhecimento em conjunto e compartilhado mundialmente Organograma UNIDADE 3 — NEGOCIAÇÕES EM CONTEXTOS MULTICULTURAIS 128 Caro acadêmico, você percebeu que à medida que a globalização se intensifica, a internacionalização de empresas também acelera? Há empresas que já nascem internacionalizadas são as Born Global. Por vezes, as empresas utilizam-se de estratégia de fusão para alcançar o mercado internacional, sobre isso leia o texto a seguir, que narra um pouco da história da Natura, empresa que inaugurou sua história em 1969 e se transformou na maior multinacional de cosméticos. NOTA NATURA AGORA TEM UM DESAFIO GLOBAL TRÊS VEZES MAIOR Em sua primeir a entrevista, o executivo titular do grupo Natura diz como pretende comandar uma operação cuja presença global mais que triplicou. O paulistano Roberto Marques costumava viajar com um avião de Nova York, onde mora, uma vez a cada dois meses para frequentar, em São Paulo, os encontros do conselho de administração da fabricante de cosméticos Natura, do qual faz parte há dois anos. Nos últimos meses, ele passou a colecionar muito mais milhagens. O executivo, que fez carreira internacional nas fabricantes de bens de consumo americanas Johnson&Johnson e Mondeléz, envolveu-se diretamente na avaliação da compra da britânica The Body Shop, por 1 bilhão de euros. Desde setembro, Marques é o principal executivo do novo grupo Natura, constituído também pela australianaAesop, adquirida em 2012. De uma hora para a outra, o escopo da empresa, antes restrito a 20 países, passou a atuar em 70. Com pouco mais de 200 lojas, somando Aesop e Natura, agora são mais de 3000 espalhadas mundo afora. Como não existe a estrutura jurídica de uma holding, o cargo oficial de Marques é presidente executivo do conselho de administração, que continua sob o comando compartilhado dos três fundadores da empresa, Luiz Seabra, Guilherme Leal e Pedro Passos. De São Paulo, Marques falou a EXAME, em sua primeira entrevista no cargo. Em vez de constituir uma holding, a Natura criou uma estrutura de grupo que chamou de “lean”. O que é e como funcionará? Não queremos uma estrutura corporativa pesada, e sim privilegiar as unidades de negócios como empresas independentes. Queremos manter o poder decisório com os presidentes de cada uma delas, ao mesmo tempo que eles devem buscar sinergias. Por isso, eles participam do que chamamos de comitê operacional do grupo, comandado por mim. Participam também outros quatro executivos de áreas como recursos humanos e logística, as quais terão duplo chapéu ao manter suas funções anteriores nas empresas. Três executivos vêm da Natura, e um, da Aesop. Como sou um conselheiro, esse formato permite a conexão entre o comitê e o conselho, que terá um papel mais ativo neste momento. TÓPICO 1 — NEGOCIAÇÃO: DESAFIOS E OPORTUNIDADES 129 O único integrante com dedicação exclusiva é o chief transformation officer. Qual é o papel dele? É um cargo ocupado por Robert Chatwin, há cinco anos vice-presidente de internacionalização da Natura. Na nova posição, ele será responsável por organizar e dar ritmo à busca de sinergias. Essa será uma estrutura temporária? Não. As empresas continuam se transformando, independentemente deste momento. O comitê terá um papel estratégico e de longo prazo. O senhor mora em Nova York. A Natura tem sede em São Paulo; a Aesop, na Austrália; e a The Body Shop, em Londres. Como será a rotina do grupo? Teremos seis encontros presenciais em 2018, um a cada dois meses. O local vai variar. No restante do tempo, vamos nos comunicar virtualmente. No geral, as viagens se tornarão mais frequentes. Pela primeira vez na história, a reunião do conselho da Natura não acontecerá em São Paulo, e sim em Londres, na sede da The Body Shop. Em janeiro, vamos realizar a primeira reunião com a participação de executivos das três empresas. Serão 100 profissionais juntos, em São Paulo, para trocar informações. Será um marco histórico para o grupo. O senhor foi contratado como conselheiro há dois anos. Já havia a previsão de que assumiria um cargo executivo na Natura? Não. Quando fui contratado para o conselho, era presidente da Mondeléz para a América do Norte. Já estava havia 15 anos fora do Brasil e queria ter uma ligação com o país. A Natura, por sua vez, já vinha articulando maneiras de crescer internacionalmente. Em abril, com a compra da The Body Shop, deixei minha posição na Mondeléz. Foi tudo muito intenso e rápido. Em junho, começamos a pensar como iríamos nos organizar. Qual será a prioridade do comitê? Vamos investir muito tempo na integração da equipe. Essas pessoas nunca trabalharam juntas. Alguns acabaram de chegar ao cargo, como o recém- contratado presidente da The Body Shop, que chegou oficialmente em 11 de dezembro. A primeira reunião de todo o grupo aconteceu nesse mesmo dia. Já foram mapeadas as oportunidades? Teremos um centro de excelência de varejo, no qual vamos usar muitos recursos e informações da Aesop. Outro será sobre digitalização e comércio eletrônico – áreas em que o Brasil já avançou e nas quais a The Body Shop está tentando avançar. UNIDADE 3 — NEGOCIAÇÕES EM CONTEXTOS MULTICULTURAIS 130 Qual será o maior desafio para melhorar os resultados da The Body Shop, cujas vendas vinham encolhendo? Precisamos revigorar a marca, muito reconhecida, mas com espaço para resgatar sua essência ativista. É necessário aumentar sua voz e trabalhar a narrativa da marca. Além de melhorar a eficiência operacional, pois algumas lojas não estão apresentando resultados satisfatórios e é preciso fazer ajustes. Só recentemente a Natura investiu no varejo. Como resolver esses problemas com pouca experiência nessa área? O novo presidente da The Body Shop, David Boynton, que já teve passagens pela L’Occitane, vai trazer um conhecimento enorme nessa área. Temos também a experiência de Michael O’Keeffe, presidente da Aesop, à frente de uma rede de quase 200 lojas que não param de crescer. Ao mesmo tempo, contratamos Peter Saunders para o conselho de administração. Ele foi presidente da The Body Shop no passado e tem muito conhecimento sobre varejo e sobre a empresa. Hoje ele está no conselho de redes como [de chocolates] a Godiva. A Natura anunciou projeções para dobrar o lucro operacional da The Body Shop nos próximos cinco anos. De onde virá boa parte desse ganho? Há oportunidades de ganhos na área de compras, onde existe muita coincidência entre as empresas. E melhorias na eficiência operacional da The Body Shop. E há novas oportunidades de crescimento para a empresa? Sim. Com a The Body Shop, adquirimos uma base presente em 70 países. Uma rede de franqueados que podem nos ajudar a levar a marca Natura para fora. A expansão da The Body Shop com a venda direta é outra possibilidade. A empresa já usa o modelo na Austrália e na Inglaterra e vai bem. Ainda não temos todas as respostas. Estamos aprendendo. FONTE: . Acesso em: 22 abr. 2021. Observa-se que para muitas organizações a internacionalização é o caminho que conduz ao crescimento. Para que isso seja possível, diversas estratégias são implementadas, ponderando não apenas o crescimento para além do território nacional, mas também a eficiência das operações a nível global. Dunning (1979) em seu estudo conhecido como paradigma eclético teve como objetivo explicar a atuação e o padrão das firmas no exterior, de modo a entender como funcionava a produção internacional, e identificou três fatores determinantes para internacionalização da produção de uma empresa, a saber: (I) TÓPICO 1 — NEGOCIAÇÃO: DESAFIOS E OPORTUNIDADES 131 capacidade de desenvolver um projeto por ter uma habilidade gerencial superior; (II) benefícios associados a logística e a melhor acesso a fontes de matérias-primas e, por fim, (III) o desenvolvimento de processos produtivos de forma mais eficiente. Conforme aponta Oliveira Júnior (2010, p. 40): As teorias convencionais de negócios internacionais pressupõem que as firmas irão se internacionalizar com base em vantagens competitivas definidas que lhes possibilitam assegurar retornos suficientes para cobrir os custos adicionais e riscos associados com operações no exterior. O paradigma eclético desenvolvido por Dunning (1981, 2001) apresenta elementos de teorias anteriores para identificar vantagens de propriedade, localização e internalização (ownership, location, internalization – OLI), que motivam a internacionalização. As vantagens de propriedade são fatores específicos da firma, tais como propriedade superior de recursos ou capacidades gerenciais, que podem ser aplicadas competitivamente num país no exterior. As vantagens de localização se dão por decisões de investir em países que oferecem oportunidades de mercado ou de produção superiores. As vantagens de internalização se dão para firmas que conseguem reduzir custos de transação por meio de investimentos no exterior, assim eles empreendem transformações ou processos de forma mais eficiente do que mantendo operações de mercado. A internalização pode oferecer vantagens no gerenciamento de interdependências relativas a know-how, reputação, cadeia de valor e marketing, e essas vantagensoferecem uma poderosa explicação para o crescimento da empresa multinacional. A realização das vantagens de internalização depende das capacidades de propriedade e, em geral, é o que foi acordado nas principais explicações teóricas para IDE e internacionalização. Caro acadêmico, você consegue perceber que há dois motivos principais para se tornar um negociador de nível internacional? (1) o surgimento de uma economia global e (2) a grande diversidade de acordos empresariais internacionais (ACUFF, 2004). Neste contexto, Acuff (2004) aponta seis etapas a serem cumpridas em negociações internacionais, a saber: (1) orientação e pesquisa; (2) resistência; (3) reformulação das estratégias; (4) discussões difíceis e tomada de decisões; (5) acordo e (6) seguimento. Vejamos a seguir cada uma dessas etapas com mais detalhes. • Orientação e pesquisa A primeira etapa é fundamental para a negociação, pois quanto maiores forem as informações adquiridas, melhores serão os resultados no decorrer do processo. A busca de informações é extremamente importante para se conhecer o objeto de negociação, bem como seu ambiente e as questões envolvidas. Esta etapa consiste principalmente na busca por conhecimento, como: o estudo da organização envolvida, o histórico das negociações semelhantes anteriores, a verificação do poder que seu parceiro de negociação possui em sua organização ou mesmo no meio em que está inserido. Esta fase inicial também compreende o Planejamento. O êxito de uma negociação depende de um planejamento bem elaborado. Para tanto, há a necessidade de examinar interesses e definir metas, UNIDADE 3 — NEGOCIAÇÕES EM CONTEXTOS MULTICULTURAIS 132 bem como identificar quais serão os interesses e objetivos do outro, através da coleta de informações necessárias, com o intuito de se prever possíveis impasses e buscar a maneira de evitá-los e superá-los. Efetivamente deve-se programar as apresentações na mesa de negociação. Através do planejamento, ainda, pode-se ter uma visão geral da situação para então definir os assuntos a serem abordados – no intuito de estabelecer as prioridades. Não se deve, entretanto, deixar de lado a criação de um ambiente favorável à negociação, a fim de reduzir eventuais tensões, para facilitar a busca pelo consenso e pela cooperação. • Resistência O segundo ponto é referente à resistência da outra parte com quem se está negociando. Neste estágio é importante identificar a origem da resistência para, então, superar as objeções. Com relação às objeções que podem surgir nas negociações, indicamos o vídeo “Técnicas de negociação: Como lidar com objeções em negociações?”, do consultor Erik Guttmann. Confira em: https://www.youtube.com/watch?v=8rMT78QXwIo. DICAS Há de se considerar que em uma negociação pode haver resistência por parte do outro negociador. A resistência existe até mesmo para caracterizar a importância relativa da negociação. Se o seu oponente não apresentar certa resistência, você deve verificar qual a real importância do objeto que está sendo negociado. De qualquer forma, é importante se preparar para enfrentar a resistência, buscando formas de quebrá-la. Isto é alcançado ao assumir posições, buscando sempre ter um ponto de vista lógico, debatendo e argumentando seus motivos. É importante também ser compreensivo com o outro negociador, e isso se dá através do conhecimento profundo do mesmo e do objeto da negociação. • Reformulação das estratégias A reformulação das estratégias deve ser colocada em prática assim que novas informações pertinentes à negociação são adquiridas. Você sempre deve elaborar estratégias de negociação, antes mesmo de partir para o processo em si. Entretanto, novos fatores podem surgir durante o processo e você deve estar preparado para enfrentá-los, inclusive reavaliando as estratégias previamente estabelecidas. É possível trabalhar a reformulação de estratégias a partir da introdução de dados novos, da redefinição de algumas questões, mas, principalmente, através da efetiva reavaliação das estratégias originais. TÓPICO 1 — NEGOCIAÇÃO: DESAFIOS E OPORTUNIDADES 133 • Discussões difíceis e tomada de decisões No quarto passo é o momento em que deve-se avaliar as necessidades de todos os envolvidos e apresentar opções para ganhos recíprocos. Todo negociador deve concentrar seus esforços nas reais necessidades das partes envolvidas no processo. Quando uma discussão está difícil, o objetivo maior é buscar o real motivo do que se está negociando. Este é o momento exato para se tomar decisões com base efetiva na busca por resultados recíprocos: ganha-ganha, ou seja, deve se criar alternativas de ganho mútuo, perguntando-se: o que a outra parte pode ganhar com a negociação? É extremamente importante nas discussões, na tomada de decisões, explorar e compreender todas as variáveis envolvidas, a fim de clarificar pontos obscuros na intenção de superar impasses existentes. • Acordo Na etapa do acordo são definidos os detalhes do negócio, em que é importante verificar se todos compreendem o que foi acertado. É o momento de traçar todos os detalhes da negociação e garantir a compreensão deles por todos os envolvidos. Os negociadores ratificam os acordos com suas organizações. Dessa forma, são fatores que envolvem o acordo: busca de área de entendimento; revisão de todo o processo de negociação, a fim de garantir a compreensão mútua do que foi acordado; revisar e redigir o acordo; recapitular os benefícios mútuos alcançados com a negociação. • Seguimento O último ponto, muitas vezes esquecido, porém de extrema importância, é o seguimento, onde se prepara o terreno para uma próxima negociação. Esta etapa é primordial para o alcance de sucesso de uma próxima negociação e muitas vezes ela é negligenciada. Logo após o acordo firmado, é necessário manter um bom relacionamento com seu oponente, enfatizando que a sua tomada de decisão foi acertada e que ambos fizeram bons negócios. Enfatizar um relacionamento é também uma chave para o sucesso de ume negociação. Dessa forma, o seguimento consiste em supervisionar a implementação do acordo negociado e destacar que você acaba de fazer um bom negócio. Conclui-se que o que diferencia uma negociação comum da negociação internacional é o ambiente em que ela ocorre, por isso, o negociador deve estar atento às regras, sinais e comportamentos locais (STELLE; MURPHIL; RUSSILL, 1995). Assim, o êxito em negociações corporativas internacionais, conforme afirmam Ayerbe e Bojikian (2011, p. 75): UNIDADE 3 — NEGOCIAÇÕES EM CONTEXTOS MULTICULTURAIS 134 “depende, em grande medida, da habilidade dos atores que participam desse processo – seus estilos de negociar, seus conhecimentos sobre o negócio/assunto em questão, seus modos de se relacionar com outras pessoas. Depende, também, das estratégias adotadas, da capacidade de entender diferentes idiomas e da forma de comunicação, além da capacidade de gerar uma interação positiva, compreendendo o outro negociador (que, no caso de negociações internacionais, será de uma cultura distinta)”. A respeito disso, acompanhe o tópico a seguir. 135 Neste tópico, você aprendeu que: • Negociações internacionais são transações que ocorrem entre instituições de diferentes países, que podem abranger diferentes campos, como: militar, econômico, psicossocial e político. • A globalização pode ser entendida como um fenômeno que veio a intensificar as relações entre os países, sendo retratado pela literatura como a denominação de um movimento marcado pela diluição das fronteiras entre as nações, tanto nos aspectos físico e geográfico, como nas facilidades geradas em termos de trocas culturais, fluxo de informações e evolução nos meios de comunicação. • A globalização tem acelerado as relações comerciaisentre países, estimulando a celebração de acordos bilaterais e a formação de blocos econômicos. • Por internacionalização considera-se a obtenção de parte ou totalidade do faturamento a partir de operações internacionais, seja pela exportação, pelo licenciamento, com alianças estratégicas, aquisições de empresas em outros países ou construção de subsidiárias próprias. RESUMO DO TÓPICO 1 136 1 As negociações que ocorrem em eventos como a Rodada de Doha possibilitam países como o Brasil fechar de acordos bilaterais e multilaterais com outros países de economias desenvolvidas. Descreva a diferença entre os tratados bilaterais e multilaterais. 2 A atual era é marcada pelo avanço da tecnologia. Esta também trouxe, no entanto, alguns desafios globais. Um problema climático em um país, por exemplo, pode afetar outras nações. A cooperação global é um imperativo do presente século. Tendo em vista o processo de negociação no âmbito internacional, analise as sentenças a seguir: I- À medida que cresce o grau de internacionalização das empresas, diminui a abertura de frentes de negociações comerciais multilaterais e bilaterais. II- O estudo, observação e conhecimento dos costumes e peculiaridades locais da outra parte pode ser fundamental para que a negociação tenha o sucesso almejado. III- Nas negociações internacionais pouco importa o costume e cultura do outro negociador. IV- Negociadores internacionais precisam estar informados sobre as tendências da outra parte, influenciada diretamente pela cultura do país de origem do outro negociador. Assinale a alternativa CORRETA: a) ( ) As sentenças I e II estão corretas. b) ( ) As sentenças II e IV estão corretas. c) ( ) Somente a sentença III está correta. d) ( ) As sentenças I, II e III estão corretas. 3 Uma negociação internacional não se desenvolve apenas discutindo os aspectos técnicos relacionados ao produto, prazo de entrega e condições de pagamento, antes é pautada no respeito a cultura e costumes daqueles com quem se negocia. Sobre cultura, avalie as asserções a seguir e a relação proposta entre elas. I- A cultura dos negociadores é expressa em seu estilo de negociação. PORQUE II- A cultura consiste no conjunto compartilhado de valores e crenças duradouras que caracterizam e distinguem grupos sociais. AUTOATIVIDADE 137 Assinale a alternativa CORRETA: a) ( ) As asserções I e II são proposições verdadeiras, e a II é uma justificativa correta da I. b) ( ) As asserções I e II são proposições verdadeiras, e a II não é uma justificativa da I. c) ( ) A asserção I é uma proposição verdadeira, e a II é uma proposição falsa. d) ( ) A asserção I é uma proposição falsa, e a II é uma proposição verdadeira. 4 Atualmente, é inimaginável um mundo sem o enorme fluxo de bens, recursos financeiros, informações, pessoas e de uma série de outros elementos mais difusos e menos quantificáveis que transitam continuamente entre as fronteiras que delimitam os Estados. Na base desse fenômeno, está uma ampla e complexa malha de organizações internacionais. Diante deste cenário, disserte sobre o papel desempenhado pelas organizações multilaterais no mundo atual. FONTE: SATO, E. Conflito e cooperação nas relações internacionais: as organizações internacionais no século XXI. Revista Brasileira de Política Internacional, v. 46, p. 161-176, 2003. 5 Importadores de países árabes querem fazer negócios com frigoríficos paranaenses. Contudo, exigem que os frangos sejam abatidos de um modo indolor em um local voltado para meca e com frases religiosas em placas no local de abate. Dado este contexto, assinale a alternativa INCORRETA: FONTE: . Acesso em: 10 jul. 2021. a) ( ) Neste caso a religião interfere na estrutura do exportador. b) ( ) Em negociações internacionais deve-se ponderar os costumes, tradições, religião, linguagem. c) ( ) Neste caso, a religião não interfere na estrutura do exportador. d) ( ) Neste caso, ainda que o exportador não se adeque a negociação será realizada. 138 139 UNIDADE 3 1 INTRODUÇÃO Vimos que a globalização e a internacionalização de empresas são dois dos principais fatores que promoveram as negociações internacionais. Neste tópico, vamos examinaremos os impactos que a cultura exerce em negociações internacionais. A cultura compreende os fatores culturais, elementos psicológicos, normas, valores e crenças, que são compartilhados pelos membros de um grupo social. Aprenderemos, neste tópico, quais são os impactos que esses fatores exercem em negociações internacionais. Você perceberá, acadêmico, o quão importante é o conhecimento da cultura da outra parte, o que pode determinar o fechamento de um bom acordo comercial, amenizar problemas gerados pelo choque cultural e dificuldades de interação e comunicação. TÓPICO 2 — NEGOCIAÇÕES MULTICULTURAIS 2 O IMPACTO DA CULTURA NAS NEGOCIAÇÕES O termo cultura é complexo e de difícil definição. Segundo Pires e Macêdo (2006, p. 83), “possui inúmeros significados, todos derivados de sua raiz latina, que se refere à plantação no solo. Em muitas línguas ocidentais, cultura significa civilização ou refinamento da mente e, em particular, os resultados desse refinamento, como educação, arte e literatura”. Considera-se a cultura como um conjunto de expressões e representações simbólicas de uma sociedade, ou ainda, a interpretação do significado das formas simbólicas, o modo através do qual se busca compreender a cultura de um grupo (MUSSKOPF, 2017). Para Arruda (2001, p. 59): Se comunicação é um processo, podemos dizer que a cultura é a estrutura por meio da qual a comunicação é formulada e interpretada. Cultura diz respeito à forma como as pessoas vivem e se relacionam. Quando uma negociação envolve pessoas de culturas distintas, 140 UNIDADE 3 — NEGOCIAÇÕES EM CONTEXTOS MULTICULTURAIS é preciso que ocorra uma adaptação entre as partes, a fim de que a comunicação efetivamente flua. Lidar com elementos interculturais em uma negociação significa lidar com signos, símbolos e índices diversos, em suas distintas similaridades e diferenças. Na literatura é possível encontrar diversos conceitos para o termo, mas não há um consenso quanto à definição. Pastore (2015) considera que a maioria das definições compartilha três características principais sobre cultura, a saber: • Cultura é um fenômeno de grupo: embora cada grupo consiste essencialmente em indivíduos e, apesar do fato de que a cultura é manifestada através de indivíduos, ela em si é um fenômeno que só pode ser observado na medida em que é compartilhado pela grande maioria dos indivíduos pertencentes a um determinado grupo. • Cultura é adquirida pelos indivíduos a partir do grupo a que pertencem, através de socialização ou aculturação. Isso implica que a cultura não só tem que ser compartilhada pelos indivíduos pertencentes a um determinado grupo, mas também tem que ser preservada no tempo e transmitida de uma geração para outra. • Cultura é um conjunto exclusivo de atributos que englobará todas as áreas da vida social, e esses atributos podem possuir características intangíveis ou incorpóreas. O primeiro grupo, por exemplo, inclui significados, valores, crenças etc. O segundo, suas expressões, tais como padrões de comportamento e artefatos. O que a cultura tem a ver com negociação? Bom, primeiramente diversos estudos apontam que a cultura é um dos principais fatores a serem considerados em negociações internacionais. Conforme Musskopf (2017), com a ampliação de mercados e alianças com empresas estrangeiras – e para que um negócio seja bem-sucedido – deve-se considerar váriosfatores, sendo observada, em primeiro lugar, a língua falada, em segundo, a cultura e, em terceiro, as diferenças sistêmicas, como legislação e restrições tarifárias. Segundo Jacobus e Muller (2013), na negociação internacional existem diversos fatores que influenciam diretamente o resultado do processo, uma delas é a cultura, que está presente em cada negociador, fazendo com que haja diferenças e semelhanças nas características negociais de cada indivíduo. Para Musskopf (2017), a cultura tem o poder de intervir a qualquer momento na negociação, pois ela é inegociável e inalterável, antecedendo a própria negociação. O negociador necessita desenvolver técnicas e estratégias para conseguir lidar com fatores peculiares que surgem durante uma negociação. TÓPICO 2 — NEGOCIAÇÕES MULTICULTURAIS 141 Um exemplo claro é a história do executivo americano que presenteou a filha de seu sócio chinês com um relógio, por ocasião do casamento desta, sem saber que relógios são presentes inapropriados na China, porque são associados à morte. Este insulto resultou no término do relacionamento de negócios com seu sócio. Observa-se que, conforme aponta Acuff (2004), os principais fatores culturais que interferem nas negociações são: I. uso do tempo; II. individualismo vs. Orientação coletiva; III. estabilidade de funções e conformidade; IV. padrões de comunicação. O uso do tempo diz respeito à relação das culturas com o horário e prazos. Como exemplo, utilizamos o povo suíço, onde atrasos são faltas graves – ao contrário das culturas latinas. O segundo ponto trata da consciência do “eu” (individualismo) em contraste com a consciência do “nós” (Orientação coletiva). Deste modo, pode-se explicar a velocidade das negociações. Como exemplo, podemos mencionar os Estados Unidos, onde uma decisão pode ser tomada imediatamente, devido à cultura individualista – ao contrário do que ocorre no Japão, onde uma decisão normalmente é tomada por um grupo de pessoas. O terceiro fator, estabilidade de funções e conformidade, caracteriza- se pela necessidade ou não de haver conformidade e estabilidade nas funções, enfatizando mais ou menos a estrutura do comportamento do que o conteúdo. Como exemplo, podemos mencionar o povo alemão, que prioriza o conteúdo dos negócios, deixando de lado o relacionamento interpessoal – ao contrário dos povos asiáticos, onde antes de qualquer negociação é necessário o relacionamento profundo com o interlocutor. O quarto, padrões de comunicação, é um dos principais pontos a ser levado em consideração para uma negociação bem-sucedida, devendo ser bem entendido por todas as partes para evitar divergências. Como exemplo, podemos utilizar o sinal de polegar levantado, que no Brasil tem como significado uma afirmação positiva, indicando que algo está correto ou de acordo, mas já em outras culturas, pode ser visto como grande ofensa. Acuff (2004) aponta ainda que quando o negociador desconhece os marcos de referência habituais de como agir, ocorre o choque cultural. Estes marcos podem incluir atividades básicas, como apertar as mãos, como se dirigir às pessoas, a quem dirigir os comentários, nível de franqueza ou se deve ou não discutir sobre o negócio durante os jantares. 142 UNIDADE 3 — NEGOCIAÇÕES EM CONTEXTOS MULTICULTURAIS Brett (2001) enfatiza que a cultura é formada por elementos psicológicos, normas e valores, que são compartilhados pelos membros de um grupo social, sendo que quando duas partes negociam, trazem consigo sua cultura, interesses, prioridades e estratégias de negociação. Os valores culturais podem, na maioria das vezes, revelar tendências comuns de negociadores de alguns países. A autora desenvolveu um modelo que apresenta a influência que a cultura exerce sobre os negociadores. Observe na figura a seguir: FIGURA 3 – MODELO DE BRETT FONTE: Brett (2001, p. 102) No modelo de Brett é possível perceber que a cultura afeta os elementos da negociação – tais como interesses, prioridades ou a seleção de estratégias. Valores culturais têm uma influência notável sobre os interesses e as prioridades das negociações, enquanto normas culturais afetam os padrões de interações e estratégias de negociação (PASTORE, 2015). Também nos apropriamos dos estudos de Salacuse (2004), que realizou entrevistas com 400 pessoas de 12 nacionalidades diferentes, a fim de conhecer dez elementos que podem interferir em negociações interculturais. Veja na tabela a seguir: TÓPICO 2 — NEGOCIAÇÕES MULTICULTURAIS 143 TABELA 1 – COMO A CULTURA AFETA AS NEGOCIAÇÕES FONTE: Adaptado de Salacuse (2004) Pessoas de culturas distintas negociam de forma diferente, comportam- se de maneira diferente e, além disso, interpretam o processo de negociação de forma distinta (FLORIANI, 2003). A respeito disso, acompanhe o texto a seguir. PARA NEGOCIAR BEM NO EXTERIOR É PRECISO ESTAR ATENTO ÀS TRADIÇÕES E COSTUMES O tempo de negociação e a construção dos relacionamentos mudam de um país para outro. Karla Kalef, da NSO Borrachas: "Para fazer negócios na Arábia Saudita, a mulher deve ter postura". 144 UNIDADE 3 — NEGOCIAÇÕES EM CONTEXTOS MULTICULTURAIS FONTE: . Acesso em: 14 jul. 2021. Quem lida com negociação sabe que a tarefa não é para amadores. Dominar as técnicas, conhecer bem o negócio e o interlocutor são algumas das exigências, mas quando a missão envolve outro país, o que já era difícil torna-se mais desafiador. O negociador terá que dominar, também, as particularidades daquela nova cultura. E experiências internacionais serão cada vez mais frequentes com o fenômeno da globalização. O tempo de negociação, a construção de relacionamentos e até a postura, tudo muda de um lugar para outro. Para ter sucesso, é preciso aprender cada cultura, como fez a diretora administrativa e comercial da empresa joinvilense NSO Borrachas, Karla Rosane Ernst de Mello Kalef. Há quatro anos ela participa de feiras e rodadas de negócios durante missões empresariais para Arábia Saudita e no Sudão. Já fez bons negócios e, de tão acostumada, já sente até saudades. – Dizem que na Arábia Saudita não se negocia com mulheres, mas isto não é verdade. Negociam, desde que a mulher tenha postura – afirma. Logo ao desembarcar no aeroporto, Karla veste a roupa feminina padrão na Arábia Saudita: o véu e a abaya (vestido preto que cobre todo o corpo), mas não é só isso. Para impor respeito, cuida de cada gesto. Nas reuniões, as mãos ficam em cima da mesa sobrepostas, a esquerda em cima da direita para mostrar a aliança. As mangas do vestido cobrem a pele até o punho. Os cabelos ficam, de preferência, totalmente cobertos pelo véu, mas, às vezes, o véu sai do lugar e os cabelos loiros aparecerem um pouquinho. Karla diz que não faz mal, por se tratar de uma estrangeira. TÓPICO 2 — NEGOCIAÇÕES MULTICULTURAIS 145 Embora muito comunicativa, quando está na Arábia Saudita, Karla também evita sorrir abertamente. E um aperto de mão é suficiente ao cumprimentar os interlocutores. Certa vez, um descuido acabou tendo um efeito inesperado. Ao ligar o notebook para projetar a apresentação de sua empresa, esqueceu que na tela inicial havia uma grande foto de sua família. Como a família é sagrada para eles, a cena foi o suficiente para ganhar o respeito e a simpatia entre os presentes. Karla também procura conhecer a região que visita, pois sabe que as oportunidades podem estar em qualquer lugar. Foi assim quando fechou um dos negócios internacionais mais recentes. Certo dia, no Sudão, percebeu muitos pneus jogados nas estradas e procurou entender o que ocasionava aquilo. Descobriu que os pneus estouram frequentemente devido à grande oscilação de temperatura. Da curiosidade, nasceuuma parceria para transferência tecnológica e de material para reciclagem do produto. • Planejamento, a palavra-chave em negociação Se você é iniciante no ramo de negociação e seu chefe lhe deu a missão de discutir negócios com estrangeiros, é bom se preparar com antecedência. Planejamento é a palavra-chave antes de qualquer negociação internacional, explica a assessora de relações internacionais e professora da Universidade da Região de Joinville (Univille), Jurema Tomelin Barg. Ela aconselha estudar sobre o país, seus costumes e ter bem claro o objetivo da viagem. Um cuidado simples para não errar logo de início é verificar os feriados locais. Algumas datas são tratadas com muita importância e marcar reuniões nesses dias é uma grande gafe. Vale a pena, também, dar uma olhadinha nos jornais locais ao chegar. Jurema afirma que isto demonstra interesse pela localidade e contribui para estabelecer uma conversa informal com os interlocutores. Gesticular demais é algo que deve ser evitado em qualquer lugar, diz Jurema, porque pode ser interpretado como falta de preparo. Alguns costumes são bem específicos, por isso, cada viagem é única. De acordo com a professora da Univille, os árabes querem conhecer a pessoa por trás do cartão de visita. E nessa cultura, nunca se deve mostrar a sola do sapato. Algo considerado indelicado. A troca de cartão acontece com as duas mãos e este nunca deve ser colocado imediatamente no bolso. Ainda que não entenda o idioma, o ideal é fazer uma expressão de aprovação, olhar atentamente para o que está escrito no cartão e, só então, deixá-lo na mesma ao seu lado. Jamais colocá-lo no bolso ou na pasta imediatamente. 146 UNIDADE 3 — NEGOCIAÇÕES EM CONTEXTOS MULTICULTURAIS Outro cuidado é não tirar conclusões precipitadas. Os japoneses escutam atentamente e fazem movimentos afirmativos com a cabeça, mas isto não é sinal de concordância, somente de educação. Depois farão as considerações. Para saber como agir em ambientes tão distintos quanto à China, Sudão ou Estados Unidos, uma dica é conhecer os padrões de comportamento descritos pelo mestre em negociação e escritor Frank L. Acuff. Entre eles, está o uso do tempo. A pontualidade tem peso diferente conforme a cultura. Também é importante saber em que regiões o negociador pensa de forma coletiva e onde é mais individualista, ou quem valoriza mais a forma da apresentação e quais focam o conteúdo. • Confira os padrões de comportamento mais comuns – Uso do tempo Os norte-americanos, suíços, alemães e australianos são normalmente exigentes e exatos na sua administração do tempo... na América Latina, pode- se pensar, e inclusive esperar, que uma sessão de negociação comece meia hora depois da hora marcada. Um atraso de dois meses num projeto no Oriente Médio pode ser considerado mais normal do que anormal. Talvez pensem: "O nosso país tem sobrevivido durante séculos sem esse novo equipamento, e não faz mal se esperamos mais dois meses". • Individualismo vs. Orientação coletiva Um estudo clássico do pesquisador holandês Geert Hofstede encontrou grandes diferenças entre países. Sendo 100 a nota mais alta, os gerentes norte- americanos obtiveram 91 pontos, os mais individualistas de todos os países pesquisados. Em seguida, vieram outros países ocidentais como Austrália, Grã- Betanha e Canadá. A maioria das culturas dos países da Orla do Pacífico tem contagem muito menor, indicativa de uma cultura coletiva, como Japão, Hong Kong, Cingapura e Taiwan. Em menor grau, isso também ocorre nos países latino-americanos, onde a contagem variou entre 46 (Argentina) e 16 (Venezuela). A ênfase ao grupo ajuda a explicar por que os japoneses são tão lentos ao tomar decisões nas negociações. Precisam de tempo para assegurarem-se de que todos os membros da equipe concordam com a decisão. A ênfase no grupo também condiciona a quem você tenta convencer na mesa de negociações. Os norte-americanos que negociam com outros norte-americanos normalmente procuram o representante mais importante do outro lado, porém, nas culturas centradas na coletividade, é o grupo que você deve convencer, não o indivíduo. • Estabilidade de funções e conformidade Algumas culturas, como as da Orla do Pacífico, frequentemente, enfatizam mais a forma ou estrutura do comportamento do que o conteúdo. Como fazem as coisas tem uma importância fundamental. Esse fator ajuda a explicar por que os TÓPICO 2 — NEGOCIAÇÕES MULTICULTURAIS 147 japoneses enfatizam mais o relacionamento com o interlocutor. Conhecer a outra pessoa ajuda a estabilidade e a previsibilidade do processo de negociação. De forma semelhante, os japoneses prestam muita atenção ao ritual, como a apresentação de cartões de visita. Por outro lado, os negociadores norte-americanos, alemães e suíços tendem a enfatizar mais o conteúdo das negociações que a forma como se chega aos resultados finais. • Padrões de comunicação Os negociadores norte-americanos, especialmente, prezam a comunicação direta e aberta (vá direto ao assunto). Já as pessoas da Orla do Pacífico, por exemplo, de culturas de conteúdo denso (nas quais o significado da mensagem está embutido no contexto da comunicação) podem considerar essa abordagem agressiva e insensível. Os norte-americanos podem achar difícil acompanhar, julgando inclusive ser enganosa, a comunicação indireta daquela pessoa de sociedade de denso conteúdo, pensando que esta pessoa deve ser dissimulada já que não responde sim ou não. • Comunicação não verbal Saudações e aperto de mão se fazem de formas diferentes. Por exemplo, os negociadores norte-americanos, alemães e russos têm forte aperto de mão comparados com os demais. Os norte-americanos normalmente também gostam de muito espaço físico nas suas vidas organizacionais. Isso se reflete numa distância física de mais ou menos um metro, em situações de conversas de negócios. Não há muito contato físico. Quando ocorre, geralmente há desconforto. Se apenas dois passageiros permanecem no elevador após o seu esvaziamento, imediatamente se dirigem para os lados. Em outras culturas, a proximidade física, em situações sociais ou de negócios, é muito maior que nos Estados Unidos. Em parte da América Latina e do Oriente Médio, é costume dois colegas de negócios se abraçarem, se beijarem levemente no rosto, e ficarem a apenas uma distância de 30 centímetros, ao conversar sobre negócios. O que faz com que um comportamento não verbal seja considerado exagerado ou apropriado é uma questão de interpretação cultural. Por exemplo, os latinos se tocam mais que os norte-americanos ou canadenses, que, por sua vez, se tocam mais que os suecos ou ingleses. FONTE: . Acesso em: 7 jul. 2021. 148 UNIDADE 3 — NEGOCIAÇÕES EM CONTEXTOS MULTICULTURAIS A cultura pode ser comparada ao iceberg, em que a parte superior denota as questões visíveis enquanto a parte inferior submersa na água representa as questões não visíveis, mas que influenciam diretamente as negociações, observe a imagem a seguir. FIGURA 4 – ICEBERG DA CULTURA FONTE: Erbesdobler (2015, p. 60) De acordo com Erbesdobler (2015), a parte superior do iceberg acima da água representa o idioma, as emoções, comportamento etc. Já a parte submersa invisível e, por vezes, inconsciente nos seres humanos diz respeito a questões como religião, sentimentos, valores etc. Desse modo, é possível concluir que além do entendimento do estilo negocial da outra parte, em negociações internacionais deve-se estar atento as crenças e normas culturais da outra parte, pois estas, não só se manifestam no processo de negociação como também podem influenciar o resultado da negociação(SOBRAL; CARVALHAL; ALMEIDA, 2008; PASTORE, 2015). 149 RESUMO DO TÓPICO 2 Neste tópico, você aprendeu que: • A cultura é formada por elementos psicológicos, normas, valores e crenças, que são compartilhados pelos membros de um grupo social. • A cultura é um dos principais fatores a serem considerados em negociações internacionais. • Quando o negociador desconhece os marcos de referência habituais de como agir, ocorre o que é denominado choque cultural. • Diferenças culturais afetam as escolhas das estratégias e a abordagem da negociação a ser utilizada. • A cultura pode ser comparada a um iceberg, em que a parte superior denota as questões visíveis enquanto a parte inferior denota questões não visíveis. 150 1 O conhecimento da cultura da outra parte com quem se está negociando pode eliminar o choque cultural e também as dificuldades de interação e comunicação. Sobre negociação internacional, assinale a alternativa INCORRETA: a) ( ) Dependendo da forma como é conduzida, a negociação pode ser responsável pela manutenção ou pelo rompimento das relações, levando ao êxito ou fracasso dos empreendimentos organizacionais. b) ( ) Negociações interculturais requerem um entendimento do estilo negocial da outra parte, bem como a aceitação e respeito pelas suas crenças, usos, costumes e normas culturais. c) ( ) Ao negociar com pessoas de outros países, deve-se deixar de lado questões que envolve clima político, econômico e valores culturais. d) ( ) Ao negociar com pessoas de outros países, deve-se informar sobre os usos e costumes dos seus interlocutores. 2 A omissão do fator cultura no planejamento ou na estratégia do negociador pode comprometer os resultados da negociação. No que diz respeito aos principais fatores culturais que interferem nas negociações, associe os itens, utilizando o código a seguir: I- Uso do tempo. II- Individualismo vs. Orientação coletiva. III- Estabilidade de funções e conformidade. IV- Padrões de comunicação. ( ) Caracteriza-se pela necessidade ou não de haver conformidade e estabilidade nas funções, enfatizando mais ou menos a estrutura do comportamento do que o conteúdo. ( ) Referente à consciência do “eu” em contraste com a consciência do “nós”. Deste modo, pode-se explicar a velocidade das negociações. ( ) Relação das culturas com o horário e prazos, como exemplo é utilizado o povo suíço, onde atrasos são faltas graves, ao contrário das culturas latinas. ( ) Um dos principais pontos a ser levado em consideração para uma negociação bem-sucedida, devendo ser bem entendido por todas as partes para evitar divergências. Assinale a alternativa que apresenta a sequência CORRETA: a) ( ) I – IV – II – III. b) ( ) III – II – I – IV. c) ( ) IV – I – III – II. d) ( ) II – III – I – IV. AUTOATIVIDADE 151 3 Para Erbesdobler (2015), a cultura pode ser comparada a um iceberg, em que a parte superior denota as questões visíveis, enquanto a parte inferior submersa na água representa as questões não visíveis. Dado este contexto, disserte sobre o iceberg da cultura. 4 A negociação muitas vezes não é uma maneira de discutir uma questão, mas de aprender mais sobre a outra parte. Assim, uma negociação inserida em um relacionamento, talvez nunca termine. Dado este contexto, assinale a alternativa CORRETA: a) ( ) Conhecer os conceitos e entender os tipos de negociação e os estilos de negociadores nem sempre é importante em uma transação. b) ( ) A negociação pode ser considerada uma técnica, ou mesmo arte, ainda não desvendada por profissionais e estudiosos. c) ( ) O objetivo maior de uma negociação é o lucro imediato para que não se perca tempo com negócios que gerem prejuízo financeiros. d) ( ) Em negociações o que vale é chegar em um acordo em que ambas as partes saiam satisfeitas. 5 Na literatura não há um consenso quanto à definição do termo cultura, mas sabe-se que em negociações internacionais os fatores culturais exercem significativo impacto. Disserte sobre a importância de se conhecer os fatores culturais da outra parte com quem e está negociando. 152 153 UNIDADE 3 1 INTRODUÇÃO Há quem considere a negociação uma arte. Há também aqueles que consideram a negociação uma técnica, ou ainda, a junção da arte com técnicas específicas. De qualquer modo, sabemos que negociar é fundamental. Tornar-se um bom negociador leva tempo. Bons negociadores são lapidados pelos aprendizados extraídos dos conflitos enfrentados, da prática do dia a dia, do domínio de técnicas de negociação e do convívio com bons negociadores. Também, há de se considerar que bons negociadores precisam ter domínio próprio e autoconhecimento. Vale citar a frase de Sun Tzu (2006, p. 60) “Conhece- te a ti mesmo, conhece teu inimigo. Tua vitória jamais correrá risco. Conhece o lugar, conhece o tempo. Então, tua vitória será total”. De acordo com o autor do provérbio chinês, se você conhecer o inimigo e conhecer a si mesmo, você não precisará temer o resultado de cem batalhas. Se você se conhece, mas não conhece o inimigo, para cada vitória obtida você sofrerá também uma derrota. No entanto, se você não conhecer nem o inimigo e nem a si mesmo, você perderá todas as batalhas. TÓPICO 3 — DESAFIOS DA NEGOCIAÇÃO 2 A IMPORTÂNCIA DA COMUNICAÇÃO NAS NEGOCIAÇÕES Certamente, conhecer a si próprio é um dos desafios da negociação – além disso, outro desafio é a comunicação. Convém, portanto, abordar o conceito de comunicação: uma mensagem que envolve a transmissão de conteúdos emocionais ou intelectuais, ou ambos, que nem sempre são transmitidos pela fala, abrange, também a linguagem não verbal, como o tom de voz, a escrita, vestimenta, gestos e expressões faciais. 154 UNIDADE 3 — NEGOCIAÇÕES EM CONTEXTOS MULTICULTURAIS Caro acadêmico, em negociações internacionais é muito importante o domínio de um outro idioma, como o inglês, considerado uma língua universal. A seguir, acompanhe algumas dicas para aprimorar o seu inglês. • Troque o idioma do seu celular e outros equipamentos eletrônicos para inglês. • Troque o idioma de suas redes sociais para o inglês. • Torne um hábito a leitura de sites de notícias internacionais. • Assista filmes e séries em inglês. DICAS A comunicação envolve um fluxo de mão dupla, com um emissor e um receptor, em que o que recebe a informação responde a ela de alguma forma, de imediato ou após certo tempo. A informação impacta no julgamento e comportamento das pessoas, alterando o modo como aquele que a recebe percebe alguma coisa. Para Almeida (2007, p. 200), “conseguir comunicar eficazmente é um dos objetivos mais importantes ao nível da gestão”. A comunicação para ser eficaz não compreende apenas o que você diz, mas o que o outro entende, nesse caso o mais importante é se fazer entendido. Um dos perigos da negociação intercultural é possibilidade de interpretação errônea, seja da comunicação verbal, quanto da não verbal, com maior possibilidade de enganos da segunda, pois o comportamento corporal é fruto, em grande escala do inconsciente, a linguagem verbal pode ser rapidamente corrigida já um gesto pode ser mais difícil de corrigir. FIGURA 5 – GESTO MAL INTERPRETADO FONTE: . Acesso em: 7 jul. 2021. TÓPICO 3 — DESAFIOS DA NEGOCIAÇÃO 155 Na figura exposta, vemos um gesto que nos Estados Unidos tem uma conotação positiva associada ao time de futebol da Universidade do Texas. Entretanto, neste mesmo país, no meio de outras subculturas, ele também pode representar "cultos satânicos". Da mesma forma, no Brasil, tanto pode representar "cultos satânicos" (indicando os chifres diabólicos), como também pode ser entendido como sinal de "sorte". Já na Itália a conotação é de insulto. Isto mostra queum gesto só deve ser usado, quando se tem certeza de que o seu interlocutor irá compreender exatamente o sentido que se quer transmitir (ARRUDA, 2001). Ainda, com relação à linguagem corporal, o autor ressalta que o modo de andar, sentar ou simplesmente permanecer parado pode comunicar mensagens positivas ou negativas. FIGURA 6 – POSTURA FONTE: . Acesso em: 7 jul. 2021. • Conforme Arruda (2001, p. 50): Comportar-se de forma muito relaxada e casual pode ser considerado rude em algumas culturas, como no caso da alemã. A forma de cruzar as pernas pode variar entre os gêneros feminino e masculino, e entre as culturas. Algumas costumam fazê-lo com mais frequência, enquanto outras não tem este hábito. No mundo árabe, a postura ao sentar-se é considerada muito importante. Deve-se evitar mostrar a sola do sapato, bem como apontar os pés na direção de outra pessoa, pois, está extremidade do corpo humano, por estar em contato com o chão não é considerada limpa. 156 UNIDADE 3 — NEGOCIAÇÕES EM CONTEXTOS MULTICULTURAIS No que se refere à comunicação, observa-se que a maior facilidade proporcionada pelos recursos tecnológicos para transmitir informações não leva necessariamente a uma melhora na qualidade da informação, sobretudo em negociações internacionais. Deve-se selecionar o melhor canal de comunicação, criar um ambiente propício ao entendimento da mensagem, considerando as diferenças culturais, conforme aponta Arruda (2001, p. 85): “embora a boa comunicação não seja, por si só, o único elemento que garanta sucesso a uma negociação, indubitavelmente é o pilar que sustenta a argumentação, pois, a comunicação permeia todo processo negocial e é o ambiente, por meio do qual os interesses são evidenciados”. 3 NEGOCIAÇÃO ESTRATÉGICA A globalização aliada ao avanço da ciência e da tecnologia diminuíram barreiras possibilitando um número maior de trocas e compartilhamentos entre pessoas, entre empresas, entre países, entre blocos comerciais. Diante desse cenário, as corporações precisam ser flexíveis, proativas e com uma visão estratégica sempre presente em suas ações, inclusive nas negociações. Assim, necessitam de visão sistêmica para um melhor entendimento do contexto no qual estão inseridas, aperfeiçoando as relações entre seus Stakeholders internos e externos. Uma vez que o número de parcerias, acordos e contratos, e, como consequência, os conflitos se multiplicam, as negociações tornam-se vetores de mudança sendo uma das habilidades básicas dos membros das organizações do século XXI (CAVALCANTE; SAUAI, 2006). A negociação é considerada uma das softs skills mais relevantes e mais requisitadas atualmente, posto que as empresas adotam cada vez mais uma estrutura em linha staff, com a participação de diversos parceiros atuantes em suas operações. As empresas que reconhecem as negociações como parte da estratégia organizacional possuem uma visão sistêmica dos relacionamentos estabelecidos. Assim, seus colaboradores carregam a responsabilidade de firmar, nutrir e também desvincular relacionamentos que não estejam alinhados à estratégia da empresa. NOTA TÓPICO 3 — DESAFIOS DA NEGOCIAÇÃO 157 É importante ampliar a visão e compreender que as organizações comerciais e industriais podem ser imaginadas como sistemas compostos de processos operacionais estruturados e regulados por um conjunto de estratégias, que são objeto de intensa pressão do ambiente no qual pertencem. Na figura a seguir é possível visualizar os fatores presentes no ambiente internos e externos e que impactam nas ações da organização: FIGURA 7 – AMBIENTE INTERNO E EXTERNO FONTE: . Acesso em: 7 jul. 2021. Ao analisar a imagem exposta é possível ampliar a visão quanto aos inúmeros agentes que impactam e são impactados pelas ações das empresas. Vale ressaltar que a empresa possui domínio apenas sobre o ambiente interno composto de recursos de natureza física (homens, máquinas, materiais, equipamentos etc.) e não física (métodos, rotinas, tecnologias, conhecimentos, padrões, procedimentos etc.) necessários para a produção de bens e serviços. Quanto ao ambiente externo composto pelos bancos, concorrentes, clientes etc., a empresa não possui total domínio sendo impacta por estes agentes. Assim, as empresas podem adotar diversas táticas a fim de alcançar seus objetivos, aproveitando as oportunidades do mercado, ao mesmo tempo, permanecendo em harmonia com os seus ambientes. Quanto às estratégias, podemos citar: 158 UNIDADE 3 — NEGOCIAÇÕES EM CONTEXTOS MULTICULTURAIS • Inovação. • Diversificação. • Expansão. • Diferenciação. • Alianças e parcerias. Uma empresa que adota a estratégia de alianças e parcerias, por exemplo, deve estar muito mais atenta às negociações realizadas por seus colaboradores nas rodadas de negociação, pois, é justamente a qualidade da negociação realizada que irá possibilitar o crescimento ou até mesmo o fracasso da empresa. Vale relembrar aqui o conceito do BATNA (best alternative to no agreement) técnica que detalha o que seria um bom e o que seria um mau acordo (SARFATI, 2006). Além de criar o próprio BATNA, deve-se também tentar descobrir o BATNA da outra parte. Assim, para construção do BATNA é necessário seguir os seguintes passos: a) Quais as ações que se pode tomar se nenhum acordo for alcançado; b) Deve-se lapidar as ideias e transformá-las em alternativas concretas; c) Selecionar as melhores alternativas. Ainda, Sarfati (2006) argumenta que: • Quanto menor a obrigação de uma parte em seu fechar o acordo mais forte ela será em uma barganha. • O poder de uma negociação não está diretamente associado aos ativos de uma parte e sim aos incentivos que ela tem, ou não, para estar em uma mesa de negociação. • Quanto mais se entende as alternativas do outro lado, melhor preparado para se negociar. As partes ainda costumam estabelecer pontos de resistência ou pontos de reservas, a localização do ponto de resistências de um negociador depende de seu BATNA, que, por sua vez, possui relação com a ZOPA (Zona de possibilidade de acordo) ou em inglês zone of possible agrément, que são as alternativas de acordo de cada parte (RAIFFA, 1982). Considerando a ZOPA, as negociações podem ser do tipo distributivas ou integrativa, conforme aponta Sarfati (2006, p. 140): As negociações em toda ZOPA podem ser do tipo distributivas, quando as partes envolvidas consideram que exista uma 'torta fixa' para ser dividida entre os participantes. Nesse caso, os participantes discutem quem merece mais ou menos da torta (claiming value). As negociações podem também ser integrativas, quando as partes envolvidas reconhecem que possuem interesses em comum ou que tem oportunidades de ganho em conjunto, principalmente, nas trocas que envolvem múltiplos assuntos e partes. Nesse caso, as partes discutem como aumentar a torta (create value). TÓPICO 3 — DESAFIOS DA NEGOCIAÇÃO 159 Para relembrar sobre as negociações distributivas ou integrativa, observe a imagem a seguir: FIGURA 8 – NEGOCIAÇÕES INTEGRATIVA E DISTRIBUTIVA FONTE: . Acesso em: 7 jul. 2021. Relacionando os temas estratégia e negociação, podemos tomar como exemplo o caso da IBM que fez uma aliança com uma companhia transportadora francesa. Na parceria estabelecida criaram uma nova firma, da qual a IBM possui 49% das ações. Esta nova firma ficou responsável pela distribuição física dos microcomputadores IBM e se tornou uma especialista em entregas just-in-time com armazéns completamente automatizados. Este é um exemplo de negociação integrativa com o uso de estratégia de aliança eparceria. Toda empresa deve possuir uma estratégia. Não ter uma estratégia significa ser a estratégia de alguém. A negociação estratégica vai além das negociações comuns, pois são fundamentadas na estratégia macro da empresa. Assim, toda negociação é premeditada visando a sustentabilidade do negócio. Examine a figura a seguir. 160 UNIDADE 3 — NEGOCIAÇÕES EM CONTEXTOS MULTICULTURAIS FIGURA 9 – ESTRATÉGIA DE NEGOCIAÇÃO FONTE: Mello (2010 p.18) Com base na imagem, pode-se concluir que a negociação estratégica vai além das negociações comuns, pois é fundamentada a partir da estratégia organizacional visado o relacionamento. Assim, destacam-se seis suposições que justificariam os diferentes objetivos de um negociador: a) ganhar agora; b) ganhar agora e depois; c) ganhar depois; d) construir um relacionamento; e) manter um relacionamento; f) consertar um relacionamento; g) tudo junto. Na negociação cooperativa, as partem tem interesse em alcançarem um acordo. É fundamental a troca legítima de informações para um conhecimento pleno de ambos os lados; a construção de um relacionamento de confiança; ter percepção correta dos fatos e a atenção nas concepções diferentes e justas, chegando assim a uma solução compartilhada que atendam os interesses de todos. Em negociações estratégias deve-se pensar até no ambiente em que a negociação irá ocorrer, as táticas usadas servem para conhecer e compreender as necessidades das partes. Segundo Mello (2010), deve-se seguir seis etapas: • Ouvir mais do que falar. • Separar as pessoas do problema. • Colocar-se do lugar da outra parte. • Compreender os interesses do outro. • Estabelecer normas de trabalho. • Táticas competitivas usadas de forma cooperativa (orçamento limitado, hipótese, agenda prévia, intimidade). TÓPICO 3 — DESAFIOS DA NEGOCIAÇÃO 161 O filme Jobs, lançado em 2013, retrata a história de Steve Jobs quando em 1976, abandona a faculdade e junto com seu amigo, o gênio da tecnologia Steve Wozniak, iniciaram uma revolução nos computadores com a invenção do Apple 1, o primeiro computador pessoal. Construído na garagem dos pais de Jobs, o Apple 1 e a formação da empresa Apple mudaram o mundo para sempre. Diretor: Joshua Michael Stern. Música composta por: John Debney. Bilheteria: 42,1 milhões USD. Produção: Joshua Michael Stern, Mark Hulme, Arthur Benjamin. DICAS FONTE: . Acesso em: 18 abr. 2021. 162 UNIDADE 3 — NEGOCIAÇÕES EM CONTEXTOS MULTICULTURAIS LEITURA COMPLEMENTAR NEGOCIAÇÃO: QUAL É O PESO DAS DIFERENÇAS CULTURAIS? Luiz Augusto Costacurta Junqueira Um executivo de construção civil canadense estava feliz por estar em Paris com sua filha, que estudava francês na Sorbonne. Ele estava mais feliz ainda por ter acabado de negociar um contrato multimilionário com um soberano árabe. O jantar de comemoração estava em andamento. O canadense, como anfitrião, trouxe sua filha. O árabe entendeu tratar-se de um atraente presente. O acordo de negócios terminou: do lado canadense, com “os grosseiros avanços sexuais” feitos pelo árabe em relação a sua filha; e do lado árabe, o negócio acabou com o soco, nada convencional, que o canadense lhe aplicou no queixo. Em Londres, um grupo de homens de negócios americanos estava tentando acertar um difícil problema com um grupo de ingleses, em uma mesa de conferência. Ambos os grupos estavam ficando exasperados com seus adversários. Os ingleses insistiam que o problema fosse “colocado na mesa”. Os americanos, por sua vez, com igual ênfase se recusavam a fazê-lo. Só depois descobriram que em inglês londrino “to table” quer dizer discutir e agir sobre um problema, enquanto em inglês americano, que dizer adiar o problema. Em Leningrado, um argentino, disposto a vender produtos agrícolas, foi levado a uma protocolar visita a monumentos da Segunda Guerra Mundial, antes de iniciar as negociações. Ele viu, ouviu e manifestou um interesse bem- educado. Depois que os russos esfriaram as negociações, por acaso descobriu que os estrangeiros devem manifestar inequívocos e profundos protestos de horror e solidariedade diante dos terríveis sofrimentos infligidos aos russos durante a Segunda Guerra Mundial. Estas estórias ilustram um ponto importante a ser aprendido por todo homem de negócios no âmbito internacional: a consciência das diferenças culturais pode ser a diferença entre o sucesso e o fracasso. O fracasso nessas histórias vem no fim. O sucesso advém de uma consciência clara de como as outras pessoas pensam e agem no estabelecimento de relações de negócios, desde seu início. Homens de negócios devem estar sintonizados para onde se manifestam as diferenças culturais e quais os seus efeitos no processo de negociação. Quando a negociação funciona, os dois lados ganham. Esta é a meta. Para que isso funcione no comércio internacional atual, o negociador bem-sucedido é aquele que leva em conta os fatores culturais. TÓPICO 3 — DESAFIOS DA NEGOCIAÇÃO 163 Diplomatas de carreira há muito reconhecem esses fatos. Harold Nicholseon, um grande político inglês, escreveu em seu livro “Diplomacia”, em 1939, que “existem certos padrões de negociação que podem ser considerados permanentes e universais. A par desses, entretanto, há notáveis diferenças causadas por caráter nacional, tradição e rituais”. Todo mundo acena sobriamente quando essa afirmação é citada, denotando uma compreensão dessa peça fundamental de sabedoria. Praticamente, todos que atuam transculturalmente aceitam o acerto dessa proposta alternativa e equilibrada – há similaridades e há diferenças. Fundamentalmente, somos todos seres humanos, seja qual for nosso contexto cultural e como seres humanos temos certos padrões em comum, aplicáveis independentemente do tom que possam assumir as negociações. Por outro lado, naturalmente, há diferenças culturais significativas que trazemos conosco à mesa de negociação, e que afetam nossas atitudes e nossos procedimentos. Naturalmente ambos os lados desta verdade elementar devem ser considerados. Mesmo o observador eventual “sabe”, por exemplo, que à medida que prosseguem as negociações, todos, independentemente das origens culturais, querem ser respeitados e levados a sério. Todos têm seus objetivos e querem vencer. Quase todos estão dispostos a fazer algumas concessões para alcançar acordos. As realidades transcendem às culturas. No entanto, o negociador inteligente também aceita as diferenças como parte do processo. Ele “sabe” que um “alemão típico” tenderá a considerar a oferta de muitas opções como um sinal de fraqueza da outra parte. Ele “sabe” que um japonês “típico” coloca muita ênfase no status da pessoa com quem está negociando. Ele “sabe” que a amistosidade, a hospitalidade e a informalidade de um americano “típico” não têm nada a ver com sua maneira de conduzir uma negociação. O negociador em contexto transcultural deve prestar atenção nas semelhanças, assim como nas diferenças. Decorre daí a pergunta crucial: como fazê-lo? Deve-se fazer um exaustivo estudo socioantropológico da cultura de seu oponente? Será que todo homem de negócios tem que fazer um curso universitário sobre os costumes de todas as nações do mundo? Não parece ser muito prático e, felizmente, não é de fato necessário que se o faça. O que é prático e necessário é uma compreensão do fenômeno e do processo da negociação. Deste modo terá um referencial, uma sistemática de trabalho que propicie uma visão das diferenças culturais à medida que se evidenciam durante o processo da negociação. Este referencial emerge da própria definição de negociação. Se a natureza e os passos no processo da negociação são conhecidos, há um arcabouço conceitual que denuncia as semelhanças e diferençaspessoas dentro das organizações, hierárquica e funcionalmente, faz com que que elas tenham que saber integrar os seus interesses e trabalhar em conjunto nas várias unidades de negócio e áreas funcionais. O grau crescente de especialização e conhecimento do mundo empresarial implica que as pessoas estejam cada vez mais dependentes de outros, no fornecimento de partes de um serviço ou de um produto completo. Os gestores necessitam de saber promover os seus próprios interesses, e criar valor acrescentado para as suas organizações. • Competição: num mercado cada vez mais competitivo, continuamos a assistir ao fenômeno crescente da concentração. As grandes empresas afirmam-se como grandes atores nos maiores mercados, conseguindo economias de escala e grandes lucros. As restantes empresas perdem posição, ficando muitas vezes em situações muito fragilizadas, essencialmente com pouco mercado. A tendência nos próximos anos não será diferente da atual, os grandes serão cada vez maiores e muitos pequenos correrão o risco de desaparecer. Esta realidade significa que as empresas devem ser peritas em ambientes competitivos, e saber navegar neste ambiente é fundamental para negociar com sucesso. • A Era da Informação: enquanto negociador, a era da informação traz também oportunidades e desafios para o gestor. A velocidade e a disponibilidade da informação levam a que os gestores tenham que estar preparados para negociar em cima do acontecimento, no momento certo. O desenvolvimento da informática e a gestão da informação vieram ampliar as obrigações e a capacidade das empresas para criar valor acrescentado para os seus clientes. UNIDADE 1 — PRINCÍPIOS DE NEGOCIAÇÃO 8 • A Globalização: as barreiras culturais, como a língua, os hábitos e o câmbio devem ser eficazmente ultrapassados pelos gestores para que possam desen- volver as suas capacidades de negociação globais. Comunicar e negociar junto de pessoas de diferentes nacionalidades, estratos e estilos de comunicação é um desafio primordial para os gestores. Ao refletir esses cinco itens elencados, é possível concluir que em uma economia globalmente integrada, as negociações entre pessoas de diferentes contextos culturais são cada vez mais frequentes. É por isso que negociar tornou-se uma função-chave para os gestores. Conforme enfatiza Boff (2011, p. 112): A negociação é uma ferramenta valiosa, para todos os profissionais, no cenário atual do mundo das organizações e dos negócios. Todos os profissionais negociam diversas coisas, o tempo todo, com seus clientes internos, externos, líderes e liderados, tais como, recursos humanos e financeiros, prazos, orçamentos, contratos, dentre tantas outras e, portanto, é de fundamental importância saber como abordar cada momento que envolve uma negociação para que se obtenham resultados positivos. Ainda, Pollan e Levine (1994, p. 6) enfatizam que a "negociação é, depois de ler e escrever, é a habilidade mais importante e necessária para alguém se tornar bem-sucedido pessoalmente, financeiramente e nos negócios". Desse modo, saber negociar tornou-se uma competência fundamental a todo líder e gestor. Tal tarefa é parte fundamental da atividade empresarial, conforme aponta Mintzberg (1973, p. 91): “embora possa até ser classificada por muitos como um trabalho não gerencial, trata-se de uma parte vital da função de um administrador”. FIGURA 2 – BASES CONCEITUAIS DA NEGOCIAÇÃO FONTE: . Acesso em: 8 jun. 2021. TÓPICO 1 — INTRODUÇÃO: NEGOCIAR É PRECISO 9 No dicionário, o termo “negociação” abarca sinônimos como negócio, transação, negociamento. De acordo com Rosalem e Santos (2007), o termo deriva do latim negocium, palavra formada pela junção dos termos nec (nem, não) + ocium (ócio, repouso). Negociar significa negar o ócio. Seu uso mais frequente, tanto no latim quanto no português, gira em torno de comércio, tráfico, relações comerciais, transação, combinação, ajuste. O termo está associado à estratagema ou truque para ganhar dinheiro com facilidade, oportunidade. No inglês, o termo equivalente negociate tem apenas o significado de transação comercial. A negociação como campo de conhecimento vem sendo explorado por diversas áreas de estudo, como Direito, Administração, Engenharia, Marketing, Secretariado. Godinho e Macioski (2005, p. 144) afirmam que “nas escolas de negócios e de direito, novas disciplinas têm sido criadas contemplando o estudo das técnicas de influenciar as pessoas, ensinando os futuros profissionais a discutir preços, normas, cláusulas e acordos, a persuadir, a conceder, a intimidar e a blefar”. No entanto, Teixeira, Fialho e Silva (2011) apontam que por mais que a palavra negociação seja conhecida, pode-se dizer com propriedade que o assunto “negociação” ainda é pouco desenvolvido no meio acadêmico, com muita pouca teoria e conceitos definidos. Vale ressaltar o estudo de Martinelli (2001), que analisou o estado da arte sobre o tema Negociação, identificando as diferentes visões de autores renomados, a partir de 14 definições referentes a 11 autores distintos. Portanto, as definições selecionadas mostraram-se significativas nas décadas de 1970 a 1990, tendo em vista que se tem três definições até 1980, cinco entre 1985 a 89 e seis conceitos entre 1993 a 1996. Os principais aspectos que caracterizam os conceitos de negociação estão apresentados no Quadro 1. QUADRO 1 – ASPECTOS DAS DEFINIÇÕES DE NEGOCIAÇÃO AUTOR ASPECTOS Cohen (1980) Obter vantagens Cohen (1980) Uso da informação e do poder Nierenberg (1981) Relacionamento humano Fisher & Ury (1985) Importância da comunicação Matos (1989) Busca de interesses comuns Matos (1989) Importância da participação no processo Steele att ali (1989) Movimento de posições divergentes para um acordo Steele att ali (1989) Uso da barganha no processo UNIDADE 1 — PRINCÍPIOS DE NEGOCIAÇÃO 10 Acuff (1993) Busca de um acordo Mills (1993) Negociamos sempre Gibbons & Mc Govern (1994) Importância da flexibilidade Hodgson (1996) Instrumento da satisfação das necessidades Robinson (1996) Negocia-se desde o dia em que se nasce Lewick et al. (1996) Negociação estratégia FONTE: Adaptado de Martinelli (2001) As pesquisas que surgiram nos últimos anos sobre a temática possuem seu foco na riqueza e complexidade das negociações. Por meio de diferentes perspectivas teóricas, estabelecem visões diferentes do processo de negociação. É possível dividir essas vertentes em estudo normativo, descritivo e prescritivo (BELL; RAIFFA; TVERSKY, 1989 apud PAULA; SOUZA, 2007). Conforme apresenta-se no quadro a seguir. QUADRO 2 – ABORDAGENS DA NEGOCIAÇÃO Abordagem Normativa Abordagem Descritiva Abordagem Prescritiva Modelar o processo assumindo um comportamento racional dos negociadores. O foco do estudo normativo é a elaboração de modelos formais da negociação que, a partir da hipótese de racionalidade dos negociadores, podem ser usados para facilitar a obtenção de compromissos estáveis e eficientes. Na abordagem descritiva, os pesquisadores estão interessados em entender e descrever o comportamento dos negociadores, com o foco nos aspectos comportamentais e na forma como as decisões são tomadas efetivamente. Esses profissionais se concentram na descrição e análise das percepções e comportamento dos negociadores e suas implicações no processo e nos resultados obtidos. Diferenças individuais, influências sociais e a influência do ambiente são discutidas nesta abordagem. O objetivo é prescrever o comportamento dos negociadores, de maneira que eles alcancem bons resultados durante a negociação e a excelência no processo, que normalmente é a abordagem considerada por cientistas comportamentais,culturais presentes no comportamento dos negociadores, na medida em que ocorram em uma situação concreta. 164 UNIDADE 3 — NEGOCIAÇÕES EM CONTEXTOS MULTICULTURAIS Estabelecemos uma definição: negociação é um processo através do qual duas ou mais facções que tenham interesses em comum e conflitantes expõem e discutem propostas explícitas acerca dos termos específicos para um possível acordo. Resultam dessa definição quatro tópicos em que semelhanças e diferenças devem ser consideradas: 1. Interesses comuns. 2. Interesses conflitantes. 3. Discussão. 4. Acordo. Os dois primeiros situam-se mais no nível das ideias. Os dois últimos estão mais no nível da ação. Os negociadores de ambos os lados devem estar conscientes de seus próprios vieses culturais na medida em que possam surgir nesses quatro aspectos do processo. No mundo atual, simplesmente não é possível que seja apenas responsabilidade de alguém (seja quem for este alguém) manter-se sensível aos padrões culturais, de modo que apenas esse alguém possa “compreender” e se adaptar às maneiras “estranhas” dos outros. Deve haver uma reciprocidade entre as pessoas no pavor ou no encanto pela cultura do seu adversário. A questão é mais abrangente. O negociador atual tem consciência dos vieses culturais de sua origem, assim como dos de seu oponente. Se, de fato, sabe negociar, pode administrar esses vieses na medida em que ocorram nos aspectos básicos da negociação. Consideremos os dois tópicos no nível das ideias: interesses comuns e interesses conflitantes. Afinal, esta é a razão pela qual os negociadores estão à mesa. Ambos têm interesses comuns e conflitantes. A questão é se as diferenças culturais fazem tanta diferença quando interesses importantes estão em jogo. Em geral, os interesses comuns transcendem às diferenças culturais e, até mesmo existem independentemente dessas diferenças. Os negociadores bem-sucedidos identificam esses interesses em termos de senso comum. Eles se perguntam: “o que temos em comum nessa situação?” Eles sabem, no fundo de suas mentes e do processo de negociação, que esses interesses comuns são típicos: o objetivo de lucro, evitar problemas a longo prazo, fazer “boa figura” diante dos familiares, deixar as portas abertas para futuras negociações etc. Essas semelhanças são transculturais e os negociadores bem-sucedidos não se esquecem delas. Ninguém se prejudica por lembrar-se ou ser lembrado de que compartilha de alguns interesses com os outros – isso é humano. Pelo simples fato de que as partes envolvidas, por definição, não se sentem muito à vontade nas negociações transculturais, esses interesses comuns têm que ser considerados e reconhecidos. Dar-lhes a ênfase adequada e permanente é responsabilidade que TÓPICO 3 — DESAFIOS DA NEGOCIAÇÃO 165 toca aos parceiros em uma negociação. Quando os interesses conflitantes são examinados, o negociador bem-sucedido não só encara os pontos em conflito como continuamente se questiona sobre se sua origem é “normal” ou devido às diferenças culturais. Devem-se esperar os conflitos normais acerca dos preços, controle de qualidade, prazos de entrega, planos de pagamento etc. A razão de sua presença é resolver esses problemas e atender aos interesses comuns. Alguns conflitos de interesse podem surgir de diferenças culturais, o que ambos os negociadores devem ter em mente. O perigo está em localizar erradamente a origem desses conflitos. Um fabricante ocidental de máquinas agrícolas, por exemplo, ao negociar com distribuidores indianos não deve presumir, gratuitamente, que o conflito é devido a questões de preço. A ênfase do indiano na competição e na necessidade premente pode, muito possivelmente, derivar de uma visão do mundo, baseada em sua experiência cultural de escassez e limitação de recursos. O conflito de interesses, neste caso, pode ser mais uma questão de experiências culturais de escassez e de fartura, que uma questão de preço para cada um dos contendores. Neste caso, como aliás na maioria dos casos de negociação, o requisito principal para o sucesso é a compreensão do ponto de vista do oponente. Devemos compreender claramente o modo de pensar e de agir de pessoas de diferentes países para que possamos distinguir as divergências verdadeiras daquelas que decorrem de vieses culturais. Em qualquer negociação, os conflitos de interesses podem ou não estar baseados em diferenças culturais. Os outros dois pontos que decorrem da definição de negociação estão no nível de ação: discussão e acordo. Esses termos se referem às técnicas de negociação, à maximização dos interesses comuns e à minimização dos interesses conflitantes, de modo que a negociação resulte em ganho para ambos os parceiros. Esses estágios de discussão e acordo são normalmente entendidos pelos negociadores em termos de quatro estágios em que na prática evolui uma negociação. Isso equivale a afirmar que, atualmente, quase todos os negociadores bem-sucedidos devem entender (e entendem) que as ações de desenvolvem em quatro fases. Um entendimento compartilhado dessas fases, independentemente das origens culturais, é aquilo que os negociadores têm em comum. Esses quatro estágios são os seguintes: 1) Abertura; 2) Exploração; 3) Apresentação e 4) Clarificação, Ação final, Avaliação e Controle. O que é culturalmente influenciado e, às vezes de muitos modos significativos, são as expectativas que os negociadores possam ter quanto à maneira “normal” de desenvolver o processo da negociação. A questão, que é responsabilidade de cada negociador, é verificar o que está ocorrendo em cada uma dessas quatro fases e as diferentes expectativas ligadas às diferenças culturais. 166 UNIDADE 3 — NEGOCIAÇÕES EM CONTEXTOS MULTICULTURAIS Na etapa de abertura (estabelecimento de uma relação pessoal adequada) os americanos, por exemplo, tendem a dispender muito menos tempo que os japoneses. Os japoneses têm a expectativa de que é normal dispender um tempo considerável e uma boa soma de dinheiro para estabelecer uma relação harmoniosa com aqueles com quem tencionam fazer negócios. Alguns finlandeses tenderão a comportar-se de um modo muito formal e silencioso nessa fase e esperam que o relacionamento e a fase de exploração evoluam numa semana. Os russos são notórios por misturarem negócios (e apenas negócios) com vodka. Para os japoneses é normal perguntar muito e falar o mínimo, e esse mínimo é dito de maneira ambígua na fase de exploração. Eles tendem a firmar suas intenções à medida que juntam as informações e ouvem as ofertas e propostas. Os alemães tendem a superestimar o entendimento técnico do parceiro, a serem mais diretos e francos nessa fase, o que, com frequência, faz os japoneses sentirem-se mal. Na fase de apresentação, pode parecer normal para muitos londrinos discordar abertamente na medida em que o oponente faça um esforço para moldá-los ou use técnicas agressivas – suas normas culturais estabelecem que o desacordo não atinge as relações pessoais e a persuasão agressiva é uma habilidade valorizada. Os japoneses, que já deram ênfase à etapa anterior, procuram evitar confrontações, tendem a não requerer nem esperar persuasão e, muito provavelmente, manifestarão um considerável silêncio nessa fase. Está claro que ninguém vai muito longe na negociação se tenta persuadir na base do estereótipo, confundindo o comportamento de vendedores de carros usados, antiquários e feirantes com uma negociação para valer. Há, então, o estágio final – Clarificação, Ação final, Avaliação e Controle. Os americanos, por exemplo, tendem a pensar que é normal fazer concessões ao longo do processo, de modo que a ação final para eles tenda a constituir-se num sumário dos itens em que foram feitas concessõesem termos de interesses conflitantes. Os japoneses tendem a fazer todas as concessões ao final do processo. Pode parecer aos outros que o acordo é feito de maneira abrupta e sem muita consistência. De modo diferente, os soviéticos, com frequência, ouvem as concessões do outro e depois procuram adiar o acordo por acharem que o tempo, inevitavelmente, trabalha a seu favor. É uma aplicação prática da teoria do materialismo dialético, segundo a qual o adversário fará ainda mais concessões se houver uma demora significativa. Quem está “certo” nessas ilustrações é algo que pode ser discutido eternamente – nunca haverá uma conclusão. O certo é que as pessoas de diferentes culturas têm diferentes expectativas sobre o que deva ser considerado comportamento normal na prática das várias fases do processo de negociação”. TÓPICO 3 — DESAFIOS DA NEGOCIAÇÃO 167 Flexibilidade e receptividade de um lado tendem a provocar sempre a reciprocidade no oponente. O negociador ágil vê contrastar essas diferenças culturais com o processo de negociação em si. Quanto mais os parceiros conhecem o processo, tanto mais podem tornar-se, mutuamente, conscientes das diferenças culturais quando elas surgirem e, então, poderão lidar adequadamente com elas. O entendimento é o nosso objetivo. Entender o processo de negociação. Estar alerta para as sutis diferenças. Os alemães usam a expressão: “Andere lande andere sitte” (cada terra tem seu uso). Os americanos preferem: “When in Rome, do as the Romans do” (em Roma aja à maneira dos romanos). Em negociação, justamente, aprende-se à maneira dos romanos, observando e ouvindo. FONTE: JUNQUEIRA, L. A. C. Negociação: tecnologia e comportamento. Rio de Janeiro: Suma Econômica, 1995. 168 RESUMO DO TÓPICO 3 Neste tópico, você aprendeu que: • A comunicação ocorre mediante uma mensagem que envolve a transmissão de conteúdos emocionais ou intelectuais, ou ambos, que são transmitidos pela linguagem verbal e não verbal. • A mesma mensagem (verbal ou não verbal) pode ter diferentes significados em diferentes culturas. • A linguagem pode ser uma chave que abre ou fecha portas. Utilizar uma palavra inapropriada ou produzir um gesto ofensivo pode resultar em ofensas irreparáveis. • A habilidade de comunicar-se é vital em uma negociação, sobretudo em negociações internacionais. • A negociação é considerada uma das softs skills mais relevantes e mais requisitadas atualmente, posto que as empresas adotam cada vez mais uma estrutura em linha staff, com a participação de diversos parceiros atuantes em suas operações. • A negociação do tipo integrativa está relacionada a um resultado que seja bom para ambas as partes é também conhecida como “ganha-ganha”. • A negociação do tipo distributiva é aquela em que uma das partes será privilegiada. Há uma competição e o interesse está em quem conseguirá mais vantagem à custa do outro, conhecida como “ganha-perde”. • A negociação estratégica vai além das negociações comuns, pois são fundamentadas na estratégia da empresa. • São exemplos de estratégias adotadas pelas organizações: inovação, diversificação, expansão, diferenciação, alianças e parcerias. Ficou alguma dúvida? Construímos uma trilha de aprendizagem pensando em facilitar sua compreensão. Acesse o QR Code, que levará ao AVA, e veja as novidades que preparamos para seu estudo. CHAMADA 169 1 As rodas de negociações propostas pela OMC (Organização Mundial do Comércio) representam oportunidades para os países participantes estabelecerem acordos e regras justas para transações comerciais. Sobre as negociações internacionais, avalie as asserções a seguir e a relação proposta entre elas. I- As negociações em âmbito internacional são revestidas de maior complexidade se comparadas às negociações domésticas. PORQUE II- Em negociações globais há uma série de macrofatores, como o clima político e econômico das regiões envolvidas. Assinale a alternativa CORRETA: a) ( ) As asserções I e II são proposições verdadeiras, e a II é uma justificativa correta da I. b) ( ) As asserções I e II são proposições verdadeiras, e a II não é uma justificativa da I. c) ( ) A asserção I é uma proposição verdadeira, e a II é uma proposição falsa. d) ( ) A asserção I é uma proposição falsa, e a II é uma proposição verdadeira. 2 Em visita ao Japão, o presidente do Brasil foi convidado a participar de uma solenidade em memória de centenas de pessoas que haviam sido mortas. Nesta ocasião, o presidente brasileiro vestia um terno preto, o que gerou um enorme desconforto no país que tem o branco como cor de símbolo do luto oficial. Tendo em vista este contexto, assinale a alternativa CORRETA: a) ( ) O presidente desconhecia a cultura do país. b) ( ) Os costumes associados ao luto na região são severos. c) ( ) O presidente desrespeita os mortos. d) ( ) Houve falha na construção do BATNA. AUTOATIVIDADE 170 3 A negociação é considerada uma das habilidades mais requeridas atualmente. Negociar é uma prática que faz parte do cotidiano das instituições. Sobre negociação, classifique V para as sentenças verdadeiras e F para as falsas: ( ) Todas as organizações, sejam elas públicas ou privadas, constantemente precisam negociar. ( ) As negociações empresariais não possuem relação com a estratégia delimitada pela organização. ( ) A negociação estratégica vai além das negociações comuns. ( ) Toda negociação é estratégica. Assinale a alternativa que apresenta a sequência CORRETA: a) ( ) V – F – F – V. b) ( ) V – F – V – F. c) ( ) F – V – F – V. d) ( ) V – V – V – V. 4 Um bom negociador, além de criar seu próprio BATNA, tentar descobrir o BATNA da outra parte. Para construção do BATNA é necessário seguir algumas etapas. Disserte sobre o processo de construção do BATNA. 5 O BATNA (best alternative to no agreement) é uma técnica de negociação que detalha o que seria um bom e o que seria um mau acordo. Um bom negociador jamais vai para uma rodada de negociação sem o BATNA. Diante deste contexto, classifique V para as sentenças verdadeiras e F para as falsas: ( ) Quanto menor a obrigação de uma parte em seu fechar o acordo mais forte ela será em uma barganha. ( ) O poder de uma negociação não está diretamente associado aos ativos de uma parte, e sim aos incentivos que ela tem (ou não) para estar em uma mesa de negociação. ( ) Quanto mais se entende as alternativas do outro lado melhor preparado para se negociar. ( ) A parte quem tem o BATNA mais forte é a parte que tem o maior poder de negociação. 171 Assinale a alternativa que apresenta a sequência CORRETA: a) ( ) V – F – F – V. b) ( ) V – V – V – F. c) ( ) V – V – F – V. d) ( ) V – V – V – V. 6 Depois de três derrotas consecutivas em eleições à Presidência da República, Lula declarou que só se candidataria pela quarta vez se sua campanha eleitoral fosse dirigida por um publicitário. Tal fato denota a preocupação com a figura que também é uma forma de comunicação. Dado este contexto, disserte sobre a relação da figura com a comunicação. FONTE: RODRIGUES, C. de C.; PÉREZ-NEBRA, A. R. A mudança na imagem do presidente Lula nas campanhas eleitorais à Presidência da República. Conexão-Comunicação e Cultura, v. 6, n. 12, 2007. 172 REFERÊNCIAS ACUFF, F. L. Como negociar qualquer coisa em qualquer lugar do mundo. 2. ed. São Paulo: Senac, 2004. 355 p. 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Acesso em: 8 jul. 2021.historiadores, psicólogos, sociólogos, antropólogos e cientistas políticos. Na abordagem prescritiva, o objetivo principal é desenvolver técnicas que direcionam os negociadores na maneira como eles devem se comportar. FONTE: Adaptado de Bell, Raiffa e Tversky (1989 apud PAULA; SOUZA, 2007) TÓPICO 1 — INTRODUÇÃO: NEGOCIAR É PRECISO 11 Como é possível observar no quadro exposto, o estudo normativo tem seu foco no estabelecimento de modelos formais da negociação que, a partir da hipótese de racionalidade dos negociadores, possibilitam a obtenção de compromissos estáveis e eficientes. O foco desse modelo é desenvolver técnicas que direcionam os negociadores na maneira como eles devem se comportar. Na abordagem prescritiva, o objetivo é prescrever o comportamento dos negociadores, de maneira que eles alcancem bons resultados durante a negociação e a excelência no processo. Na abordagem descritiva, os pesquisadores que geralmente são cientistas comportamentais, historiadores, psicólogos, sociólogos, antropólogos e cientistas políticos estão interessados em entender e descrever o comportamento dos negociadores, com o foco nos aspectos comportamentais e na forma como as decisões são tomadas efetivamente. Nessa abordagem, o foco está na descrição e análise das percepções e comportamento dos negociadores e suas implicações no processo e nos resultados obtidos. Diferenças individuais, influências sociais e a influência do ambiente são discutidas nesta abordagem (KERSTEN, 2002; NEALE; BAZERMAN, 1991). Vejamos outras definições sobre o tema. Os autores Fisher e Ury, (1985, p. 30) afirmam que a “negociação é um processo de comunicação bilateral com o objetivo de se chegar a uma decisão conjunta”. Para Brett (2000), negociação é uma forma de interação social, um processo em que duas ou mais partes tentam solucionar metas percebidas como incompatíveis. Sendo uma interação socialmente motivada entre indivíduos ou grupos com interesses divergentes e comuns, a negociação promove o confronto entre diferentes valores, visões e perspectivas do mundo. (SOBRAL; CARVALHAL; ALMEIDA, 2007). A negociação é o processo de buscar a aceitação de ideias, propósitos ou interesses, visando ao melhor resultado possível, de tal modo que as partes envolvidas terminem a negociação, conscientes de que foram ouvidas, tiveram oportunidades de apresentar toda sua argumentação e que o produto final seja maior que a soma das contribuições individuais (JUNQUEIRA, 1988, p. 5). Nesta mesma linha de raciocino, Acuff (1993) argumenta que negociação é o processo de comunicação com o propósito de se atingir um acordo agradável sobre diferentes ideias e necessidades. Também Carvalhal et al., (2012) enfatiza que a negociação surge como processo e forma de resolver conflitos para viabilizar os resultados desejados, visto que se gerenciar é administrar e liderar, a negociação deve ser um instrumento inseparável do cotidiano dos gestores. UNIDADE 1 — PRINCÍPIOS DE NEGOCIAÇÃO 12 Para Lewicki, Saunders e Barry (2014, p. 3), a negociação “é uma forma de tomada de decisão na qual duas ou mais partes discutem um assunto no esforço de resolver as diferenças relativas a seus interesses”. Segundo os autor, há quatro pontos caracterizam as negociações: 1) Toda e qualquer negociação envolve duas ou mais partes interessadas, um gerente pode negociar com seus colaboradores um breve recesso no final do ano, desde que a equipe possa deixar até dois colaboradores nos postos de trabalho. Os colaboradores podem entre eles definir quem serão os escolhidos para cumprirem o recesso dos demais. 2) Em toda negociação existe um conflito de interesses, sendo que uma parte deseja uma coisa e a outra parte uma outra coisa, isso é o conflito. No exemplo do recesso de final de ano dos colaboradores, um grupo pode desejar ficar e aproveitar o recesso do final do ano. O outro grupo, para a negociação não ter conflito, deveria ficar na semana do Natal, entretanto os dois grupos querem a mesma semana do final de ano. E agora? Temos um conflito. 3) As partes negociam deliberadamente. Usam argumentos para convencer a outra parte, evocam benefícios e tentam convencer o que a outra parte pode obter. No caso do recesso de final de ano, um grupo pode argumentar para convencer o outro grupo que no final de ano o recesso é menos atraente, que o outro grupo poderá curtir com a família o Natal com mais tempo, enfim, realiza-se toda uma justificativa para convencer as partes de que quem desfrutar do recesso no Natal terá mais benefícios que aqueles que fruírem do recesso no final de ano. As argumentações de uma parte podem convencer aqueles que desejam a mesma coisa, mas também podem contra-argumentar e esse processo dialógico da negociação é que vai dar as sustentações necessárias para que um grupo faça a opção pelo recesso da semana do Natal ou da semana do Ano Novo. 4) Quando o processo de negociação ocorre, as partes envolvidas esperam, em troca do que dão, receber aquilo que desejam e que acham ser justo. Há duas possibilidades de resultado do processo: ou há negociação ou não há, e quando não há, as partes podem perder. Já pensou se o gerente desiste do recesso de final de ano, por que a equipe não chegou a um denominador comum? Todos perderam. Entretanto, se a equipe chegar a um acordo que seja bom para todos, que haja concessões de ambas as partes, todos poderão fruir de um recesso de trabalho no final de ano. Para se tornar um bom negociador, é preciso não apenas conhecer os estilos de negociação e as estratégias adotadas pela outra parte, mas, sobretudo conhecer a si mesmo, o autoconhecimento e o controle emocional (inteligência emocional) são fatores decisivos durantes uma negociação. Também é preciso lembrar que nenhuma negociação é estática, podendo ocorrer imprevistos, posto que, o ser humano é dotado de sentimentos e emoções que se externalizam em suas práticas diárias e situações inesperadas podem ocorrer durante uma negociação. TÓPICO 1 — INTRODUÇÃO: NEGOCIAR É PRECISO 13 Essas situações são chamadas de entraves, a falta de controle emocional é reconhecida como um desses entraves ou bloqueios. Conforme afirma Pessoa (2009), problemas emocionais em uma negociação ocorrem quando envolve herança entre herdeiros; pensão alimentícia entre ex-cônjuges; empresários com viés competitivo, acostumados a tratar seus opositores com ar de inferioridade; ou ainda colaboradores de unidades diferentes da organização que não se admiram. Outro entrave é a falta de confiança, que ocorre em situações em que uma das partes possui um histórico de acordos ruins para outra parte. Ninguém negocia para perder, mas obviamente para se chegar a um con- senso alguém precisa ceder, isso muitas vezes ocorre pelo bem comum das partes. Para compreender a evolução do tema no decorrer da história vamos nos apropriar do texto de Robert Benjamin, “The Natural History of Negotiation and Mediation: The Evolution of Negotiative Behaviors, Rituals, and Approaches”. O autor traz uma importante análise quanto ao foco dado à negociação no decorrer da história. Observe a figura a seguir: FIGURA 3 – LINHA DO TEMPO FONTE: Adaptado de Benjamin (2012) De acordo com Benjamin (2012), assim como a linguagem e a comunicação evoluíram em resposta às mudanças ocorridas na sociedade, as abordagens de negociação também se adaptaram às mudanças. No início da história humana o foco da negociação está na sobrevivência. No século XVI renascimento a ênfase da negociação com mais consciência e estratégia. No século XVII a XIX período da revolução cientifica e iluminismo abordagem racionalista. Segundo Freitas (1994, p. 13-14), na pós-modernidade, as organizações já não podem mais lidar com os conflitos que emergem usando apenas o rigor da autoridade.À medida que as sociedades se tornam mais abertas; o poder, mais questionável; UNIDADE 1 — PRINCÍPIOS DE NEGOCIAÇÃO 14 as pessoas, mais reivindicativas, a participação nas decisões passa a ser considerada como um direito não só dos cidadãos, mas também dos membros da organização. É possível concluir que hodiernamente tornou-se mais complexo lidar com os assuntos culturais, sociais e políticos, o que requer um conhecimento maior no que diz respeito à psicologia e neurociência. Você já percebeu que negociar é uma arte. A forma como encaramos uma negociação está diretamente relacionado a nossa mentalidade, alguns profissionais percebem a negociação como um desafio árduo e demasiadamente difícil, já outros percebem a negociação como uma oportunidade de crescimento, circunstância ideal para estreitar relacionamentos e criar networking. O texto que você vai ler agora demonstra exatamente isso! Dois pontos de vista sobre negociação. NOTA Uma grande empresa da área de calçados, mundialmente conhecida tinha números e métricas formidáveis. Seu DRE e seu balanço patrimonial eram perfeitos: situação econômica e financeira em "timing" consonantes. E, então, o diretor de Marketing sugeriu que os seus dois melhores gestores de negócios participassem de um desafio. Chamados para uma reunião na sala do diretor, não conseguiam esconder as suas inseguranças. Com muitas dúvidas, receberam das mãos do diretor, o briefing contendo suas missões. A missão dos dois, basicamente era: vender todo o estoque de calçados. Eles seriam enviados à África, cada um em um período diferente: dois semestres, duas visitas distintas, com todas as despesas pagas, com suas famílias e uma equipe técnica, em datas distintas. Desafio aceito. No primeiro semestre, primeiro gestor partiu para um dos países africanos. O primeiro, chegou com dúvidas. Com a equipe, faziam muitas reuniões e trabalharam açabarcando uma grande área de trezentos quilômetros quadrados, pesquisando e fazendo levantamentos. Basicamente o trabalho foi sendo realizado. Terminando os seis meses, o primeiro chegou à empresa. Logo, enviaram o segundo e a segunda equipe. O trabalho foi o mesmo! Levantamento estatístico, planejamento de vendas, reuniões e muitas aventuras profissionais. O segundo voltou após seis meses. No fim de ano, a empresa reuniu os dois gestores para uma reunião com todos os investidores e sócios. Parecia a sala do "Aprendiz" (programa da rede Record, apresentado por Roberto Justus). Os dois, confiantes, estavam TÓPICO 1 — INTRODUÇÃO: NEGOCIAR É PRECISO 15 prontos para iniciarem suas explanações, com flip chart, data show e toda a tecnologia possível! O momento era crucial para definição de suas carreiras! Chegou a hora do primeiro gestor. E, assim, começou sua apresentação. Ele apresentou seus resultados: zero de vendas! Seis meses. Zero de vendas. Com os olhares esbugalhados, os sócios e investidores, acionistas da corporação, não acreditavam no que viam e escutavam! E ele deu sua explicação: "Ninguém usava sapato! Ninguém queria comprar algo inútil para eles. Achavam que era algo que não agregava, apesar de todos os esforços". Disse o primeiro. Obviamente, comentou que a promoção dos sapatos havia sido feita em uma área carente, com péssimo IDH etc. E terminou sua apresentação. O mediador, então chamou o segundo, sem comentar nada sobre a apresentação do primeiro. O segundo iniciou a sua apresentação. Com aquele sorriso de campeão, apresentou os histogramas do sucesso: 100% da produção semestral havia sido comprada pelo comércio de toda a área abrangida. Por que? E eis a resposta do segundo gestor: "Ninguém usava sapato". Surpreendentemente, os acionistas se levantaram e bateram salvas de palmas para o grande feito! O primeiro gestor teve de iniciar aulas de gestão com o segundo para corrigir seu desempenho. E o segundo recebeu louvável promoção! FONTE: . Acesso em: 30 mar. 2021. Caro acadêmico, aprenda mais sobre negociação assistindo o filme “O poderoso chefão”. DICAS FONTE: . Acesso em: 8 jun. 2021. UNIDADE 1 — PRINCÍPIOS DE NEGOCIAÇÃO 16 O filme é um clássico do cinema e conta com a atuação impecável do ator Marlon Brando no papel de Don Vito Corleone. Apesar da trama se desenvolver sobre o submundo do crime o filme traz diversas inspirações sobre etapas da negociação e comportamento dos participantes é possível observar técnicas de persuasão e exemplos do que não fazer na hora de negociar. O filme revela um dos pontos fundamentais de toda negociação o relacionamento das partes que inicia antes mesmo de sentar-se à mesa para se negociar. 4 VARIÁVEIS BÁSICAS DA NEGOCIAÇÃO: TEMPO, INFORMAÇÃO E PODER Este é um dos tópicos mais importantes desta unidade, pois o domínio das variáveis explicitadas a seguir determinará o desfecho de uma negociação. Existem três variáveis que influenciam uma negociação: o poder, o tempo e a informação; sendo importante ter pelo menos duas das três variáveis para efetivar a negociação (FISHER; URY; PATTON, 2005). Em negociações, essas variáveis são chamadas de tríade da negociação, conforme é possível observar na figura a seguir: FIGURA 4 – TRÍADE DA NEGOCIAÇÃO FONTE: . Acesso em: 8 jun. 2021. • Poder Vamos iniciar explicitando a variável poder. Não é uma tarefa simples conceituar o termo poder, mas sabe-se que o poder implica numa vontade de que nossa vontade prevaleça sobre o outro, sendo alcançado pela posição social, status, dinheiro, rede de contatos etc. TÓPICO 1 — INTRODUÇÃO: NEGOCIAR É PRECISO 17 FIGURA 5 – PODER FONTE: . Acesso em: 8 jun. 2021. O poder é um conceito estudado por filósofos, sociólogos e demais estudiosos. O mais notório deles foi o filósofo inglês Thomas Hobbes (1588- 1679), que enfatizava que todas as pessoas buscam o poder para assim utilizá- lo sobre os outros. Para Hobbes, as pessoas são egoístas e movidas pelo medo da morte e por ganhos pessoais, assim, o poder do homem está atrelado aos meios de que dispõe para alcançar o futuro, quer sejam esses meios naturais ou mesmo instrumentais. Desse modo, entende-se que as partes que envolvem uma negociação em muitos dos casos visam obter ganhos unilaterais, ou seja, em que apenas sua vontade prevalece. Martinelli e Almeida (1997, p. 24) mencionam que “ao contrário do que se pensa, tem-se mais poder do que se imagina. Ainda que não usem abertamente os poderes em uma negociação, é útil conhecê-los”. O poder significa impor uma vontade própria em uma relação social, a qual influencia diretamente na capacidade de determinar o comportamento do outro, mesmo havendo resistência de uma das partes. Este é o poder potencial, que em um processo de negociação, dependendo dos participantes, pode ser evidenciado por alguém. Essas variáveis ocorrem no dia a dia dos indivíduos e cabe, a cada um, explorá-las a fim de aproveitar as oportunidades surgidas (MARTINELLI; ALMEIDA 1997). Vejamos com mais detalhes cada um desses elementos. No que se refere ao poder, elemento constituinte e até mesmo determinante das relações sociais de negociação, Cohen (1980) destaca a inter-relação do poder com o próprio conceito de negociação como sendo o uso da informação e do poder, com o fim de influenciar o comportamento dentro de uma rede de tensão. UNIDADE 1 — PRINCÍPIOS DE NEGOCIAÇÃO 18 O poder implica em relacionamentos nos quais um lado domina o outro (COHEN, 1980). Tendo em vista a variável poder, Wanderley (1998, p. 165) afirma que “os negociadores devem identificar as fontes de poderde cada parte e determinar a relação de poder existente.” ► Poder: a palavra poder sugere uma ideia de superioridade, autoridade, capacidade de exercer controle, de ter direito sobre algo ou alguém. No entanto, o poder não deve ser um objeto em si mesmo, mas um meio para se chegar a um fim desejado. Dentro de limites razoáveis, e acreditando que se tem poder, é possível conseguir tudo o que se pretende, ou seja, é possível conseguir resultados por meio das pessoas, desde que se transmita confiança a elas. O poder compreende: poderes pessoais e poderes circunstanciais. Os poderes pessoais englobam poderes exclusivos da pessoa, são poderes natos, que independem do papel desempenhado pelo negociador, dos seus conhecimentos e das suas habilidades para lidar com pessoas. O poder pessoal compreende poderes, tais como: da moralidade, da atitude, da persistência, da capacidade persuasiva, da aparência, da vontade e da motivação. Já, os poderes circunstanciais, enfocam questões da situação, isto é, o momento, o tipo da negociação e a influência do meio sobre ela. O poder circunstancial compreende poderes, tais como: do especialista em determinado assunto, da posição que ocupa em determinada organização, da legitimidade, da concorrência, de investimento, de assumir riscos, de recompensa e de punição, de barganha e da competência. French e Raven (1959) descrevem cinco bases do poder que uma pessoa pode exercer sobre a outra. O poder é a extensão na qual uma pessoa pode influenciar outra para fazer algo. As bases do poder são apresentadas no quadro a seguir: QUADRO 3 – CINCO BASES DO PODER E INFLUÊNCIA INTERPESSOAL DE FRENCH E RAVEN E COMO ELAS PODEM SER UTILIZADAS BASE UTILIZAÇÃO Conhecimento Dar informações. Referência Fazer com que os subordinados gostem de você. Legítimo Obter um cargo ou título de nível hierárquico elevado. Recompensa Recompensar a observância Coerção Punir a não observância FONTE: Adapatado de French e Raven (1959) TÓPICO 1 — INTRODUÇÃO: NEGOCIAR É PRECISO 19 Spector (2012), em seu livro Psicologia nas organizações, explica as cinco bases do poder. Segundo o autor, o poder do conhecimento se baseia no conhecimento e na expertise do supervisor. Um subordinado provavelmente seguirá as instruções de uma pessoa que acredita ter um conhecimento ou expertise especial na área em questão. Lewicki Saunders e Barry (2014) atribuíram essas diversas formas ao que chamam de tipologias do poder, que são associadas aos poderes: especialista, de recompensa, coercitivo, legítimo e referente. Cada um desses poderes será detalhado a seguir: I- Poder Especialista: esse tipo de poder é inerente às pessoas que têm informações exclusivas e detalhadas sobre um determinado assunto. Imagine que um negociador tem uma informação privilegiada que os demais não têm. A partir dessa condição, o negociador que tem poder de especialista se concentra em guinar a negociação para aquilo que ele tem como ponto forte em seu favor. É importante também considerar que estamos falando de uma situação isolada em que alguém tem naquele momento uma informação que lhe dará maior condição de negociar, mas há casos em que negociadores são exímios especialistas, pois dependendo de algumas negociações ele se antecipa e procura verificar com aqueles que podem lhe nutrir de informações as quais ele usará em seu favor no processo de negociação. Como dica recomendamos que assista à série House of Cards (da plataforma Netflix). Lá, você observará que todos os episódios da série partem de um processo de barganhas para obtenção de poder. Apesar de se enquadrar em muitas das situações explicadas aqui, recomendamos que fique atento às tratativas em que há políticos e lobistas com poder especialista DICAS II- O poder de referência é a extensão na qual o subordinado gosta do supervisor e se identifica com ele. Uma pessoa tende a ser influenciada por outra a quem ela admira ou de quem gosta. Esse é um tipo que deriva daquilo que o negociador conquistou enquanto experiência adquirida e também por meio dos atributos: personalidade, atitudes éticas, integridade. Dessa forma, o responsável pelos processos de negociação pode obter o respeito dos demais participantes, tendo em vista todo o histórico de referências positivas que o negociar passou a obter por meio de sua conduta. UNIDADE 1 — PRINCÍPIOS DE NEGOCIAÇÃO 20 III- O poder legítimo é o poder inerente ao cargo do supervisor e provém da crença do subordinado de que o supervisor tem a autoridade ou o direito legítimo de estar no comando. O poder legítimo é quando alguém dentro de um processo de negociação responde hierarquicamente pelas negociações. É dado a ele a condição de atender tudo aquilo que está sendo discutido. Sua autoridade é chancelada pelo cargo ou função que ocupa em uma organização, assim todo o desenrolar do processo de negociação ficará a cargo daquele que tem como responsabilidade negociar dentro dos parâmetros desejáveis pela organização. IV- O poder de recompensa é a capacidade do supervisor de recompensar os subordinados com bônus, atribuições desejáveis, promoções a aumentos salariais. Esse é um tipo de poder em que as pessoas reconhecem o quanto o outro foi importante para que o processo de negociação pudesse ser concretizado. Certamente, há negociadores que não fazem uso dessa estratégia, até porque dependendo da ajuda concedida para alguns dos negociadores este é o trabalho da pessoa, portanto, ela não está muito preocupada em recompensar ninguém, por outro lado retribuir alguém que ajudou em uma grande negociação é importante, pois torna grato uma ação e fortalece os vínculos de parcerias. Certamente, novas negociações ocorrerão, e, certamente, aquela pessoa estará novamente no jogo e como tal ajudando a novas conquistas. As recompensas podem ser extrínsecas, como prêmios, bonificações, gratificações e outras, mas pode ser intrínseca, como a gratidão exercida perante à equipe de trabalho pelo bom trabalho desenvolvido no processo de negociação. V – O poder de coerção é a capacidade do supervisor de punir os subordinados com ações disciplinares, multas, demissão ou reduções salariais. Essa tipologia de poder está relacionada a punições, que em muitos dos casos inviabilizaram aquilo que foi amplamente pactuado pela equipe, que era atingir os objetivos em uma negociação. A coerção pode ser antes, durante ou depois da negociação acontecer. Antes, para fazer algum tipo de pressão caso as coisas não aconteçam como planejado, durante, quando o ato de negociar estiver ocorrendo, e depois, quando dependendo da situação resultante do processo o negociador não obteve aquilo que foi desejado. De acordo com Brito (2011), o poder no ato de negociar é determinado pela habilidade de influenciar pessoas ou situações, não abusando de autoridade, para não prejudicar o êxito no resultado. Ainda conforme Brito (2011), o poder pode ser definido com dez tipos dis- tintos, que podem influenciar a negociação, a pessoa pode possuí-lo e não usá-lo. 1. Posição – Hierarquia dentro de uma empresa, por exemplo, gerente e empregado. 2. Legitimidade – Posições de autoridade. O papa, por exemplo, para a igreja Católica. TÓPICO 1 — INTRODUÇÃO: NEGOCIAR É PRECISO 21 3. Conhecimento ou especialização – Não o fato de possuí-lo, mas o modo, como a pessoa usa e aplica-o. Você pode ser brilhante, e mesmo assim não ter poder. 4. Caráter – quanto mais íntegra e leal a pessoa for, maior poder ela terá em negociações. 5. Recompensa – pessoas que tem autonomia para conferir recompensas ou algo que seja visto pela contraparte como recompensa. 6. Punição – Aqueles que podem criar um resultado negativo para sua contraparte têm o poder de punir. Osgerentes, por exemplo, podem demitir o empregado. 7. Sexo – O tratamento com o sexo oposto pode conferir poder. O ponto decisivo da negociação acontecia quando a mulher tocava casualmente a mão ou o braço do homem. 8. Estilo comportamental – Você pode ter um ou vários. A) Analítico – orientado para o processo, metódico. B) Dirigido – orientado para a tarefa, para a meta, com enfoque no resultado final. C) Protetor – orientado para o relacionamento, para os sentimentos. 9. Nenhum poder – Em alguns casos, você pode conseguir o poder se abrir mão dele. Ex. Sequestrador. 10. Loucura – Isso pode soar engraçado, mas um comportamento estranho ou irracional pode conferir grande poder a uma pessoa. Ex.: Pessoas explosivas (MARTIN, 1982 apud Brito 2011). Caro acadêmico, você pode se profundar ainda mais neste assunto lendo o artigo “Rede de relações e poder de negociação: uma análise do caso citrícola brasileiro”, no link a seguir: https://www.scielo.br/pdf/gp/v8n3/v8n3a04.pdf. O estudo traz uma análise do desenvolvimento da rede de poder citrícola brasileira a partir das relações de recursos de poder. FONTE: PAULILLO, Luiz Fernando. Rede de relações e poder de negociação: uma análise do caso citrícola brasileiro. Gestão & Produção, v. 8, n. 3, p. 250-270, 2001. DICAS • Tempo O tempo é considerado o bem mais precioso que um ser humano possui. UNIDADE 1 — PRINCÍPIOS DE NEGOCIAÇÃO 22 FIGURA 6 – TEMPO FONTE: . Acesso em: 8 jun. 2021. ► Tempo: o tempo envolve a noção de presente, passado e futuro e nas negocia- ções está relacionado aos prazos disponíveis para as partes, com a oportuni- dade em que questões deveriam ser abordadas e com a duração da negociação O tempo está relacionado com a necessidade de o negociador tomar decisões estratégicas para: avaliar o prazo limite disponível para si mesmo, o prazo a ser disponibilizado para a outra parte, o momento oportuno em que as ques- tões devem ser abordadas e a duração da negociação (WANDERLEY, 1998). Prazos e limites exercem influência sobre decisões, deixando a parte pressionada em desvantagem, pois geralmente quando uma parte negocia sob a pressão do tempo, pode ficar emocionalmente abalada e realizar concessões que normalmente seriam evitadas em condições mais equilibradas. O tempo conforme citado por Ghisi (2006, p. 23), “[...] refere-se ao ponto de apoio para projetar o negócio e a consequente satisfação dos envolvidos. Implica o período durante pelo qual o processo de negociação acontece”. Sabe-se que o tempo é um fator importante para a negociação e para que tenha sucesso é preciso que ele seja analisado, acompanhado e controlado, sendo delimitado por quem negocia, podendo inclusive ser negociado. É notável que geralmente o desenrolar dos fatos acontecem quando o prazo estipulado está chegando ao fim, assim afirma Ghisi. A informação é uma das mais importantes ferramentas do processo de negociação. Ghisi afirma que quanto mais preparado, mais aumentam as chances de alcançar um melhor desempenho. Pode-se afirmar que ao obter informações consistentes e com fundamento sobre a outra parte, torna o processo de negociação um tanto quanto mais fácil inclusive para traçar estratégias tornando-as mais eficazes. • Informação A informação é o ato de informar-se, de ter um conhecimento amplo e bem fundamentado, tornando-o primordial ao processo de negociação (MARTINELLI, 2001). TÓPICO 1 — INTRODUÇÃO: NEGOCIAR É PRECISO 23 FIGURA 7 – INFORMAÇÃO FONTE: . Acesso em: 8 jun. 2021. A informação é uma questão chave no processo de negociações, ela pode garantir um fechamento desejável ou um baixo resultado – caso não tenhamos as informações necessárias. De acordo com Brito (2011), na negociação a informação representa uma parte essencial, pois: • O lado mais informado terá melhor resultado. • Prepare-se com antecedência, tendo consciência que a outra parte omitira informações no processo de negociação. 5 PROCESSO DA NEGOCIAÇÃO O processo de negociação é uma atividade planejada, que envolve a definição de algumas fases, procedimentos e atores específicos. Trata-se de um processo dinâmico, onde cada parte agrega novas informações, altera expectativas e modifica comportamentos. Assim como num jogo de golfe, em que o jogador seleciona o taco certo para cada jogada, o negociador precisa saber escolher as ferramentas adequadas a cada caso. Neste tópico, você identificará a negociação como processo, pois ela é composta por entradas e saídas. Conforme afirma Serrano (1988), ela é complexa por envolver a cooperação e também a competição, como opções que não constituem alternativas separadas, mas realidades interligadas e as motivações para estas alternativas surgem, muitas vezes, em simultâneo. A negociação como processo pode ser estudada quanto a vários aspectos, iniciamos os estudos quanto às etapas. Tendo em vista que a organização por etapas é mais facilmente assimilada quando separada cronologicamente. UNIDADE 1 — PRINCÍPIOS DE NEGOCIAÇÃO 24 O processo de negociação deve ser estruturado com base em diversos fatores, deve-se verificar qual é a posição em que se encontra, pois você pode negociar como cidadão, como consumidor ou cliente, ou ainda representando uma corporação. Assim, é necessária uma visão sistêmica para um melhor entendimento do contexto no qual se está inserido. Cavalcanti (2006) considera o processo de negociação sistêmico que inclui input e output. Os inputs caracterizam-se como as entradas: informações, comunicação, interesses, valores, entre outras, e são transformadas em saídas que sugerem as conquistas, concessões, decisão, satisfação, solução, acordo, entre outros. A negociação considerada um sistema de transformação de entradas (estímulos) em saídas(resposta). As entradas (ou estímulos) seriam os impulsos iniciais da negociação, por exemplo: a comunicação entre as partes, o uso da informação e do poder, os interesses comuns, entre outros. O processo seria a transformação desses impulsos citados em resultados, podendo ser caracterizado como a negociação em si. As saídas seriam o produto final da negociação, isto é, o acordo, a solução do conflito, as relações duradouras (CAVALCANTI, 2006, p. 41). FIGURA 8 – COMPONENTES DO PROCESSO DE NEGOCIAÇÃO FONTE: . Acesso em: 8 jun. 2021. Concessão significa permissão/consentimento é o ato de ceder. Nas negociações as concessões ocorrem quando uma das partes aceita rever uma posição adotada, de forma a atender aos interesses ou às demandas da outra parte. Já uma negociação sem concessão ocorre quando uma das partes não aceita ceder. NOTA TÓPICO 1 — INTRODUÇÃO: NEGOCIAR É PRECISO 25 Segundo Fisher e Ury e Patton (2005), quando há muitos membros em um grupo torna-se mais difícil chegar a uma concessão, quanto maior o número de participantes, mais complexa se torna uma negociação isso ocorre em conferências como das Nações Unidas em que mais de 150 países negociam. Chegou-se à compreensão de que o desafio de uma nação pode tornar-se um desafio global. Um problema climático em um país, por exemplo, pode afetar outras nações. A cooperação global é assim um imperativo do presente século. 6 MODELOS DE NEGOCIAÇÃO Hoje em dia é comum que as pessoas residam mais próximas umas das outras, em condomínios, apartamentos, localizados em cidades maiores e mais populosas, essa proximidade promove as relações, mas também os conflitos, há, portanto, a necessidade de se negociar. (BENJAMIN, 2012). Conclui-se que a intensificação das relações entre pessoas, entre empresas, entre nações, promove a negociação, que de acordo Lewicki, Saunders e Barry (2014), necessita de três razões para que ocorra, a saber: 1. A primeira delasestá relacionada divisão algo que é limitado. 2. A segunda ocorre quando é necessário produzir ou criar algo novo que não é possível fazer sozinho. 3. E a terceira razão é quando há disputas em que há pessoas desejando uma coisa enquanto outras desejam outras coisas. No próximo tópico você vai aprender mais sobre as bases conceituais da negociação. Lewicki, Barry e Saunders (2010) apontam sete características comuns a todas as situações de negociação, sejam as cotidianas, de paz ou de negócios: FIGURA 9 – ELEMENTOS DA NEGOCIAÇÃO FONTE: Adaptado de Lewicki, Barry e Saunders (2010) ^ UNIDADE 1 — PRINCÍPIOS DE NEGOCIAÇÃO 26 Ao examinar a figura exposta, é possível perceber que qualquer negociação possui seis elementos: (i) a presença de duas ou mais partes, que podem ser indivíduos, grupos ou organizações; (ii) um conflito de necessidades e desejos; (iii) voluntariedade, uma vez que as partes escolhem negociar, com a expectativa de que terão melhores resultados; (iv) concessões, pois se espera que as partes alcancem uma posição intermediaria às posições iniciais, mas podem haver soluções criativas, nas quais as partes não precisem necessariamente ceder; (v) a preferência por soluções personalizadas para resolver o conflito; (vi) a gestão dos elementos subjetivos, como motivações psicológicas, emoções e valores. Apesar de a negociação ser uma abordagem eminentemente sensata para resolver as diferenças que emergem, muitas pessoas têm resistência à negociação ou mediação. Conforme afirma Benjamin (2012), muitas pessoas, independentemente da cultura, continuam a ser dominados por uma resistência centenária e profunda com relação à negociação. Segundo o autor, existem quatro fontes primárias de resistência à negociação: neurobiológica, cultural, psicológica e moral, nas próximas unidades esse tema será profundado. A negociação, definida como comunicação feita com o propósito de persuasão, é a alternativa que guarda maiores possibilidades de reduzir o stress que os conflitos organizacionais provocam, é tida como o mais preeminente modo de resolução de conflitos em razão de seu baixo custo operacional (ou custo processual) e sua celeridade (GOLDBERG et al., 1992). Vejamos a seguir as funções da negociação, conforme aponta Pruitt (1981): • desenvolver acordos específicos, ou seja, determinar como as pessoas devem se comportar em certas situações; • estabelecer procedimentos e fortalecer o relacionamento das partes envolvidas no processo; • desenvolver políticas de longo prazo sobre papéis, obrigações e privilégios. Ainda, segundo o autor, um acordo sobre políticas gerais terá implicações sobre as múltiplas decisões específicas; mediar a mudança social que ocorre com a falência de estruturas e padrões tradicionais, resultante da alteração das circunstâncias, modificação das necessidades e transformação das relações entre membros e grupos organizacionais. Nesse sentido, podemos entender melhor a mudança na consideração do papel dos sindicatos brasileiros, isto é, a passagem do vilão/agitador/fazedor de greves para um interlocutor, que não pode mais ser ignorado no processo decisório das organizações, inclusive o Estado. TÓPICO 1 — INTRODUÇÃO: NEGOCIAR É PRECISO 27 As negociações distributivas (com resultado de soma zero) envolvem tipicamente uma questão única, divisível, como o dinheiro, por exemplo. São jogos “competitivos” de pura oposição de interesses, que envolvem disputas entre os dois lados, com soma zero: se um ganha, o outro perde (PESSOA, 2009). Negociações integrativas (com resultados diferentes de zero) envolvem muitas questões que diferem em importância para as partes, possibilitando ganhos mútuos que podem ser obtidos com compromissos ao longo ao longo das diversas questões. São jogos “cooperativos” que todos os jogadores ganham, ainda que não necessariamente as mesmas recompensas (PESSOA, 2009). 28 Neste tópico, você aprendeu que: RESUMO DO TÓPICO 1 • Os conceitos, características e os aspectos que envolvem uma negociação. • A negociação é um processo de comunicação bilateral com o objetivo de se chegar a uma decisão conjunta. • O processo de negociação é uma atividade planejada, que envolve a definição de fases, procedimentos e atores específicos. • Os componentes do processo de negociação são compostos por entradas e saídas. • O processo de negociação se constitui de três variáveis, presentes em toda e qualquer negociação, a saber: tempo, informação e poder, chamada de tríade da negociação. • Na literatura de negociação, um conceito é particularmente importante para uma preparação adequada: o BATNA (Best Alternative To Negotiation Agreement – Melhor Alternativa à Negociação de um Acordo). 29 1 A negociação é parte fundamental das atividades do dia a dia dos executivos, diretores, líderes e gestores e isso se deve a diversos fatores. Sobre as cinco razões-chave para que a negociação assuma uma importância crescente no mundo empresarial, associe os itens, utilizando o código a seguir: I- Globalização. II- Dinâmica do Negócio. III- Interdependência. IV- Competição. V- Informação. ( ) A mobilidade e a flexibilidade são hoje fatores imperativos no contexto atual do mercado de trabalho. ( ) Empresas multinacionais e transacionais se estabelecem como grandes players dominado determinados mercados, conseguindo economias de escala e grandes lucros. ( ) A velocidade e a disponibilidade dos dados e informação levam a que os gestores tenham que estar preparados para negociar em cima do acontecimento, no momento certo. ( ) Comunicar e negociar junto de pessoas de diferentes nacionalidades, estratos e estilos de comunicação é um desafio primordial para os gestores. ( ) O grau crescente de especialização e conhecimento do mundo empresarial implica que as pessoas estejam cada vez mais dependentes de outros, no fornecimento de partes de um serviço ou de um produto completo. Os gestores necessitam de saber promover os seus próprios interesses, e criar valor acrescentado para as suas organizações. Assinale a alternativa apresenta a sequência CORRETA: a) ( ) I – IV – II – III - V. b) ( ) V - III – II – I – IV. c) ( ) IV – I – V- III – II. d) ( ) II – IV – V – I - III. 2 Um conflito pode emergir de diferentes situações. Pode resultar em aprendizados ou dissoluções, dependendo da forma como foi gerenciado. Faça um texto dissertativo, explicando por que a negociação é considerada parte vital das funções de líderes e gestores hodiernamente. AUTOATIVIDADE 30 3 O processo de negociação constitui-se de três variáveis básicas: poder, tempo e informação. Essas variáveis ocorrem no dia a dia dos indivíduos e cabe a cada um explorá-las a fim de aproveitar as oportunidades que emergem (MARTINELLI; ALMEIDA, 1997). Escolha uma das variáveis e explique como em uma negociação a ausência ou a exploração da variável escolhida pode impactar na negociação 4 Estudo revela que um em cada três funcionários admite que sua companhia perde pelo menos 5 horas de trabalho semanais em conflitos entre pessoas de idade diferentes. Sobre as razões que antecedem o conflito, assinale a alternativa CORRETA: FONTE: . Acesso em: 21 jun. 2021. a) ( ) Dissensões – Falha na comunicação – Pensamento divergente. b) ( ) Trabalho em equipe – Pensamento convergente - Uniformidade de opiniões. c) ( ) Pesquisa - Clima – Cultura organizacional. d) ( ) Disputas – Medo – Concepções convergentes. 5 Toda relação humana é uma negociação, e não saber negociar pode custar caro. O processo de negociação deve ser estruturado com base em diversos fatores, tendo em vista que, dependendo do contexto, negociamos