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LÍNGUA BRASILEIRA DE SINAIS 
LIBRAS 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
AULA – 5 
 
INTERLÍNGUA — 
CARACTERIZAÇÃO, 
SEMELHANÇAS, 
INTERFERÊNCIA E 
FOSSILIZAÇÃO 
 
Prezado aluno, 
 
O estágio de interlíngua na educação de surdos é algo natural, pois a 
criança surda geralmente cresce rodeada por duas línguas e, ao entrar em 
contato com uma delas, não deixa de lado a outra, e vice-versa, tanto no processo 
de ensino-aprendizagem quanto em contextos comunicacionais do seu dia a dia. 
Neste capítulo, você conhecerá o conceito de interlíngua e sua relação 
com a educação de surdos e a Libras, vendo a diferença entre a estrutura dessa 
língua e a da língua portuguesa. 
 
Bons estudos! 
 
 
 
5. INTERLÍNGUA — CARACTERIZAÇÃO, SEMELHANÇAS, INTERFERÊNCIA E 
FOSSILIZAÇÃO 
De acordo com Capovilla, (2012), a interlíngua representa uma linguagem 
produzida por falante que não é nativo de uma língua ao iniciar o seu aprendizado e 
é caracterizada pela interferência da língua materna ou natural (L1) durante o 
processo de aprendizagem. Em alguns casos, a L1 possui um maior ou menor 
aproveitamento na formação de uma interlíngua, quando as habilidades linguísticas 
prévias da L1 encontram semelhanças na língua-alvo a ser aprendida. 
Se em algumas situações existe semelhança entre a L1 e a que será 
aprendida, em outras, pode ocorrer uma interferência entre elas e, 
consequentemente, na formação da interlíngua. Nesse último caso, há certa 
interferência ou ocorrência de formas de uma língua na outra, o que cria desvios 
perceptíveis na pronúncia, na formação de vocabulário, na estruturação de frases, 
etc. Já a fossilização (ou congelamento) seria a existência de erros ou desvios 
no uso da segunda língua (L2) que ficam internalizados nela e, por isso, são difíceis 
de serem reparados futuramente. 
5.1 Os estágios de interlíngua na aprendizagem da língua brasileira de sinais 
Capovilla, (2012), explica que do ponto de vista do sujeito surdo, deve-se ter 
em mente que existem diversos cenários em que a criança pode ser enquadrada, e 
cada um deles gera um tipo diferente de estágio de interlíngua. Veja no Quadro 1 
como funciona o cenário de aprendizado de uma L2 por uma criança ouvinte filha de 
pais ouvintes. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Quadro 1. Aprendizado de uma segunda língua por criança ouvinte, filha de 
pais ouvintes 
. 
Fonte: adaptada de Capovilla, (2003). 
Conforme Capovilla, (2012), nesse cenário, o qual é o mais comum de 
acontecer, independentemente do país, desde o nascimento, a criança ouvinte tem 
contato com sua L1 e, a partir da escolarização, começa a ter contato com sua L2. A 
partir desse ponto, ela utilizará sua L1 como interlíngua para desenvolver e aprender 
sua L2 no contexto de sala de aula. 
Se puder passar um período fora, em contato com os nativos da L2 que 
deseja aprender, será melhor ainda, mas, se isso não acontecer, ela ainda terá sua 
L1 sendo fortemente adquirida todos os dias no contato com os falantes de língua 
portuguesa. No Quadro 2, você pode ver como funciona o cenário de aprendizado/ 
aquisição de uma L2 por uma criança ouvinte filha de pais surdos. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Quadro 2. Aprendizado de uma segunda língua por criança ouvinte, filha de pais 
surdos. 
 
Fonte: adaptada de Capovilla, (2012). 
Nesse exemplo, há uma criança ouvinte que nasceu em um lar surdo e o seu 
único contato, na maior parte do dia, será com os pais. O ideal seria que pelo menos 
um dos pais fosse ouvinte, pois, assim, ela teria uma referência das duas línguas 
(português e Libras) no seu espaço de criação, o que resultaria em um ambiente 
bilíngue de aquisição de linguagem. Contudo, como seus pais são surdos, a criança 
pode ter ou não um maior contato com ouvintes, o que dependerá de cada caso — 
se ela fica parte do dia em uma creche ou somente com um dos pais em casa. Ao 
iniciar a escolarização, ela possivelmente apresentará algumas particularidades no 
uso da língua portuguesa, tanto na pronúncia como na escrita (caso ela já domine o 
alfabeto, o que é possível, por ele ser um elo importante para utilizar a datilologia em 
Libras). 
Ao iniciar a educação básica, em escola regular, ela certamente utilizará seu 
conhecimento da Libras como interlíngua para desenvolver a aquisição da língua 
portuguesa oral e escrita. Nesse ponto, em sala de aula, o profissional não deve 
confundir a dificuldade da criança em usar a língua portuguesa com algum problema 
de aprendizagem, pois as línguas de sinais possuem uma modalidade diferente das 
orais — as de sinais são de modalidade visuo-espacial; e as orais, de modalidade 
oral-auditiva. Com o passar do tempo, a criança filha de pais surdos (CODA, um 
acrônimo para Child ofDeafAdults), terá sua evolução na língua portuguesa de forma 
natural, tanto aprendendo em sala de aula como no contato com outros ouvintes, e 
 
 
 
continuará usando a língua de sinais, naturalmente adquirida, no contato com seus 
pais surdos. 
Veja no Quadro 3 como funciona o cenário de aprendizado de uma L2 por 
uma criança surda filha de pais surdos. 
 
Quadro 3. Aprendizado de uma segunda língua por criança surda, filha de 
pais surdos. 
 
Fonte: adaptada de Capovilla, (2012). 
Nesse caso, há o exemplo que representa os 5% de casos de crianças surdas 
que nascem em lar surdo, contra 95% daquelas que nascem em lar ouvinte. Ela terá 
acesso à língua de sinais desde o primeiro dia e, provavelmente, será matriculada 
em uma escola bilíngue para surdos, em que seu desenvolvimento da L1 será muito 
similar ao de uma criança ouvinte, que nasce em lar ouvinte, cresce rodeada de 
ouvintes e vai à escola para aprender em língua portuguesa. Para o filho surdo de 
pais surdos, acontece o mesmo, pois ele nasceu em um lar surdo, crescerá no meio 
da comunidade surda e irá à escola de surdos, onde assistirá as aulas sendo 
ministradas em língua de sinais. 
Quando esse aluno tiver que desenvolver a sua L2 (português), pois o ensino 
e o uso da Libras não substituem o aprendizado da língua portuguesa escrita, ele 
usará a sua L1 (Libras) como interlíngua para desenvolver sua escrita em L2. Pelo 
fato de as duas línguas serem de modalidades distintas, a construção do aluno 
surdo e do futuro adulto surdo dificilmente será igual ao de um ouvinte, cuja L1 é o 
português. 
 
 
 
Veja a seguir como é a escrita de uma criança surda filha de pais surdos, em 
um texto redigido por um aluno da 7a série do Ensino Fundamental: 
 
Fonte: adaptada de Bertó e Gabriel (2007). 
 
Nota-se que a construção desse aluno apresenta falta de acentuação em 
algumas palavras, dificuldade de concordância verbal e nominal, bem como pouco 
uso de artigos, preposições e conjunções. Nesse contexto, na opinião de Chaves e 
Rosa (2014): 
[...] enunciados curtos, vocabulário reduzido, ausência de artigos, de 
preposições, de concordância nominal e verbal, uso reduzido de diferentes 
tempos verbais, ausência de conectivos (conjunções, pronomes relativos e 
outros), falta de afixos e verbos de ligação, além de uma suposta colocação 
aleatória de constituintes na oração. [...] devido ao fato de os surdos se 
encontrarem em estágios do processo de ensino--aprendizagem de uma 
segunda língua, no caso o português, e porque a língua que o surdo tem 
como legítima e usa não é a mesma que serve como base ao sistema 
escrito, por ser um sistema visuomanual, portanto muito diferente do oral-
auditivo. (CHAVES E ROSA, 2014, p. 14). 
Entretanto, existe uma grande importância no uso da Libras como interlíngua 
na educação de surdos, principalmente, no aprendizado da língua portuguesa como 
L2. De acordo com Capovilla (2012), “a língua materna, de sinais, é que deve servir 
de ponte para a introdução do português. Mas, como as crianças custam a aprender 
Libras, ela tem sido uma ponte quebrada”. 
Quanto a uma criançasurda filha de pais surdos, o uso da sua L1 (Libras) 
como uma interlíngua para fazer uma ponte de aprendizado da língua portuguesa 
 
 
 
escrita é muito importante, bem como para ampliar seu vocabulário no momento em 
que ela usar a datilologia de palavras, tanto na produção de palavras que não 
tenham sinal como na visualização de alguém fazendo a datilologia. Nesse último 
exemplo, é comum o ouvinte que não sabe direito a língua de sinais usar muito o 
datilológico de palavras e, se o surdo tiver um vocabulário bom de palavras em 
português, ele conseguirá automaticamente fazer a ponte interlingual para o sinal ou 
o equivalente em significado em Libras. 
No Quadro 4, você pode observar como funciona o cenário de aprendizado de 
uma L2 por uma criança surda filha de pais ouvintes. 
 
Quadro 4. Aprendizado de uma segunda língua por criança surda, filha de pais 
surdos. 
 
Fonte: adaptada de Capovilla, (2012). 
Esse exemplo é o mais clássico e preocupante de todos, em que a criança 
surda nascida em lar ouvinte representa 95% dos casos no mundo. Nesse cenário, 
há os quadros mais graves de privação linguística, no qual a criança pode ficar anos 
sem exercitar a fundo algum tipo de linguagem humana, oral ou sinalizada. Além 
disso, ela dificilmente tem acesso à língua de sinais nos primeiros anos e, por mais 
que tenha acesso ao português oralizado pelos pais, não fará diferença, pois é surda 
e vê somente bocas se mexendo. 
Antes de chegar à educação básica, a criança já passou por diversos 
médicos especialistas, usa aparelho auditivo e faz terapia da fala com o 
fonoaudiólogo, e seus pais podem estar cogitando que ela faça uma cirurgia de 
implante coclear (se já não tiverem colocado o aparelho na sua cabeça antes dos 5 
anos). Essa criança surda que nasce em lar ouvinte, em geral, sofre com a falta da 
 
 
 
língua de sinais e a resistência dos pais em leva-la para conhecer a comunidade e a 
cultura surda. Os abalos psicológicos e emocionais que surgem na infância e se 
mantêm quando adulto, devem ser evitados, o que é possível ao possibilitar que a 
criança tenha acesso à construção de sua identidade como ser surdo. 
Ainda com base nesse cenário, ao chegar à educação básica, geralmente em 
escola regular, essa criança tem pouco ou quase nenhum conhecimento da língua 
portuguesa oral e escrita, por isso, é muito difícil criar uma interlíngua baseada no 
português para fazer uma ponte de aquisição da Libras. Na verdade, deveria ocorrer 
o contrário. 
Se a criança não tem base nenhuma de sua L1 (Libras), como ela fará a 
ponte de interlíngua? Seria o mesmo que deixar uma criança brasileira que ainda 
não domina o português oral e não sabe Libras para viver com uma família de 
surdos por um tempo, por exemplo, 5 anos, e dizer para ela usar a língua 
portuguesa como interlíngua para aprender a Libras. 
A relação de interlíngua que a criança surda pode criar, servindo como ponte 
entre a língua portuguesa e a Libras, é o sistema datilológico, em que saber o 
alfabeto em português é fundamental para aprender as configurações de mãos. Para 
ela usar sinais e a própria Libras independe de já conhecer o alfabeto, porém, mais 
tarde, esse conhecimento será necessário como um recurso de empréstimo 
linguístico, em que as palavras em português são utilizadas por empréstimo na falta 
de um sinal em língua de sinais ou para reforçar a sinalização. Por exemplo, o surdo 
faz o sinal de empoderamento e, logo após, usa o datilológico para reforçar 
exatamente a qual palavra aquele sinal se refere. 
 
 
 
Você pode ver, a seguir, como é a escrita de uma criança surda filha de pais 
ouvintes, em um texto redigido por um aluno da 7a série do Ensino Fundamental: 
 
Fonte: adaptada de Bertó e Gabriel (2007). 
Nota-se que, em comparação ao primeiro exemplo do texto, produzido por um 
aluno surdo filho de pais surdos, este, que é filho de pais ouvintes, tem uma 
construção de escrita mais fácil de compreender, e muito dessa diferença se deve a 
influência dos pais. 
Bertó e Gabriel (2007), cita que, algo muito importante nessa relação entre L1 
e L2 é ter em mente que a criança surda filha de pais ouvintes e a filha de pais 
surdos terão uma escrita do português mais enraizada na estrutura de produção da 
língua de sinais, que se caracteriza na sinalização por suprimir proposições e 
conjunções, bem como por ter outras formas de conjugar verbos, atribuir plural e 
gênero aos elementos da frase. Devido a isso, não se deve esperar que a escrita do 
sujeito surdo, ao chegar na fase adulta, seja muito melhor do que os textos que 
serviram de exemplos. 
Contudo, você pode estar se questionando que conhece um surdo que 
escreve muito melhor do que no exemplo citado. Cada caso é diferente, e todos os 
indivíduos têm sua própria bagagem de aprendizado ou vivência. Por isso, existem 
diferenças nas produções de escrita em português entre os surdos, sendo que 
alguns deles, inclusive, chegam muito próximo ao nível de um ouvinte, mas são 
 
 
 
exceções construídas por meio de uma boa capacidade intelectual e muito estudo 
da língua portuguesa escrita. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA 
BERTÓ, S.; GABRIEL, R. Problematizando a Escrita De Sujeitos Surdos Na L2 - 
Língua Portuguesa. SIGNO 2007. 
CAPOVILLA, F. C. Avaliando a competência de leitura de palavras em escolares 
surdos do ensino fundamental ao médio. 2012. 
CHAVES, G. M.; ROSA, E. F. O português na modalidade escrita como segunda 
língua para surdos: um estudo sobre o uso dos conectivos. uox – Revista 
Acadêmica de Letras--Português, Florianópolis, n. 2, p. 18-30, 2014.

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