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Uma proposta metodologica para a formacao continuada de professores na perspectiva historico

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Uma proposta metodológica para a formação continuada de 
professores na perspectiva histórico-social 
Francisco José Carvalho Mazzeu* 
 
 
RESUMO: O texto apresenta uma proposta para a formação de professores, 
baseada na pedagogia histórico-crítica. São apresentados três eixos básicos para 
orientar esse trabalho: domínio dos conteúdos escolares e formas de ensinar; 
estudo da concepção dialética; formação de uma nova atitude ético-política. A 
metodologia sugerida é similar àquela que os professores poderão usar com seus 
alunos. Procura seguir os cinco passos propostos por Saviani: a prática social, a 
problematização, a instrumentalização, a catarse e a prática social. 
Palavras-chave: Formação de professores, concepção dialética, pedagogia histórico-
crítica 
 
 
Apresentação 
O presente texto é um resultado e um instrumento de trabalho de uma equipe de 
pesquisadores que foi se constituindo em função de um referencial teórico comum: 
a perspectiva histórico-social. Com base nesse referencial, a equipe tem 
desenvolvido pesquisas sobre a formação de professores e sobre diferentes 
aspectos do processo de ensino na escola, com ênfase especial no ensino do 1º 
grau. 
Mais recentemente, a partir do início de 1995, a equipe vem realizando estudos 
sistemáticos sobre as idéias de Vigotski e seus colaboradores, através da leitura e 
da discussão de textos, alguns inéditos no Brasil, buscando identificar as 
implicações pedagógicas dessa corrente teórica. 
O próximo passo desse grupo de pesquisadores é envolver professores da rede 
pública, através de um processo de formação continuada, de modo que esses 
estudos possam ser aprofundados a partir das necessidades e dos desafios do 
cotidiano da escola e da sala de aula. Esse trabalho de formação continuada, dentro 
da perspectiva histórico-social, implica a elaboração não só de novos conteúdos a 
serem explicitados a partir dos textos de autores dessa corrente, mas de uma 
forma de atuar junto aos professores que esteja coerente com esses pressupostos 
teóricos. Pretendo que este texto seja uma contribuição nesse sentido e possa, 
portanto, estimular a reflexão de outros educadores que têm atuado ou pretendem 
atuar com base nesse referencial teórico. 
 
Alguns pressupostos teóricos 
A compreensão mais profunda do processo de formação de professores na 
perspectiva aqui adotada implica uma reflexão sobre o próprio significado do 
processo educativo, na sua relação com o processo mais amplo de constituição e 
desenvolvimento histórico-social do ser humano. 
A educação é um processo fundamental para o homem porque, ao contrário dos 
outros animais, o indivíduo humano não recebe na sua herança genética toda a 
herança acumulada pelas gerações anteriores no seu processo de ação sobre a 
realidade. 
Sendo assim, aquilo que caracteriza, de fato, um indivíduo humano, do ponto de 
vista histórico e social, é o seu ser genérico, ou seja, a herança cultural da 
humanidade, da qual esse indivíduo vai se apropriando ao longo de sua existência e 
que contribui para expandir. 
Como se constitui essa herança cultural? Através do processo de apropriação e 
objetivação que caracteriza a atividade humana (cf. Duarte 1993, p. 27 ss.). O 
homem, ao agir sobre a realidade, apropria-se dos elementos naturais, 
transformando-os em objetos humanos. Nessa atividade, cria conhecimentos e 
habilidades que permitem reproduzir esses objetos e produzir novos objetos. A 
cultura humana acumula-se tanto nos objetos em si quanto na linguagem (em suas 
várias formas) e nos usos e costumes. A história da humanidade tem se 
caracterizado por esse processo de apropriação subjetiva da realidade, na forma de 
idéias, conhecimentos, imagens etc. e na criação de objetivações (produtos gerados 
a partir dessas idéias ou de sua transformação). 
Também a história de cada indivíduo humano está marcada por esse processo na 
medida em que cada um precisa se apropriar da cultura acumulada pelas gerações 
anteriores, mas ao mesmo tempo precisa criar novas objetivações correspondentes 
às suas idéias e aos desafios de seu tempo. Cabe à educação propiciar que tal 
apropriação ocorra, bem como dotar o indivíduo de instrumentos para criar essas 
novas objetivações. 
Esse referencial possibilita compreender de modo articulado tanto o processo de 
aprendizagem do aluno quanto o processo de formação de professores e demais 
agentes da prática educativa. Freqüentemente, a análise da prática pedagógica tem 
se baseado em uma dicotomia na qual se separam o processo de aprendizagem do 
aluno e o processo de formação continuada de professores. Dessa dicotomização 
resulta a utilização de diferentes paradigmas teórico-metodológicos para analisar 
esses dois processos. Nesse aspecto, a situação atual da pedagogia parece 
semelhante à situação da crise apontada por Vygotski (1991, pp.259-450) na 
psicologia, no que se refere à falta de uma concepção teórica geral que dê conta 
das questões comuns às áreas específicas de conhecimento, possibilitando 
perceber, ao mesmo tempo, a unidade e a diversidade dessas áreas. 
Embora sem ignorar essa especificidade, é fundamental compreender os processos 
envolvidos na prática educativa de modo integrado, e analisá-los à luz dos mesmos 
pressupostos teóricos. A perspectiva histórico-social pode dar uma contribuição 
para essa tarefa, na medida em que possibilita compreender a aprendizagem do 
aluno como um processo ativo, sem secundarizar a ação mediadora do professor 
nessa atividade (a importância dessa ação fica clara, por exemplo, no conceito de 
"zona de desenvolvimento próximo" proposto por Vigotski). 
A formação continuada do professor, por sua vez, na perspectiva histórico-social 
toma como base a prática pedagógica e situa como finalidade dessa prática levar os 
alunos a dominarem os conhecimentos acumulados historicamente pela 
humanidade. Para conseguir que os alunos se apropriem do saber escolar de modo 
a se tornarem autônomos e críticos, o professor precisa estar, ele próprio, 
apropriando-se desse saber e tornando-se cada vez mais autônomo e crítico. 
Portanto, a formação continuada é analisada neste trabalho com base no conceito 
de humanização (cf. Duarte 1993, p. 57 ss.). Esse conceito, no meu entender, 
possibilita uma compreensão mais ampla e profunda dessa formação do que outros 
conceitos como o de profissionalização, quer essa profissionalização seja entendida 
sob um enfoque funcionalista (como uma equiparação do professorado a categorias 
profissionais com mais vantagens no âmbito da sociedade atual, como os médicos, 
por exemplo) quer essa profissionalização seja compreendida apenas como 
aquisição de uma postura prático-reflexiva ou crítico-reflexiva, na qual não seja 
dado o devido peso ao processo de apropriação, pelo professor, do saber 
acumulado historicamente. 
A humanização do trabalho docente implica uma ampliação da autonomia do 
professor e, ao mesmo tempo, uma apropriação, por ele, de conhecimentos, 
habilidades e valores fundamentais da cultura existente, bem como de 
conhecimentos necessários para assegurar aos alunos a apropriação ativa e criativa 
dessa cultura. Essa humanização está limitada por relações e formas de ação no 
âmbito da prática pedagógica, que refletem a influência de relações mais amplas, 
em outras instâncias da prática social. 
A separação entre significado e sentido do trabalho docente, separação essa que 
faz com que o professor e a escola muitas vezes percam de vista os fins sociais de 
sua existência, decorre de relações de dominação existentes na própria estrutura 
da sociedade. Apostar nas possibilidades da escola como instância que pode 
contribuir para uma transformação da sociedadenão significa retomar a crença 
ingênua na escola como "redentora da humanidade", mas buscar a identificação e a 
exploração de limites e possibilidades oferecidos pelas condições existentes para 
promover as transformações possíveis nessas condições. 
Esse processo requer, por parte dos educadores envolvidos na escola, um processo 
permanente e sistemático de reflexão. No entanto, tendo em vista esse caráter 
complexo e contraditório do processo educativo no qual os pólos opostos como as 
dimensões reprodutora e transformadora da escola, a apropriação e a criação se 
complementam em lugar de se excluir, entendemos que uma reflexão inspirada no 
pensamento dialético tem melhores condições de compreender os problemas do 
aprendizado escolar e da formação continuada de professores, e, 
conseqüentemente, encontrar soluções viáveis para esses problemas. 
Em síntese, o processo de formação continuada de professores que se está 
propondo aqui centra-se em três eixos básicos: 
• o domínio do saber acumulado no que se refere ao conteúdo escolar e às formas 
de ensiná-lo; 
• o domínio da concepção dialética como meio de desenvolver uma ação e reflexão 
autônomas e críticas; 
• a formação de uma postura ético-política guiada por sentimentos e valores que 
possibilitem ao professor utilizar esse saber acumulado como meio para o 
desenvolvimento pleno do aluno e para seu próprio desenvolvimento como ser 
humano. 
 
Propostas de ação 
A orientação metodológica a ser sugerida neste texto será baseada na discussão 
desenvolvida por Saviani (1984, p. 71) a propósito dos métodos de ensino, na qual 
o autor sugere uma seqüência de trabalho composta de cinco passos que se 
articulam. Esses "passos", sem serem encarados como fórmula ou orientação 
rígida, podem fornecer um importante subsídio para uma direção do processo 
pedagógico na perspectiva do desenvolvimento pleno de alunos e educadores. Essa 
seqüência tem servido de referência tanto para a elaboração de propostas para o 
ensino dos conteúdos escolares, quanto para a orientação do trabalho formativo 
com os professores, de modo que eles vivenciam nesse trabalho um processo 
análogo ao que poderão realizar com seus alunos. Os passos sugeridos pelo autor 
são: a prática social, a problematização, a instrumentalização, a catarse e a prática 
social. 
 
A prática social 
Dentro da perspectiva histórico-social, o conceito de prática social envolve o 
processo mais amplo através do qual a humanidade vai produzindo e reproduzindo 
as condições (materiais e ideais) e as relações sociais que possibilitam sua 
existência. Nessa perspectiva, a prática social do professor não se identifica com a 
prática cotidiana, nem com a experiência de cada indivíduo. A prática social tem 
como aspecto central exatamente a relação contraditória entre o cotidiano e o não-
cotidiano, bem como a relação entre a experiência de cada um e as experiências 
acumuladas pelo conjunto da sociedade ao longo de sua história. São essas 
relações contraditórias que estão no ponto de partida da formação de professores, 
uma vez que essa formação ocorre nessa prática social e não apenas no momento 
em que o professor recebe algum tipo de curso. Segundo Vieira Pinto (PInto 1982, 
p. 109): 
O educador deve compreender que a fonte de sua aprendizagem, de sua formação, 
é sempre a sociedade. Mas esta atua de dois modos: um, indiretamente, mas que 
aparece ao educando (futuro educador) como direto (pois é aquele que sente como 
ação imediata): é o educador, do qual recebe ordenadamente os conhecimentos. E 
outro, diretamente, ainda que apareça ao educando (futuro educador) como 
indireto, pois não o sente como pressão imediatamente perceptível: é a 
consciência, em geral, com o meio natural e humano no qual se encontra o homem 
e do qual recebe os estímulos, os desafios, os problemas que o educam em sua 
consciência de educador. 
Compreender a formação do educador nessa perspectiva conduz a uma abordagem 
da questão do saber desenvolvido pelo professor, na qual se busca superar tanto a 
negação desse saber, quanto uma valorização que não considera seus limites e 
acaba reificando esse saber. Nessa questão é fundamental a idéia de que a prática 
cotidiana do professor é movida pelo senso comum pedagógico, o qual é constituído 
de fragmentos de teorias, assimilados geralmente sob a forma de clichês. O senso 
comum acaba criando a ilusão de um domínio das "teorias" cujos elementos ele 
incorpora. O professor que está imerso na sua prática muitas vezes não percebe a 
necessidade de romper com essa relação imediata entre pensamento e ação, o que 
leva a uma rejeição da reflexão filosófica e das teorias educacionais mais 
elaboradas. O professor em formação assume, muitas vezes uma postura 
semelhante à do homem comum, o qual, segundo Vazquez (1968, p. 14), "vê a si 
mesmo como ser prático que não precisa de teorias; os problemas encontram sua 
solução na própria prática, ou nessa forma de reviver uma prática passada que é a 
experiência". 
Portanto, partir da prática social na formação de professores implica não só um 
conhecimento da experiência de cada professor, de sua memória, de seu saber 
prático, mas uma ruptura com a forma de pensamento e ação próprios do 
cotidiano. 
Uma das formas essenciais para promover essa ruptura consiste em levar o 
professor a se apropriar cada vez mais do saber acumulado historicamente, 
especialmente dos conceitos científicos e das formas artísticas de apreender a 
realidade. Vygotski (1979), ao analisar o processo de formação de conceitos, 
aponta essa função mediadora dos conceitos científicos na superação dos conceitos 
espontâneos. Luria (1990), a partir de pesquisa com adultos pouco escolarizados, 
mostra a importância dos conhecimentos elaborados, transmitidos na escola, para a 
superação da forma prático-utilitária de perceber a realidade. 
Como promover uma apropriação significativa do saber acumulado, por parte dos 
professores em formação? Como desencadear um processo de reflexão que supere, 
sem ignorar, a experiência cotidiana desses professores? 
 
A problematização 
Segundo Saviani (1985, p. 17) a necessidade de refletir filosoficamente evidencia-
se quando o ser humano se encontra diante de uma situação problemática: 
Com efeito, todos e cada um de nós nos descobrimos existindo no mundo 
(existência que é agir, sentir, pensar). Tal existência transcorre naturalmente, 
espontaneamente, até que algo interrompe o seu curso, interfere no processo 
alterando a sua seqüência natural. Aí, então, o homem é levado, é obrigado 
mesmo, a se deter e examinar, procurar descobrir o que é esse algo. E é a partir 
desse momento que ele começa a filosofar. O ponto de partida da filosofia é, pois, 
esse algo a que damos o nome de problema. 
A problematização, nesse sentido, precisa ser entendida não apenas como 
identificação das necessidades que a prática cotidiana coloca para o professor, e 
que são por ele captadas, ou como levantamento dos temas que emergem de sua 
experiência anterior ou de sua história de vida, mas também (e sobretudo) como 
criação de necessidades novas e como colocação de novos temas como objeto de 
sua reflexão, em função de necessidades da prática social. 
Esses temas e necessidades, para que possam romper com a forma cotidiana de 
apropriação (que o professor já possui), precisam ser apresentados não como algo 
natural, como simples "atividade" ou como informações, mas sim como situações a 
serem superadas, como objeto com o qual é preciso estabelecer uma relação 
consciente para que se possa apreendê-lo. 
A problematização implica levar o professor a tomar contato com os conhecimentos 
acumulados de uma forma tal que: 
- seja levado aconsiderá-los como produtos da atividade humana, como respostas 
encontradas e selecionadas (dentre um elenco de possibilidades) para resolver 
determinados impasses; 
- atue perante esses conteúdos movido pela necessidade de promover seu próprio 
desenvolvimento como ser genérico, isto é, como membro da comunidade humana 
e não como ser particular, movido apenas por interesses prático-utilitários; 
- perceba esses conteúdos como instrumentos necessários (tanto individualmente 
como coletivamente) para a libertação em relação a condições opressoras e para a 
ampliação das possibilidades de escolha em relação ao seu próprio futuro. Além de 
condição para a liberdade, é preciso mostrar que a apropriação de novos 
conhecimentos pode ser um momento de exercício dessa liberdade, na medida em 
que a apropriação efetiva de determinados conteúdos requer a realização de 
escolhas e a tomada de decisões. 
A formação de professores aqui proposta toma como ponto de partida os problemas 
enfrentados pelos professores na tentativa de assegurar o domínio efetivo do saber 
escolar pelos alunos. Parte, portanto, das próprias dificuldades de aprendizagem da 
criança, considerando-as como desafio cuja superação possibilita o crescimento do 
professor na medida em que revela suas próprias dificuldades, seja em relação ao 
conteúdo escolar, seja em relação aos procedimentos de ensino. Como explica 
Vieira Pinto (1982, pp. 21-22), 
O caminho que o professor escolheu para aprender foi ensinar. No ato do ensino ele 
se defronta com as verdadeiras dificuldades, obstáculos reais, concretos, que 
precisa superar. Nessa situação ele aprende. (...) A educação implica uma 
modificação de personalidade e é por isso que é difícil de se aprender, porque ela 
modifica a personalidade do educador ao mesmo tempo que vai modificando a do 
aluno. Desse modo, a educação é eminentemente ameaçadora. Ela consiste em 
abalar a segurança, a firmeza do professor, sua consciência professoral (que teme 
perder o estabelecido, que é o seu forte no plano da prática empírica) para se 
flexionar de acordo com as circunstâncias. A resistência do aluno ao aprendizado é 
um fator de modificação da consciência do educador, e não uma obstinação, uma 
incompetência. 
Provocar nos professores a necessidade de dominar conhecimentos e teorias, a 
partir do desafio de dar conta das dificuldades de aprendizagem dos alunos, já traz 
em si alguns pressupostos da maior importância para a perspectiva histórico-social: 
• que a finalidade principal do processo de ensino é dirigir a aprendizagem para 
assegurar uma efetiva apropriação do saber escolar; 
• que as dificuldades de aprendizagem não são uma "incompetência" do aluno, mas 
o produto de determinadas condições que podem ser alteradas; 
• que o professor pode ser o principal sujeito de sua própria formação, na medida 
em que for capaz de tomar sua prática como objeto de reflexão crítica. 
É importante ressaltar que a problematização aqui proposta não se limita a 
constatar as dificuldades de aprendizagem que o professor espontaneamente 
identifica no aluno, mas implica uma análise conjunta com o professor que 
contribua para alterar a própria visão que possui a respeito das dificuldades do 
aluno. Na alfabetização, por exemplo, é comum a identificação, pela professora, de 
dificuldades de aprendizagem em relação ao sistema ortográfico ou ao desenho das 
letras, deixando de perceber aspectos relacionados ao texto e às orações como um 
todo, tanto em termos de significado, quanto em termos de estrutura formal. 
A partir das dificuldades de aprendizagem, pode-se levantar as formas como os 
professores compreendem esses problemas. Nesse momento, surgem explicações 
que resultam das "teorias" que de fato estão orientando o trabalho em sala de aula. 
Pode-se explorar as incoerências desse saber próprio do senso comum, buscando 
seu núcleo válido e contrapondo esse núcleo válido aos elementos de diferentes 
ideologias que vão deixando suas marcas no discurso pedagógico, geralmente sob a 
forma de clichês esvaziados de significado. Esse núcleo válido envolve, por 
exemplo, a percepção da importância dos conteúdos para a formação do aluno e da 
ação do professor para a apropriação desse conteúdo. Esse núcleo válido (que 
precisa ser trabalhado com vistas a superar uma prática verbalista e mecanicista) 
é, muitas vezes, abafado pelo discurso escolanovista arraigado no senso comum 
pedagógico. 
Nessa reflexão sobre as dificuldades dos alunos, os professores podem perceber 
suas próprias dificuldades em relação a determinados tópicos ou componentes 
curriculares do ensino básico. Perceber e admitir essas dificuldades é um passo 
importantíssimo para elaborar uma nova postura perante os alunos e sua prática. 
Nesse processo de problematização, o debate entre professores é de vital 
importância, uma vez que no confronto de visões opostas, os interlocutores atuam 
como mediadores entre cada professor e os problemas sobre os quais se está 
refletindo, possibilitando a criação do que Vigotski denominou zona de 
desenvolvimento próximo, ou seja, cada professor no grupo poderá elaborar 
análises que não elaboraria sozinho e, a partir daí, realizar atividades que 
promovam e consolidem novos patamares de desenvolvimento intelectual. Note-se 
que esse resultado não decorre, de modo natural, da interação e do diálogo entre 
os professores, mas depende do objeto e da forma dessa reflexão e desse diálogo. 
Se não se toma como ponto de partida da reflexão os problemas essenciais da 
prática pedagógica, a interação entre professores pode se deteriorar em bate-papo, 
sem maiores conseqüências para um avanço do trabalho docente. A perspectiva 
histórico-social concebe a aprendizagem em termos de uma relação complexa de 
mediação das relações sociais (mais amplas e mais imediatas) na atividade do 
sujeito sobre objetivações, bem como de mediação dessas objetivações na 
comunicação e nas atividades coletivas. A concepção de aprendizagem proposta por 
Vigotski é, por vezes, erroneamente interpretada como um modelo centrado 
apenas no dialogismo e na interação social (entendida, geralmente no sentido 
construtivista, sobretudo como interação entre os pares). 
Entre as principais objetivações que possibilitam compreender e buscar a superação 
de situações problemáticas estão os instrumentos e os signos. A superação de 
problemas de aprendizagem exige que o professor se aproprie e crie instrumentos 
de trabalho (procedimentos, técnicas, materiais didáticos) e, ao mesmo tempo, 
desenvolva um discurso significativo, fundamentado teoricamente, que possibilite 
compreender esses problemas e reorientar a prática no sentido da superação deles. 
 
A instrumentalização 
A realização dessas atividades vai requerer a criação de novos procedimentos e, 
talvez, novos materiais didáticos, o que poderá exigir a busca de novos 
conhecimentos. 
A instrumentalização consiste nesse processo de apropriação dos instrumentos e 
signos produzidos pela humanidade, que fazem parte da herança cultural, e, ao 
mesmo tempo, de criação de novos instrumentos e signos. 
Essa herança cultural é constituída pelo saber (conhecimentos, informações, 
conceitos, idéias, normas etc.). No entanto, o domínio desse saber requer a 
assimilação de um saber-fazer (habilidades, técnicas, operações etc.). A utilização 
(ou não) desse saber implica, por sua vez, um envolvimento afetivo com ele e a 
adesão a valores que orientem sua utilização em benefício do desenvolvimento da 
humanidade e de cada indivíduo. É preciso assimilar uma postura perante o saber. 
Vale frisar que esses aspectos (conhecimentos, habilidades e valores) não estão 
desvinculados. Por exemplo, as habilidades podem serformadas através da própria 
assimilação de informações dependendo da maneira como essa assimilação é feita. 
Nesse mesmo processo, pelas relações que o professor estabelece com os 
conteúdos escolares e com as teorias educacionais, mediado pela sua relação com 
os colegas, com a direção e o sistema escolar, bem como com a sociedade como 
um todo, é que se mudam e se consolidam valores e sentimentos que vão ajudar a 
orientar suas ações no cotidiano da sala de aula e, até mesmo, em outras situações 
da prática escolar e da prática social mais ampla. 
Como esperar que um professor desperte o interesse dos alunos pela busca do 
conhecimento, se ele apenas receber informações de outros agentes educacionais 
ou de "especialistas" com a orientação de assimilar e aplicar na sua prática? 
O desafio da instrumentalização aqui proposta consiste em levar o professor a 
elaborar seus próprios instrumentos e seu discurso, através da apropriação da 
produção de outros. O caminho para conseguir isso seria articular essa 
instrumentalização com a reflexão sobre os problemas e as necessidades de uma 
prática, que pretende assegurar o sucesso escolar e, ao mesmo tempo, propor 
procedimentos, materiais didáticos e textos de fundamentação teórica que 
respondam às necessidades dessa prática e não se baseiem em condições 
idealizadas de trabalho. 
Portanto, o discurso pedagógico resultante de uma teoria educacional e os meios de 
ensino coerentes com essa teoria, para que sejam apropriados pelo professor como 
instrumentos de superação dos limites da prática cotidiana e do senso comum, 
precisam estar atuando como mediadores na relação desse professor com sua 
prática e com seus alunos. Isso só é possível na medida em que forem trabalhados 
de modo sistemático e constante, a fim de que se incorporem de modo irreversível 
ao pensamento e à ação do professor, passando a fazer parte, por assim dizer, "de 
sua natureza". Para designar o momento em que ocorre efetivamente essa 
internalização, pelo indivíduo, de conhecimentos acumulados socialmente, Saviani 
(1984, p. 75) utilizou-se do conceito de catarse. 
 
A catarse 
Saviani (1984, p. 75) conceitua a catarse utilizando a definição de Gramsci, para 
quem a catarse significa a "elaboração superior da estrutura em superestrutura na 
consciência dos homens". Trata-se da constituição de uma espécie de "segunda 
natureza", isto é, são formas de pensar e agir produzidas histórica e socialmente, 
que se incorporam de tal maneira na estrutura psíquica do indivíduo que as utiliza 
que aparecem como formas naturais, mas que na verdade resultam de um longo 
processo educativo. 
Essa internalização do pensamento, do conhecimento e do discurso dos outros não 
constitui, neste caso, uma socialização na qual o indivíduo tenha que sacrificar seus 
impulsos e valores para se ajustar à sociedade, mas uma criação, no indivíduo, de 
impulsos cada vez mais humanos que possibilitam a formação de uma verdadeira 
autonomia. 
Para que esse momento da catarse realize-se na formação do professor, é essencial 
que os conhecimentos, as habilidades e os valores dos quais ele se apropriou, por 
meio da instrumentalização, sejam trabalhados de modo reiterado a fim de 
constituírem automatismos. Por essa razão, a formação continuada de professores 
precisa buscar a irreversibilidade das mudanças provocadas na reflexão e na ação 
dos sujeitos envolvidos, o que demanda tempo e um esforço contínuo. 
É importante ressaltar também que a formação de automatismos na perspectiva 
aqui esboçada ocorre de forma consciente e reflexiva. Um dos procedimentos 
fundamentais para esse processo é o momento em que, após conquistar um novo 
patamar em termos de domínio de conceitos e de formas de ensino, o professor 
reflete sobre a trajetória seguida, percorrendo novamente, no plano abstrato, o 
caminho que realizou. Com isso, percebe mais claramente as possibilidades e os 
obstáculos de seu processo de aprendizagem e, portanto, a necessidade de estar 
constantemente revendo e aperfeiçoando sua forma de aprender. Com isso espera-
se que cada professor busque se tornar efetivamente o sujeito principal de sua 
formação. 
 
A prática social 
Como explica Saviani (1984, p. 76), "(...) a prática social referida no ponto de 
partida (primeiro passo) e no ponto de chegada (quinto passo) é e não é a 
mesma". É a mesma no sentido de que a transformação das formas de pensar e 
agir em face dos conteúdos escolares (a partir de sua apropriação em atividades 
universalizantes, conscientes e livres) não significa uma transformação das 
condições sociais objetivas da escola e muito menos da sociedade como um todo. 
Essa transformação precisa se dar em todas as instâncias da prática social, 
especialmente no âmbito da produção da existência material. Ao mesmo tempo, a 
prática social já não é a mesma uma vez que professor e alunos transformaram-se 
nesse processo, o que se reflete nas outras instâncias da sociedade. 
 
Considerações finais 
A reflexão desenvolvida neste artigo baseou-se em estudos e experiências de 
formação básica e continuada de professores. Atualmente, essas idéias estão 
servindo de base para ações de formação continuada que estão sendo 
desenvolvidas em diferentes municípios da região de São Carlos (SP). 
Dado o caráter recente da divulgação do pensamento de Vigotski e outros no Brasil 
e o caráter incipiente da pesquisa de suas implicações pedagógicas, considerei 
importante apresentar o presente texto ainda que este se constitua apenas um 
esboço para a formulação de uma proposta mais detalhada de formação de 
professores. No entanto, essa proposta precisa resultar de uma articulação com 
experiências mais sistemáticas e do intercâmbio com diferentes pesquisadores 
preocupados com o mesmo tema. 
 
 
A methodological proposal for teachers permanent formation according to 
a social-historical perspective 
ABSTRACT: This article aims at presenting a proposal for teaching teachers based 
on the historical-critical pedagogy. It presents three basic aspects: knowledge of 
the school curriculum and methods of teaching; knowledge of dialectic; construction 
of a new ethical-political attitude. The proposal is based on the five steps as 
suggested by Saviani: social practice; problem setting; acquisition of the contents 
as instruments of action; catharsis and social practice. 
 
 
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* Unesp/Araraquara

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