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PSIQUIATRIA Casos Clinicos e

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Casos Clínicos 
em Psiquiatria Sumário
Editorial..................................................................................................1
Auto-relatos
Minha amiga, a morte ...............................................................................3
Síndrome de Stevens-Johnson com carbamazepina ................................7
Artigos Originais
Dependência de álcool por automedicação de 
substância fitoterápica ..............................................................................10
José Antonio Zago, Sérgio Augusto Monteiro dos Santos, Paulo Ségio Rocha Pereira,
Josi Aparecida Sartonelli Miranda de Araújo
Esquizofrenia paranoide y trastorno delirante con trastornos
sensoriales: dos entidades con límites imprecisos....................................13
P. Álvarez Mas, P. Sierra San Miguel, L. Livianos Aldana, L. Rojo Moreno
Arthur Bispo do Rosario – biografia clínica ............................................16
Maria Clara Queiroz Corrêa
Psicanálise, neurociências e posição autista-contígua: contribuição
para um desenvolvimento na teoria e na técnica psicanalítica ..................26
Sebastião Abrão Salim
Sessão Especial de Casos Clínicos 
XIX Congresso Brasileiro de Psiquiatria...................................................31
Coordenação: Hélio Elkis, Maurício Viotti Daker 
Apresentação: Valentim Gentil
Casos Literários
Trovas psíquicas ........................................................................................83
Oswaldo Soares da Cunha
O último monólogo de Nietzsche ............................................................86
Ataulpho da Costa Ribeiro
Patografia
Felipe II, un hombre irresoluto, mágico, coleccionista y depresivo ......91
Francisco Alonso-Fernández
Caso Histórico
A ilusão de “sósias” em um delírio crônico sistematizado......................96
J. Capgras, J. Reboul-Lachaux
Index CCP ............................................................................................97
Normas de Publicação ................................................................99
Casos Clin Psiquiatria 2001; 3(1,2):1-99
UMA PUBLICAÇÃO DO Departamento de
Psiquiatria e Neurologia da Faculdade de
Medicina – UFMG, da Residência de Psiquiatria
do Hospital das Clínicas – UFMG e da Associação
Acadêmica Psiquiátrica de Minas Gerais –
AAP-MG, federada da Associação Brasileira de
Psiquiatria – ABP
Editor Geral
Maurício Viotti Daker
Diretor Executivo
Geraldo Brasileiro Filho
Comissão Editorial
Alexandre Lins Keusen • Alfred Kraus • Antônio Márcio
Ribeiro Teixeira • Betty Liseta Marx de Castro Pires •
Carlos Roberto Hojaij • Carol Sonenreich • Cassio
Machado de Campos Bottino • Cleto Brasileiro Pontes •
Delcir Antônio da Costa • Eduardo Antônio de Queiroz
• Eduardo Iacoponi • Erikson Felipe Furtado • Fábio
Lopes Rocha • Flávio Kapczinski • Francisco Alonso-
Fernández • Francisco Baptista Assumpção Jr. •
Francisco Lotufo Neto • Hamilton Miguel Grabowski •
Hélio Durães de Alkmin • Helio Elkis • Henrique
Schützer Del Nero • Irismar Reis de Oliveira • Jarbas
Moacir Portela • Jerson Laks • John Christian Gillin •
Jorge Paprocki • José Alberto Del Porto • José Carlos
Rosa Pires de Souza • José Raimundo da Silva Lippi •
Luis Guilherme Streb • Luiz Alberto Bechelli Hetem •
Michael Schmidt-Degenhard • Marco Antônio Marcolin
• Maria Elizabeth Uchôa Demichelli • Mário Rodrigues
Louzã Neto • Miguel Chalub • Miguel Roberto Jorge •
Osvaldo Pereira de Almeida • Othon Coelho Bastos Filho
• Paulo Dalgalarrondo • Paulo Mattos • Pedro Antônio
Schmidt do Prado Lima • Pedro Gabriel Delgado •
Ricardo Alberto Moreno • Roberto Piedade • Ronaldo
Simões Coelho • Sérgio Paulo Rigonatti • Saulo Castel •
Sylvio de Magalhães Velloso • Talvane Martins de
Moraes • Tatiana Tscherbakowsky de Guimarães Mourão
Editora
Cooperativa Editora e de Cultura Médica Ltda (Coopmed)
Capa, projeto gráfico, composição eletrônica e produção
Folium Comunicação Ltda
Periodicidade: semestral
Tiragem: 5.000 exemplares
Correspondência e artigos
Coopmed
Casos Clínicos em Psiquiatria
Av. Prof. Alfredo Balena, 190
30130-100 - Belo Horizonte - MG - Brasil
Fone: (31) 3273 1955 Fax: (31) 3226 7955
E-mail: ccp@medicina.ufmg.br
Home page: http://www.medicina.ufmg.br/ccp
Capa:
Marinha de Arthur Bispo do Rosario, montagem.
Desde que a Medicina deixou de ser uma prática mágico-
esotérica para se tornar uma atividade lógico-racional, ainda
que pré-científica, a necessidade de se limitar o fenômeno mór-
bido de que se tratava se impôs. Com efeito, já nos primórdios da
Medicina, ainda entre babilônios e egípcios, havia uma preocu-
pação com a diagnose, maneira de se delimitar o problema da
perda da saúde e do bem-estar. As tábuas cuneiformes e os papi-
ros ensinavam como se chegar à diagnose. Claro que de manei-
ra muito empírica, pois tudo era baseado apenas na observação
e na experiência transmitida. Mas o que importa é que já havia
a compreensão mais ou menos estabelecida de que existiam mui-
tas espécies de doenças e que era preciso saber de que mal se tra-
tava quando diante de um doente. A escola hipocrática de Kós e
a escola de Cnidos, entre os gregos, criaram a propedêutica como
primeira ação do médico. A propedêutica (“conhecimento pré-
vio”) era justamente a prática das técnicas diagnósticas, eviden-
temente muito precárias aos olhos de hoje, mas quando manda-
va observar a cor da pele ou as características da urina estavam
sendo estabelecendos os rudimentos de uma semiologia. Os
romanos (Celso, Galeno, Areteu) e os árabes (Avicena,
Averróis) continuaram na mesma direção. Quando a Medicina
se tornou uma atividade científica, no fim do século XVIII e
durante todo o século XIX, a idéia de que a diagnose era parte
indissolúvel da prática médica já estava consolidada. A classifi-
cação das enfermidades com a decorrente semiologia fazia parte
da ideologia taxonomista que criou a Botânica de Lineu e a
Zoologia de Cuvier. É oportuno lembrar que a primeira classifi-
cação de doenças veio na primeira edição da Enciclopédia
Britânica – meados do século XVII – feita por Cullen, o criador
do termo “neurose” (doença sine materia).
No final da década de 60 do século XX, o movimento da
contracultura com sua contestação universal, sua aversão a
tudo que era estabelecido, seu horror ao exercício do poder em
função de um saber, não poderia deixar de atingir a Medicina.
A Medicina como atividade científica e tecnológica e o “poder
médico” passaram a ser questionados, por vezes de maneira
assaz acirrada. Mas como não se pode anular a Natureza por
um ato de vontade, em pouco tempo tais idéias tiveram de se
retirar da Medicina. A idéia de que a diagnose era um rótulo,
que era expressão do jugo médico, que era uma criação do apa-
relho ideológico repressor da Medicina, uma criatura sociocul-
tural, não pôde subsistir por muito tempo. Claro, como mostra
a história das idéias e das mentalidades, um resíduo bom e útil
ficou. O aparecimento da Psicologia Médica, da concepção psi-
cossomática das doenças, o advento da Medicina Social e
Comunitária, o estudo da ideologia médica muito devem ao
ideário da contracultura e do movimento de contestação, ainda
que desde o final da Segunda Guerra Mundial tal fermento já
existisse na Medicina. 
Repelidas da Medicina pela própria natureza do fenômeno
da enfermidade e do sofrimento físico, tais idéias encontraram
enorme guarida na Psiquiatria. A diagnose em Psiquiatria pas-
sou a ser violentamente contestada como a mais lídima expres-
são de tudo aquilo que oprimia o ser humano e o colocava sob a
guante do poder. O diagnóstico em Psiquiatria passou a receber
Editorial
inúmeros epítetos desairosos: medieval, opressor, desumano (no
sentido de não respeitar a individualidade e o sujeito). Como
não existiam doenças mentais, não se poderia delimitar as espé-
cies patopsíquicas. A doença mentalnão era um fenômeno bio-
psicossocial existente na Natureza e na Cultura, mas uma mera
criação histórico-cultural e política a serviço da opressão do
homem pelo homem. Num primeiro momento, o patrulhamento
ideológico daí decorrente foi devastador: os médicos recuaram e
quase permitiram às demais profissões de saúde virem para o
proscênio. Se a propedêutica não existia e o tratamento nada
mais era do que restaurar a dignidade do paciente solapada pela
usurpação política de sua condição humana, o médico passava a
ser o “trabalhador de saúde”, membro da equipe horizontal de
saúde, por vezes até desimportante. A existência em Psiquiatria
das “variações anormais do modo de ser”, além das doenças
mentais propriamente ditas, corroborava, em parte, tais idéias.
Como o modelo médico podia ser aplicado de maneira mais ou
menos precisa às demências, às oligofrenias e às psicoses mais
importantes – e a Psiquiatria Biológica está, cada vez mais,
mostrando isto – tais situações clínicas acabaram sendo preser-
vadas na desconstrução geral. Mas algumas psicoses, as neuro-
ses e as psicopatias (transmudadas para transtorno de persona-
lidade) não escaparam. As doenças viraram “transtornos” e as
entidades clínicas “estados”. Tudo isso pode ser aceito desde que
alguns postulados imperem: 1) existe um fenômeno ao mesmo
tempo biológico e sociocultural que expressa uma alteração do
sistema nervoso e um padecimento anímico do homem; 2) essa
alteração do sistema nervoso pode ser anatomopatológica ou
fisiopatológica; 3) a demonstração de tal alteração não elimina a
coexistência com a dimensão histórico-cultural e sociopolítica
do homem, ou seja, a Psiquiatria não se reduz a uma Neurologia
Cognitiva e do Comportamento; 4) a diagnose é uma peça fun-
damental na prática da Psiquiatria, pois delimita o campo onto-
lógico onde se passa fenômeno biopsicossocial; 5) essa delimita-
ção é condição fundamental para que o fenômeno, que é sempre
um padecimento, possa ser debelado.
Assim, podemos entender plenamente o que é um “caso”
em Psiquiatria. O caso clínico nada mais é do que a reunião de
uma série, maior ou menor, de fenômenos, uns anatômicos,
fisiológicos, citológicos, moleculares ou genéticos, outros histó-
ricos, sociais, culturais e políticos, que confluem na produção de
uma situação humana de sofrimento e menos-valia. A diagnose
psiquiátrica nos aponta qual a confluência que está diante de
nós dentre as confluências possíveis e conhecidas.
Miguel Chalub
Professor de Psiquiatria da Universidade Federal do Rio de
Janeiro e da Universidade Estadual do Rio de Janeiro,
Psicanalista. 
Since Medicine became a logic-rational practice, even
though pre-scientific, and no longer an esoteric-mystic practice,
the need to limit the morbid phenomenon has been imposed.
Thus, in the beginning of Medicine, even among Babylonians
and Egyptians, there was concern about diagnosis as a way of
limiting the problems of health and well-being losses. The
cuneiform tables and the papyrus taught how to reach the diag-
nosis. Of course, it was very empirical based only on observa-
tion and gained experience. However, the important point was
the understanding already established that there were many
types of diseases and that it was necessary to identify them in
the patient. The Kós Hippocratic and Cnidos’ schools, among
the Greeks, created the propedeutic as the physicians’ first
action. Actually, propedeutic (“previous knowledge”) was the
practice of the diagnostic techniques, evidently very precarious
in comparison to today’s view. By asking the physicians to
observe the color of the skin or the characteristics of the urine it
was establishing the basis of semiology. The Romans (Celsus,
Galenus, Areteu) and the Arabs (Avicenna, Averroës) followed
the same direction. In the end of the 18th century and during
the 19th century, when Medicine became a scientific activity,
the idea that diagnosis was a non-dissociated part of the med-
ical practice was already consolidated. The classification of the
diseases that occurred due to semiology was part of the taxono-
mist ideology that gave origin to the Linnaus’ Botanic and
Cuvier’s Zoology. It is interesting to remember that the first
classification of diseases appeared in the first edition of the
British Encyclopedia- middle of 17th century – proposed by
Cullen, the creator of the term “neurosis” (disease sine materia). 
In the late 60s of the 20th century, the contra-culture
movement with its universal contestation, its aversion to every-
thing that was established, its horror to the power as result of
knowledge, affected also the Medical field. The medicine, as a
scientific and technological activity and the “medical empower-
ment” were questioned, sometimes very severely. But, as it is
not possible to deny Nature at one’s free will, soon such ideas
were banned from Medicine. The idea that diagnosis was a
label, the expression of medical yoke, the creation of an ideolog-
ical repressor apparatus of the Medicine, a sociocultural crea-
ture, was unable to stay on for a long time. Of course, as shown
by the history of ideas and mantalities, good and useful compo-
nents remained. The appearance of Medical Psychology, the
conception of psychosomatic diseases, the beginning of the
Social and Community Medicine, the study of medical ideology
came from the ideas of the contra-culture and contestation
movement, although this ferment in Medicine already existed
since the end of Second World War.
Rejected from the Medicine by the nature of the illness phe-
nomenon and physical suffering such ideas met enormous sup-
port in Psychiatry. A diagnosis in Psychiatry rendered an
intense disapproval as being the most genuine expression of
everything that oppressed the human being by keeping them
under stringent control. Diagnosis in Psychiatry rendered
numerous awkward epithets: medieval, oppressor, inhuman (in
the sense of no respect to the individuality and subject). As
mental diseases did not exist, it would not be possible to delim-
it the pathopsychic syndromes. The mental disease was not a
biopsychosocial phenomenon existent in Nature and in
Culture, but a mere historic-cultural and political creation to
the service of opression from the man to the man. Initially, the
resulting ideological control was devastating: the physicians
withdrew and almost allowed the rest of the health professions
to come to the proscenium. If the propedeutic did not exist and
the treatment was merely to restore the pacient dignity under-
mined by political seize from the human condition, then the
physician turned to be a “health worker”, member of the hori-
zontal health team, sometimes not important. The existence in
Psychiatry of “abnormal variations of the way of being”,
besides the mental diseases themselves, corroborated, in part,
such ideas. As the medical model could be applied in a kind of
precise way to the dementias, oligophrenias and to the most
important psychosis – and the Biological Psychiatry has shown
this more often - such clinical situations have been preserved
from the general de-construction. But, some psychoses, the neu-
roses and the psychopathies (changed to personality disorder)
did not escape. The diseases became “disorders” and the entities
“estates”. This all can be accepted as long as some postulations
prevail: 1) there is a phenomenon that is at the same time bio-
logical and sociocultural that expresses an alteration of the
nervous system and the suffering of the soul; 2) this nervous
system alteration may be anatomopathological or physiopatho-
logical; 3) the demonstration of such alteration does not rule
out the co-existence with the historic-cultural and sociopolitical
dimension of man, that is, Psychiatry is not to be reduced to
Behavioral and Cognitive Neurology; 4) the diagnosis is a fun-
damental tool in the practice of Psychiatry as it delimits theontological field where the biopsychosocial phenomenon takes
place; 5) this delimitation is a fundamental condition to efface
the phenomenon which is always painful.
Thus, we can understand completely what is a “case” in
Psychiatry. The clinical case is nothing but the gathering of a
series of phenomena, some anatomic, physiologic, cytological,
molecular or genetic, others historical, social, cultural and
political, which join together to produce a suffering disadvan-
tageous human condition. The psychiatric diagnosis points out
to which confluence is ahead of us within the known and possi-
ble confluences.
Miguel Chalub
Professor in Psychiatry – Federal and Estate University of Rio
de Janeiro, Psychoanalyst.
3 Casos Clin Psiquiatria 2001; 3(1,2):3-6
Joana Lúcia (nome fictício)
Introdução
Cleonides Martins de Oliveira*
Francisco das Chagas Valle**
Regina Celsa de Souza e Silva Martins Oliveira***
Maria Fernanda Attie Cury****
Flávia Bonsucesso Teixeira*****
Trata-se de história de moléstia atual relatada por uma
paciente de nível escolar técnico em Contabilidade. Ela convive
com o marido que possui diagnóstico de “psicose”, após aciden-
te vascular cerebral (AVC). A paciente teve que abandonar seu
emprego de contabilista para assistir o esposo nos seus momentos
mais difíceis. Quando casaram, ambos não apresentavam trans-
torno mental. O casal não tem filhos. Do temor da morte do mari-
do a paciente desenvolveu verdadeira admiração pela morte.
Auto-relato
Assim começou a minha história. Peço que a leia atentamen-
te até meu sonho de ter uma cozinha, sonho que está gravado em
meus devaneios. Sou casada e não tenho filhos. Tive com meu
marido uma vida de muita paz, saúde, alegria, passeios e festas.
Era uma vida invejável, eu e ele sempre trabalhamos juntos e
todos os finais de tarde nos fazíamos presentes na igreja, para a
missa das 18 horas. De tão assíduos, o padre nos apelidou
de casal vinte.
Até que em outubro de 1997 tudo foi renunciado. Meu mari-
do, que jamais bebeu ou fumou, foi vítima de acidente vascular
cerebral. Fiquei surpresa desde esse momento, ou seja, quando
ele disse que estava passando mal e já começou com delírios,
dizendo nomes e fatos estranhos.
Ele foi conduzido a um hospital e lá foi atendido por um
médico de plantão. Sua pressão arterial (PA) estava muito eleva-
da e fui informada que de ele estava desenvolvendo um AVC
muito grave.
Fiquei muito aflita em ver tantos médicos, muitos aparelhos,
nunca tinha visto tal quantidade de profissionais correndo por
todos os lados. Naquela noite entrei em desespero total por medo
do meu marido morrer, ele era saudável. Eu estava completamen-
te despreparada para tal situação, chorava e agarrava loucamente
todas as pessoas que passavam ou chegavam perto de mim, prin-
cipalmente aquelas de trajes brancos.
Durante essa madrugada entrei em desespero, cada minuto
parecia horas, até que um médico neurologista me abraçou com
um semblante de vitória. Ele disse: acalme-se senhora, a PA já
normalizou e ele está consciente, agora é só observação.
Isso intensificou minha emoção e alegria, junto com o medo
dele morrer. Por um instante senti que o chão do corredor do
hospital estava cheio de aparelhos de pressão e tudo encostado no
meu rosto, inclusive o piso.
Depois de vários dias de desespero e medo, o meu marido
obteve alta hospitalar. No entanto, eu sofria intensamente
com o medo dele morrer, durante 24 horas consecutivas. Ele
conversava durante todas as noites, já com sintomas de desequilí-
brio mental.
Continuei freqüentando o meu trabalho com muito sono e
ainda com medo. Sentia o drama de ter que trabalhar e ficar tele-
fonando para minha casa, preocupada com possíveis notícias
advindas de minha sogra, de que ele estava morto. O meu pai
tinha falecido em junho de 1997.
Após vários dias, a minha sogra foi embora e eu quase enlou-
queci, na tentativa de conciliar o emprego e ajudar o marido com
doença mental. Ele ficava sozinho e trancado em casa, vivi esse
trágico pesadelo durante durante quatro meses. Foi a pior tortu-
ra psicológica que já conheci.
Em fevereiro de 1998 renunciei ao trabalho, pois não tinha
condições para suportar tal situação. Decidi ficar só em casa cui-
dando dele. Parecia que eu estava mais doente do que o meu
marido. Estava desfigurada por medo dele morrer.
Procurei tratamento psiquiátrico; a profissional passou a ser
mito e ídolo do meu marido, que passou a acreditar, incondicio-
nalmente, nos remédios por ela prescritos. Todas orientações
advindas da médica eram aceitas pelo mesmo.
Sempre fui uma pessoa dócil e sensível, nunca acreditava que
tudo teria um fim. De acordo com minhas idéias, as pessoas deve-
riam se perpetuar, sofri muito por isso. Certa vez, perguntei à psi-
quiatra se o estado do meu marido era reversível. Ela respondeu:
não, mas isso não quer dizer que ele vai morrer pelo AVC.
Fiquei com muitos traumas psicológicos na minha cabeça,
durante todos os dias, além de pavor do meu marido morrer.
Certa manhã eu estava muito deprimida e impressionada com
aparelho de pressão, era outro suplício que não saía da
minha cabeça.
Auto-relatos
MINHA AMIGA, A MORTE
MY FRIEND THE DEATH
*Professor Adjunto Livre-Docente em psiquiatria na Faculdade de Medicina do
Triângulo Mineiro. Membro da Associação Acadêmica Psiquiátrica de Minas
Gerais
**Professor Titular Doutor do Departamento de Ciências Básicas da Faculdade de
Medicina de Pouso Alegre e Universidade São Judas Tadeu
***Psicóloga Clínica
****Médica no setor de Psiquiatria e Psicologia Médica do Hospital de Clínicas da
Universidade Federal de Uberlândia
*****Terapeuta Ocupacional no Setor de Psiquiatria e Psicologia Médica do
Hospital de Clínicas da Universidade Federal de Uberlândia
Endereço para correspondência:
Coopmed
Casos Clínicos em Psiquiatria
Av. Prof. Alfredo Balena, 190
30130-100 - Belo Horizonte - MG
E-mail: ccp@medicina.ufmg.br
Foi tanto tormento que minha boca e mãos estavam sempre
dormentes, tive uma perda de vista à esquerda, por uns 20 minu-
tos, além de minha cabeça ter ficado inerte por determinado
tempo. Preciso esclarecer que o meu marido teve uma crise pare-
cida com esquizofrenia, em abril de 1999, o que piorou a minha
depressão. Em maio desse mesmo ano, comecei a sentir que den-
tro de mim vinha se desenvolvendo uma outra pessoa. Eu sentia
medo daquilo e comecei a ir até a psiquiatra na tentativa de me
livrar deste problema, mas não tive cura.
Foi então que pensei em suicídio, planejando acabar com
aquela situação. Também planejei matar o meu marido e suicidar
logo após. Tudo isso para acabar definitivamente com aquilo que
me consumia a cada minuto. Eu estava sozinha, sem uma
palavrinha sequer.
Os amigos e parentes me abandonaram, eu sentia falta de
pessoas para conversar, mesmo que fosse por pouco tempo.
Nesse dia planejei matar o meu marido e suicidar, na parte da
tarde. Realmente a vida já não me interessava. Mas uma amiga me
ligou chorando para contar que seu marido tinha morrido por
AVC hemorrágico. Fui até sua casa para lhe dar apoio.
Chegando na casa da minha amiga, fiquei muito surpreendi-
da, porque tive a sensação de estar em uma festa e não em um
velório. Tudo ali era bom e maravilhoso. O falecido estava lindo,
senti um profundo desejo de acariciá-lo. Acabei me controlando,
aquela foi a minha primeira atração por cadáveres.
Naquela noite começou minha confusão mental, não conse-
gui dormir porque aquele profundo desejo ficou impregnado em
meus pensamentos. Por mais que eu quisesse, não conseguia me
livrar desse fato. Quando aquele homem era vivo, jamais senti por
ele qualquer atração sexual ou interesse afetivo.
Quando o dia amanheceu, comecei a me identificar com a
morte e ter afinidade só por assuntos relacionados a ela. Em
alguns instantes eu me rejeitava, pois sabia que tal comportamen-
to era anormal. Mas meu desejoera maior que a rejeição.
Aquele terrível sofrimento de medo do meu marido falecer,
durante um ano e meio, apaguei por completo e passei a procu-
rar mais mortos e só quero conviver com eles. O vício se tornou
tão forte que comecei a procurar serviço nos cemitérios da cida-
de, mas não consegui o emprego.
Iniciaram-se os preconceitos e a discriminação das pessoas
que me conhecem. Fico muito nervosa e freqüentemente brigo
com elas, pois quero fazer valer o meu direito de gostar de defun-
to. Não entendo porque discriminar uma coisa que é
meramente bela e verdadeira.
Também procurei emprego no serviço médico legal da minha
cidade, para estar perto dos cadáveres. Tenho inveja dos profis-
sionais que atuam neste setor, porque eles têm contato mais dire-
to, único e profundo com quem já morreu.
Matar alguém não é o meu forte, gosto de aplaudir o que faz
a minha amiga morte, vejo o desempenho de sua função com elo-
gios. O importante é que fiquei tão amiga da morte que temos
confissões de absoluto sigilo.
Antes de todos esses acontecimentos, quando viajava com o
meu marido, por medo dele morrer, não conhecia a morte e fui
enlouquecendo por medo dela. Hoje ela é minha melhor amiga,
sei que tenho privilégios, posso escolher como e quando morrer.
Tenho contatos diretos e secretos com a morte. Esta quer que eu
trabalhe em um cemitério, onde se tornam mais fáceis nossos con-
tatos. Até o momento, não consegui.
Fui pretensiosa e quis ganhar aqueles 65 milhões de reais ou
metade deles na mega-sena. Eu sabia os números do prêmio que,
no entanto, saiu para o Estado da Bahia. Dei os números para
algumas pessoas, mas elas não acreditaram em mim e não fizeram
o jogo. Pedi dinheiro para jogar apenas um jogo, elas não me
emprestaram. Não vou desistir de jogar. Vou de novo saber os
números e não contarei para ninguém, ganharei sozinha e vou
para um lugar onde serei desconhecida. Lá vou montar um cemi-
tério só para mim.
É estranho e interessante que eu não consigo discernir como
mudei a minha preferência da noite para o dia. Talvez pelo fato
de ter vivido o medo do meu marido morrer durante um ano e
meio. Eu ficava acordada para vigiar sua respiração e seus bati-
mentos cardíacos, acreditava que se dormisse ele morreria.
Eu não tinha apoio de ninguém, exceto nas consultas ambu-
latoriais mensais, ou no pronto socorro nas situações de crises.
Não passeava e não tinha relações sexuais desde o AVC do meu
marido. Enfim, nem televisão assistia porque ele cismou que os
apresentadores estavam dentro da nossa casa. Ele arrumava uma
gritaria total com os programas de televisão e quando ouvia músi-
ca, gritava sem parar. Acreditava que os cantores tinham que
pagar um percentual para ele, nos momentos em que estavam
cantando. Era um situação insuportável quando o marido assistia
a programas musicais.
Depois de longo tempo encarcerada em casa e vivendo os
problemas do marido esquizofrênico e com AVC, os meus pas-
seios são apenas nos velórios. Lá encontro várias pessoas, das
quais gostaria de receber pelo menos um telefonema de apoio.
É evidente que nos velórios tem gente triste. Às vezes, fico
chocada por não estar preparada para vivenciar tanta tristeza em
um mesmo lugar. Para mim o velório é uma festa deliciosa. Gosto
e insisto nesta minha tarefa de falar somente sobre morte e andar,
por onde quer que seja, procurando defunto pelas ruas da cida-
de. Eu preciso dessa busca, este é o meu refúgio, minha
festa e meu prazer.
Ainda tenho sonhos a serem realizados: 1) conhecer o meu
ídolo que é o Dr. Morte e beijar o solo que ele pisa, como símbo-
lo do meu fanatismo e 2) um dia fazer a cozinha dos meus sonhos,
mas não tenho dinheiro. O retrato da cozinha que idealizei para
a minha casa não sai da minha cabeça. Um amigo me ofereceu
esta cozinha, só que em troca queria sexo. Ele falava que eu
era bonita e cheirosa, mas não aceitei a barganha, não me
interesso mais por sexo.
Eu gostaria de participar de um grupo de médicos em que
todos me permitissem contar o prazer que tenho de falar sobre
defuntos. Por que me refiro a médicos? Porque são eles que
conhecem e tocam nos cadáveres, os meus pratos preferidos.
Certo dia fui questionada sobre a diferença entre morte e
defunto, respondi que a morte desfigura o defunto, que é o resul-
tado eficiente da morte. Entendo que quase não existe diferença
entre um e outro, só posso, no momento, afirmar que ambas as
situações são maravilhosas.
Quanto a minha memória, deixo claro que tenho algumas
dúvidas se me comporto bem, pois noto que as pessoas se afastam
de mim porque só falo da morte com elogios e aplausos. Só me
Casos Clin Psiquiatria 2001; 3(1,2):3-6 4
Minha amiga, a morte
interesso por isso, mas é verdade que tento me prender, mas é
uma tentativa inútil. Inútil sim, frustrada não, porque só
quero isso.
Por uma vez fiquei tão brava que joguei um homem na fren-
te de um ônibus, sem sucesso porque o motorista o freou rapida-
mente. Isso ocorreu porque o homem estava me incomodando,
tentando falar comigo. Meus estímulos nervosos surgem forte-
mente, quando sinto que estão me fazendo de boba. Minha cabe-
ça fica desorientada quando escuto contestações. Eu não tenho
senso de qualquer gravidade, foi assim que ocorreu no ponto
de ônibus.
Preconceitos, discriminações, rejeições ou conselhos não
impedem meus compromissos com a morte e meus defuntos.
Estou me especializando só nesse assunto. Por isso estou escre-
vendo este depoimento com plena liberdade.
Se alguém quiser marcar uma reunião comigo, para falar de
morte e defunto, terei um prazer imenso. Um dia serei famosa e
conhecida mundialmente; aí os psiquiatras terão orgulho de mim,
me aguardem. Pretendo e vou lutar pela minha fama, talvez um
especial na televisão. Também quero falar das minhas sete cabeças.
Quando comecei a desenvolver essa quantidade de cabeças,
confesso que fiquei revoltada, mas aos poucos fui acostumando.
Também não é todos os dias que tenho de suportar isso, elas não
me atrapalham em nada, só que cada uma delas pensa uma coisa,
e como tenho sete cabeças e dois corpos, é claro que acabo fazen-
do um pouquinho de confusão mental.
Peço ao leitor que leia e releia este meu depoimento e, quem
sabe, isso sirva como lição de vida ou exemplo às famílias que
tenham doente mental. Não devem deixá-lo sob a responsabilida-
de de uma única pessoa, como aconteceu comigo.
Se você está achando anormal o novo comportamento e pre-
ferência que adotei, saiba então que eu também era supersaudá-
vel e normal. Sou contadora formada, de família humilde, porém
educada. Eu tinha uma vida normal, participava de churrascos,
festas e clubes com o meu marido, que também era saudável.
Tudo mudou rapidamente, tive que renunciar até ao meu traba-
lho e ficar trancafiada dentro de casa, cuidando do meu marido
doente mental. Tenho a impressão de que fui para o mesmo cami-
nho, mas não faço queixas e estive muito infeliz com medo
dele morrer.
Hoje estou feliz, porque faço contato direto com a morte,
tenho vários tipos de privilégios com ela, inclusive foi minha
amiga que me fez ver que tenho sete cabeças e dois corpos. Só
fico com uma enorme confusão mental quando as sete cabeças
começam com os pensamentos desiguais, cada uma quer
uma coisa.
Fico muito nervosa na hora em que fico louca para ver um
defunto e alguém tenta me impedir. Se teimar comigo, eu bato e
não tenho medo de ninguém. Tornei-me insensível, como se eu
estivesse infeliz, chorando com aquele terrível medo do meu
marido morrer. Ninguém veio passar a mão na minha cabeça.
Anteriormente eu gostava muito disso, hoje as coisas mudaram,
eu gosto só de defunto e não se discute, é melhor assim.
Tenho ainda o gosto de limpar a minha casa e sonho, até hoje,
com a cozinha e a área de serviço que não pude fazer, sofro muito
com isso. Tenho dificuldade financeira e não consigo serviço, por-
que não tenhocontrole para sair à procura de defunto, nem por
isso eu deixo de ser amiga da morte.
O dia vem amanhecendo e não tenho dormido, meu marido
usa indutor de sono e dorme igual um anjo, enquanto eu fico
andando dentro de casa ou andando pela rua, procurando defun-
to. Só aceito contato com outras pessoas se for para falar de
morte e defunto.
Talvez eu não esteja em condições de continuar o relatório
com perfeitas explicações, estou transtornada, minha filha
sumiu.a Eu a procuro em cada rostinho infantil, tenho a sensação
de que estou anormal. Esta busca, este resgate me tem feito mal,
pois tenho visto que tem sido inútil.
Consolo-me ainda com alegria porque, mesmo com a barrei-
ra do preconceito social, sou amiga assídua da morte. Tento me
identificar com outra ocupação, por exemplo a música “natália”,
o que me envolve em parte, só um pouquinho, é claro.
Logo corro para os braços que me fazem realmente feliz, que
é meu verdadeiro ídolo, a morte e seus maravilhosos resultados
que são cadáveres lindos, silenciosos, pálidos e imóveis.
Desperta-me uma certa admiração pelo médico anestesista, pois
entendo que ele leva o paciente à meia morte. Porém, ele perde o
encanto ao ser o homem que tem o conhecimento por intermédio
da ciência de devolver a vida.
Estou com dor de cabeça e tenho que ir ao dentista, existe
um dever humano que é cuidar da faixada, que é a tal da aparên-
cia. Cumprido isso, volto às atividades normais e rotineiras, ou
seja, visitar velórios e cemitérios.
Quero lhes pedir uma alma branda que saiba julgar, instruir
a medicina humana e discernir a força bruta de vocês. Em se tra-
tando de humanidade, vocês (introdutores conhecedores deste
relato) ministram verdadeiras aulas inspirados na mesma jurisdi-
ção para com os pacientes, diante da infinita misericórdia divina.
Perdoem aqueles que ora erram, são doentes e desvirtuados da
consciência humana e espiritual, usem da legítima medicina que
se faz presente nos pólos mais distantes do universo. Orem por
todos que não tiveram a mesma sorte e agora apodrecem seus
corpos carnais nas celas das enfermarias psiquiátricas. Velem
pelas suas consciências, amando e servindo sempre, mas não se
esquecendo do dever bem cumprido. Não julguem ao livre arbí-
trio sem merecimento. Lembrem-se, acima da medicina dos
homens existe a medicina de “Deus”, que é imortal.
Peço que a força do conhecimento para o bem inspire os
jovens nos seus trabalhos, acima do conhecimento da medicina.
A honestidade está atravessando uma fase difícil, dolorosa
e cheia de indagações por causa deste meu comportamento.
Parece que sofri um choque delicioso ao sentir que meu
mundo se transformou.
Asseguro-lhes que tenho um profundo respeito, amo-os e
respeito na condição física e espiritual. Só quero que esse sol forte
lhes dê força e tenham fé em seus corações. Bons dias, boas tar-
des, boas noites e que o ser invisível zele por vocês.
5 Casos Clin Psiquiatria 2001; 3(1,2):3-6
a) A paciente não possui ou teria possuído filha (nota dos autores da introdução).
Discussão
Sérgio Kehdy*
Como se trata de relato de uma paciente, feito de forma livre
e espontânea, também me permitirei pensar e escrever da mesma
forma. Esse relato me fez pensar na tragédia humana. Kohut1,
psicanalista do self, falecido em 1970, aponta a dimensão trágica
do homem e distingue o homem culpado (freudiano) do homem
trágico. No primeiro, predominam os conflitos psíquicos e a
culpa, ou seja, a luta entre os desejos proibidos por um superego
cruel e a culpa intensa desencadeada por esses desejos. No segun-
do, a questão é mais definitiva, pois trata-se do ser ou não ser, do
existir ou desintegrar-se. Lendo o relato de Joana, penso num ser
humano que luta com todas as forças para se manter vivo e, por
incrível que pareça, consegue a vida através da adoração da
morte, de cadáveres e dos velórios. Tentarei explicar o que
estou dizendo.
Joana sofre um duro golpe com a doença do marido, que
representa um corte brutal em sua “continuidade do ser”.
Winnicott2 nos mostra que as ameaças à “continuidade do ser”
são vividas de forma tão catastrófica que é algo inominável e cer-
tamente desperta uma angústia pior que o medo da morte, mui-
tas vezes o próprio suicídio pode significar uma “defesa” para
essa sensação indescritível e intolerável. Joana vivia “feliz” como
membro de um “casal vinte”, sendo o marido a referência para
sua existência, um amálgama que a mantinha inteira e lhe garan-
tia o seu “ser”. Não estou falando de amor romântico ou algo
parecido entre duas pessoas adultas, mas sim de algo mais primi-
tivo e arcaico no desenvolvimento emocional, estou falando de
fusão, ou seja, “uma unidade de dois”, semelhante ao estágio ini-
cial quando entre a mãe e o bebê existe uma “simbiose”. O mari-
do sofre um “derrame cerebral” com sintomas psiquiátricos (qua-
dro psicótico), deixa de “ser” e Joana perde seu espelho e sua
referência, ficando sem saída para sua angústia, com medo de se
desintegrar psiquicamente, como se fosse um bebê sem cuidados.
A primeira descrição sugere um quadro dissociativo típico, quan-
do fica tonta, vê aparelhos de pressão por toda parte e passa a
viver na “corda bamba”, com ameaças freqüentes de despersona-
lização. Fica confinada, cuidando do marido delirante e se iden-
tifica, ou melhor, se “mistura com ele”, numa tentativa de resga-
tar sua própria integridade. Como ele estava “psicótico”, o qua-
dro aparente é uma “folie a deux”, com sua composição típica,
histérico com um psicótico. O medo da morte do marido e da
ruptura da fusão simbiótica é de tal monta que, para se sentir
viva, busca de forma desesperada defesas com características
maníacas, que se caracterizam por negação, onipotência e triun-
fo, e tenta com elas um controle sobre a morte, transformando a
dor da perda numa “festa” e conseguindo assim um certo grau,
mesmo que precário, de integração. Assim, aparentemente,
“resolve” a dor insuportável da perda de seu “objeto sustenta-
dor” e de sua ameaça de desintegração. Nunca é demais lembrar
que não estou falando da perda de seu marido amado e sim de um
“objeto” cuja representação psíquica significa um pedaço dela
mesma e que é fundamental para a existência mental, como se
fosse um pulmão sem o qual não se respira. Kohut1 denomina
esse objeto de “self objeto”, que mostra um nível primitivo de
desenvolvimento emocional.
No auto-relato, a primeira cena de adoração à morte, cadá-
ver do marido da amiga, sugere uma perversão típica, necrofilia,
mas com o desenrolar do relato fica claro não tratar-se de desejo
sexual por cadáveres e sim de um fascínio pela morte, o que tem
a função de fazê-la suportar a vida. Algo já morto não ameaça,
nem à sua “continuidade do ser”. Ela tenta através da adoração
um controle sobre a morte e diminui o terror da desintegração;
algo que adora e não teme, inerte e imutável, torna-se uma boa
referência, visto que deixa de ser um objeto “abandônico”. O
fator onipotência das defesas maníacas faz com que apareçam
manifestações “deliróides”, pois não se trata de produção deli-
rante primária e sim função da onipotência maníaca. Nada mais
claro para exemplificar isso do que “as sete cabeças e as sete
vidas”. A adoração e a dedicação exclusiva à morte provavelmen-
te a fazem sentir-se a própria morte, numa relação de tal intimi-
dade que sugere uma exaltação narcísica, pois se é possível domi-
nar a morte, estou perto da situação de imortalidade, busca inces-
sante do narcisismo humano desde os primórdios do homem.
Volto à dimensão trágica do homem, à questão do ser ou não ser,
do existir e se manter vivo ou não, sendo essa a última defesa con-
tra a hecatombe psíquica. Além disso, só resta o caos e o pó.
Do ponto de vista psicodinâmico, de uma forma mais ampla,
fala-se de psicose mais como um funcionamento psíquico em que
não se é capaz de continência dos conteúdos internos, daí resul-
tando alucinaçõese delírios, do que de algo estrutural ou etioló-
gico. Desse ponto de vista, os transtornos dissociativos não se
diferenciariam muito dos quadros delirantes. Mas, do ponto de
vista de diagnóstico fenomenológico, vale a pena arriscar: penso
num transtorno dissociativo, tipo histeria dissociativa, com
alguns sintomas maniformes e idéias deliróides. Deixo a questão
da perversão para outra oportunidade, visto que do nosso ponto
de vista os atos perversos desse tipo, sem consistência, têm antes
uma função integradora e não uma estrutura fixa.
O ser humano é maior do que todas as teorias. Ajudar os
pacientes através da possibilidade de propiciar novas identifica-
ções e com uma escuta atenta e respeitosa, deixando de lado os
rótulos e preconceitos, é dever de todos que lidam com o ser
humano doente, principalmente com aqueles que estão no limite
de sua existência.
Referências Bibliográficas
1. Kohut H. Formas e transformações do narcisismo. In.
Psicologia do self e a cultura humana. Porto Alegre, Artes
Médicas; 1988 (original de 1966).
2. Winnicott, D.W (1963). O medo do colapso. In. Explorações
psicanalíticas. Porto Alegre, Artes Médicas, 1994 (original de
1963).
Casos Clin Psiquiatria 2001; 3(1,2):3-6 6
*Psicanalista didata da Sociedade Psicanalítica do Rio de Janeiro – SPRJ e do Núcleo Psicanalítico de Belo Horizonte - NPBH. Preceptor da Residência em Psiquiatria do
HC-UFMG. Membro da Associação Acadêmica Psiquiátrica de Minas Gerais. 
E-mail: sergio@kehdy.com
7 Casos Clin Psiquiatria 2001; 3(1,2):7-9
SÍNDROME DE STEVENS-JOHNSON COM CARBAMAZEPINA
STEVENS-JOHNSON SYNDROME WITH CARBAMAZEPINE
Bruna Maria Dante (nome fictício)
Nos meus relatos “Dunas de Girassóis e Outros Delírios”a
omiti que fui acometida de grave síndrome. Ocorre que em 1996
estava me sentindo acelerada porque meu filho sofrera um aci-
dente grave no carnaval e fui eu quem o socorreu. Neste aciden-
te uma jovem mãe perdeu seu bebê, de apenas seis meses de ges-
tação. Ela era "carona" no carro, juntamente com seu marido.
Conclusão: procurei um psiquiatra e contei a história. Deu-me
um ansiolítico e disse que voltasse em três dias. Assim o fiz.
Prescreveu então carmabazepina, para tomar indefinidamente,
todos os dias, mas não me explicou o porquê.
Comecei a tomar e em questão de uma semana já sentia
“estado febril” e os gânglios aumentados pelo corpo todo. Liguei
para ele e me disse que era “virose”, que deveria continuar
tomando a tal medicação e que procurasse um "clínico". O clíni-
co, no dia em que me atendeu, disse também ser uma "virose" e
que procurasse um infectologista... Todo esse tempo eu sabia que
todos estavam errados e que eu tinha algo grave. Procurei o infec-
tologista, mas antes fiz um hemograma por minha conta. Cheguei
ao consultório, disse que estava com "Stevens-Johnson", mostrei
o exame e a bula. Ele, prof. titular de universidade federal, gritou
que "o médico era ele!" Não fez exame clínico, solicitou exames
para "lúpus", "rubéola" e "mononucleose". O kit iria para São
Paulo, demoraria mais de 15 dias para saber o resultado... Disse
que ele estava errado e que eu morreria por isso.
Ao chegar em casa notei que já haviam se formado pequenas
manchas rosas em meu corpo, como início de "catapora". No dia
seguinte, ainda tomando carmabazepina, virei um monstro.
Edemas intensos de mãos e pernas, vermelhidão, rosto deforma-
do pelo inchaço e onde eu encostava os vasos capilares rebenta-
vam e eu ficava "preta". Começou um ardor, dor e coceira inten-
sos pelo corpo todo e as manchinhas já eram enormes, com
bolhas cheias de líquido amarelo e isso só aliviava um pouco com
banho gelado acompanhado de "bolsas de gelo". Liguei para ele,
relatei como estava e me mandou tomar composto de betameta-
sona com anti-histamínico à noite, dois comprimidos. Estava
desesperada e cada vez mais monstruosa. Chegando a noite tomei
apenas um comprimido e depois de certo tempo senti "baixa res-
piratória", acompanhada de "rash cutâneo" intenso. Pedi a meu
marido que ligasse para ele, pois estava morrendo e ninguém
acreditava em mim por ter doença mental (que não sabia qual,
mas, na época, tomavam-me por esquizofrênica). Ele disse que se
eu piorasse me internaria no dia seguinte. Mais um Ph.D. imbe-
cil na minha vida!
Amanheceu e logo falei com a pediatra da minha filha, des-
crevendo como estava. Na mesma hora ela disse que ligaria para
um infectologista infantil e que eu fosse para o hospital de doen-
ças contagiosas. Não tinha nem o que vestir de tão inchada e da
dor e prurido intenso que sentia. Fui. O médico, ao me ver, man-
dou entrar com urgência. Examinou-me por inteiro e disse: é,
você tem razão, é mesmo “Stevens-Johnson” e é muito grave.
Nesta altura descompensei. Mandei todos à.... e disse que morre-
ria em casa, uma vez que era (e é) fatal. Ele suplicou para que eu
deixasse ajudar, que me internaria e mandou chamar uma derma-
tologista, que também confirmou o diagnóstico. Foram momen-
tos de horror e dor absolutos. Meus anéis haviam ficado presos
nos dedos e estes estavam totalmente pretos. Meus lábios eram
pretos. O Hospital era de ortopedia, sem recursos, nem UTI. Fui
internada assim mesmo, pois não havia vaga noutro lugar.
Perguntei a ele se poderia ir em casa, falar com meus filhos e ele
disse que não havia tempo. No caminho do Hospital peguei um
celular de minha amiga, casada com o Secretário de Saúde do
município, e disse que fossem (os médicos que conhecia) se des-
pedir de mim, inclusive o psiquiatra. Em pouco tempo foram
chegando ao hospital: pediatras, sanitarista, psiquiatra, clínicos
gerais, enfim uma gama de "especialistas" que nunca "aprende-
ram" em suas faculdades de medicina sobre essa doença. Piada.
Dei-lhes uma aula, bem eloqüente, taxando-os de incompetentes
e que iriam aprender “ao vivo” comigo. A dermatologista man-
dou fazer medicação em farmácia de manipulação (cortisona) e
prescreveram dose altíssima, acompanhada de ranitidina, por
causa de possível hemorragia. Fizeram punção do líquido das
bolhas e ao final de alguns dias deu: "stafilococcus áureos". Entrei
em delírio absoluto pela dosagem alta de cortisona. Foram 10
dias e noites sem dormir, delirando sem parar e com dores horrí-
veis na pele. Meus médicos vinham me ver logo cedo. À noite,
davam-me uma injeção que me deixava pior. A pele parecia que-
rer sair do corpo e ardia por demais. Só me aliviava tomando
banho gelado, arrastando o suporte do soro e medicação para o
chuveiro. Foi aí que surgiu "a bolha". Uma enorme bolha sob o
meu braço, que corria feito mercúrio, e eu, sabendo que não era
"soro vazando", chamei a enfermeira (?). Ela disse: é da doença.
Mandei que chamasse um médico. Após umas duas horas vem
um ortopedista, todo amarfanhado (estava dormindo) e pergun-
tou: “quem é a nervosinha do apartamento nove?” Identifiquei-
me e ele, áspero, disse: “é da doença, vá dormir!” Pasme... Bom,
pensei, se vou morrer (e nem sei se posso abaixar o braço), vou
tirar todos da cama (era madrugada). Peguei o celular e liguei
para todos os médicos novamente. Às 05:30h da manhã a derma-
tologista veio me ver e trouxe outra médica para conhecer "meu
caso". Fiquei possessa. Eu não era “um caso”, sim um erro médi-
co. Expulsei a médica do quarto (a estranha). Disse o que bem
entendi. Ela tentou me acalmar e falou que eu estava melhoran-
do, que era da doença (mistério...). Logo depois chega o infecto-
logista infantil e a história se repete. Ele me salvou a vida, por
acreditar em mim. Tirou-me do hospital mais cedo porque
minhas defesas imunológicas estavam muito baixas e continuei
a) Casos Clínicos em Psiquiatria 2000; 2(2):58-61. Endereço para correspondência:
Coopmed
Casos Clínicos em Psiquiatria
Av. Prof. Alfredo Balena, 190
30130-100 - Belo Horizonte - MG
E-mail: ccp@medicina.ufmg.br
em tratamento de consultório e exames, principalmente de fun-
ção do fígado, pâncreas, entre outros.Voltei para casa delirante e
assim fiquei por bom tempo.
Tornei-me alérgica a inúmeras medicações em decorrência
dessa doença (sulfa, penicilina, dipirona, antiinflamatório, ácido
acetilsalicílico, a própria carmabazepina, certos corantes, etc),
fiquei com manchas escuras pelo corpo, proibida de tomar sol e
tendo de usar "protetor solar" dentro de casa. Hoje tenho apenas
pequenas manchas leves que me lembram do susto, da falta de
preparo dos médicos e de humanidade. Fui tratada com prepo-
tência por aquele Ph.D. em infectologia que disse que eu tinha
mononucleose ou rubéola. Espero que ele nunca sinta "na pele"
o que aconteceu comigo. Por ser bipolar, surtei com gosto, para a
mania.
Escrevo a vocês para que, por meio desta carta, possam
aprender com minha experiência e repassá-la a outros que se
dedicam à área médica, evitando que muitas pessoas venham a ter
óbito por "despreparo" médico, falta de humanidade e humilda-
de. Posso dizer que, no meu caso, esses dois médicos que acredi-
taram em mim, mesmo sendo doente mental, que me viram como
ser humano e notaram as evidências clínicas do caso, salvaram a
minha vida. A eles sou grata até hoje. Souberam honrar o jura-
mento feito em suas formaturas e continuam praticando a medi-
cina "humanizada", em que a relação médico-paciente deve sem-
pre ser preservada.
Discussão
Leandro Augusto Paula da Silva*
Júnia Bicalho de Sousa**
Eduardo Antônio de Queiroz***
Balint e Norell, logo na introdução do conceituado livro
“Seis Minutos para o Paciente”1, chamam-nos a atenção para
ouvir o paciente. Ele nos está dizendo o diagnóstico, informando-
nos a respeito. Kaplan e Sadock, no primeiro capítulo sobre rela-
ção médico-paciente no “Synopsis of Psychiatry”2, recomendam-
nos aprender a ouvir, uma habilidade que pertence à arte da
comunicação, exemplarmente desenvolvida nos humanos. Na
relação com o paciente nunca apresentar “ar de superioridade”,
controlar a pressa, respeitar o paciente, estar disponível e acessí-
vel de modo oportuno e dar informações sempre. Lembrar que
paciente psiquiátrico também adoece fisicamente, não tratá-lo
com preconceito! É fundamental acompanhar, assistir e orientar
o paciente após um acidente ou insucesso, recomenda-nos
Gonçalves.3 E que nos perdoem os pacientes pelos nossos erros!
Isso posto, falaremos sobre a síndrome de que a paciente foi
acometida. Inicialmente descrita em 1922 pelos autores que lhe
deram nome, a síndrome de Stevens-Johnson (SSJ) ou eritema
multiforme maior é uma forma mais grave do eritema multiforme.
Resulta de uma reação imunológica na pele e nas mucosas media-
das freqüentemente por imuno-complexos circulantes desenvol-
vidos em resposta a vários possíveis estímulos antigênicos (infec-
ções, mais freqüentemente drogas, doença do tecido conectivo).4
São numerosos os medicamentos correlacionados com a SSJ, em
especial as sulfas, as drogas anticonvulsivantes (ácido valpróico,
carbamazepina, fenitoína, fenobarbital, lamotrigina – não há rela-
to com a oxcarbazepina) e os antiinflamatórios não esteroidais.5,6
A SSJ é rara, com incidência anual de 1-2/1.000.000 na
população geral.7 Sintomas prodrômicos, incluindo mal-estar,
febre, cefaléia, faringoalgia, tosse, dor no peito, vômitos, diarréia,
mialgias e artralgias precedem a aparição de lesões na pele em 1
a 14 dias. A erupção dermatológica caracteriza-se por acometi-
mento cutâneo-mucoso múltiplo. A área mais acometida é a boca,
com lesões labiais, linguais e da mucosa oral, surgindo bolhas
hemorrágicas ou purulentas. Lesões oculares são também fre-
qüentes, podendo ser intensas a ponto de resultarem em seqüelas
graves e até cegueira. A mucosa anogenital pode também ser atin-
gida. As lesões cutâneas iniciam simultaneamente ou após o aco-
metimento das mucosas. Um rash macular, às vezes morbiliforme,
aparece primeiro na face, pescoço e tronco, podendo espalhar-se
para as extremidades e o resto do corpo. Pode haver confluência
das lesões na face, pescoço e tórax, formando um eritema difuso.
Na periferia, as lesões permanecem como máculas individuais.
Dentro das lesões, a epiderme se torna frouxa e facilmente desta-
cável, seguindo mínimo trauma. Há formação de bolhas flácidas,
sero-hemorrágicas, que podem evoluir para necrose. A expressão
máxima da doença é usualmente alcançada em quatro a cinco
dias, mas novas lesões podem aparecer até semanas depois, se a
droga causadora é de longa duração. Sintomas gerais incluem
febre, artralgia, fraqueza e prostração.5
Aproximadamente 3% dos pacientes que tomam carbamaze-
pina desenvolvem rashes, geralmente de menor importância.6 Até
10% a 15% dos pacientes tratados com carbamazepina podem
desenvolver uma erupção pruriginosa benigna nas primeiras
semanas de tratamento.8 Parte destes pacientes podem sofrer sín-
dromes dermatológicas ameaçadoras à vida, incluindo dermatite
esfoliativa, eritema multiforme e necrólise epidérmica tóxica.
Alguns clínicos sugerem a interrupção da medicação se qualquer
rash ocorre. Estudo multicêntrico europeu observou risco
aumentado de desenvolvimento de SSJ nas primeiras oito sema-
nas de uso de anticonvulsivantes, sendo que nos casos do feno-
barbital e do ácido valpróico se especula sobre um risco aumen-
tado também com o uso a longo prazo.6
O tratamento inclui hospitalização, limpeza cuidadosa das
lesões, manutenção do equilíbrio hidro-eletrolítico (o doente tem
grandes perdas através da pele e há dificuldade de ingestão de ali-
mentos e líquidos). Uma das complicações mais freqüentes e gra-
ves são as infecções, que devem ser prontamente identificadas e
tratadas. A utilização de corticosteróides é atualmente controver-
sa, predominando entre os autores a recomendação de sua não
utilização, por contribuírem para diminuição das defesas antiin-
fecciosas. A única justificativa para sua utilização seria quando
introduzido em fases precoces, em que ainda se observa o apare-
cimento de novas lesões. Nestes casos, preconiza-se o uso de
doses altas pelo menor tempo possível. A droga causadora deve
ser retirada e nunca mais administrada ao paciente.5
Casos Clin Psiquiatria 2001; 3(1,2):7-9 8
* Residente do segundo ano da Residência de Psiquiatria do HC-UFMG.
** Residente do primeiro ano da Residência de Dermatologia do HC-UFMG.
*** Professor Adjunto do Departamento de Psiquiatria e Neurologia da Faculdade de Medicina da UFMG, membro da Associação Acadêmica Psiquiátrica de Minas
Gerais.
Síndrome de Stevens-Johnson com carbamazepina
B.M.D. iniciou com sintomas de febre e linfadenomegalia
uma semana após o uso de carbamazepina. Progressivamente, em
poucos dias, evoluiu com o aparecimento de lesões bolhosas e
edema, além de rash cutâneo e "baixa respiratória". Foi tratada
com cortisona. Desenvolveu hipersensibilidade a uma gama de
medicamentos. Os autores não encontraram, na literatura revista,
dados sobre o desenvolvimento de hipersensibilidade a outros
medicamentos a que a paciente se refere. Também não observa-
ram na literatura a descrição do quadro inicial com
linfadenomegalia.
A SSJ é uma síndrome potencialmente letal, com mortalida-
de de até 50% quando ocorre necrose epidérmica extensa. Não
há como prever qual paciente poderá apresentar o quadro. O psi-
quiatra deve estar atento a possíveis efeitos cutâneos adversos e
sempre considerar a suspensão da medicação nesses casos.9
Referências Bibliográficas
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2. Kaplan HI, Sadock BJ, Grebb JA. The doctor-patient rela-
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14,1995; 333 (24):1600-1608.
9 Casos Clin Psiquiatria 2001; 3(1,2):7-9
José Antonio Zago*
Sérgio Augusto Monteiro dos Santos**
Paulo Sérgio Rocha Pereira***
Josi Aparecida Sartorelli Miranda de Araújo****
Resumo
É relatado o caso de paciente do sexo feminino, brasileira, 35
anos, solteira, farmacêutica, católica. Aos 33 anos começou a se
automedicar com produto fitoterápico para aliviar sintomas de
estresse do trabalho.
A princípio utilizava a dose terapêutica diária recomendada
(15 ml), mas com o tempo foi aumentando a freqüência e a quan-
tidade de uso. O produto era um alcoolato de ervas medicinais, o
que resultou em transtornos de comportamento. Chegou a con-
sumir, em média, 150 ml da substância diariamente ou cerca de 11,2
unidades (112 gramas) de álcool.
É enfatizado o risco de dependência de substância psicoativa,
mesmo por profissional de área da saúde, por automedicação com
produto fitoterápico.
Palavras-chave: Dependência de Álcool; Automedicação; Medicina
de Ervas; Fitoterápico.
Introdução
O DSM-IV apresenta uma série de medicamentos capazes de
causar transtornos relacionados a substâncias. Embora não cite
substância fitoterápica, alerta que esses medicamentos não se limitam
aos ali listados.1
Já apresentamos a história clínica de um paciente que substituiu
a bebida alcoólica por um produto fitoterápico. Ele desconhecia que
tal produto era um alcoolato de ervas medicinais, cujo uso foi inicia-
do indevidamente para aliviar sintomas digestivos. A rigor, o pacien-
te recaiu, pois apresentava histórico de dependência de álcool e se
encontrava, havia quatro anos e sete meses, em abstinência.2
O presente estudo de caso chama a atenção por se tratar de
paciente sem história pregressa de uso, abuso ou dependência de
substância, que, dada sua profissão de farmacêutica, possui conheci-
mento dos riscos da automedicação, mesmo de produto fitoterápico.
Descrição do Caso
Identificação
Paciente do sexo feminino, brasileira, 35 anos, solteira, farmacêu-
tica, católica.
HMA
Admitida na Clínica Mirante do Instituto Bairral de Psiquiatria –
Itapira – SP no final de junho de 2001.
Veio em companhia dos pais e aceitando a internação. Esta era a
quarta internação em clínicas psiquiátricas, sendo que as anteriores
foram involuntárias por apresentar agitação e comportamento
agressivo. 
Iniciara o uso de substância psicoativa havia dois anos, embora
na adolescência fizesse uso ocasional de bebida alcoólica em
comemorações ou saídas com amigos. Nessa época considerava o
consumo de alcoólicos como uso social e controlado, informação esta
ratificada pelos genitores.
Havia dois anos começara com dificuldades no trabalho, por não
sentir-se bem com o ambiente competitivo e tenso de laboratório far-
macêutico. A fim de superar essas dificuldades e manter-se em condi-
ções de exercer seu trabalho e coordenar os funcionários sob sua res-
ponsabilidade, em vez de pedir demissão, como em situações anterio-
res, teve a iniciativa de fazer uso de calmante fitoterápico industriali-
zado, à base de erva cidreira.
Por ser farmacêutica, ela mesma escolheu o produto, automedi-
cando-se inicialmente com a dose terapêutica recomendada: 5 ml três
vezes ao dia. Aumentou gradativamente a freqüência e a quantia de
uso da substância, chegando a consumir 150 ml do produto por dia.
Durante um ano utilizou somente a substância fitoterápica e depois,
devido ao preço do produto, passou também a consumir outras bebi-
das alcoólicas destiladas.
Ao aumentar a dosagem de consumo da substância fitoterápica,
cerca de dois anos antes, começou a apresentar alterações de compor-
tamento. A princípio euforia e conduta facilitada, posteriormente irri-
tabilidade, agressividade e esquecimento de atos que cometera. A
partir dessas alterações os pais forçaram-na às internações. Com exce-
ção da primeira internação ocorrida havia cerca de dois anos, em que
Artigos Originais
DEPENDÊNCIA DE ÁLCOOL POR AUTOMEDICAÇÃO DE
SUBSTÂNCIA FITOTERÁPICA
ALCOHOL DEPENDENCE BY SELF-MEDICATION OF PHYTOTHERAPIC SUBSTANCE
Casos Clin Psiquiatria 2001; 3(1,2):10-12 10
*Psicólogo do Instituto Bairral de Psiquiatria – Itapira – SP
**Psiquiatra do Instituto Bairral de Psiquiatria – Itapira – SP
***Psicólogo do Instituto Bairral de Psiquiatria – Itapira – SP
****Farmacêutica do Instituto Bairral de Psiquiatria – Itapira – SP
Endereço para correspondência:
Rua Padre José Maurício, 11
Itapira – SP
13974-040
E-mail: joseantoniozago@ig.com.br ou bairral@bairral.com.br
Dependência de álcool por automedicação de substância fitoterápica
11 Casos Clin Psiquiatria 2001; 3(1,2):10-12
se manteve abstêmia por quatro meses com naltrexone, nas outras
duas internações, também involuntárias, as recorrências ao produto
fitoterápico foram imediatas à saída hospitalar.
Quando sob efeito da substância, relata apresentar medo de ficar
sozinha e de sentir pânico. Tem apresentado transtornos orgânicos
como desconforto abdominal. Alternam-se períodos de humor
depressivo e mais exaltado, com o discurso voltado para lembranças
de fatos passados ligados à insatisfação na vida amorosa e rompimen-
tos afetivos. É de opinião que começou a beber “porque no fundo é
carente”. Já fez uso de paroxetina e fluoxetina, concomitante ao uso
do fitoterápico, sem resultados.
Antecedentes pessoais e dados familiares
Apresentou terror noturno na infância. Teve bom desempe-
nho escolar e é formada em Farmácia. Sempre foi responsável no
trabalho e nas empresas onde passou chegou a cargos de chefia.
Reside com os pais. Tem irmão mais velho com 38 anos, defi-
ciente físico por acidente automobilístico, sem antecedentes de
dependência de substância. Refere problemas familiares, isola-
mento social.
Exame psíquico
Ao exame psíquico a paciente apresentava-se com vestes e
higiene pessoal cuidadas. Orientada globalmente. Contato pes-
soal adequado. Insone. Inapetente. Não se observavam alterações
sensoperceptivas. Crítica parcialmente prejudicada. Memórias
preservadas.
Hipóteses Diagnósticas
– Eixo I: Dependência de álcool: uso contínuo F 10.25
Transtorno misto de ansiedade e depressão F 41.2
– Eixo II: Transtorno de personalidade dependente F 60.7
Provas psicológicas
– Escala Reduzida de Autoconceito: escore 91 (autoconceito
desvalorizado).
– Psicodiagnóstico de Rorschach: produção razoável em
quantidade, porém a qualidade não é boa pela dificuldade de
julgamentos mais precisos e objetivos. Dedica-se de forma
exagerada às coisas mais palpáveis e rotineiras, evitando assim
tomar contato com seu mundo interno. Neste sentido mostra
aumento excessivo do racional e conseqüente repressão dos
afetos e emoções, temendo expressão dos impulsos incontro-
láveis, com os quais não sabe lidar. Sua vivência é introverti-
da, com certo embotamento afetivo decorrente de forte con-
trole voluntário que nem sempre é eficiente. Experimenta for-ças e vivências que considera hostis e estranhas a si, criando
áreas de conflito e, portanto, causando angústia. No contato
com as pessoas adota postura submissa, tentando ser agradá-
vel, com medo de que apareçam suas reais características.
Como o índice de impulsividade é alto, diante das vivências
negativas pode buscar fugas para amenizá-las.
Tratamento
Psiquiátrico, apoio psicológico individual e grupal e terapia
ocupacional, conforme o programa terapêutico da Clínica
Mirante.3 Medicada com ansiolítico e antidepressivo.
Após quatro semanas, sem intercorrências clínicas ou psi-
quiátricas, e cumprindo o programa terapêutico, recebeu alta
(melhorada). Foi indicado seguimento ambulatorial psiquiátrico
e psicológico.
Dados sobre o produto fitoterápico
O produto fitoterápico em questão, da Farmacopéia
Brasileira, é um alcoolato obtido a partir da dissolução em álcool
de sete essências de ervas medicinais, destacando a Melissa offici-
nalis (erva cidreira). De acordo com a bula, é indicado como
“Calmante nas depressões nervosas e angústias. Antiflatulento”.
Na análise da fórmula do produto observa-se que a soma da
quantidade dos princípios ativos é de 0,027 ml para cada 5 ml do
fitoterápico e a quantidade de álcool para essa dose corresponde
a 3,75 ml. Portanto, 0,54% do produto corresponde aos princí-
pios ativos, 75% correspondem a álcool e 24,46%, a água.4
Discussão
O transtorno misto de ansiedade e depressão como hipótese
diagnóstica em comorbidade com a dependência de álcool deveu-
se ao fato de que tais queixas eram recentes na história da pacien-
te, provavelmente reativas às situações de estresse no ambiente de
trabalho e em outras situações na vida. É prudente considerar
que muitos pacientes procuram ajuda terapêutica com queixas de
ansiedade e depressão, as quais devem ser avaliadas – se são sin-
tomas atuais ou do modo de ser do paciente no decorrer da vida.5
Após duas semanas de tratamento em ambiente protegido, a
paciente não mais apresentava sinais ou sintomas de ansiedade ou
depressão, nem transtorno de conduta. Foi constatado que o fun-
cionamento da paciente durante a vida era de personalidade
dependente, cujas características persistiram.
Conforme os dois tipos dominantes de alcoolistas descritos
por Vallejo-Nagera, a paciente é do tipo sensível - ao contrário do
tipo social, ativo e expansivo - com sentimentos de insuficiência e
inferioridade, com amplas dificuldades para o relacionamento
interpessoal. As pessoas desse tipo são tímidas e carentes de afei-
ção e de amizade. O álcool proporciona-lhes autoconfiança; sob
seu efeito se sentem capazes de superar a timidez e a rígida auto-
crítica e a estabelecer relações sociais.6
A paciente começou a apresentar uso, abuso e posteriormen-
te dependência de substância a partir dos 33 anos, sendo que aos
35 já se encontrava em sua quarta internação em clínica psiquiá-
trica. Isso chama a atenção porque geralmente o curso do alcoo-
lismo tem início com episódios de intoxicação na adolescência; a
dependência atinge o pico no período que vai dos 20 aos 35 anos
de idade, sendo que a maioria dos indivíduos manifesta distúrbio
relacionado ao álcool aproximadamente aos 40 anos.1
Apesar das dificuldades da paciente devido ao transtorno de
personalidade dependente, as alterações de comportamento
somente surgiram depois do consumo da substância fitoterápica,
Casos Clin Psiquiatria 2001; 3(1,2):10-12 12
além de frustração provocada por rompimento de relacionamen-
to amoroso de sete anos. A paciente tivera bom desempenho
escolar. Trabalhou em algumas empresas, porém deixava o traba-
lho quando dela era exigida maior liderança.
Em seu emprego atual, ao invés de pedir demissão, resolveu
fazer uso de um “calmante natural para suportar o estresse do tra-
balho” (sic). Passou então a automedicar-se com o produto fito-
terápico descrito. Iniciou com a dose terapêutica recomendada,
ou seja, 5 ml três vezes ao dia, aumentando com o tempo a fre-
qüência e a quantidade de uso do produto. Conforme aumentava
a dosagem de uso, começaram a aparecer alterações de compor-
tamento, tais como euforia, conduta facilitada e, posteriormente,
irritabilidade e agressividade. Estes, provavelmente, sintomas de
abstinência.
Com o tempo, a paciente passou a usar, em média, cerca de
150 ml do produto por dia. A concentração de álcool da substân-
cia fitoterápica utilizada é de 75%. Isso significa que estava con-
sumindo aproximadamente 112 gramas de álcool (150 ml x 75%
= 112,50) ou 11,2 unidades por dia.
Para mulheres, em relação aos riscos à saúde pelo consumo
de álcool, o uso de menos de 14 unidades por semana oferece
baixo risco para a saúde; de 15 a 35 unidades por semana tem
risco moderado e mais de 36 unidades por semana tem alto risco
à saúde.7 A paciente estava consumindo em torno de 11 unidades
de álcool por dia, ou seja, cerca de 77 unidades por semana, por-
tanto mais que o dobro da quantidade considerada de alto risco
à saúde, que é de 36 unidades por semana.
Vale salientar que a paciente é farmacêutica e com recursos
para saber da composição da medicação e dos efeitos colaterais.
Pôde-se constatar que a profissional da área da saúde tinha a
crença de que a autoprescrição estava correta e que teria o con-
trole no uso da medicação, talvez um modo de demonstrar a si
mesma autonomia numa área de seu conhecimento. Entretanto,
aspectos emocionais envolvidos pareceram embotar a autocrítica
da paciente, impedindo-a de utilizar adequadamente seus conhe-
cimentos farmacêuticos. Além disso, houve o fato de o produto
não ter sido usado conscientemente com o objetivo de consumir
o álcool nele contido (75%), mas de obter melhora do quadro de
depressão e ansiedade por meio do princípio ativo das ervas con-
sideradas calmantes (0,54%).
Situações de crises emocionais, dificuldade emocional de
buscar ajuda especializada e segurança nos conhecimentos farma-
cêuticos, por exemplo não observar com rigor os possíveis efeitos
colaterais de um produto fitoterápico, pareceram ser cruciais
para o caminho da automedicação e, conseqüentemente, da
dependência. 
Conclusão
O caso apresentado evidencia os riscos da automedicação,
mesmo em profissional da área de saúde.
Também, demonstra que medicamentos compostos de ervas
medicinais, usados sem prescrição e supervisão médicas , podem
ser de alto risco à saúde.
Summary
This is a case report of an unmarried woman of 35 years old,
Brazilian, pharmaceutical and catholic. She started self-medica-
tion with a phytotherapic substance to alleviate stress work
symptoms.
At first, she took the recommended daily therapeutic dose (15
ml), but she progressively increased the frequency and amount of
the substance and consequently the amount used. Since it is a for-
mulation of medicinal herbs diluted in alcohol, behavioral disor-
ders occurred. She consumed 150 ml/day of the phytotherapic
substance or approximately 11,2 units (112 gr.) of alcohol.
This study emphasizes on the risk of psychoactive substance
dependence for self-medication of a phytotherapic product even
for health professional.
Key words: Alcohol Dependence; Self-medication; Herbal
Medicine; Phytotherapic Substance.
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13 Casos Clin Psiquiatria 2001; 3(1,2):13-15
ESQUIZOFRENIA PARANOIDE Y TRASTORNO DELIRANTE CON
TRASTORNOS SENSORIALES: DOS ENTIDADES CON LÍMITES IMPRECISOS
PARANOID SCHIZOPHRENIA AND DELUSIONAL DISORDER WITH SENSORIAL
MANIFESTATIONS: TWO DISORDERS WITH IMPRECISE LIMITS
P. Álvarez Mas*
P. Sierra San Miguel**
L. Livianos Aldana***
L. Rojo Moreno***
Resumen
Los límites entre la esquizofrenia paranoide y el trastorno
delirante que presenta trastornos sensoriales continúan siendo
imprecisos. Todavía no se ha resuelto la clásica controversia entre
los autores que plantean una clara separación entre la psicosis
esquizofrénica y los trastornos delirantes, y aquellos que tienden
a englobar los trastornos delirantes dentro del contexto nosológi-
co de la esquizofrenia. Enmarcada en esta discusión nosológica
presentamos el caso de una paciente de 54 años ingresada en tres
ocasiones en la sala de psiquiatría de nuestro hospital.
Finalmente, analizamos el diagnóstico diferencial desde la pers-
pectiva de diferentes autores y de los manuales diagnósticos
actuales (DSM IV y CIE 10).
Palabras-clave: Esquizofrenia Paranoide; Trastorno Delirante;
Trastornos Sensoriales.
Introduccion
Pese a los sucesivos esfuerzos de autores como Kahlbaum1
Kraepelin2, Bleuler3 o Meyer4, los límites entre la esquizofrenia
paranoide y la paranoia que presenta trastornos sensoriales conti-
núan siendo imprecisos. Cabe destacar dos posturas contrapues-
tas clásicamente, por una parte la escuela francesa que plantea
una clara separación entre la psicosis esquizofrénica y los trastor-
nos delirantes y por otra, la escuela alemana y americana que tien-
den a englobar todos los delirios de evolución crónica dentro del
contexto nosológico de las esquizofrenias, considerándolos como
un subtipo más. Ya Kraepelin intentó ubicar nosológicamente los
cuadros paranoides, modificando la clasificación en las sucesivas
ediciones de su Tratado, bien incluyéndolos o excluyéndolos den-
tro del concepto de demencia precoz. Así en la octava edición,
trazó el cuadro sintomático de la paranoia definiéndolo como el
desarrollo insidioso de un sistema delirante inconmovible y per-
sistente, condicionado internamente, que transcurre con comple-
ta conservación de la claridad y orden en el pensar, querer y
obrar. Por el contrario, las formas de “demencia precoz” condu-
cirían a un estado de defecto con pérdida de la capacidad de jui-
cio, alteraciones en el afecto y disminución de la energía.5 Sin
embargo, Bleuler no consideró una distinción tan marcada entre
ambos trastornos y definió la paranoia del siguiente modo:
“Aparte del sistema delirante y de todo cuanto se refiera a éste, su
lógica y el curso de sus ideas aparecen intactas ante nuestros
medios de investigación. Sensación y percepción se mantienen
también intactas. Faltan casi siempre las alucinaciones, pero no
puede decirse que se hallen completamente excluidas. Éstas pue-
den aparecer en intensos estados de exaltación o incluso éxta-
sis…” Para Bleuler la esquizofrenia no tiene necesariamente un
curso deteriorante, a diferencia de lo expuesto por Kraepelin
para la demencia precoz.2
En el contexto de esta interesante discusión nosológica se
sitúan casos como el de la paciente que presentamos.
Caso clínico
Mujer de 54 años, divorciada, con antecedentes de tres ingre-
sos involuntarios en una sala de psiquiatría y seguimiento ambu-
latorio desde que finalizó el primer ingreso.
Como personalidad premórbida destaca una tendencia a la
suspicacia y desconfianza desde la juventud, que a los 30-35 años
comenzó a agravarse y traducirse en conductas extrañas (entre
ellas proteger toda su casa con rejas por temor a los vecinos al
darse cuenta de que “pasaban cosas raras”).
La paciente ingresó por primera vez en la sala de psiquiatría
de nuestro hospital a los 49 años. Presentaba pseudoalucinacio-
nes auditivas, ilusiones perceptivas, falsos reconocimientos, ideas
delirantes de perjuicio y de contenido extravagante, interpreta-
ciones delirantes de la realidad, miedo intenso e insomnio.
Pasados tres días del inicio de la toma de neurolépticos, desapa-
reció la certeza de persecución o conspiración y se redujeron las
alteraciones perceptivas. Al finalizar el ingreso comenzó a ser
atendida de forma regular en el centro de salud mental.
Durante seis años, hasta el momento en el que se produjo el
segundo ingreso, permaneció asintomática realizando crítica del
delirio. En el nuevo ingreso presentaba trastornos de la conducta
derivados de las ideas delirantes y negativa a ingesta de medica-
*Psicólogo Interno Residente del Hospital Universitario La Fe.
Valencia.
**Psiquiatra del Centro de Salud Mental de Catarroja. Valencia.
***Psiquiatra del Servicio de Psiquiatría del Hospital Universitario
La Fe. Valencia.
****Profesor titular de psiquiatría. 
Endereço para correspondência/dirección:
Paloma Álvarez Mas
C/ Poeta Querol nº 10, puerta 10.
Valencia C.P.: 46002
España.
ción. La psicopatología difería del anterior internamiento, ya que
no presentaba falsos reconocimientos, ni ideas delirantes de
carácter extravagante. En cambio, aparecían alucinaciones audi-
tivas funcionales, gustativas y olfativas junto con ideas delirantes
de filiación y referencia. Con la medicación neuroléptica, al fina-
lizar el ingreso, habían desaparecido los trastornos de conducta y
las alteraciones sensoperceptivas, pero persistía la ideación deli-
rante sin modificar.
Tras unos meses de abandono de la medicación, a los 54
años, se produjo el tercer y último ingreso de la paciente, hasta el
momento. Volvieron a aparecer pseudoalucinaciones auditivas,
ideas delirantes de filiación y perjuicio. Presentaba así mismo, dos
nuevos fenómenos psicopatológicos, vivencias de influencia y de
imposición del pensamiento.
Para finalizar hay que señalar que durante los años transcur-
ridos desde el primer ingreso, no ha existido un deterioro impor-
tante en el funcionamiento sociolaboral de la paciente.
Discusión
Como hemos señalado en la introducción, a lo largo de la his-
toria ha existido una interesante controversia en torno a la deli-
mitación entre los cuadros esquizofrénicos y los cuadros de para-
noia. Remitiéndonos al concepto original de la esquizofrenia,
Kraepelin en su Tratado de las enfermedades mentales, introdujo
el término “demencia precoz”, expresión que ya había utilizado
Benedict Morel (“démence précoce”) para describir a los pacien-
tes que habían enfermado en la adolescencia y se habían deterio-
rado con el paso del tiempo.6 Kraepelin la consideró una psicosis
funcional junto con la paranoia y la psicosis maníaco-depresiva.
Reunió el patrón hebefrénico, junto con el catatónico y el para-
noide y destacó la extravagancia de las ideas delirantes presentes.
Una de las características fundamentales sería que conduciría a
un estado de defecto, lo que la diferenciaría de la psicosis manía-
co-depresiva, con un curso deteriorante a largo plazo y síntomas
clínicos frecuentes del tipo alucinaciones y delirios.3 Por su parte
Bleuler, quien acuñó el término esquizofrenia, aportó una visión
distinta de la enfermedad, buscó criterios psicológicos comunes y
trastornos elementales de las grandes funciones mentales (asocia-
ción de ideas, afectividad, contacto con el mundo exterior y
ambivalencia) que se encontrarían en la base de la demencia pre-
coz llegando a la noción de esquizofrenia, a su vez defendió una
evolución más variable, con casos residuales próximos a la cura-
ción. Además Bleuler, diferenciándose también en este punto de
Kraepelin, señaló que las

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