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1 DIREITO CIVIL III - CONTRATOS PROF. DANIEL PAIVA UNIDADE IX – CONTRATOS EM ESPÉCIE: COMPRA E VENDA Após o estudo da Teoria Geral dos Contratos, no qual se encontram os princípios e fundamentos básicos que servem de orientação para a generalidade dos ajustes e convenções bilaterais, passamos agora a tratar das várias espécies de contrato. A primeira delas: o contrato de compra e venda (verbal ou escrito), é a espécie mais comum dos contratos. Em nosso dia-a-dia realizamos inúmeras operações de compra e venda, muitas vezes sem prestar atenção. Por exemplo, quando saímos para jantar, quando compramos um chiclete na banca, estamos realizando pequenas operações de compra e venda. Não é à toa que essa é a primeira espécie a ser tratada pelo Código Civil, sendo que outros contratos, como permuta, são regulados também pelas disposições do contrato de compra e venda. 1. CONCEITO DE COMPRA E VENDA: Primeiramente, devemos esclarecer que o contrato de compra e venda não gera efeitos reais, ou seja, não transfere, por si só, o domínio do bem alienado. O contrato de compra e venda é tão somente gerador de obrigações pessoais para as partes: •••• Para o Vendedor – A obrigação de transferir a coisa vendida; •••• Para o Comprador - A obrigação de pagar o preço ajustado. Ver: art.481 do CC/2002 Porém, a transferência do domínio só ocorre com a tradição (entrega) do bem, no caso de bem móvel; ou com o registro do título de compra no Registro de Imóveis na hipótese de bem imóvel. Ver: arts. 1.267 e 1.245 do CC/2002, respectivamente. Nestes termos, denomina-se Compra e venda: O contrato bilateral pelo qual uma das partes (vendedor) se obriga a transferir o domínio de uma coisa à outra parte (comprador), mediante a contraprestação de certo preço em dinheiro. Nota-se, ainda, a existência de 2 atores fundamentais neste cenário jurídico: o vendedor (que se obriga à transferência do domínio) e o comprador (que se obriga ao pagamento do preço). Importante também destacar, que o contrato de compra e venda pode ter objeto bens de toda natureza: bens corpóreos (compreendendo móveis e imóveis), bem como bens incorpóreos. Todavia, para a alienação dos bens incorpóreos reserva-se, como mais adequada e correta tecnicamente, a expressão “cessão” ao invés de “compra e venda”. Por exemplo: cessão de crédito, cessão de direitos autorais, cessão de direitos hereditários, etc. 2 2. CARACTERÍSTICAS DO CONTRATO DE COMPRA E VENDA: Na sua caracterização jurídica, diz a doutrina que este contrato é: Sinalagmático (Bilateral) - Envolve prestações recíprocas de ambas as partes. O comprador deve entregar o preço enquanto o vendedor deve entregar a coisa; Em regra, Consensual – Depende apenas da vontade das partes. Estando ambas de acordo com o objeto e o preço, o contrato é realizado. Não se exige, em regra, formalidade específica para o contrato de compra e venda. Todavia, este contrato terá caráter solene quando, além do consentimento, a lei exigir uma forma para sua celebração; Ver: art. 108 CC/2002 Oneroso – Tanto o comprador quanto o vendedor têm prestações a cumprir, que envolvem transferência de seu patrimônio; Em regra, Comutativo – Em linhas gerais, as prestações são certas e as partes podem antever as vantagens e os sacrifícios da contratação, que geralmente se equivalem. Contudo, admite-se a compra e venda aleatória (por exemplo: compra e venda de safra futura de soja); 3. ELEMENTOS DO CONTRATO DE COMPRA E VENDA: Além dos requisitos gerais de validade dos negócios jurídicos (art. 104 CC/2002), o contrato de compra e venda, pela sua própria natureza, exige ainda, como elementos integrantes: Consentimento (consensus) – O consentimento deve ser livre e espontâneo, sob pena de ter a sua validade afetada pelos vícios ou defeitos do negócio jurídico (erro, dolo, coação, etc.). O consentimento recíproco deve abranger o acordo quanto ao objeto do contrato e quanto ao preço. Ver: art. 482 CC/2002 Preço (pretium) – Em regra, o preço deverá ser fixado pelas próprias partes, segundo a autonomia de suas vontades. Contudo, esta autonomia de vontade não é absoluta, uma vez que o preço deve observar o princípio da equivalência material das prestações1, bem como deve ser sério (no sentido de não ser insignificante), pois, em caso contrário, configurar-se-ia uma doação simulada. Admite-se, ainda, que o preço possa ser fixado por terceiro designado (art. 485) ou fixado pelo mercado (art. 486 e 487). Ver: arts. 485, 486, 487 e 489 CC/2002 Coisa (res) – O bem, objeto do contrato de compra e venda, deverá ser coisa passível de comercialização, certa e determinada (ou determinável), o que afasta, por consequência, todos os interesses não suscetíveis de aferição ou valor econômico essencial, como a honra, o nome, a integridade física, a vida, etc. A lei admite ainda que a compra e venda tenha por objeto coisas atuais (existentes e disponíveis ao tempo da celebração do negócio) ou futuras (ainda que não tenham existência real, é de potencial ocorrência), bem como que seja realizada à vista de amostras, protótipos ou modelos. Ver: arts. 483 e 484 CC/2002 1 O princípio da equivalência material das prestações busca realizar e preservar o equilíbrio real de direitos e deveres no contrato, antes, durante e após sua execução, para harmonização de interesses. 3 4. EFEITOS ESPECÍFICOS DA COMPRA E VENDA: Os principais efeitos da compra e venda são: Surgimento de obrigações pessoais recíprocas – A celebração de um contrato de compra e venda gera obrigações recíprocas para os contratantes: para o vendedor - a de transferir o domínio de certa coisa; e para o comprador - a de pagar-lhe certo preço em dinheiro; Ver: art. 481 CC/2002 Repartição das despesas – Em regra, as despesas de escritura e registro ficam a cargo do comprador. Ao passo que as despesas da tradição (tais como as despesas de transporte da coisa e de sua entrega no local combinado) ficam a cargo do vendedor. Admite-se, ainda, que as partes possam livremente negociar estas despesas, no sentido de repassar o ônus à parte contrária. Ver: art. 490 CC/2002 Direito de reter o preço ou a coisa – Na “compra e venda à vista”, as obrigações são recíprocas e simultâneas, mas cabe ao comprador o primeiro passo: pagar o preço. Antes disso, o vendedor não é obrigado a entregar a coisa, podendo retê-la, ou negar-se a assinar a escritura definitiva até que o comprador satisfaça a sua parte. Na mesma linha de raciocínio, sendo a “venda a crédito”, pode o vendedor sobrestar a entrega da coisa, se antes da tradição o comprador cair em insolvência, até obter dele caução de que pagará no tempo ajustado. Ver: arts. 491 e 495 CC/2002 Responsabilidade pelos riscos – Até o momento da tradição dos bens móveis e o registro dos bens imóveis, a coisa pertence ao vendedor. Assim, os riscos da coisa perecer ou se danificar, até esse momento, correm, portanto, por conta deste (vendedor); ao passo que os riscos do preço se perder, por conta do comprador. De mesma forma, se a coisa for expedida para lugar diverso de onde se encontrava ao tempo da venda, por ordem do comprador, por sua conta correrão os riscos, uma vez entregue à transportadora indicada. Ver: arts. 492 e 494 CC/2002 Responsabilidade pelos débitos existentes – Salvo disposição em contrário, o vendedor responde por todos os débitos que onerem a coisa até o momento da tradição, se móvel, ou até o momento do registro, se imóvel. Ver: art. 502 CC/2002 Responsabilidade pelos vícios redibitórios e pela evicção – Tão íntima a conexão entre estas responsabilidades e a compra e venda,que em alguns sistemas as respectivas teorias estão inseridas na dogmática deste contrato. Para o nosso direito, com maior rigor científico, o seu lugar é na teoria geral dos contratos, pois que a outros contratos, além da compra e venda, se aplicam também. E como anteriormente visto, enquanto que os vícios redibitórios garantem o adquirente contra os defeitos materiais da coisa, a evicção garante o comprador contra os defeitos jurídicos da coisa. Ver: arts. 441 e 447 CC/2002 4 5. VENDAS ESPECIAIS: Venda por amostra - Ocorre quando a venda se dá com base em amostra exibida ao comprador. O comprador tem direito de receber coisa igual à amostra. Ver: art. 484 CC/2002 Venda ad mensuram – Trata-se da venda em que o preço é estipulado em razão da real dimensão do imóvel. Ou seja, o objetivo do adquirente é comprar uma coisa com determinado comprimento necessário para desenvolver uma finalidade. No caso de venda ad mensuram, o comprador tem o direito de exigir que a coisa vendida tenha as medidas acertadas, e, não o tendo, pode pedir a complementação da área, ou caso isso não seja possível, rescindir o contrato de compra e venda. Ver: caput, §1º e §2º do art. 500 CC/2002 Venda ad corpus – Nessa espécie de venda, o imóvel é adquirido como um todo, como corpo certo e determinado, caracterizado por seu conjunto, não sendo determinante na estipulação do preço as suas dimensões. Ou seja, as partes estão interessadas em comprar coisa certa e determinada, independentemente da sua extensão. Nestes casos, entende-se que a referência à medida do terreno é meramente enunciativa. Ver: §3º do art. 500 CC/2002 6. CLÁUSULAS ESPECIAIS DO CONTRATO DE COMPRA E VENDA: As ditas cláusulas especiais (também chamadas de pactos acessórios à compra e venda) são, na verdade, condições especiais insertas no contrato, subordinando a eficácia do negócio jurídico pretendido e celebrado a eventos futuros. Estas cláusulas especiais podem ou não estar presentes nos contratos de Compra e Venda, a critério das partes. Retrovenda - É a cláusula pela qual o vendedor, em acordo com o comprador, fica com o direito de, em até 3 (três) anos, recomprar o imóvel vendido, devolvendo o preço e todas as despesas feitas pelo comprador. O direito de resgate ou retrato poderá ser exercido conforme estipulado na cláusula, não podendo ultrapassar o prazo de 3 anos. Não se aplica a bens móveis, só a bens imóveis. A aplicabilidade da retrovenda é de iniciativa do vendedor e torna ineficaz a venda originária, reconduzindo os contratantes à situação anterior ao contrato. A retrovenda se extingue pelo seu exercício, pela decadência do prazo de três anos, pela destruição do imóvel (ex: incêndio, desmoronamento) ou pela renúncia do vendedor a esta cláusula. Ver: arts. 505 a 508 CC/2002 Venda a contento - É a cláusula pela qual fica a compra e venda subordinada à condição de somente se tornar definitiva se o comprador ficar satisfeito com a coisa que lhe foi vendida. Esta cláusula, caso inserida pelas partes, permite desfazer o contrato se o comprador não gostar da coisa adquirida (por exemplo: a venda de um barbeador elétrico com prazo de alguns dias para o comprador experimentar o produto). O comprador não precisa dar os motivos caso não queira ficar com o bem (é verdadeira cláusula de arrependimento em benefício do comprador). O prazo para denúncia do contrato será livremente pactuado entre as partes. Ver: art. 509 CC/2002 5 Venda sujeita a prova – É a cláusula pela qual presume-se feita a venda sob a condição suspensiva de que a coisa tenha as qualidades asseguradas pelo vendedor e seja idônea para o fim a que se destina. Percebam que neste caso, a condição para desfazimento do negócio não está ligada à satisfação ou gosto do comprador, mas SIM à circunstância de a coisa ter ou não as qualidades asseguradas pelo vendedor e ser ou não idônea para o fim a que se destina. Assim, a recusa do comprador não poderá ser injustificada. Ver: art. 510 CC/2002 Preempção ou Preferência - É a cláusula segundo a qual o comprador (novo proprietário) fica na obrigação de oferecer ao vendedor (antigo proprietário) a coisa comprada, se algum dia vier a pretender vendê-la. Exigem-se duas condições para se efetivar: que o comprador queira vender e que o vendedor (ex-dono) pague o mesmo preço ofertado a terceiros, e não o preço pelo qual vendeu. Ver: arts. 513 a 520 CC/2002 Venda com reserva de domínio - É a cláusula pela qual o vendedor reserva para si a propriedade até que o preço esteja integralmente pago. Assim, o comprador assume a posse da coisa, mas só se tornará seu proprietário após pagar o preço integral. Não se aplica a imóveis, só a móveis comprados a prazo, bem como só recai sobre coisas infungíveis. A cláusula de reserva de domínio deverá ser expressamente estipulada e por escrito, dependente ainda de registro (Cartório de Títulos e Documentos). Ver: arts. 521 a 528 CC/2002 Venda sobre documentos - Muito comum nos negócios de importação e exportação. É assim chamada, pois na venda sobre documentos, a tradição física da coisa é substituída pela entrega do seu título representativo e de outros documentos exigidos pelo contrato. Um exemplo bastante comum no comércio internacional: É o ocorre na venda de mercadoria ainda em transporte, depositada em armazém ou pendente de liberação na alfândega, em que o vendedor entrega ao comprador um título (warrant, conhecimento de embarque – BL ou outro documento hábil) para o recebimento da coisa, que se encontra com terceiros. Ver: arts. 529 a 532 CC/2002 7. RESTRIÇÕES AO CONTRATO DE COMPRA E VENDA: Compra e Venda de ascendente a descendente - É anulável a venda de ascendente a descendente, quando os demais descendentes e o cônjuge não tiverem expressamente consentido. Ver: art. 496 CC/2002 Compra e venda de imóvel entre marido e mulher - É vedada a compra e venda entre marido e mulher que tenha por objeto bem que integre o acervo dos bens comuns do casal. Ver: art. 499 CC/2002 Imóvel pendente de indivisão - Enquanto pendente o estado de indivisibilidade do bem, o condômino não poderá vender a sua parte a estranho, sem oferecer primeiro ao outro condômino. Ver: art. 504 CC/2002 Venda sem anuência do cônjuge - Com exceção do casamento com regime da separação absoluta de bens, não pode o cônjuge, sem a anuência do outro (outorga uxória), realizar contrato de compra e venda que tenha por objeto imóvel de qualquer valor; Ver: art. 1.647, I, CC/2002. 6 QUESTÕES PARA REVISÃO DA UNIDADE 01. Quanto à classificação, o contrato de compra e venda de imóveis se apresenta da seguinte forma: a) Consensual, bilateral, oneroso e não solene; b) Consensual, bilateral, oneroso e solene; c) Bilateral, oneroso, formal e aleatório; d) Oneroso, bilateral, não formal e consensual; 02. A compra e venda entre cônjuges é: a) ineficaz enquanto não dissolvida a sociedade conjugal. b) válida com relação a bens integrantes ou não da comunhão. c) nula em relação a quaisquer bens, porque implica alteração do regime de bens entre cônjuges. d) válida com relação a bens excluídos da comunhão. 03. A cláusula segundo a qual o vendedor de coisa imóvel pode reservar-se o direito de recobrá-la, em determinado prazo, restituindo o preço recebido e reembolsando as despesas do comprador, é denominada: a) venda com reserva de domínio. b) preempção ou preferência. c) venda a contento. d) retrovenda. 04. É correto afirmar sobre os contratos de compra e venda, EXCETO: a) Pode ter por objeto coisa atual ou futura; b) Pode o preço ser fixado por terceiro designado pelas partes; c) Até o momento da tradição, os riscos da coisa corrempor conta do comprador, e os do preço por conta do vendedor; d) Nas coisas vendidas em conjunto, o defeito oculto de uma não autoriza a rejeição de todas. 05. Sobre os contratos de compra e venda, marque a opção INCORRETA: a) É nulo quando se deixa ao arbítrio exclusivo de uma das partes a fixação do preço; b) É lícito o contrato de compra e venda entre os cônjuges, com relação a bens pertencentes à comunhão; c) A cláusula de reserva de domínio deve ser estipulada por escrito e depende de registro no domicílio do comprador para valer contra terceiros; d) Quando o contrato de compra e venda for pura, considera-se obrigatório e perfeito, desde que as partes acordem no objeto e no preço. 06. Marcelo firmou com Augusto contrato de compra e venda de imóvel, tendo sido instituído no contrato o pacto de preempção. Acerca do instituto da preempção, assinale a afirmativa correta: a) Trata-se de pacto adjeto ao contrato de compra e venda em que Marcelo impõe a Augusto a obrigação de oferecer a coisa quando vender, ou dar em pagamento, para que use de seu direito de prelação na compra, tanto por tanto; b) Trata-se de pacto adjeto ao contrato de compra e venda em que Marcelo se reserva ao direito de recobrar o imóvel vendido a Augusto no prazo máximo de 3 anos, restituindo o preço recebido e reembolsando as despesas do comprador. c) Trata-se de pacto adjeto ao contrato de compra e venda em que Marcelo reserva para si a propriedade do imóvel até o momento em que Augusto realize o pagamento integral do preço; d) Trata-se de pacto adjeto ao contrato de compra e venda em que Marcelo, enquanto constituir faculdade de exercício, poderá ceder ou transferir por ato inter vivos. 07. Ambrósio, empresário bem sucedido e pai de 5 filhos, pretende vender um imóvel de sua propriedade para seu filho mais velho, João, que com suas economias irá comprar e nesse local iniciar sua própria empresa. Diante de tal situação, explique em breves palavras quais seriam os cuidados que Ambrósio deveria observar para que este negócio jurídico de compra e venda fosse válido e eficaz.
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