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O Poliamor como prática subversiva da heteronormatividade

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS 
FACULDADE DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS HUMANAS 
DEPARTAMENTO DE SOCIOLOGIA 
 
 
 
 
 
Marco Túlio Fernandes 
 
 
 
 
 
Poliamor como prática subversiva da heteronormativadade 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Belo Horizonte 
14 de Novembro de 2017 
 
 
Marco Túlio Fernandes 
 
 
 
 
 
 
 
Trabalho de Sociologia 
 
 
Trabalho de Sociologia apresentado ao curso 
de Ciências Sociais da Universidade Federal 
de Minas Gerais como atividade avaliativa de 
trinta pontos. 
 
Professor: Dimitri Fazito 
Disciplina: Sociologia I 
Turma: Ciências Sociais 2017/2 
 
 
 
 
 
 
Belo Horizonte 
14 de Novembro de 2017 
1 
 
1 OBJETIVO DA DISSERTAÇÃO 
A pretensão deste trabalho não é fazer uma síntese ou explicar a teoria do amor 
e a teoria das relações interpessoais propostas por Georg Simmel. O conhecimento 
produzido por esse autor e a sua filosofia são amplos e não cabem em totalidade 
nesta breve dissertação que, por sua vez, objetiva pontuar análises sociológicas 
diante da normatividade monogâmica. Na forma positiva, ao tratar desta 
problemática, serão feitos breves comentários sobre o que se configura como 
Poliamor e como este se estabelece de modo a subverter estruturas sociais 
opressoras no ocidente, como o patriarcado e a heterossexualidade compulsória1, a 
fim de relacionar estes temas com o pensamento simmeliano. 
2 O POLIAMOR E A HETERONORMATIVIDADE 
A formação da sociedade ocidental e a acumulação histórica que construiu todo 
o seu tradicionalismo fundamentou-se em séculos de conflitos ideológicos e 
imposições violentas de costumes. Foi desta forma que o cristianismo estabeleceu 
sua hegemonia e conseguiu disseminar as práticas patriarcais e monogâmicas. 
Apoiada no surgimento dos Estados-Nações, a tradição cristã conseguiu legitimar 
seus preceitos religiosos nos regimentos jurídicos que organizam a vida civil, aliando 
o poder político do Estado, caracterizado pelo uso exclusivo da força e da violência2, 
na punição do sujeito ou do grupo que resolvesse ir contra aquelas normas. Tal 
legitimação se encontra presente ainda na contemporaneidade, como a 
criminalização do casamento entre mais de duas pessoas e a recente lei que 
permite o divórcio (após a década de 50, houve uma quantidade considerável de 
países que, a partir de muita luta, resolveu reconhecer este direito). 
Dentro deste contexto, a monogamia institui-se paralelamente ao processo de 
normatização da heterossexualidade, que corresponde terminologicamente à 
“heteronormatividade” e que expressa “as expectativas, as demandas e as 
 
1
 “Heterossexualidade compulsória” foi o termo utilizado primeiramente pela escritora Adrienne Rich, 
em seus ensaios feministas, para designar a atuação institucional da heteressexualidade na 
sociedade e a maneira como ela oprime as diferentes manifestações sexuais. Desta forma, 
reverberam comportamentos sociais sexistas, radicais e intolerantes, acabando por invisibilizar a 
diversidade de expressões afetivas e sexuais do ser humano. Revista Bagoas. Edição 05. Ano 2010. 
p.17-44. 
2
 Definição de poder político de Noberto Bobbio. BOBBIO, 1998, p. 954-962. 
2 
 
obrigações sociais que derivam do pressuposto da heteressexualidade como natural 
e, portanto, fundamento da sociedade”3. Logo, o homem e a mulher, exclusivos um 
ao outro, caracterizaram o que se pressupõe ser a configuração ideal de união. 
O que vem se fundar como poliamor não atenderá a este critério de naturalidade 
imposto e subverterá a ideia do senso comum de que a capacidade afetiva ou, 
melhor dizendo, as manifestações amorosas dos seres humanos não são variáveis e 
diversas. Há, portanto, um aspecto revolucionário em assumir a pluralidade que o 
poliamor teoriza. Abrindo mão da extensa explicação desde o surgimento do termo 
até a sua configuração social atual, a definição objetiva é: 
“modalidade conjugal que apregoa a primazia do amor não exclusivo, por 
meio de lógicas institucionalizadas na possibilidade de estabelecer múltiplas 
relações afetivo-sexuais de modo concomitante, igualitário e consensual”
4
. 
É importante esclarecer que o poliamor não é antônimo a monogamia. Isso 
porque ele leva em consideração diversas manifestações que não existem 
antiteticamente nas práticas monogâmicas e também porque não é a única 
manifestação “não-monogâmica”. Além disso, os poliamoristas5 
“não são poligâmicos, uma vez que a poligamia pressupõe assimetria de 
gênero, ou seja, há um único poligâmico em cada relação. No poliamor, é 
indispensável que a possibilidade de mais de um relacionamento amoroso 
simultâneo seja tanto de homens quanto de mulheres”
6
. 
Diante disso, os tipos de combinações numa relação de poliamantes são muito 
diversas, pois abre-se a possibilidade de estabelecer vínculos afetivos de modo não-
arbitrário. A liberdade e o consenso são tratados sob um aspecto extremamente 
distante da forma como é tratada numa relação monogâmica e sendo assim, a 
 
3
 CHAMBERS, 2003; COHEN, 2005, p.24 
4
 COSTA, Tatiane; BELMINO, Marcus Cézar. Poliamor: da institucionalização da monogamia à 
revolução sexual de Paul Goodman. Revista IGT na Rede, v. 12, no 23, 2015. p. 411 – 429. 
Disponível em <http://www.igt.psc.br/ojs>. Acesso em: 11 de Novembro de 2017. p.412. 
5
 “Adjetivações para a prática e para os sujeitos adeptos às relações afetivo-amorosas que são 
centrais neste trabalho: “poliamorista”, “poliamante”, “poliamoroso/a” são os termos mais 
referendados. Nesse sentido, optarei por padronizar a escrita a partir dos termos que mais surgiram 
em campo: quando eu estiver tratando dos sujeitos praticantes do poliamor, utilizarei a expressão 
“poliamorista” (por exemplo, “Marina é poliamorista”); para as relações, utilizarei “poliamorosas” (as 
relações poliamorosas [...]). Isto porque em campo notei que o uso do sufixo “ista” se referia quase 
sempre à prática, enquanto que o sufixo “oso” ou “osa” dizia respeito quase sempre à característica 
ou à qualidade das relações. O termo “poliamante”, também apropriado para os sujeitos, era utilizado 
de forma bem menos frequente, contudo será utilizado durante a escrita (quando aparecer) como 
sinônimo de poliamorista.” FRANÇA, 2016, p.22 
6
 PILÃO, Antonio C. GOLDENBERG, Mirian. Poliamor e Monogamia: construindo diferenças e 
hierarquias. In: Revista Ártemis, Edição V.13; jan-jul, 2012, pp.65-71. 
3 
 
maneira de se pensar “amor”/”afeto” e outros temas relevantes numa relação 
conjugal, como o sexo, é sob uma ótica abolicionista, no que diz respeito à dogmas. 
 Retornando brevemente à institucionalização da monogamia junto à 
heterossexualidade, é evidente a invisibilização da monogamia de casais não-
heterossexuais. No poliamor, a forma de reconhecer a existência de pessoas não-
heterossexuais e dar à elas visibilidade leva a multiplicação da quantidade de 
combinações que podem existir na hora de se configurar a relação, ou seja, é algo 
positivo e de contribuição para a diversidade. 
Para finalizar, é notável a disparidade entre o modo como a monogamia e o 
poliamor trata a questão de gênero, principalmente se for um relacionamento de 
héteros. A começar pela subordinação da mulher para com o homem manifestado 
nesta primeira ordem e pela liberdade de posicionamento que a mulher possui nesta 
segunda ordem. Além disso, ao contrário das instituições adeptas ao monogamismo, 
o poliamor reconhece a existência de gêneros não-binários, ou seja, vai muito além 
da atmosfera normativa. 
3 A SUBVERSÃO DAS PRÁTICAS NORMATIVASO livro “Filosofia do amor” reúne muitas reflexões feitas por Simmel acerca do 
sentimentalismo e do vínculo, a priori, afetivo que une pessoas e acabam por formar 
grupos. Em muitos textos do alemão é possível encontrar referências tratando da 
monogamia e em um deles, intitulado “Sobre a sociologia da família” (1895), a 
dissertação ilustra como as sociedades, a partir das suas necessidades coletivas, 
moldam as estruturas de agrupamento e acrescentam sentidos subjetivos a elas. 
Georg Simmel escreve sobre como o surgimento da propriedade privada e da figura 
patriarcal fundaram a ideia de monogamia e de matrimônio. Logo após isso, a ideia 
de amor individual é constrangida a ser fundamento principal do casamento. É 
interessante pontuar que em casamentos “arranjados” a lógica continua sendo a 
mesma, de algo conveniente e acrescido de sentimentos subjetivos logo após o 
contrato, que no caso aconteceria nas núpcias e na convivência diária entre os 
casados. Diante disto, Simmel complementa: 
“Aqui produziu-se uma inversão que a sociologia pode constatar em pontos 
tão numerosos quanto importantes: o que para a espécie era uma causa, 
4 
 
para o indivíduo é um efeito, e vice-versa. A entrada em vigor do casamento 
monogâmico, tal como decorria de circunstâncias econômicas e sociais, 
levou em geral ao sentimento específico de amor e de fidelidade por toda a 
vida; e agora, inversamente, o nascimento de tal sentimento é o motivo para 
contrair matrimônio.”
7
 
A possível avaliação que se fará, ao relacionar a dinâmica do poliamor com o 
conceito de família e como esta deve ser constituída, é a de que se encontrou o 
primeiro ponto de subversão, onde será combatida a ideia de modelo universal e 
serão propostas outras maneiras de classificar um grupo social como um núcleo 
familiar. De fato esse combate ocorre, mas não se pode inferir que existe uma 
subversão total, visto que, o poliamor não se põe contrário à definição de família: um 
grupo para conjugar inúmeros interesses bastante diversos – eróticos, econômicos, 
religiosos, sociais, interesses de poder ou de desenvolvimento pessoal –, que se 
alternam e geram combinações diferentes em dados momentos e acabam por atuar 
na vida dos indivíduos envolvidos8. 
Desconsiderando a ordem de apresentação das considerações que serão feitas 
a partir de agora, dentro da filosofia simmeliana foram resgatados alguns conceitos 
que ilustrarão, com clareza, em quais passos o poliamor adquire seu caráter 
revolucionário. Todos eles estão relacionados ao tipo de interação que se 
estabelece e como as circunstâncias sob as quais aquele grupo está submetido 
alteram a dinâmica coletiva. 
As primeiras considerações são em relação a determinação quantitativa do 
grupo. O que se troca experimentalmente num relacionamento está diretamente 
ligado à maneira como foi estabelecida aquela união. Na comparação feita por este 
trabalho anteriormente entre a forma monogâmica e poliamorista é totalmente 
compreensível que existam, em cada tipo, circunstâncias geradas pelo simples fato 
de se ter duas pessoas compartilhando algo e de se ter mais de duas pessoas em 
convivência. 
“[...] certos outros desenvolvimentos são impostos ao grupo por certas 
modificações puramente quantitativas, mas nem mesmo estes 
desenvolvimentos surgem automaticamente – pois dependem também de 
outras características, além das numéricas. O ponto decisivo, entretanto, é 
 
7
 SIMMEL, 1993, p.34 
8
 SIMMEL, 1993, P.21 
5 
 
que esses desenvolvimentos não são o resultado destas características 
somente, mas que eles só se produzem sob certas condições numéricas.”
9
 
É o que explica, por exemplo, a questão do radicalismo tão presente nas 
relações monogâmicas. A possibilidade de se relacionar com mais de uma pessoa e 
estabelecer as próprias regras daquele pacto, no poliamor, necessariamente 
compreende o estabelecimento de regras que consigam suportar a diversidade de 
desejos existentes, de personalidades conflitantes, de anseio por liberdade, e que, 
consiga manter o grupo em contato. Sendo assim, as regras daquele consenso tem 
de ser acessível a todos e portanto, tem um caráter mais simplista e genérico. O que 
se percebe nas relações monogâmicas é, em muitos casos, o ciúme em seu estado 
mais radical. Na filososia simmeliana, os estudos sobre o ciúme estiveram 
associados aos estudos do conflito. 
“Assim é porque o conflito cumpre com a mesma competência o fim básico 
de propiciar a associação entre os indivíduos. Em um raciocínio paradoxal, 
Simmel defende que o conflito realiza o contato interpessoal com ainda 
mais propriedade que as outras formas de relação social, uma vez que aí os 
ânimos se encontram intensificados, gerando ações extremamente 
recíprocas. O que causa preocupação, na verdade, é o fator da dissociação, 
marcado pela ausência de reciprocidade, que torna os indivíduos isolados 
de modo definitivo. O conflito, ao contrário, permite uma solução para a 
unidade.”
10
 
O que se conclui desta reflexão é que o ciúme se idealiza como a aniquilação da 
individualidade. Para os poliamoristas, os desejos e ambições individuais podem ser 
preservados e ainda existe espaço para experiências de reciprocidade. O que se 
coloca como central é a liberdade individual como algo natural e inerente ao ser 
humano e que, devido a essa individualidade, é impossível realizar planos a partir da 
perspectiva unitária monogâmica, ou seja, duas pessoas diferentes somadas a todas 
as implicações subjetivas disso e agindo como se fossem uma coisa só. 
A noção de fidelidade simmeliana aplicada aos poliamoros e aos monogâmicos 
gera mais oposição. Para o sociólogo, a fidelidade é um dos atributos onde esta 
apoiada a capacidade de perpetuar vínculos que integram a sociedade e por isso, 
sem ela, o mundo social se desfaleceria. O que gera dissemelhança é na maneira 
como a fidelidade é apropriada. Ser exclusivo ao outro na monogamia é sinônimo de 
ser fiel. O que ocorre entre os poliamoristas é um conceito mais subjetivo: ser fiel é 
 
9
 SIMMEL, 1983, p.90-91. 
10
 DOLZANI, 2013, p.189. 
6 
 
estar em acordo com seus interesses individuais e, a partir do consenso, também 
estar de acordo com seus parceiros. 
Quando se trata de liberdade, Simmel faz levantamentos acerca da dominação 
como forma de interação. Logicamente, o que mais se aproxima de uma relação 
entre superordenador e subordinado na sociedade ocidental são as práticas 
heteronormativas impostas às mulheres. O machismo e a estrutura patriarcal 
delimitam o quão expressivo pode ser o comportamento das mulheres dentro de 
uma relação. Num relacionamento de subordinação, onde o ciúme é expresso de 
modo incisivo e a fidelidade é sob a ótica de propriedade (no caso, a mulher sendo 
propriedade do homem), a espontaneidade é quase excluída em sua totalidade. A 
mulher age de acordo com a normatividade que lhe foi impregnada toda a vida para 
atender as demandas do homem. Na recente divulgação de dados sobre o suicídio 
no Brasil pelo Ministério da Saúde11, concluiu-se que o casamento (no Brasil só se 
considera casamento a união civil entre duas pessoas, portanto, o dado se refere a 
casamentos monogâmicos) é um fator de proteção para homens e de risco para 
mulheres, devido ao alto índice de violência doméstica que elas sofrem de seus 
parceiros (19% das vezes a violência é praticada pelo atual companheiro e em 16% 
são ex-companheiros)12 e que acabam por aumentar as chances de suicídio. Nessas 
situações, a exclusão da espontaneidade da mulher chega muito próximo da total. 
A problemática do machismo não está resolvidano poliamor, entretanto, o modo 
como é pensada a figura individual do ser humano, independente do gênero, não 
reafirma a estrutura heteronormativa que tradicionalmente oprime a mulher. De 
modo contrário, as mulheres poliamoristas e os homens poliamoristas têm total 
liberdade de decidirem como vão construir suas respectivas relações. O que se 
propõe também é uma desconstrução de ideias do senso comum como a de que o 
ciúme é da natureza humana. A possibilidade de flexibilização da estrutura que 
mantém aquela interação agrada a ideia de que os seres humanos são diferentes 
um do outro e se é imposto algo rígido para todo tipo de manifestação individual, 
sempre se estará em desarmonia. 
 
11
 Disponível em: https://www.pragmatismopolitico.com.br/2017/09/boletim-sobre-suicidio-no-brasil-
assustadores.html. Acesso em: 12 de novembro de 2017. 
12
 Disponível em: < https://exame.abril.com.br/brasil/os-numeros-da-violencia-contra-mulheres-no-
brasil/> . Acesso em: 12 de novembro de 2017. 
7 
 
“Amor romântico, para poliamoristas, é um sentimento que implica em 
comportamentos sociais visando exclusividade nas relações, isto é, sugere 
em amar uma pessoa de cada vez, posto que não há desejo sexual e 
sentimento amoroso por mais ninguém, salvo pela pessoa amada. Esta 
perspectiva alude à noção de fidelidade, entendendo esse conceito como 
pilar da exclusividade no relacionamento amoroso. Para poliamantes, o 
amor romântico é instrumento de violência e opressão nas relações 
afetivas; é a idealização de um sentimento que implica necessariamente na 
monogamia e que reitera afetos por eles/as considerados nocivos, tais 
como o ciúme, a possessividade, a angústia pela iminência da infidelidade, 
entre outros.”
13 
Além destas maneiras, o poliamor se afirma subversivamente devido à questão 
moral, trabalhada por Simmel. O que o autor evidencia é a capacidade dos 
indivíduos em interação de se colocarem em oposição a si mesmos e pensar a 
dinâmica de suas próprias vidas sem necessariamente responderem à pressão 
social que lhes é submetida. Quando começam a agir de acordo com esses 
pensamentos, a moral individual é investida de maior poder nas tomadas de 
decisões do que a moral coletiva. Sendo assim, o poliamor construiu seu caráter 
moral personalizado e que se classificam como contrários á moral coletiva, que é 
regida pela heteronormatividade. 
“[...] uma vez que as formas normativas tenham recebido conteúdos 
particulares, estes conteúdos se libertam de seus veículos sociológicos 
originais e chegam a ser uma necessidade interior e autônoma, que merece 
a designação de ideal. Neste estágio, estes conteúdos que são na verdade 
comportamentos ou estados dos indivíduos, têm valor em si mesmos: são 
devidos. Sua importância ou natureza social não lhes dá mais, 
isoladamente, seu caráter imperativo: nesse estágio derivam mais de seu 
valor e importância objetivamente ideal. É verdade que a moralidade se 
torna personalizada.”
14
 
Finalizando, é imprescindível que se resgate o conceito de “aventura” tratado 
por Georg Simmel. A prática poliamorista vai de encontro ao que o autor considera 
como 
“[...] aquilo que é absolutamente descolado do fluxo contínuo visto que 
enquanto o projeto total da vida segue um trajeto linear, com ricas conexões 
com o que lhe é anterior e posterior, a aventura mais se assemelharia a um 
ponto nodal, sem correlações com a continuidade da vida.”
15
 
Ou seja, a dinâmica poliamorista surge diante de um cenário completamente ácido à 
sua existência. A rigidez com que a heteronormatividade trata seus transgressores 
 
13
 FRANÇA, 2016. p.25. 
14
 SIMMEL, 1983, p.102. 
15
 DOLZANI, 2013, p.185-186. 
8 
 
talvez seja o preço mais alto a se pagar por escolher uma vida de aventuras. Simmel 
afirma que uma das mais expressivas formas de aventura é a erótica. “O amor não é 
um acidente na vida do indivíduo, e que para vivenciá-la é preciso lançar-se na sorte 
e acreditar no êxito.”16 Viver a liberdade e compartilhar o estado mais puro e mais 
subjetivo que é possível se encontrar do amor é um ato revolucionário no poliamor. 
 
4 CONCLUSÃO 
Nas dissertações sobre os objetos dos sociólogos e a metodologia que deve ser 
usada nos estudos sociais, Simmel disserta sobre a apreensão de “fenômenos no 
momento de sua sociação livres dos seus conteúdos que ainda não são sociais para 
si”17. A chamada “sociologia pura” aborda temas caros para as ciências humanas e 
em certa medida, faz muitas analogias ao exame que a sociologia deve fazer de si 
mesma. 
Como em muitas de suas obras, Georg Simmel aborda temas com muitas 
reflexões antitéticas e que fundamentam uma maneira muito peculiar de se construir 
o conhecimento. A ideia do poliamor, se levarmos em considerações superficiais, 
aproxima-se de um fenômeno tão contrário as normas impostas pela consciência 
coletiva ou moral ou qualquer outro termo que descreva as imposições sociais que 
existem exteriores ao indivíduo mas necessariamente por causa deles, que pode-se, 
por um momento, acreditar que ela se encontra mais próxima das formas puras de 
manifestações humanas do que das formas corruptas (influenciadas pelas pressões 
sociais). Entretanto, é um erro pensar que a dinâmica poliamorista não está 
submetida aos vícios da coletividade, porque ela nasceu a partir dessa prática 
comunitária e também é exercida dentro dela. 
Concluindo de um modo simmeliano e paradoxal de colocar suas apreensões, 
digo que esse trabalho terá atingido seu objetivo se tiver feito mais indagações sobre 
como se processam essas forças sociais do que afirmações rígidas sobre estas tais. 
 
 
16
 DOLZANI, 2013, p.186 apud SIMMEL, 2004. 
17
 Disponível em: < http://www.antropologia.com.br/res/res35.htm>. Acesso em: 12 de novembro de 
2017. 
9 
 
REFERÊNCIAS 
 
SIMMEL, Georg. Georg Simmel: Sociologia. Coleção Grandes Cientistas Sociais 
34. Organizador [da coletânea]: Evaristo de Moraes Filho. Coordenador: Florestan 
Fernandes. São Paulo: Ática, 1983. 
SIMMEL, Georg. Filosofia do Amor. São Paulo: Martins Fontes, 1993. 
DOLZANI, Miriam. As formas eróticas em Simmel. In: Revista Intratextos, 2013, 
vol 4,no1, p. 180-193. DOI: 10.12957/intratextos.2013.8586 
AMORIM, Patrícia Mafra de. Problemática da monogamia [manuscrito]: 
investigações psicanalísticas acerca da instituição monogâmica em Freud e 
Horney.. 62f. Dissertação (mestrado) – Universidade Federal de Minas Gerais, 
Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas. Belo Horizonte, 19 de Outubro de 
2016. 
RICH, Adrienne. Compulsory Heterosexuality and Lesbian Existence. In: GELP, 
Barbara C. & GELP, Albert (editores). Adrienne Rich's Poetry and Prose. New 
York/London: W.W. Norton & Company, 1993. Disponível em (tradução): 
<http://www.cchla.ufrn.br/bagoas/v04n05art01_rich.pdf>. Tradutor: Carlos Guilherme 
do Valle. Acesso em: 11 de Novembro de 2017. 
BOBBIO, Norberto. Dicionário de Política. Tradução: João Ferreira. 11ed. Brasília: 
Universidade Federal de Brasília. 
FRANÇA, Matheus Gonçalves. Além de dois existem mais: estudo antropológico 
sobre poliamor em Brasília/DF. 136 f. Dissertação (mestrado) – Universidade de 
Brasília, Instituto de Ciências Sociais, Departamento de Antropologia. Brasília, 2016.

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