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Edema 1. Definições: a) Edema define-se como o aumento aparente do volume líquido no espaço intersticial. A expansão do volume intersticial é precedida por ganho de peso e a perda do líquido naturalmente acompanha a perda do peso. b) Formas especiais do edema constituem o acúmulo de líquido nas serosas, ou cavidades fechadas corporais, sendo o acúmulo na cavidade peritoneal a ascite, e o acúmulo na cavidade pleural o derrame pleural ou hidrotórax. c) O edema generalizado é denominado anasarca. Para constatação de anasarca é necessária presença de edema perifárico associado a pelo menos um derrame cavitário. Por exemplo: pacientes com edema de membros inferiores e derrame pleural já podem ser considerados com anasarca. d) O sinal do cacifo é definido como a manutenção da impressão do dedo sobre a pele após digitopressão sobre o local edemaciado. Este sinal é um importante sinal clínico do edema mole, quando há apenas acúmulo de líquido. No edema duro não é possível fazer o sinal do cacifo já que nesse tipo de edema há também acúmulo de proteínas e restos celulares. O edema duro é muito mais raro que o edema mole e só ocorre em situação de lesão de vasos linfáticos. 2. Fisiopatologia A água corporal total constitui 60% do peso corporal e se distribui em dois grandes compartimentos: o espaço intracelular (dois terços da água total) e o espaço extracelular (um terço restante). O líquido extracelular ainda se divide no espaço intravascular e o espaço intersticial. O aumento de volume no espaço intersticial se manifesta como edema e ocorre pela saída de líquido do espaço intravascular. Os mecanismos iniciadores envolvem alterações primárias das forças de Starling (a pressão hidrostática e a pressão coloido-osmótica) e/ou alterações da permeabilidade capilar. Em situação normal há uma natural passagem de líquido dos vasos para o interstício na extremidade arteriolar dos capilares devido ao leve aumento da pressão hidrostática, e dos interstício para os vasos na extremidade venular dos capilares devido ao leve aumento da pressão coloido-osmótica. O excesso de líquido no espaço intersticial decorrente dessa troca é capturado pelos vasos linfáticos. Qualquer alteração da pressão hidrostática (para mais nos vasos e para menos no interstício) ou da pressão coloido-osmótica (para menos nos vasos e para mais no interstício) além do aumento da permeabilidade capilar iniciam a formação de edema. a) Aumento da pressão hidrostática capilar: Qualquer causa local ou sistêmica que diminua a drenagem venosa provocará aumento da pressão hidrostática capilar. O excesso da passagem de líquido para o interstício ultrapassa a capacidade de drenagem do sistema linfático e o líquido se acumula até que a tensão tecidual se torne equivalente a tensão vascular e o edema se estabiliza. Exemplos de condições que levam ao edema local: insuficiência venosa crônica de membros inferiores e trombose venosa. Exemplos de condições que causam edema por aumento sistêmico: insuficiência cardíaca congestiva e insuficiência renal b) Diminuição da pressão coiloido-osmótica plasmática: a pressão coloido-osmótica é dada fundamentalmente pelas concentrações séricas de albumina, uma proteína produzida no fígado, e portanto situações de edema por diminuição da pressão oncótica são estados de hipoalbuminemia e são sempre sistêmicos. Atenção para a cirrose hepática que além do comprometimento hepático para a produção de albumina (pressão coloido-osmótica por hipoalbuminemia) ocorre também aumento da pressão porta por desestruturação do parênquima hepático e portanto aumento da pressão hidrostática do sistema de drenagem venosa abdominal de forma retrógrada, levando a edema na cavidade peritoneal (ascite) Outras causas de diminuição da pressão coloido-osmótica são: síndrome nefrótica, que cursa com albuminúria, desnutrição severa e perda de proteínas pelo trato gastro-intestinal. c) Alterações da permeabilidade capilar: as condições clínicas de lesão endotelial com aumento da permeabilidade capilar e formação de edema são na maioria das vezes de causa local (inflamatória ou alérgica) e não geram grandes edemas. As únicas condições clínicas que geram grandes edemas por aumento da permeabilidade capilar sistêmica é a resposta inflamatória sistêmica que ocorre em situações críticas de septicemia e pancreatite aguda severa e o choque anafilático que ocorre em decorrência da liberação de substâncias vasoativas. Esse tipo de edema tem como característica comum a presença de sinais inflamatórios (sinais cardinais). Queimaduras, traumatismos, infecções bacterianas, agentes químicos e físicos são exemplos de causas de edemas. d) Obstrução linfática: Os edemas causados por deficiência de drenagem linfática são de causa local. Não fazem sinal do cacifo, pela consistência dura, e provocam infiltração e espessamento da pele, o que lhe confere aspecto de casca de laranja. São edemas de difícil tratamento. Exemplos de causas: filariose, linfangites crônicas secundárias a erisipela de repetição, neoplasia linfática, ressecção cirúrgica ou traumatismos. Os mecanismos perpetuadores disparam com a passagem de líquidos para o espaço intersticial a fim de compensar a diminuição do volume intravascular, em especial no leito arterial. A redução do volume arterial efetivo reduz o fluxo renal e desencadeia a ativação do sistema renina-angiotensina-aldosterona (SRAA) que promove aumento da vasoconstricção e da reabsorção de sódio e água, levando ao ciclo vicioso que mantém ou aumenta o edema. Quando o edema é de causa local esse sistema é ativado apenas até corrigir o déficit arterial, já que o edema local estabiliza com o equilíbrio de novas forças de Starling. Já nos edemas sitêmicos os mecanismos perpetuadores são sempre progressivos, agravando o quadro. É sobre os mecanismos perpetuadores que a maioria dos tratamentos agem em relação aos edemas. 3. Propedêutica Na grande maioria dos casos, a história e o exame físico fornecem o diagnóstico da causa do edema. Fundamentalmente, o que se procura é distinguir se o edema é de causa local ou sistêmica e se for sistêmica, se é de origem cardíaca, hepática ou renal (insuficiência renal ou síndrome nefrótica) Devem ser investigados 3 aspectos principais: a) A distribuição dos edemas: os edemas de distribuição assimétrica (unilaterais de membro inferior ou de região periorbitária) são em geral de causa local. Da mesma forma que os edemas simétricos são a princípio de causa sistêmica. b) Variação circadiana e progressão: o edema que surge de forma simétrica nos membros inferiores, se intensifica e ascende ao longo do dia e das semanas sugere insuficiência cardíaca. Já o edema que surge matutino na região periorbitária progride para o acometimento de toda a face e membros superiores sugere doença renal. E o edema que surge como ascite e progride de forma simétrica para os membros superiores sugere doença hepática. c) Características do edema: todas as causas sistêmicas provocam edemas frios, com cacifo e indolores. A diferenciação do linfedema para o edema de origem vascular localizado se dá principalmente pelas características particulares do linfedema, que é duro e causa espessamento da pele. O edema com sinais inflamatórios sugerem causa local por aumento da permeabilidade vascular. Atenção: presença de dor no edema não deve ser confundida com sensação desconfortável de peso, que pode ser interpretada como dor pelo paciente. No caso de hipótese diagnóstica de edema de cause sistêmica deve-se investigar na história do paciente, outros sintomas de doenças de causas sistêmicas. A queixa de dispnéia progressivaaos esforços, ortopnéia ou dispnéia paroxística noturna, dor precordial aos esforços, ou histórico de hipertensão arterial de longa data não tratada sugerem insuficiência cardíaca. História prévia de hepatite, alcoolismo, icterícia ou sangramento digestivo sugerem doença hepática. Já os sintomas urinários são muito inespecíficos. As queixas normalmente são diminuição do volume urinário (oligúria), alterações de coloração da urina (normalmente hematúria) e nictúria que podem também aparecer em pacientes com doença hepática ou cardíaca devido a ativação do SRAA e aumento da concentração urinária. O diferencial da doença renal é a proteinúria, que gera urina espumosa e pode ser identificado em exame de urina. 4. Tratamento Como o edema é um sintoma e um sinal de diversas doenças de patogenias diferentes o tratamento é específico da condição subjacente a ele. Porém de uma forma geral o tratamento do quadro edematoso envolve interferência sobre os mecanismos perpetuadores do edema, ou seja, o SRAA, com administração de diuréticos de alça ou de antagonistas da aldosterona. Em contrapartida, esses tratamentos podem provocar redução drástica do volume arterial efetivo (hipotansão arterial e hipovolemia) e piora da função renal. Portanto o tratamento com diurético deve ser feito com cautela e monitorização do peso e do balanço hídrico do paciente.
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