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8 Genética da cárie OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM: • Compreender de que maneira a genética influencia na formação da cárie • Conheceros principais genes envoLvidosnasuscetibiLidade à cárie índices CPOD (número de dentes cariados, perdidos e obturados) e CPOS (número de superfícies cariadas, perdidas e obturadas) Osdois índices foram criados por KLeine PaLmer,'em 1937, para serem usados tanto em dentes permanentes (CPOD/CPOS) quanto em dentes decíduos (ceod/ ceos).O índice é utilizado para contar e descrever os dentes afetados peLadoença cárie, tanto para medir a prevaLênciada doença quanto sua severidade. A cárie dentária é uma doença bucaL infecciosa, crônica e multifatorial, de alta prevaLência global, com enorme impacto no sistema de saúde pública de países desenvolvidos e em desenvoLvimento. ALém disso, a cárie é uma das mais importantes causas de perda dentária e de dor de dente, dois problemas que estão associados tanto com o desempenho das crianças na escola como com a falta de adultos no trabalho, sendo indicativos de uma diminuição na qualidade de vida. O índice global de dentes cariados, perdidos e restaurados (CPOD) vem sofrendo uma queda nos últimos anos, tanto em países desenvolvidos como em desenvolvimento; no entanto, a cárie continua a afetar de 60 a 90% das crianças em idade escolar e a maioria dos adultos de maneira polarizada -ou seja, a distribuição da doença não é homogênea entre indivíduos de uma população. A doença cárie possui origem multifatorial: sua ocorrência depende .tanto das variáveis ambientais (modificadoras) como de fatores relacionados ao hospedeiro (determinantes). Quando o biofilme é exposto a uma grande quantidade de carboidratos fermentáveis, são selecionadas as bactérias cariogênicas, como Streptococcus mutans, Streptococcus sobrínus e algumas espécies de Lactobacíllus. A exposição contínua aos ácidos produzidos por essas bactérias, associada a uma capacidade limitada de corrigir o pH bucal do hospedeiro, levam a uma descalcificação do dente, processo conhecido como desmineralização. O processo de desmineralização pode ser modificado por fatores ambientais, como higiene bucal e exposição ao flúor, como também por fatores socioeconômicos, como gênero, etnia e idade. Entretanto, a combinação de todos esses fatores ainda não explica completamente a doença cárie. Indivíduos expostos aos mesmos níveis de fatores de risco arnbientais apresentam diferenças no índice CPOD. A explicação para esse fato talvez seja a diferença de cariogenicidade dos fatores ambientais entre indivíduos, sugerindo uma influência genética na etiopatogenia da cárie. GENES E CÁRIE Desde 1930, pesquisadores vêm conduzindo estudos para tentar compreender a natureza do componente genético que controLa a suscetibiLidade e a resistência à cárie. As pesquisas têm enfocado dois eixos principais: EpidemioLogia moLecuLar dos microrganismos bucais que coLonizam o hospedeiro; Identificação dos fatores de risco genéticos do hospedeiro envoLvidos no controLe da suscetibiLidade à cárie. No eixo de pesquisa de fatores de risco genéticos do hospedeiro, duas Linhas podem ser observadas: estudos experimentais em animais e estudos em humanos. Nos tópicos seguintes, será discutido cada um dos eixos citados. Genética odontológica 117 GENES MENCIONADOS NO CAPíTULO: ,"I- Genes humanos: ACTN2 GNAT3 MTR AMELX HLA-DÇJB7 PRPs CA6 HLA-DRB7 TAS7R2 CD74 LPO TAS2R38 E2f7 MBL TNFA EDARADD MRL Genes não humanos: Aqp brpA gtfB MICROBIOTA CARIOGÊNICA E GENÉTICA Genótipo Identidade genética de um indivíduo (conjunto de dois alelos para cada gene, um vindo do pai e outro da mãe, no caso de espécies dipLoides, como a humana). Se os aLeLos(cópias dos genes) forem iguais, o indivíduo é homozigoto; se forem diferentes, o indivíduo é heterozigoto para aqueLegene. Uma Linha de estudos foi iniciada tentando associar variáveis reLacionadas aos microrganismos e à resposta do hospedeiro. Por exempLo, em 1999, foi observada uma reLação dos aLeLosdo sistema HLA de classe II e do gene TNFA com o níveLde bactéria oraL e o índice de número de superfícies cariadas, perdidas e obturadas (CPOS) em muLheres afro-amerícanas." Os resuLtados confirmam a associação entre o perfiL genético HLA e do TNFA do hospedeiro com a coLonização específica de cepas de Streptococcus f mutans, Lactobacillus casei e Lactobacillus acidophilus. De 1970 até 1990, a grande maioria dos estudos na área de genética da cárie pesquisava aspectos reLacionados à variação genética nos microrganismos bucais. Tais trabaLhos tinham como objetivo principaL identificar cepas de microrganismos bucais que possuíssem maior cariogenicidade; por exempLo, coLônias de microrganismos que aderiam mais faciLmente à estrutura do esmaLte dentário ou que produziam maior quantidade de ácido, o que acarretaria uma maior chance do desenvoLvimento de Lesões de cárie. Estudos têm demonstrado a influência de diferentes cepas e genótipos do Streptococcus mutans no desenvoLvimento da cárie. Por exempLo, variantes genéticas dos genes gtfB (que codifica a gLucosiLtransferase) e brpA (que codifica a proteína reguLatória A do biofiLme) de Streptococcus mutans foram capazes de modificar proteínas envoLvidas no desenvoLvimento do biofilme, aumentando sua cariogenicidade e modificando o impacto sobre o risco de ocorrência da cárie. GENÉTICA DO HOSPEDEIRO E CÁRIE •Tanto os estudos genéticos em modeLos animais quanto os estudos em humanos vêmdemonstrando o papeL dos fatores genéticos na etioLogia da cárie. O maior desafio éestabeLecer a magnitude do efeito genético quando comparado com os fatores ambientais e outros fatores re~onados ao hospedeiro, bem como identificar os genes e a natureza das variações genéticas envoLvidas. As doenças genéticas podem ser classificadas em duas categorias: doenças mendelianas e doenças complexas. A cárie é classificada como uma doença complexa, pois resulta da interação entre fatores genéticos (em um modelo provavelmente oligogênico ou mesmo poligênico) e não genéticos (ambientais, comportamentais, socioeconõmicos). 118 Trevilatto / Werneck Fenótipo Conjunto de características observáveis em um organismo no níveLbioquímico, fisioLógico ou morfoLógico. É resuLtado da interação entre genótipo e fatores ambientais. ATENÇÃO A cárie é uma doença compLexa, resuLtante da interação entre fatores genéticos (em oLigogênico ou poLigênico) e não genéticos (ambientais, comporta mentais, socioeconômicos). Polimorfismos Variantes genéticas presentes em uma popuLação em frequência superior a 1%.Quando existe a possibilidade de mais de um par de aLeLose estes são estáveis, diz-se que o gene é poLimórfico. Animais knockout Animais manipuLados geneticamente, com modificação de seu DNA. ALguns genes são "desligados" ou inativados com a utilização de pedaços de DNA. Complexo principal de histocompatibilidade (MHC) Região de genes ou família de genes com importante papeL no sistema imune. São genes aLtamente poLimórficos, com 150 aLeLoscomuns ou mais, cujos produtos são expressos nas superfícies de uma variedade de céLuLasenvoLvidas na resposta imune. Em estudos de genética de doenças complexas, usualmente o primeiro objetivo é caracterizar a existência de um componente genético que esteja controlando o fenótipo, para então prosseguir para estudos moleculares, mais complexos e caros, que visam dissecar a exata natureza desse efeito genético. Estudos comparativos>" entre linhagens de modelos animais, conduzidos desde a década de 1930, inicialmente visavam provar a existência de um efeito genético de controle da doença. Como resultado, foram identifica das diferentes linhagens de camundongos que apresentavam diferenças no grau de suscetibilidade à cárie. Em uma etapa seguinte, linhagens selecionadas combase no nível de suscetibilidade e resistência à cárie foram submetidas a cruzamentos controlados, e as proles obtidas foram analisadas. Por exemplo, ~estudos das décadas de 1950 e 1960 demonstraram que camundongos de populações geneticamente heterogêneas diferiam na experiência de cárie quando estavam sob as mesmas condições arnblentals.v" Demonstrou-se que certas linhagens de camundongos eram quase 10 vezes mais suscetíveis à cárie do que outras. Entretanto, se as cepas mais resistentes eram expostas a alimentos cariogênicos, a diferença no desenvolvimento da doença com animais suscetíveis reduzia, indicando a grande influência do ambiente. Mais recentemente, investigações moleculares, ainda envolvendo modelos animais, levaram à identificação de variações de regiões e polimorfismos relacionados com a suscetibilidade/resistência à doença. Como resultado, regiões genõmicas localizadas nos cromossomos 2, 8 e 17(região MHC murina) foram descritas ligadas a fenótipos da cárie. Além disso, uma evidência positiva de associação foi descrita entre cárie e os seguintes genes: E2f7, um fator de transcrição cuja mutação causa redução de volume de saliva; Aqp, que codifica a proteína aquaporina e que, em animais knockout, levou à redução de fluxo salivar; e MRL, relacionado com a resposta imune salivar. Estudos genéticos em humanos também têm sido aplicados na investigação do componente genético associado com a suscetibilidade/resistência dos indivíduos ao desenvolvimento da cárie. Para isso, dois grandes grupos de estudos podem ser utilizados: estudos observacionais, como estudos de agregação familial, estudos com gêmeos e análises de segregação complexa; estudos moleculares de mapeamento de genes envolvidos no controle da ocorrência da doença, como análises de ligação e de associação (Fig. 8.1).-, As análises de agregaçã'ofamilial investigam se existe agregação de casos das doenças em pedigrees (famílias), resultado do excesso de compartilhamento de variações genéticas (nos genes) e ambientais. Tipicamente, esses estudos não buscam determinar qual a causa da agregação, mas se limitam a provar a agregação de casos per se. Os estudos de agregação familial na cárie têm sido conduzidos desde 1930 (ver o Quadro 8.1) e têm produzido convincente evidência a favor da agregação de casos, levando a especulações quanto à existência de fatores genéticos controlando o desenvolvimento da doença. Outro tipo de estudo observacional é a pesquisa com gêmeos. Vários estudos desse tipo têm reportado maior concordância entre gêmeos MZ, quando comparados com gêmeos DZ, em relação a diferentes fenótipos associados à cárie, como média de (POD, tamanho dos dentes, dimensão das arcadas dentárias, distância intercuspidal e distância oclusal. Os valores da herdabilidade (h-) em relação aos fatores previamente citados variam entre 94 e 61; quanto maior o valor de herdabilidade, maior o valor da característica herdada dos pais, sendo que o valor máximo é de 100. Além dos estudos citados, a respeito da cárie, existem dois estudos envolvendo gêmeos criados separadamente, uma sofisticação do desenho original que torna a estratégia ainda mais poderosa. Um resumo dos resultados de estudos selecionados encontra-se disponível no Quadro 8.1. Mais recentemente, estudos em humanos vêm tentando identificar regiões genõmicas e polimorfismos genéticos associados com suscetibilidade e/ou resistência à cárie. Os estudos de segregação complexa ajudam a obter parâmetros de modelo genético que não são detectáveis nos estudos observacionais discutidos anteriormente. A análise busca identificar o modelo genético que melhor explica os pedigrees contendo indivíduos afetados, por meio da descrição de parâmetros, como o modelo de herança (monogênico/poligênico, dominante/recessivo, autossômico/ligado ao cromossomo X), as frequências alélicas e as penetrâncias. Modelo em animais - cruzamentos controlados Análise de ligação paramétrica Regiões genômicas, genes e variações genéticas Figura 8.7 - Fluxograma sobre as estratégias para investigação genética epidemiológica. Genética odontológica 119 SAIBA MAIS A importância dos estudos observacionais com gêmeos é simples: gêmeos monozigóticos (MZ) compartilham 100% de seus alelos (cópias dos genes que vêm do pai e da mãe), ao passo que os gêmeos dizigóticos (DZ) compartilham, em média, 50%. Além disso, gêmeos normalmente compartilham os mesmos hábitos e variáveis ambientais durante os primeiros anos de vida; assim, a influência de variáveis ambientais pode ser reduzida. A proposta é comparar a taxa de ocorrência de uma doença entre pares de gêmeos MZ e DZ, pois uma concordância maior entre os primeiros em comparação com os segundos é - forte argumento em favor da existência de um componente genético controlando a doença. Gêmeos monozigóticos (MZ) e dizigóticos (DZ) Os gêmeos MZ, também chamados de idênticos ou univitelinos, são produto dsiertilização de um único óvulo, com posterior divisão do zigoto. Esses gêmeos compartilham 100% dos alelos de seus genes. Os gêmeos DZ, também chamados de fraternos ou bivitelinos, são produto da fertilização de dois óvulos diferentes no mesmo ciclo ovariano. Os gêmeos DZ podem ser do mesmo sexo ou de sexos diferentes, e são tão parecidos quanto dois irmãos quaisquer. Compartilham em média 50% dos seus alelos. 120 Trevilatto / Werneck QUADRO 8.7 - Evidência da influência genética na suscetibilidade à doença cárie nos estudos observacionais Referência População estudada (N) Resultados Klein e Palrner? Klein'? Irmãos (4.416) Pais e filhos (5.400) Similaridade na taxa de cárie entre irmãos Quantidade de cárie em filhos quantitativa mente relacionada com a experiência dos pais Klein" Pais e filhos (-) Similaridade na taxa de cárie entre pais e filhos Book e Grahnen" Garn e colaboradores" Pais e irmãos (317) Pais e filhos (6.580) Correlação entre irmãos e pais sem cárie A similaridade entre mães e filhos em relação ao CPOD é maior que entre pais e filhos Garn e colaboradores" Garn e colaboradores" Irmãos (16.000) Casais (1.800) Correlação positiva entre irmãos Correlação de CPOD positiva entre cônjuges Maciel e colaboradores" Mães e filhos (-) Correlação positiva entre mães e filhos em relação ao padrão de preferência ao açúcar e à experiência de cárie Bedos e colaboradores" Bachrach e Younq" Mães e filhos (-) Gêmeos MZ (l30) e DZ (171) Correlação positiva entre mães e filhos edêntulos Sem diferença entre gêmeos MZ e DZ Horowitz e colaboradores" Gêmeos MZ (30) e DZ (19) Gêmeos MZ mais similares em relação à cárie do que DZ Mansbridqe'" Gêmeos MZ (96) e DZ (128) Gêmeos MZ com maior similaridade em relação à experiência de cárie Goodman e colaboradores" Gêmeos MZ (19) e DZ (19) Variação entre gêmeos DZ maior do que MZ em relação à cárie Finn e Caldwell:" Bordoni e colaboradores= Gêmeos MZ (35) e DZ (31) Gêmeos MZ (17) e controles não relacionados (-) Diferenças maiores entre MZ e DZ para cáries em superfícies lisas em dentes anteriores Maior similaridade entre morfologia e erupção dentária dos dentes decíduos entre MZ do que controles não relacionados Ga024 Gêmeos MZ e DZ (280) Maior correlação em MZ, mas não estatisticamente significativa Conrye colaboradores" Gêmeos MZ (46) e DZ (22) criados separadamente MZ com maior similaridade entre pares do que DZ para presença do dente, dentes restaurados e superfícies restauradas em gêmeos criados separadamente Boraas e colaboradores-" Gêmeos MZ e DZ (44) criados separadamente Semelhança entre número de dentes presentes, porcentagem de dentes e superfícies restauradas, porcentagem de dentes e superfícies cariadas, tamanho dos dentes e mau alinhamento dos dentes em gêmeos MZ Liu e colaboradores" Gêmeos MZ e DZ (82) Forte evidência deinfluência genética para presença do terceiro molar, tamanho do dente, tamanho da arcada deiÍtária e malformação do incisivo lateral superior. Bretz e cotaboradores" Gêmeos MZ (142) e DZ (246) Para prevalência de cárie baseada em superfícies dentárias, as taxas de herdabilidade eram fortes (h2 = 76,3), assim como para severidade da lesão (h2= 70,6) Bretz e colaboradores'" Gêmeos MZ (112) e DZ (202) Para prevalência de cárie nas superfícies, as taxas de herdabilidade foram moderadas (h2 = 30,0) e maiores para os grupos mais velhos (h2 = 46,3); para severidade das lesões, a taxa de herdabilidade também foi modesta (h2 = 36,1) e maior para mais jovens (h2 = 51,2). F Na cárie, apenas uma análise de segregação complexa foi conduzida e publicada em 2011.Nesse estudo;" dois fenótipos quantitativos foram observados em uma amostra populacional de famílias multiplex estendidas residentes em uma colônia isolada na Amazônia, no estado do Pará: índice CPODe número de dentes cariados . Um efeito genético principal controlando resistência para ambos os fenótipos foi detectado, sendo que, para o fenótipo CPOD, o melhor modelo foi codominante e, para o fenótipo de dentes cariados, foi dominante. Os resultados indicam que o modelo detectado para CPOD é provavelmente o resultado da combinação de mecanismos genéticos independentes controlando os componentes do índice. As estratégias de análise genético-epidemiológica molecular mais frequentes são os estudos de ligação e de associação. Os estudos de ligação são baseados em famílias e têm como objetivo localizar regiões cromossõmicas que podem conter genes relacionados com o fenótipo estudado. O objetivo é encontrar padrões de cossegregação entre locos (locais dos cromossomos onde ficam situados os genes) e o fenótipo da doença investigada (Fig. 8.2). Genética odontológica LEMBRETE A análise de segregação complexa é o primeiro passo para a melho descrição e compreensão da exa natureza dos fatores de risco genéticos controlando a suscetibiLidade humana à doença cárie. A análise de ligação é uma ferramenta poderosa para localizar regiões genômicas contendo genes que exercem efeito moderado ou forte sobre o fenótipo. Sua vantagem é a possibilidade de conduzir uma busca de genoma completo com um pequeno número de marcadores. No único estudo de ligação desenvolvido em humanos." um scan genômico envolvendo 392 marcadores, foi identificada evidência sugestiva de ligação entre cárie e cinco locos: três para baixa suscetibilidade à cárie (5q13.3, 14q11.2e Xq27.1)e dois para alta suscetibilidade à cárie (13q31.1e 14q24.3). As análises de associação podem ser tanto baseadas em famílias como em populações e são empregadas para a identificação precisa das variações genéticas relacionadas com o desenvolvimento da doença. O objetivo dessa estratégia de análise é identificar alelos de genes que ocorrem mais frequentemente nos indivíduos com a doença. Quando essas análises são realizadas comparando-se casos versus controles, corre-se o risco de confusão causada por possível estratificação críptica das a[l1_<?straspopulacionais em estudo. Tal erro pode ser evitado utilizando-se um desenho de análise de a~~5!.ação baseada em famílias. Em tal desenho, a associação é identificada quando um alelo é transmitido de pais heterozigotos para filho afetado em proporções diferentes das previstas pela lei da segregação independente, conforme detectado pelo teste de desequilíbrio de transmissão (TDT, Fig. 8.3). As análises de associação são utilizadas para identificar genes com efeitos de pequenos a moderados e podem ser conduzidas em pequena escala (estudos de genes candidatos) ou em larga escala (estudos pangenômicos de associação - GWA,do inglês genome wide association). T2Tl 9 G ri n G G TlTl G G TlTl G 9 rr n G G T2Tl 9 G Figura 8.2 - Análise de ligação - segregação não randômica entre o loco da doença (T2) e o marcador de localização conhecida (g). D d dd Figura 8.3 - Testede desequilíbrio ~ transmissão (TOT),que observa o número de vezes que o pai heterozigoto (Dd) transmite o Q eis: ou d para sua filha. 122 Trevilatto / Werneck •• Os primeiros estudos de associação entre variantes genéticas e cárie em humanos forampublicados em 2005. Desde então, diversos genes já foram identificados em associação com asuscetibilidade e/ou resistência à cárie, a saber:32'42 genes relacionados com desenvolvimento e mineralização do esmalte - amelogenina (AMELX) e tuftelina (TUFT1); genes relacionados com resposta imune - mannose-bindinq lectin (MBL), HLA-DRB1 e HLA-DÇ>B1, CD14 (-260); genes relacionados com a composição da saliva - saliva carbonic anhydrase VI (CA6) e proline-rich protein gene (PRPs); genes relacionados com paladar - TAS2R38, TAS1R2, GNAT3, único estudo conduzido utilizando a técnica TDT. No único GWApublicado sobre a cárie até o momento," realizado com 1.305 criançasamericanas com idade variando entre 3 e 12anos, nenhuma associaçãoatingiu o nível pangenômico de significância estatística (p<10E-7). No entanto, os autores descrevem sinais sugestivos de associaçãoentre cárie e os seguintes genes: ACTN2 - envolvido na organização dos ameloblastos durante a formação do esmalte; MTR - relacionado com a formação e a estrutura da face; EDARADD - relacionado com adisplasia ectodérmica; LPO - que codifica uma enzima da saliva que tem importante papel no metabolismo das bactérias e inibe a formação da placa bacteriana. CONCLUSÃO A importância dos fatores ambientais e biológicos no desenvolvimento da cárie vem sendo intensamente discutida nos últimos anos. Diferentes estratégias para o controle dessas variáveis e para a prevenção da doença vêm sendo aplicadas; porém, a cárie continua sendo um importante problema de saúde pública em países desenvolvidos e em desenvolvimento. Com um melhor entendimento da influência da genética no desenvolvimento da cárie, esperam-se avanços nas estratégias de prevenção e diagnóstico da doença. Por exemplo, uma vez conhecidos os genes envolvidos no desenvolvimento da cárie, tendo em vista que a doença é multifatorial e poligênica, testes genéticos poderão ser utilizados para identificar indivíduos mais suscetíveis a ela. •• Estudos têm demonstrado a influência sobre a ocorrência da cárie, principalmente, de genes relacionados com a formação do esmalte dentário, composição da saliva e resposta imune. Entretanto, é importante ressaltar que muitas dessas associações ainda não foram replicadas em diferentes populações, condição necessária para a confirmação dos achados. Ainda neste sentido, pesquisas utilizando as ferramentas para estudos de associação em famílias poderiam incrementar o reconhecimento de novos genes candidatos, pois essa metodologia reduz os erros causados pela ~!r_ª1ificação étnica da população em estudos caso-controle. Finalmente, apenas um GWAfoi conduzido a respeito da cárie, mas sem resultados estatisticamente siqniflcatlvos." PARA PENSAR Outra discussão muito relevante na área de genética das doenças é a definição do fenótipo ideal. Uma pergunta relevante, nesse cenário, é a seguinte: os métodos utilizados para identificação da cárie, hoje em dia, são ideais para os estudos genéticos? Sendo a cárie uma doença multifatorial e poligênica, existe a necessidade de trabalhar com métodos que detectem o fenótipo mais preciso. Por exemplo, a seleção de indivíduos com fenótipos extremos - alta suscetibilidade (alto índice CPOD com baixo consumo de açúcar, por exemplo) ou baixa suscetibilidade (baixo CPOD com alto consumo de açúcar) - poderia contribuir para a definição de um melhorf,enótipo. Além disso, ~dos de coorte, nos quais pacientes são acompànhados por um long-à-período durante sua vida, seriam outra importante estratégia para a melhor compreensão do fenótipo da doença cárie. Qual é a importância de conhecer os genes relacionados com as doenças bucais? Algum diaserá possível identificar os pacientes com alto risco às doenças bucais com exames laboratoriais?
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