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Resumos Oficina de Tradução

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Oficina de Tradução I (Prosa)
Aula 2 – Coerência e Coesão
Objetivos dessa Aula:
1. Conhecer o conceito de coerência e coesão;
2. Relacionar os conceitos ao trabalho do tradutor. 
Introdução – A aula 02 apresenta os conceitos de coerência e coesão e discute a relação entre as mesmas de modo a demonstrar que nem sempre um texto coerente parece ser coeso, do mesmo modo que nem sempre um conjunto de frases coesas garantem coerência e compreensão por parte do leitor. Conheceremos o ponto de vista de diferentes autores sobre os conceitos de coerência e coesão e vamos verificar que, apesar de nem sempre concordarem nas conceituações que defendem, a maioria dos autores acredita na existência de relações semânticas nos textos que ajudam a constituir sua coerência
Como leitores, assumimos sempre que aquilo que lemos é um texto, ou seja, que estamos diante de um todo coeso. Mas o que é que há de fato nos textos que convence o leitor de sua coerência? Será o sentido de “conectividade” estabelecido entre seus elementos a partir de diferentes funções, como referências, elipses e conjunções? Será somente a adjacência entre 
dois sintagmas? Ou será a coerência derivada da capacidade do leitor para combinar o texto 
com seu conhecimento prévio de mundo? O processamento do texto sempre ocupou lugar de destaque nos estudos do discurso. Há alguns pesquisadores interessados nos mecanismos de 
coesão textual, e outros voltados à compreensão dos mecanismos que viabilizam a coerência na mente do leitor. Vamos conhecer algumas dessas perspectivas a seguir, revisando a conceituação dada por alguns autores que você já deve ter ouvido falar em outras disciplinas.
Haliday e Hasan – Para Haliday e Hasan (1976), um texto é uma unidade da língua em uso e o que distingue um texto de um “não texto” é sua textura. A textura é garantida pelas relações coesas existentes entre algumas características linguísticas presentes no texto e pode contribuir 
para sua unidade total. Em outras palavras, a textura de um texto é formada pelos laços 
coesivos que mantêm. Por exemplo, 
Lave e tire os caroços de seis maçãs. 
Coloque-as em um recipiente resistente ao calor.
Widdowson (1978) – Para Widdowson (1978), um texto pode ser coerente sem uma coesão visível e linguisticamente sinalizada. Em uma situação de discurso em uma atividade comunicativa normal, expressamos, segundo Widdowson, uma proposição e, ao mesmo tempo, realizamos algum tipo de ato ilocucionário (ou ilocutório). As orações usadas no discurso com a intenção de comunicação podem assumir valor quando criam relações com outras proposições expressadas em outras orações. Quando reconhecemos essas relações, reconhecemos a sequência de orações como constitutivas de um discurso coeso. Quando um texto não dispõe de relações linguísticas coesas visíveis, como leitores, extraímos significado do texto porque inferimos as relações proposicionais a partir da interpretação dos atos ilocucionários. É por isso que o discurso frequentemente nos parece coerente mesmo quando não parece coeso. O ato ilocucionário é um dos atos de fala. Ele corresponde ao ato de o locutor proferir um enunciado em certas condições comunicativas e com certas intenções, tais como ordenar, avisar, criticar, perguntar, convidar, ameaçar, etc. Em um ato ilocucionário, a intenção comunicativa de execução vem associada ao significado de determinado enunciado.
Widdowson ilustra essa ideia com o diálogo a seguir:
A: Telefone!
B: Estou no banho.
A: OK.
Como conseguimos reconhecer no diálogo um texto coerente apesar de o mesmo não utilizar nenhuma relação de coesão? Quando considerado isoladamente, as três falas não assumem nenhum valor comunicativo particular. Juntas, entretanto, podem ser reconhecidas como partes de um diálogo. Conseguimos, portanto, interpretar a fala de A como um pedido para que B atenda ao telefone. B, por sua vez, desculpa-se por não poder ajudar A, que compreende a situação e confirma sua compreensão com a última fala. Ao reconhecermos os atos ilocucionários presentes nas sentenças, podemos preencher as lacunas deixadas pelas proposições que não estão presentes e interpretar o texto como coerente.
 	Carrell (1982) questiona o conceito de coesão proposto por Halliday e Hasan como sendo uma medida da coerência. Para a autora, existe um processo interativo entre o texto e conhecimento anterior de mundo do leitor ou ouvinte. Segundo Carrell, a insuficiência da definição de Halliday e Hasan para o conceito de coesão está na falha em considerar as contribuições do leitor ao longo do processo de compreensão. O leitor não conta somente com as características do texto superficial. Seu conhecimento de mundo é a parte mais importante para a compreensão. Carrell argumenta que a coesão dos elementos superficiais não é a causa, mas o efeito, da coerência. 
Observe o exemplo:
A comemoração foi um desastre! 
Ninguém se lembrou de levar um saca-rolha!
A coerência deste pequeno texto não está na relação linguística de coesão entre 
“comemoração” e “saca-rolha”, mas no reconhecimento, por parte do leitor, de uma sequência coerente com base no fato de que é possível acessar informações prévias sobre o mundo e identificar a relação entre uma comemoração – onde possivelmente haveria vinhos ou champanhes, por exemplo – e um saca-rolha. Em outras palavras, a coesão lexical poderia ser o efeito, e não a causa, da coerência textual.
Brown e Yule (1983) – Brown e Yule (1983) tampouco concordam com a ideia de coesão proposta por Haliday e Hasan e levantam dois questionamentos:
• A coesão proposta por Halliday e Hasan é necessária para a identificação de um texto?
• Essa coesão é suficiente para garantir tal identificação?
Os autores argumentam que um leitor irá automaticamente assumir que existem relações 
semânticas quando estão diante de um texto, e interpretam as orações em função das orações antecedentes. Portanto, a textura, no sentido de ser a realização explícita das relações semânticas, não é essencial para a identificação de textos. Um pequeno experimento foi realizado com orações misturadas em um texto que mantinha a coesão formal. A intenção era mostrar que não seria fácil para o leitor interpretar uma coleção de orações, mesmo com a presença de todas as relações de coesão. Os autores mostram que somente a coesão não é capaz de identificar um texto. Além disso, semelhante ao que diz Carrell (1982), Brown e Yule dizem que a fonte da coesão está fora do texto, e não palavras que formam o mesmo. Se compararmos a visão de coesão proposta por Halliday e Hasan com as visões propostas por Widdowson, Carrell e Brown e Yule, veremos que todos concordam que existem relações semânticas em um texto que ajudam a constituir a sua coerência. A grande diferença está na explicitude. Enquanto Halliday e Hasan enfatizam as expressões explícitas das relações semânticas, os outros autores defendem a relação semântica subjacente que detém o poder de coesão. Esse conceito também é levantado por Halliday e Hasan em sua discussão, mas é deixado de lado quando os mesmos constroem sua taxonomia de expressões conjuntivas. A relação entre coerência e coesão também pode ser analisada a partir de outra perspectiva, que é a da universalidade. Em seus estudos da tradução, Hatim e Mason (1990) argumentam que a sequência de relações de coerência – tais como causa e efeito, problema e solução, etc. – devem permanecer constante durante a transferência do texto original para o texto traduzido, mas ressaltam que a forma como essa coerência subjacente se reflete no texto superficial – a coesão – tendem a seguir as especificidades da língua ou do texto. 
 Coesão e Coerência na Tradução 
Definição – A coesão e a coerência são definidas de maneira distinta na linguística textual e nos estudos da tradução. Segundo Beaugrande&Dressler, a coesão e a coerência são os dois padrões mais óbvios da textualidade. A coesão refere-se ao modo como os elementos superficiais de um texto,tais como os elementos lexicais e os elementos gramaticais, se conectam de forma a garantir a continuidade. A coerência, por sua vez, refere-se ao modo como a continuidade de sentido é estabelecida e mantida. Segundo Beaugrande&Dressler, um texto “faz sentido” porque existe uma continuidade de sentidos entre o conhecimento ativado por suas expressões.
Conceitos – Os dois conceitos – de coerência e coesão – estão fortemente inter-relacionados, pois uma seleção bem motivada de dispositivos coesivos irá ajudar a estabelecer coerência, que por sua vez é mantida pela interação contínua entre o conhecimento apresentado no texto e o conhecimento prévio de mundo do leitor. A coerência também pode ser descrita como a maneira como o texto se encadeia semântica, pragmática e tematicamente; já que sua constituição não é imanente ao texto, mas realizada por inferência.
Inferência – A questão da inferência é particularmente importante no discurso técnico e científico, onde textos altamente específicos podem carecer de elementos coesivos. Ainda assim, esses textos podem ser considerados coerentes se puder contar com o conhecimento especializado do leitor e sua habilidade de realizar inferências com base em experiências anteriores. Do ponto de vista da tradução, esses textos são um desafio porque demandam um conhecimento específico do tradutor, que pode ter de consultar especialistas ou mesmo necessitar de um revisor técnico para que consiga estabelecer na língua-alvo a mesma coerência 
percebida na língua-fonte.
No contexto da tradução, a relevância dos conceitos de coerência e coesão já foi discutida por diferentes autores e a partir de diferentes perspectivas. Em uma investigação na qual a equivalência seja relevante e baseada na delimitação da tradução a partir de outros tipos de produção textual, pode-se assumir que a coerência refere-se ao conjunto de relações conceituais que subjaz o texto e que se mantém constante no texto traduzido. Contudo, as maneiras através das quais a coerência se reflete nos elementos superficiais do texto, ou seja, nos elementos coesivos utilizados, podem variar por diferentes motivos e ser dependente, por exemplo, da língua e do gênero textual.
A coerência também pode ser definida como o sentido pretendido, e não como o significado 
pretendido. Essa definição se deve à conceituação proposta por Beaugrande&Dressler, que dizem que o significado descreve o potencial de uma expressão da língua para representar e 
retransmitir conhecimentos (significado virtual), enquanto sentido designa o conhecimento que é realmente transmitido por expressões presentes em um texto. Eles complementam a distinção dizendo que muitas expressões possuem diversos significados virtuais, mas somente um sentido no texto. Talvez você ache mais fácil compreender a distinção entre “significado” e “sentido” 
proposta por Beaugrande&Dressler se pensarmos, por exemplo, na palavra “manga” do português. Sabemos que essa palavra pode tanto fazer referência a uma fruta quanto a uma parte da roupa. Em um texto no qual essa palavra seja usada, entretanto, o sentido a ser associado à “manga” será único e certamente estará claro em função do contexto do uso. Se você ler algo como “As mangas estavam caríssimas na feira de hoje!”, saberá, sem dúvidas, de que o trecho faz referências a frutas. Se, por outro lado, ler algo como “Não vou comprar esta camisa porque a manga está muito apertada”, não terá dúvidas de que a palavra faz referência à parte da roupa.
A distinção entre significado e sentido tem implicações diretas na tradução, pois os 
tradutores não traduzem expressões isoladas, mas expressões contextualizadas; o que requer 
que se descubra o sentido pretendido de cada expressão. Atenção especial precisa ser dada a 
textos nos quais os elementos superficiais dificultam identificação do sentido pretendido. 
É o sentido pretendido que precisa ser replicado e mantido na tradução, através do uso de elementos coesivos que podem variar entre as línguas. O uso de elementos coesivos na língua fonte que possuam equivalentes na língua alvo ajudará a manter o sentido pretendido do texto original no texto traduzido.
Aula 3 – Textualidade
Objetivo dessa Aula:
Ao final desta aula, você será capaz de:
Conhecer o conceito de unidade textualidade;
Refletir sobre os sete padrões que garantem a textualidade;
Relacionar a textualidade à tradução.
Introdução – A textualidade é o conceito linguístico que garante que uma sequência sucessiva de frases forme um texto coerente, e não uma sequência aleatória de informações.
Observe as imagens a seguir:
O que as imagens tem em comum?! Todas elas apresentam exemplos de textos sendo usados em situações de discurso. A maneira diferente como são usados indica que pertencem a diferentes gêneros, como as propagandas e a tirinha.
Em 1981, Robert-Alain de Beaugrande e Wolfgang Dressler se deram conta de que era necessário pensar em uma ciência dos textos que fosse capaz de dar conta da descrição das características compartilhadas entre os textos e das distinções entre os mesmos e seus tipos. 
Segundo os pesquisadores, era preciso descobrir os padrões a serem atendidos por um texto, a maneira como devem ser produzidos ou recebidos, o tipo de público que fazia uso dos textos e em qual contexto isso acontecia, etc. Para Beaugrande&Dressler, a grande pergunta era: Como funcionam os textos na interação humana?
Em seu trabalho, Beaugrande&Dressler definem o texto como “uma ocorrência comunicativa que atende a sete padrões de textualidade”. Segundo os autores, se um desses padrões deixar de ser atendido, o texto não poderá ser considerado comunicativo e, portanto, será tratado como um “não-texto”. Os padrões de textualidade são os seguintes:
Coesão – O primeiro padrão que vamos discutir é a coesão. Você deve se lembrar dele, da 
aula passada. A coesão é o aspecto que garante que os elementos superficiais do texto – ou seja, as palavras – estejam “mutuamente conectados em uma sequência”. Os componentes superficiais dependem uns dos outros e são regidos pelas formas e convenções gramaticais, de modo que a coesão acaba por relacionar-se às dependências gramaticais impostas pelas línguas. Não seria possível, por exemplo, modificar a ordem das palavras de modo a obter resultados como “Children slow play at” ou “Play children at slow”. A ordem das frases resultantes é tão equivocada que dificilmente as pessoas compreenderiam as placas se esses fossem os textos exibidos. Fica evidente, portanto, que as dependências gramaticais nos elementos superficiais são aspectos importantes a serem considerados na ordenação de significados e seus usos. Diversas dependências podem ser identificadas no texto original da placa. Embora seja possível fazer segmentações que agrupem “Slow children” e “at play”, fazendo com que o leitor imagine que crianças com algum comprometimento cognitivo ou motor estão brincando, o mais provável é que se criem os segmentos “Slow” e “children at play”, permitindo que se compreenda a placa como uma recomendação para diminuição da velocidade por conta da presença de crianças 
brincando na área. Beaugrande&Dressler ressaltam que uma ciência dos textos deve ser capaz 
de explicar não só como as ambiguidades, como a que acabamos de ver, são possíveis nos elementos de superfície, mas também de que maneira as pessoas conseguem resolvê-las sem grandes dificuldades. Como se vê, os elementos de superfície não são autodecisivos, e deve haver interação entre a coesão e os outros padrões de textualidade para que a comunicação se dê de maneira eficiente.
Coerência – Aqui, temos “children” como um “conceito objeto” e “play” como um “conceito 
ação” e a relação “agente de”, já que as crianças são as agentes da ação. Algumas vezes, entretanto, as relações não estão explícitas no texto e, assim, não são diretamente ativadas pelos elementos da superfície. Os leitores estabelecerãotodas as relações necessárias para compreensão um texto em sua forma original.
A coerência pode ser mais bem compreendida a partir de um conjunto de relações denominado causalidade. Essas relações dizem respeito às maneiras através das quais uma situação ou evento afeta as condições de outra situação ou outro evento. Observe a seguir o trecho de uma famosa canção de ninar inglesa chamada “Jack and Jill”:
Jack and Jill went up the hill
To fetch a pail of water.
Jack fell down and broke his crown,
And Jill came tumbling after.
 No trecho “Jack fell down and broke his crown”, o ato de “cair” é a causa do evento “quebrar”, visto que ele criou as condições necessárias para que o evento acontecesse. Existem muitas outras noções de causalidade.
É preciso perceber, portanto, que a coerência não é só uma característica dos textos, mas o resultado de processos cognitivos realizados pelos leitores. O simples sequenciamento de eventos e situações em um texto é capaz de ativar operações que recuperam ou criam relações de coerência. Um texto não faz sentido sozinho, e precisa contar com a interação entre o conhecimento que apresenta e o conhecimento prévio de mundo do leitor que o acessa.
Intencionalidade e Aceitabilidade – Os padrões denominados intencionalidade e aceitabilidade estão fortemente relacionados a modelos mentais e processos cognitivos. Ambos interagem com os padrões anteriores - coerência e coesão - mas são padrões separados porque a comunicação acaba acontecendo em situações que não são totalmente coesivas ou coerentes. Para Beaugrande&Dressler, tanto a intencionalidade quanto a aceitabilidade estão relacionadas à atitude do produtor e do receptor do texto, respectivamente. Assim sendo, esses padrões são menos óbvios do que a coesão e a coerência, já que não é possível “entrar na cabeça” do produtor ou do receptor de um texto e observar o que lá está acontecendo.
A intencionalidade relaciona-se com a atitude do produtor e sua intenção em construir um texto coesivo e coerente que atenda a sua intenção comunicativa. Às vezes a intenção do produtor acaba não sendo alcançada por conta de fatores situacionais que acabam por restringir o desempenho do leitor. Outras vezes, a boa vontade do leitor em aceitar e compreender a intenção de um texto acaba comprometida devido à qualidade do material ao qual tem acesso, onde falta coerência e coesão. Segundo Beaugrande&Dressler, a intencionalidade deve ser analisada segundo a teoria da Pragmática. Os autores sustentam o princípio cooperativo proposto por Paul Grice e dizem que os participantes devem colaborar de modo a viabilizar a comunicação. Esse princípio não dá conta dos inúmeros casos nos quais os objetivos dos participantes do evento comunicativo são contraditórios. A ideia é que é necessário existir um objetivo comum de modo a conduzir um evento comunicativo significativo.
Máximas de Paul Grice para um evento Comunicativo
Cooperação – Contribua somente quando solicitado;
Modo – Quantidade – Organize as contribuições de modo a garantir a clareza.
Relevância – Acrescente somente informações relevantes;
Qualidade – Diga somente aquilo que acredita ser verdade;
 A aceitabilidade faz o processo reverso, aproximando-se do texto pelo outro lado; já que trata da atitude do leitor diante de um texto coeso e coerente que lhe seja relevante. Aqui, outro aspecto passa a ser importante: a tolerância. Um texto pode ser ruim e ainda assim ser aceito como texto. Isso acontece somente quando a tolerância não é excedida, ou seja, quando o receptor do texto ainda é capaz de compreender a mensagem – que é passada não só pelo léxico, mas também pela gramática do texto. No que diz respeito aos parâmetros de intencionalidade e aceitabilidade, a textualidade depende muito mais da intenção de comunicação de quem produz o texto do que da boa vontade do leitor em compreender o que lê. Para que uma determinada 
configuração da língua seja considerada um texto, é preciso não só que a mesma seja coerente e coesa, mas que tenha a intenção de ser um texto e seja aceita como tal.
Informatividade – A Informatividade está relacionada às expectativas das pessoas quando iniciam uma situação de comunicação. O termo também é usado para avaliar quão novo e inesperado um enunciado pode ser para aqueles que o recebem. Esta noção normalmente é associada ao conteúdo, e essa ênfase se dá por conta do papel dominante da coerência na textualidade. Em geral, fonemas e sintaxe parecem ser apenas subsidiários e, portanto, recebem menos foco direto de atenção. Aqui, a atenção pode ser definida como a percepção que se tem 
de algo e que acaba por restringir o potencial para percepção de outros aspectos ao mesmo tempo. Assim sendo, se a atenção está voltada para a coerência de conceitos e relações, os outros sistemas deixam de receber o foco.
Beaugrande&Dressler dizem que cada um de nós possui um modelo de mundo em mente. Esse modelo de mundo seria muito bem estruturado e integrado. Cada vez que adquirimos novas informações ou novos conhecimentos, primeiro testamos os novos dados em nosso modelo de mundo e somente então os organizamos e integramos no modelo geral.Podemos concordar ou não com a nova informação recebida. Quando concordamos, ela se encaixa no modelo; quando não, ela não se encaixa. Se concordarmos somente com parte da informação, analisamos essas partes e encontramos um modo de adequá-las ao nosso modelo. Se não encontrarmos essas maneiras de adequação, simplesmente esquecemos as informações.
Situcionalidade – A Situacionalidade é controlada por todos os fatores que fazem com que um texto seja relevante em uma situação de comunicação. Ela aborda objetivos, crenças gerais, opiniões, convicções, etc. Ela nos ajuda a compreender de que maneira as informações previamente armazenadas sobre as experiências anteriores (modelo de mundo) podem ser usadas de diferentes maneiras. Beaugrande&Dressler postulam duas estratégias dominantes para a situacionalidade: monitoramento da situação e gestão da situação. O monitoramento da situação é responsável por fornecer uma descrição objetiva de uma situação, enquanto que a gestão da situação é aquela que nos ajuda a alcançar um objetivo específico. Na situação de comunicação, é comum que alternemos da estratégia 1 para a 2, mas a fronteira entre uma e outra é muito pouco clara. Beaugrande&Dressler discutem doze maneiras distintas de se alternar entre uma estratégia e outra.
Intertextualidade – A Intertextualidade é responsável por classificar as formas através das quais a produção e a recepção de um determinado texto dependem do conhecimento que os participantes têm a respeito de outros textos. Esse conhecimento pode ser aplicado através de um processo descrito em termos de mediação. Aqui, quanto maior o tempo e a duração das atividades de processamento entre o uso do texto atual e os textos previamente produzidos, maior será a mediação.
Que tal agora pensarmos na tradução com base nos pilares que acabamos de discutir?
Aula 4 – Conotação e Denotação
Objetivos dessa Aula:
Ao final desta aula, você será capaz de:
1. Conhecer o conceito de conotação e denotação;
2. relacionar os conceitos estudados à tradução.
Introdução - A aula 04 discute os conceitos de denotação e conotação. Denotação refere-se ao significado literal de uma palavra, aquele encontrado no dicionário.
Escritores cuidadosos escolhem as palavras a serem usadas em seus textos não só com base 
no que desejam dizer de fato (ou seja, o sentido dicionarizado ou denotativo), mas também 
baseado no que querem sugerir (conotações). Em português, por exemplo, as palavras 
“magro”, “magricela” e “esquelético” possuem sentidos denotativos relacionados – todas 
referem-se à magreza, digamos assim.  Entretanto, se quisermos elogiar alguém por sua 
silhueta,talvez não seja uma boa ideia recorrer ao adjetivo “esquelético”.
Todas as palavras em inglês do diagrama a seguir fazem referência “a alguém jovem”, mas suas conotações podem ser diferentes em função do contexto em que serão utilizadas. Algumas dessas palavras tendem a carregar uma conotação positiva (como little one), outras têm conotação negativa (como brat), e, há ainda, aquelas cuja conotação é considerada neutra (como kid). Em inglês, qualificar um jovem como “brat”, como na frase “Phil is a brat”, deixa bastante clara a sua opinião de que se trata de uma pessoa muitíssimo problemática.
 
No ofício do tradutor, é essencial reconhecer que as palavras podem ter sentidos diferentes, mesmo quando sinônimas, para que se proponha uma boa tradução. A seguir, veremos um exemplo que ajudará a elucidar um pouco mais a distinção entre os sentidos.
Pense na palavra “casa”. No sentido denotativo, a palavra significa “o lugar onde se mora”. No sentido conotativo, ela representa privacidade, intimidade, aconchego e conforto. Em inglês, duas palavras podem ser usadas para fazer referência à palavra “casa”: home e house. 
Observe que na acepção C1, a palavra “home” significa “casa” como um local impessoal, onde não se é cuidado por pessoas que são da família, o que refuta a ideia de privacidade, intimidade, aconchego e conforto implícitas nas acepções anteriores. Com base nessas distinções, você seria capaz de adivinhar qual das duas palavras – home ou house - é a mais usada nos anúncios imobiliários em inglês? É claro que é a palavra “home”.
Lembre-se! – Nos seus textos escolha as palavras adequadas para a transmissão da mensagem. Na língua materna, essa escolha normalmente é feita de maneira apropriada, visto que ostumamos não ter dúvidas sobre as palavras e seus significados, sejam eles conotativos ou denotativos. Na transposição de um texto de uma língua para outra, entretanto, a escolha da tradução mais adequada pode se revelar mais difícil se não estivermos atentos às peculiaridades, em especial, àquelas dos sentidos conotativos. 
Aula 5 – Intertextualidade
Mar de palavras – Quase todas as palavras e frases que usamos em textos escritos ou falados que produzimos, já foram vistas ou lidas por nós em algum momento anterior a seu uso. Nossa originalidade e habilidades como escritores vêm da forma como organizamos essas palavras e frases de maneiras que se adéquem a situações, necessidades e propósitos específicos, mas sempre recorrendo a uma base comum da língua que compartilhamos com os outros. Se não compartilhássemos conhecimentos sobre a língua, como poderíamos compreender uns aos outros? Algumas vezes, não queremos chamar atenção para a fonte de nossas palavras. Em geral, as palavras que usamos são tão comuns que parecem vir de todas as partes. Em outras situações, entretanto, desejamos dar a impressão de que falamos como indivíduos, preocupados somente com o momento no qual nos encontramos. Há ainda aquelas vezes nas quais simplesmente não nos lembramos de onde ouvimos ou lemos o texto que usamos... Mas existem as situações nas quais desejamos enfatizar a fonte de nossas palavras, pois essa fonte pode exercer grande autoridade ou pode ser uma fonte cujas palavras desejamos criticar, por exemplo. Quando ouvimos os outros, também não sabemos de onde vêm suas palavras, mas por vezes conseguimos sentir o significado delas retomando palavras e pensamentos de um ou outro lugar. A análise dessas conexões nos permite compreender com maior profundidade o significado do texto diante de nós. Criamos nossos textos a partir do mar de textos que nos rodeia, do mar da língua no qual nadamos. E compreendemos os textos dos outros a partir da mesma perspectiva. Às vezes, como autores, desejamos marcar a fontes de nossas palavras; outras vezes, não. Como leitores, acontece o mesmo: há situações nas quais conscientemente reconhecemos de onde vêm as palavras e a maneira como são utilizadas, e há momentos nos quais a origem somente nos causa a sensação incerta de já termos visto algo parecido com o texto diante de nós. Outras vezes as palavras estão tão misturadas e espalhadas pelo mar que já não podem mais ser associadas com uma época, um lugar ou um grupo em particular. Independente disso, entretanto, continuamos rodeados pelo mar de palavras que habita cada texto. 
A relação que cada texto mantém com os outros textos que o rodeiam se chama intertextualidade. A análise intertextual avalia a relação de uma oração com o mar de palavras sobre o qual falamos, como ela usa essas palavras, como se posiciona com relação às outras palavras. Podem existir muitas razões para a análise da intertextualidade de um texto. Aprender a interpretar a intertextualidade ajuda na compreensão das fontes utilizadas por um autor e na identificação de suas ideias e posicionamentos diante de determinadas questões, por exemplo. Muitas são as ocorrências de intertextualidade que nos cercam, não só em textos, mas também em outros veículos. Observe os exemplos a seguir:
 
Como dito anteriormente, a intertextualidade faz referência às relações implícitas e explícitas que um texto mantém com textos anteriores. Através dessas relações, um texto cria a representação de uma situação de discurso e os recursos textuais necessários à situação e posiciona o texto atual em relação àquele ao qual se refere. Embora esse recurso seja largamente reconhecido e utilizado, não existe uma nomenclatura padrão que dê conta dos elementos e tipos de intertextualidade. A terminologia utilizada a seguir para os conceitos, portanto, pode receber outra identificação quando tratada por outros autores.
Técnicas de Representação Intertextual – Para fins de análise, é possível distinguir entre diferentes técnicas usadas para que se estabeleça a relação de intertextualidade entre os textos. Observe as técnicas descritas a seguir:
A citação direta estabelece o tipo mais explícito de relação intertextual. Normalmente identifica-se esse tipo de citação por meio do uso de aspas demarcando o texto citado. Embora a citação direta replique as palavras extas de outro autor, o autor do texto na qual citação aparece tem controle sobre quais palavras irá citar e em qual contexto a mesma será utilizada.
A citação indireta geralmente especifica uma fonte e tenta reproduzir o significado do texto original usando palavras que reflitam a compreensão do original por parte do autor que recorre à citação. A citação indireta acaba filtrando o significado por meio das palavras e das atitudes do autor que a utiliza.
A Citação de uma pessoa, documento ou declaração, a menção a um autor ou documento baseia-se na crença de que o leitor está familiarizado com a fonte original a qual se faz referência e também ao que ela diz. Nenhum detalhe de significado é explicitado e, por isso, o autor que emprega este recurso tem grande liberdade de dizer o que pensa sobre o texto original e contar com as crenças gerais sobre sua fonte sem ter de autenticá-las.
Como vimos na primeira parte desta aula, a intertextualidade pode se fazer presente de outras maneiras. É importante pensarmos, entretanto, de que maneira é possível manter a intertextualidade quando se traduz um texto de uma língua a outra. Em geral, a manutenção, no texto traduzido, das referências presentes no texto original demanda muita criatividade do tradutor. Na prática, contudo, nem sempre se chega a uma solução criativa as alusões do texto de partida e o que resta ao tradutor é recorrer a soluções mais pragmáticas.

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