Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
43 APRENDIZADO ORGANIZACIONAL Re vi sã o2 00 9: A na - D ia gr am aç ão : F ab io 2 9/ 05 /0 9 ?-?sem-?mod Unidade II 5 10 15 20 4 CICLO E PROCESSO DE APRENDIZAGEM Como foi possível observar, o processo de aprendizagem é dinâmico, temporal e sócio-histórico. As pessoas podem aprender sozinhas, usando mecanismos próprios da capacidade cerebral e do raciocínio lógico, observando os fatos da realidade e estabelecendo significados específicos e gerais, sem perder de vista que, mesmo sendo agentes ativos do processo em si, estão sujeitas às condições ambientais nas quais estão inseridas, mas também podem aprender em grupo. Obviamente que ninguém vive sozinho ou aprende solitariamente, no sentido estrito de ser autossustentável, considerando que somos seres sociais e, como tais, precisamos da relação interpessoal para “medir” nossas diferenças e, contraditoriamente, descobrirmos nossa individualidade. Para aprender, é preciso partir de algum lugar; nesse caso, Wick e León56 apresentam como ferramenta a escada do aprendizado, que faz um diagnóstico que ajuda o gerente a definir a posição em que está quanto a sua relação com o processo planejado e o executado; alertam que o processo de aprendizagem se inicia com o reconhecimento da necessidade de aprender. É o primeiro degrau da escada, considerando que ninguém é capaz de saber tudo ou se aproximar do todo sem a ajuda do outro. Partindo desse princípio, Wick e León apontam três situações comuns que sinalizam quando as pessoas não sabem e precisam admitir o “não saber”:57 56 WICK, Calhoun W.; LEÓN, Lu Stanton. Os desafios do aprendizado. Trad. Carmen Youssef. São Paulo: Nobel, 1997. 57 Wick; León, 1997, p. 86. 44 Unidade II Re vi sã o2 00 9: A na - D ia gr am aç ão : F ab io 2 9/ 05 /0 9 Na primeira situação, existe um desafio ou problema de difícil solução, e as pessoas envolvidas não possuem recursos práticos e imediatos para operarem a solução. Na segunda situação, as pessoas identificam que o processo não obteve o êxito esperado no planejamento ou muito menos atendeu às expectativas de resultados. Finalmente, na terceira situação, as pessoas reconhecem conscientemente que não sabem o suficiente para assegurar o sucesso futuro. Em síntese, Wick e León propõem, neste modelo de escada da aprendizagem, que as pessoas aprendam com seus próprios erros e saibam identificar seus limites perceptivos e de aplicação do conhecimento tácito na solução dos problemas novos. Para aprender, a pessoa depende do tempo, tanto o tempo da maturidade perceptiva quanto do uso de sua própria inteligência e de seu raciocínio lógico-formal. Quer dizer, nem sempre as pessoas aprendem eficazmente como desejavam, e isso produz frustrações e obstáculos de aprendizagem. Analisando o processo de aprendizagem, Mumford58 apresenta cinco razões para existir esse conflito cognitivo e emocional nas pessoas diante da aprendizagem: 1. O primeiro motivo é o fato de as pessoas não reconhecerem a atividade que desenvolvem como oportunidade de aprender algo novo. 2. Mesmo reconhecendo como aprendizagem, as pessoas acabam não aproveitando plenamente a oportunidade. 3. Qualquer experiência de aprendizagem não relacionada ao trabalho é mal-projetada ou mal-implementada pelas pessoas. 4. A oportunidade de aprender é oferecida inadequadamente, entrando em conflito com o modo pelo qual a pessoa gosta de aprender. 58 Op. cit., 2001, p. 12. 5 10 15 20 25 30 45 APRENDIZADO ORGANIZACIONAL Re vi sã o2 00 9: A na - D ia gr am aç ão : F ab io 2 9/ 05 /0 9 ?-?sem-?mod 5. A oportunidade de aprender é vista como irrelevante para as necessidades e os benefícios que as pessoas procuram obter, precisando, para tanto, de maior formação. Evidentemente que os modelos de treinamento tradicionais adotados pelas organizações se ancoraram nessas justificativas para explicar a desmotivação das pessoas em seu ambiente de trabalho e suas resistências para vivenciarem a experiência de aprendizagem. Na atualidade, entretanto, foca Mumford, já existe certo reconhecimento pelas organizações de que as mesmas devem potencializar muito mais o como se aprende do que ficarem detidas no fato de a pessoa desejar ou não aprender. O que é uma observação empírica no processo de aprendizagem se transforma em modelo (ou lógica) aceito pela maioria dos estudos que vimos até o momento nesta abordagem do tema. A aprendizagem ocorre quando as pessoas sentem necessidade de exercer suas atividades no contexto organizacional ou em suas vidas, porém, não fazem coisas sem pensar ou refletir, mas partem do fato conhecido para decifrar o fenômeno novo. Quanto mais repetimos o fazer de alguma coisa, mais nos apropriamos de suas particularidades e estrutura, chegando ao ponto de nos especializarmos sobre este ou aquele assunto. De tanto repetir o fazer, o cérebro registra os procedimentos como se fossem automáticos, igual a quando aprendemos a andar de bicicleta ou conduzir um veículo. Não paramos para pensar sobre a marcha a que passaremos naquela via congestionada ou na estrada livre; simplesmente escutamos o ruído do motor “pedindo” que a marcha equivalente a maior ou menor velocidade seja acionada, e o fazemos sem olhar ou pensar. Vamos agora entender que precisamos registrar cada momento do processo de como aprendemos a andar de bicicleta ou conduzir o carro. Ao fazermos a descrição do processo e criarmos uma sequência, colocando passo a passo todos os 5 10 15 20 25 30 46 Unidade II Re vi sã o2 00 9: A na - D ia gr am aç ão : F ab io 2 9/ 05 /0 9 estágios, teremos um procedimento padrão que poderá ser repetido por outras pessoas. Seguindo essa lógica de raciocínio, Peter Senge59 entende que o processo de aprendizagem ocorre a partir de cinco disciplinas. A primeira disciplina, segundo o autor, é o domínio pessoal, em que as pessoas aprendem a clarear e aprofundar seus objetivos. É capaz de esclarecer o que realmente é importante para o indivíduo, procurando concentrar suas energias, ficar atento para desenvolver a paciência e exercitar a observação com o propósito de ver a realidade de maneira objetiva. Na segunda disciplina, os modelos mentais são abordados como paradigmas ou ideias profundamente arraigadas, generalizações e imagens que influenciam o modo de as pessoas encararem o mundo e suas atitudes. Os modelos mentais tornam-se espelhos, aprendendo a desenterrar imagens interiores do mundo, trazendo-as à superfície para que o indivíduo possa enfrentá-las e resolver a situação de desconforto na aprendizagem. A terceira disciplina é o objetivo comum, aponta Senge, consistindo em objetivos, valores e compromissos que sejam compartilhados em conjunto por membros da organização. Se a organização tem um objetivo comum, concreto e legítimo, seus membros dão tudo de si e aprendem, não por obrigação, mas espontaneamente. A quarta disciplina, no dizer do autor, é a aprendizagem em grupo, em que as habilidades coletivas são maiores que as habilidades individuais. Nesse caso, passa a ser por meio do diálogo que o grupo poderá desenvolver várias ideias relevantes para a organização. Quando o grupo aprende, além de produzir resultados extraordinários, seus integrantes se desenvolvem com maior rapidez no sentido individual. 59 SENGE, P. M. A quinta disciplina. São Paulo: Best Seller, 1990. 5 10 15 20 25 30 47 APRENDIZADO ORGANIZACIONAL Re vi sã o2 00 9: A na - D ia gr am aç ão : F ab io 2 9/ 05 /0 9 ?-?sem-?modFinalmente, a quinta disciplina trata do raciocínio sistêmico, considerando que somente é possível entender um sistema observando-o como um todo, não apenas uma de suas partes. O negócio e outros trabalhos são sistemas que devem ser analisados em conjunto, sinaliza Senge. Raciocínio sistêmico é uma estrutura conceitual, uma integração de conhecimentos e instrumentos com o objetivo de tornar mais claro esse conjunto e mostrar modificações para melhorá-lo. A quinta disciplina integra as demais, mostrando que o todo pode ser maior que a soma de todas as partes isoladas. As cinco disciplinas se articulam entre si potencializando o pensamento lógico-matemático, a criatividade, o relacionamento interpessoal e a prática da pessoa. Considerando a dinamicidade do processo de aprendizagem, Mumford apresenta o ciclo de aprendizagem (figura 1 abaixo), começando com a atividade experiencial e concreta que a pessoa desenvolve no contexto organizacional, estimulada pelo problema que foi identificado como obstáculo, exigindo solução inovadora. Testar em novas situaçãoes Observar Refletir Experiência concreta Conceptualizar A experiência concreta da pessoa é que sinaliza a capacidade de apreensão dos novos conhecimentos da realidade em que a pessoa está inserida. Mesmo que uma teoria defenda um argumento que defina com precisão um determinado fenômeno, somente quando o indivíduo vivencia concretamente o ambiente a sua volta e estrutura a relação situacional do conhecimento é que a aprendizagem cria significado em sua vida e começa 5 10 15 20 25 48 Unidade II Re vi sã o2 00 9: A na - D ia gr am aç ão : F ab io 2 9/ 05 /0 9 a fazer parte de um conjunto de valores, crenças, modos de fazeres e métodos. Quanto mais a pessoa observa a realidade ao seu redor, maior é a capacidade para refletir sobre si própria, como também sobre o meio em que vive. Ciente dos limites individuais ou grupais, o gerente começa a observar o problema, procurando extrair o máximo de informação que lhe permita refletir sobre a viabilidade da solução em si, para que defina em seguida um significado e conceitue as causas do problema. O resultado será testado em simulações que possam qualificar o processo em si e possibilitem um novo olhar sobre o processo corporativo. Trabalhando com o ciclo de aprendizagem, Mumford60 estabelece relação com os estilos de aprendizagem, abordando cada uma das vertentes que compõem os quatro estilos de aprendizagem: • ativistas: aprendem melhor com tarefas relativamente curtas e imediatistas. Podem ser atividades gerenciais no trabalho ou em cursos, como jogos de empresas e tarefas competitivas feitas por equipe de trabalho. Têm maior dificuldade para aprender quando se trata de palestras ou leitura; • reflexivos: aprendem melhor a partir de atividades em que possam ficar recuados, ouvindo e observando. Gostam de colher de informação a aprendizagem e que seja destinado tempo suficiente para refletir a respeito. Possuem dificuldade para aprender quando precisam lidar com as atividades de forma reativa sem tempo para pensar; • teóricos: aprendem melhor quando podem reavaliar suas relações e posicionamentos quanto ao sistema ao qual estão vinculados, os conceitos, modelos ou teorias. São mais interessados por absorver ideias estratégicas e de visão do futuro. A dificuldade de aprendizagem é maior 60 Mumford, 2001, p. 18. 5 10 15 20 25 30 49 APRENDIZADO ORGANIZACIONAL Re vi sã o2 00 9: A na - D ia gr am aç ão : F ab io 2 9/ 05 /0 9 ?-?sem-?mod quando precisam lidar com atividades que possuem características mais elaboradas e conceituadas; • pragmáticos: aprendem melhor quando existe uma ligação clara entre a visão do sujeito e o problema ou a oportunidade no trabalho. Sentem-se melhor em confrontos com a técnica e com processos que podem ser aplicados em suas circunstâncias imediatas. Têm dificuldade para aprender quando os acontecimentos são mais distantes de suas realidades imediatas. Cada estilo de aprendizagem apresentado pelo autor é uma característica que fica mais ou menos evidente, variando de pessoa para pessoa, portanto, não se trata de sair definindo quem é mais, um ou outro estilo de aprendizagem, e sim posicionar traços de personalidade que ficam mais marcantes na experiência vivencial em uma equipe de trabalho, em qualquer que seja a organização. David Kolb,61 em seus estudos, partindo da compreensão de que todo conhecimento é resultado da relação entre teoria e experiência, constrói o modelo denominado de “aprendizagem experiencial”. Para explicar como funciona o modelo proposto por Kolb, vale citar a contribuição ao estudo feita por Belnoski e Dziedzic,62 ao descreverem que o autor desenvolveu quatro etapas que considera básicas para o aprendizado, que também caracterizam perfis de diferentes alunos: a) sentir: é a maneira como o aluno percebe uma nova informação; inclui um bom relacionamento entre o professor e o aluno e enfatiza os seus valores pessoais — é a denominada experiência concreta; b) observar: é a forma como o aluno processa a informação, o momento em que ele separa a experiência e observa o evento novo, a partir de diversos pontos de vista — é chamada de observação reflexiva; 61 KOLB, David. Experiential learning. Hemel Hempstead: Prentice Hall, 1993. 62 BELNOSKI, Alexsandra Marilac; DZIEDZIC, Maurício. O ciclo de aprendizagem na prática de sala de aula. Athena (revista científica de educação), v. 8, n. 8, jan./jun. 2007,p. 47. 5 10 15 20 25 30 50 Unidade II Re vi sã o2 00 9: A na - D ia gr am aç ão : F ab io 2 9/ 05 /0 9 c) pensar: é a organização das informações por meio de conceitos, teorias e princípios transmitidos pelo professor — também denominada de conceitualização abstrata; d) fazer: é nesta fase que o aluno efetua os testes para a obtenção de respostas, trabalhando com o real para receber resultados práticos — chamada experimentação ativa. A figura 2 mostra o sistema conforme apresentado no modelo do autor, em um espiral dialético que combina cada estágio do processo, procurando deixar claro que o processo é dinâmico, como deve ser no caso humano. Aplicação Testar o novo conceito ou conjunto de conhecimentos através da prática e experimentação Reflexão Fazer a ligação entre a nova experiência e os conhecimentos, valores e crenças existentes Experiência Vivenciar um fenômeno novo Generalização Interpretar a nova experiência e estabelecer a relevância da mesma Figura 2: Modelo de Kolb. Fonte: www.mastermindbr.com (acesso em 18/ 08/ 2008). Na experiência concreta, a pessoa confronta o que sente com a realidade, possibilitando que as contradições sejam minimizadas e o distanciamento diminua entre o que se idealiza como realidade e o que se vive concretamente, propiciando maior domínio do fato observado. A relação entre o professor e o aluno será sempre de facilitação na apreensão das novas informações, de forma 5 10 15 51 APRENDIZADO ORGANIZACIONAL Re vi sã o2 00 9: A na - D ia gr am aç ão : F ab io 2 9/ 05 /0 9 ?-?sem-?mod que o aluno se sinta confortável diante do novo. No estágio da observação, o aluno reflete sobre a nova experiência e procura assimilar a nova informação sem maiores resistências, considerando que o professor acolheu a dialética da relação entre o conhecimento existente e o novo potencial conhecimento. As novas informações abstraídas a partir da observação reflexiva conduzem à elaboração crítica e racional do pensar, que promovea triagem do conjunto de dados, estabelecendo a ordem de prioridades. Obviamente que o aluno é um ator ativo na construção do conhecimento e, nesse caso, a nova informação deve ser testada em sua veracidade e significância. Fazer é muito mais que simplesmente executar algo. Trata- se de um fazer crítico, pensado, refletido e retroalimentado constantemente pela busca de aprender e expandir os horizontes do saber. Na figura 3, pode-se observar a aplicação do modelo no desenvolvimento de competências. Pela aprendizagem: Formal; informal; incidental; situada; baseada no trabalho; autodirigida, da vida, pelo autodesenvolvimento Propicia desenvolvimento de competências Que realimenta os processos de aprendizagem numa noção de espiral Ciclo de Aprendizagem Experiencial Experiência Abstração Ação Reflexão Que envolvem aprendizagem pela Experiência/Ação Figura 3 – O papel da aprendizagem na ação no desenvolvimento de competências. O ciclo de aprendizagem, bem como o estilo de aprender de cada pessoa, é objeto de estudo de muitas teorias no campo 5 10 15 52 Unidade II Re vi sã o2 00 9: A na - D ia gr am aç ão : F ab io 2 9/ 05 /0 9 das organizações. O que toda organização busca é desenvolver uma equipe de profissionais que coloquem seus conhecimentos a serviço da excelência no processo produtivo em si, na valorização da marca, na criação de modelos e práticas de gestão que atendam às necessidades estratégicas e operacionais da corporação. Aprender individualmente é algo que se consegue em duas dimensões, como foi analisado nos itens anteriores: pelo conhecimento formal e pelo conhecimento vivencial. No contexto das organizações, esses conhecimentos são aplicados a partir das competências e do talento de cada colaborador. Obviamente que a organização entende que a iniciativa seja do colaborador em termos de aplicação do conhecimento que possui, a partir das dificuldades de aprendizagem que vai sentindo no processo organizacional; entretanto, a organização que aprende não espera passivamente por esse acontecimento, mas cria estratégias de promoção do aprendizado corporativo, que vão desde treinamentos dirigidos, até sofisticados sistemas de simulação de cenários e testes de desenvolvimento da inteligência e da criatividade. Com isso, vale ressaltar que existem maneiras para se aprender eficazmente, como analisa Mumford (2001, p. 24), tendo como referência a abordagem feita por Sylvia Downs e Patrícia Perry63 sobre como a pessoa se propõe a aprender. Vale lembrar que esta abordagem, como bem ressalta Mumford, tornou-se conhecida pela sigla MUD, formada pelas iniciais das palavras em inglês memorising, understanding e doing. Quando a pessoa aprende uma coisa pela primeira vez, existe um grau de conforto ou de desconforto na situação, produzindo um sentimento de aceitação ou rejeição ao objeto do conhecimento. De uma forma ou de outra, a memória registra o acontecimento, e todas as vezes em que uma situação similar se apresentar na vida da pessoa, esta terá maior familiaridade com o ocorrido e, de uma forma ou de outra, aprenderá mais rápido. Nessas circunstâncias, a pessoa aprenderá por memorização, lembrando como aprendeu pela primeira vez. 63 DOWNS, Sylvia. Learning at work. Londres: Kogan Page, 1995. 5 10 15 20 25 30 35 53 APRENDIZADO ORGANIZACIONAL Re vi sã o2 00 9: A na - D ia gr am aç ão : F ab io 2 9/ 05 /0 9 ?-?sem-?mod Outra forma de aprender, sistematizada pelas autoras, comenta Mumford, será a partir da compreensão como atividade mental do indivíduo que agrupa informações e ideias em uma maneira nova de pensar, fazendo sentido para quem aprende. Compreender o mundo a sua volta é uma constante busca para explicar os fenômenos desconhecidos que o cercam de maneira criativa e inovadora. Finalmente, existe a maneira de aprender pela prática, pelo fazer, que é diferente da ideia de pragmatismo, mas refere-se à determinação de apreender o objeto de conhecimento, considerando a habilidade adquirida com a prática, articulando conhecimentos já incorporados pelo modelo mental e fazendo uso em uma aprendizagem proativa e sistêmica. 5 LIDERANÇA, EQUIPE E MANEIRAS DE APRENDER Aprender não é tão simples como parece. Uma coisa é você se colocar diante de uma situação e, depois de um tempo, poder falar desta mesma situação detalhando aspectos singulares que somente você pôde observar; entretanto, viver a situação é uma coisa, falar sobre a situação é outra coisa totalmente diferente. O professor em sala de aula professa a compreensão particular sobre o conteúdo de determinada disciplina que será ministrada para uma classe. Quando a mesma disciplina é ministrada para mais de uma classe, o professor terá uma tarefa bem mais complexa, considerando a diversidade e o aprendizado sobre o assunto professado. Dependendo da classe, em uma escola, ou da equipe de trabalho, em uma organização, a maneira de aprender será distinta, conforme aborda Mariotti (1999): (...) as novas formas de aprendizagem serão grupais e terão muito a ver com a sinergia, a criatividade e um melhor entendimento das distorções cognitivas, dos preconceitos e da resistência à mudança.64 64 Mariotti, 1999, p. 66-7. 5 10 15 20 25 30 54 Unidade II Re vi sã o2 00 9: A na - D ia gr am aç ão : F ab io 2 9/ 05 /0 9 Partindo do mesmo autor, na tabela abaixo, podemos observar as múltiplas maneiras de aprender, que, conscientemente, são usadas pelo ensino formal e influenciam diretamente na vida das pessoas e das corporações: Maneiras de aprender Características Disciplinaridade Diante de um objeto de estudo qualquer, para facilitar sua compreensão, procede-se a sua fragmentação e cada parte será estudada separadamente por uma disciplina e, conforme o estudo se aprofunda, novas subdivisões acontecem, fazendo surgir as especialidades e subespecialidades. Multidisciplinaridade Devido a sua complexidade, um assunto será estudado por várias disciplinas que se juntam para compreender as múltiplas dimensões que explicam o assunto em si, sendo que cada disciplina mantém sua integridade sem se relacionar. Como o fato de se agruparem para estudar o assunto é momentâneo e não existirá uma síntese, o todo formado pelas disciplinas será somente a soma das partes, considerando que, após o estudo, cada disciplina continuará igual a si mesma, falando sua própria língua em seu próprio compartimento. Interdisciplinaridade Diferente do processo multidisciplinar, as disciplinas reunidas interagem entre si, formando correlação e integração entre as disciplinas, o que possibilita a formação de sínteses que se diferenciam das linguagens singulares das disciplinas separadas, uma vez que formam uma linguagem comum resultante da unidade do pensamento surgida com a interação. Transdisciplinaridade As disciplinas combinadas e integradas entre si formam a tendência de desfronteirização das linguagens particulares de cada disciplina, e as relações de interdisciplinaridade se globalizam, possibilitando a composição e o surgimento de uma experiência totalmente nova e inusitada que poderá formar uma disciplina integrada e capaz de contemplar as múltiplas dimensões da realidade na qual a aprendizagem está inserida em sua riqueza quase absoluta. Seguindo nesta linha de raciocínio disciplinar, observa-se, em Wick e León (1997),65 como fazer para que uma organização esteja sempre à frente de seus concorrentes, tendo como princípio a aprendizagem corporativa. Os autores alertam que um dos passos importantes é o indivíduoassumir as rédeas de sua aprendizagem, que nada mais é 65 WICK, Calhoun W. O desafio do aprendizado. São Paulo: Nobel, 1997. 5 10 55 APRENDIZADO ORGANIZACIONAL Re vi sã o2 00 9: A na - D ia gr am aç ão : F ab io 2 9/ 05 /0 9 ?-?sem-?mod do que possuir a noção de que uma tarefa compreende simultaneamente a execução e a aprendizagem. Desta forma, sinalizam os estudiosos que as organizações devem adotar o aprendizado como uma atividade permanente. Entretanto, a organização deve ainda considerar que as pessoas aprendem de diversas formas e em todos os momentos de suas vidas, seja dentro ou fora do ambiente de trabalho. Evidentemente que aderir a uma visão dessa natureza requer, por parte da organização, uma atenção contínua aos colaboradores em suas diversas práticas gerenciais, mas, fundamentalmente, exige uma estratégia de preparação contínua do sistema de liderança, atingindo o âmbito da maestria pessoal; quer dizer, �o aprendizado começa quando cada um dos gerentes se compromete com a autodescoberta e o crescimento.66 O papel do gerente como líder da equipe de trabalho vai além do exercício do mando e começa a fazer parte de uma rotina de aprendizado permanente na organização. Buscando traçar algumas características desses líderes, os autores apontam que �os líderes que aprendem não se preocupam apenas com o próprio aprendizado, mas estão sempre estimulando e incentivando o aprendizado dos outros.67 Nas organizações que aprendem, os líderes transformam-se em mentores, treinadores de mentes e talentos, professores e projetistas que orientam a trajetória corporativa em busca da excelência nos resultados. Esse papel, como sinaliza Peter Senge,68 demanda do líder a aquisição de novas habilidades capazes para: 1) conceber uma visão comum; 2) trazer à tona e questionar os modelos mentais predominantes; 3) estimular o raciocínio sistêmico. 66 Idem, 1997, p. 28. 67 Idem, 1997, p. 160. 68 SENGE, Peter. The leader’s new work: building learning organizations. Sloan Management Review, 1999, p. 9. 5 10 15 20 25 30 56 Unidade II Re vi sã o2 00 9: A na - D ia gr am aç ão : F ab io 2 9/ 05 /0 9 Ao fazerem um estudo nas práticas gerenciais de grandes corporações, Wick e León (1997) estabelecem algumas características comuns dos líderes, que aparecem nas organizações definidas pelos autores como “de aprendizado”. Tais características corroboram com as habilidades indicadas por Senge. Para abordar a primeira característica, os autores alertam para a questão da defasagem de desempenho corporativo para criar uma visão, implicando comparar o desempenho atual com o desempenho desejado para a organização. Outra característica dos líderes de grande impacto é a indicação do caminho a ser percorrido a partir do próprio exemplo. Os colaboradores esperam que seus líderes sejam capazes de aplicar o discurso do projeto corporativo, o que significa dizer que os líderes que admitem suas próprias falhas acabam inspirando em seus seguidores maior respeito, lealdade e confiança. A demonstração por parte do líder de que é capaz não somente de gerenciar a equipe, mas também de fazer e acontecer, gera na equipe de trabalho o sentimento de colaboração e solidariedade, a partir de outra importante característica, que é a criação progressiva de um ambiente de apoio na organização. Neste ambiente, a diversidade é um princípio de convivência compartilhada, o que acaba produzindo o senso de segurança entre as partes envolvidas, demonstrando maior aceitação aos riscos, o que deixa as pessoas mais confortáveis diante das incertezas. Como quarta característica identificada pelos autores para os líderes das organizações que aprendem, surge a questão democrática do estímulo à participação, a partir do papel de líder não tirano. Para tanto, o líder deve saber como animar e motivar sua equipe, criar condições permissivas para que as pessoas mudem, bem como saber como distribuir as responsabilidades com justiça, distribuir os benefícios dos bons resultados, mas também dividir a culpa de um resultado deficitário. Finalmente, 5 10 15 20 25 30 57 APRENDIZADO ORGANIZACIONAL Re vi sã o2 00 9: A na - D ia gr am aç ão : F ab io 2 9/ 05 /0 9 ?-?sem-?mod apontam os autores que o líder da organização que aprende deve saber ouvir aquilo que não tem vontade de ouvir. O gerente, na organização que aprende, assume o papel do líder que é responsável por desenvolver novos líderes, sem perder de vista seus recursos pessoais e corporativos, o que Wick e León (1997, p. 147) denominam de “caixa de ferramentas do aprendizado”, priorizando cinco ferramentas que podem ser usadas durante todo o plano de aprendizado: 1. Visualização: ajuda o líder a transformar em realidade a visão construída. 2. Escada do aprendizado: ajuda o líder a determinar a posição atual da organização comparada com o aumento da capacidade desejada e corrigir os desvios de programação. 3. Estrela do aprendizado: esta ferramenta ajuda o líder a identificar quatro elementos importantes do aprendizado pensamento, ação, autossistema e contato com as pessoas. 4. Aprendizado através dos erros: a ferramenta ajuda o líder a conduzir as quatro reações possíveis quando alguém tenta fazer uma coisa nova e comete um erro — admitir o erro e aprender com ele; admitir o erro e procurar um culpado; esconder o erro; negar que houve erro. 5. Benchmarking: ajuda o líder a conduzir o processo corporativo aprendendo com o que existe de melhor. 6 APRENDIZAGEM ORGANIZACIONAL: ABORDAGENS TEÓRICAS E RACIOCÍNIO SISTÊMICO O aprendizado organizacional compreende um processo vivo de mecanismos gerenciais que promovem o desenvolvimento 5 10 15 20 25 58 Unidade II Re vi sã o2 00 9: A na - D ia gr am aç ão : F ab io 2 9/ 05 /0 9 sistêmico da cadeia de valores existentes na organização e, por ser intangível, tornam-se desafiantes sua mensuração e sua atribuição de indicadores que estabeleçam os melhores meios de se aprender em grupo, considerando que somente o indivíduo aprende. Porém, quando se parte do raciocínio lógico-matemático, parece que definir aprendizagem vai além da abstração e da sua intangibilidade, assumindo forma concreta, tal o método aplicado. Aprender, como define Huber (1991),69 implica a aquisição de dados que se transformam em informação, interpretação dos dados coletados, distribuição das articulações e associações formais feitas com os dados fragmentados e o armazenamento das informações tratadas, como conhecimento especializado e experimentado. A aprendizagem, neste contexto, implica preparar o indivíduo em duas dimensões: Preparação do indivíduo Formal (dados e informações) Vivencial (experiência ao longo da vida) Reforçando o que escrevemos anteriormente, na preparação formal, aprende-se pela lógica racional, que é simbolizada pela certificação, pelos diplomas escolares, pelos cursos e treinamentos e por todas as qualificações documentais que representam o preparo intelectual. Na preparação vivencial, a pessoa aprende com as experiências adquiridas ao longo da vida, seja nas relações interpessoais, seja nas relações grupais. Quando o aprendizado formal e o vivencial se integram, formam a estrutura de competências que um profissional aplica sistemicamente em um determinado contexto corporativo. No caso das organizações, as pessoas trabalham em equipes e empregam suas competências continuamente, formando uma rede de conhecimento que articula corporativamente as 69 HUBER, G. P. Organizational learning: thecontributing processes and the literatures. Organisation Science, 2, 1991. 5 10 15 20 25 59 APRENDIZADO ORGANIZACIONAL Re vi sã o2 00 9: A na - D ia gr am aç ão : F ab io 2 9/ 05 /0 9 ?-?sem-?mod concepções individuais do conhecimento formal com as práticas vivenciais. O que se aprende e o que se ensina numa empresa não pode ser reduzido a uma série mecânica e descontínua de blocos de aprendizado que transmitem um conhecimento superficial, mecanicista, de duração efêmera e, principalmente, impessoal e massificada.70 Em nosso estudo sobre aprendizagem espontânea (2006), definimos que No processo de aprendizagem formal, existem três componentes indispensáveis e essenciais: o domínio da técnica de leitura e escrita; a interpretação do que se lê e escreve e; a capacidade de deslumbramento diante do mundo.71 Obviamente que, no contexto organizacional, a permissividade para o desenvolvimento do aprendizado não ocorre de forma estratégica, mas decorre da contingência do próprio processo produtivo e da relação entre a tarefa que deve ser cumprida, a competência do sistema de liderança, a exigência do mercado, o investimento envolvido e a ausência de conhecimento pontual para resolver o problema que paralisa o processo, bem como coloca em risco a meta e o objetivo planejado em relação à produtividade necessária. Aprender é, em todos os casos, uma necessidade evolutiva do ser humano, e, desta forma, deve ser livre, respeitando o momento de deslumbramento do indivíduo diante do mundo a sua volta, o que é disparado pela problematização diante da realidade situacional, conforme apontamos em outra passagem de nosso estudo. A problematização, tanto como a percepção da realidade, é condição básica para a aprendizagem 70 MARIOTTI, Humberto. Organizações de aprendizagem – Educação continuada e a empresa do futuro. São Paulo: Atlas, 1999, p. 50. 71 GUERREIRO, Evandro Prestes. Aprendizagem espontânea e infoinclusão social. In: Cidade digital – infoinclusão social e tecnologia em rede. São Paulo: SENAC, 2006, p. 181. 5 10 15 20 25 30 60 Unidade II Re vi sã o2 00 9: A na - D ia gr am aç ão : F ab io 2 9/ 05 /0 9 espontânea; é, porém, apenas parte de uma estrutura de constituição do ser no processo educacional. Para aprender a problematizar os fatos e perceber criticamente a realidade, o indivíduo precisa de liberdade de ação e autonomia para tomar decisões.72 Conforme diz Mariotti (1999), o conhecimento necessita formar blocos de compreensão, o que significa dizer que, nas empresas, a equipe profissional forma integrações de aprendizagem e que tais formações consolidam não somente a prática, mas também a revisão de conceitos constituindo novas competências. Segundo o autor, A competência nasce de pessoas competentes e gera pessoas competentes, para as quais, vencer não implica inevitavelmente a destruição dos vencidos. A excelência de seu trabalho produz benefícios que ultrapassam em muito os objetivos e os resultados dos simples treinamentos.73 A aprendizagem organizacional, neste contexto, pode ser definida como um conjunto de competências que se articulam em uma rede inteligente e viva de resoluções de problemas práticos e estratégicos, orientando o resultado esperado no processo produtivo das organizações. Para se ter uma ideia a respeito da complexidade desse sistema de aprendizado organizacional, Mariotti aponta que eles são identificados pelas seguintes características: a) Existe uma baixa hierarquização, em que a relação de mando é obediência, está sujeita à instabilidade temperamental dos pares existentes na equipe de trabalho; nesse caso, o poder não é muito claro; consequentemente, o seu exercício é instável e inseguro, bem como ameaçador. 72 Idem, 2006, p. 191. 73 Mariotti, 1999, p. 51. 5 10 15 20 25 30 61 APRENDIZADO ORGANIZACIONAL Re vi sã o2 00 9: A na - D ia gr am aç ão : F ab io 2 9/ 05 /0 9 ?-?sem-?mod b) Baixo índice de obediência cega e pouca institucionalização, caracterizando a não existência de funções e cargos devidamente desenhados, bem como as responsabilidades definidas com precisão, gerando certa tendência de fuga em relação ao excesso de regras e normas. c) Baixo nível de especialização, com a ambiguidade e as generalizações fazendo parte do sistema; se por um lado a resistência às mudanças é menor, dada a flexibilidade da equipe de trabalho, por outro lado, as competências e responsabilidades técnicas podem ficar comprometidas, produzindo resultados duvidosos. d) Memorising, Understanding e Doing (MUD): a equipe é menos apegada às competências individualistas (egoísmo), possibilitando maior entendimento entre as partes, considerando que a conciliação de visões opostas, bem como a solução de conflitos, faz parte do cenário flexível de aprendizagem, a partir da cultura corporativa. O esforço por compreender a aprendizagem tendo como referência a dialética das relações sociais e vinculares em determinado ambiente tende a cair na matriz da existência das duas dimensões da aprendizagem, conforme tratada anteriormente: a conceitual ou cognitiva (formal) e a aprendizagem operacional (vivencial), ou, ainda, emocional, como estabelece Daniel Goleman, em Inteligência emocional.74 A maioria dos estudos publicados sobre aprendizagem organizacional, principalmente os autores americanos, partem de situações empíricas que acontecem em suas experiências corporativas, seja em um projeto, seja no desenvolvimento de cenários para novos produtos ou mesmo na expansão do mercado. 74 GOLEMAN, Daniel. Inteligência emocional. 11. ed. Rio de Janeiro: Objetiva, 1995. 5 10 15 20 25 30 62 Unidade II Re vi sã o2 00 9: A na - D ia gr am aç ão : F ab io 2 9/ 05 /0 9 Aprender, para tais autores, mesmo que suas abordagens façam a relação entre causa e efeito, significa procurar um raciocínio melhor fundamentado na história das teorias de aprendizagem para explicar fenômenos presentes; eles adotam o raciocínio mais simples e colocam a aprendizagem entre um modelo teórico, com forte influência do cartesianismo ou um modelo empírico que parte da realidade factual, vivencial, conforme se observa nos tipos de aprendizagem analisados por Garvin (2002). A aprendizagem no contexto organizacional, por exemplo, ocorre em circuito único ou simples, que depende da habilidade do gerente para detectar e fazer as devidas correções de percurso no que diz respeito ao conjunto de normas operacionais e procedimentos no qual possui influência e responsabilidade decisória. Detectar o erro e corrigi-lo a tempo significa preservar o sistema operacional da corporação, o que requer o contínuo aperfeiçoamento dos processos, tornando-os mais eficazes e eficientes. Essa abordagem sobre aprendizagem é desenvolvida por Choo (2002), como mostra a figura 4.75 Figura 4 – Modelo de aprendizagem organizacional Doutrina, estratégias e normas Investigação criminal Resultado Aprendizado de circuito duplo Aprendizado de circuito simples Fonte: www.dgz.org.br/fev08/Art02fig02.jpg (acesso em 17/08/08). Complementar ao circuito único ou simples, a aprendizagem pode ocorrer ainda em circuito duplo, que dependerá da capacidade gerencial para fazer o distanciamento seguro, sem se contaminar com a situação e exercer o poder decisório de forma arbitrada, questionando a relevância e o impacto das normas de funcionamento e procedimentos corporativos. 75 CHOO, C.W. Information management for the intelligent organization: the art of scaning the enviroment.3. ed. Medford, New Jersey: Information Today, 2002. 5 10 15 20 25 63 APRENDIZADO ORGANIZACIONAL Re vi sã o2 00 9: A na - D ia gr am aç ão : F ab io 2 9/ 05 /0 9 ?-?sem-?mod O gerente deve saber identificar e explorar as possibilidades empreendedoras de inovação do sistema operacional da organização, tendo a sensibilidade para comparar, viabilizar e envolver a mudança do modelo e prática de gestão, valores e princípios do sistema corporativo engessado com o tempo. O conceito de aprendizagem organizacional, desta forma, está relacionado com a ideia de inovação social e tecnológica nas instituições. Senge,76 por exemplo, como visto anteriormente, define as corporações que aprendem como organizações em que as pessoas continuamente expandem as suas capacidades no sentido de criar resultados desejados, nas quais novos sistemas são gerados, em que se liberta a aspiração coletiva e em que as pessoas fazem continuamente um processo de como aprender em conjunto. Isso significa dizer que, para Senge, é na equipe de trabalho que aprendemos a pensar, refletir, fazer, avaliar, checar nossas verdades, rever nossas posturas e traçar o futuro. As cinco disciplinas que o autor sistematiza integram os valores pessoais com os valores grupais a partir do domínio pessoal sobre o que se pensa e o que se faz, bem como a visão de mundo sobre si e sobre o outro. Entretanto, o risco de se ter opinião própria é se fechar em um modelo mental mais rígido e inflexível à inovação e à mudança. O modelo mental das pessoas traduz o conjunto de valores e crenças no campo ético e moral, mas também relaciona as percepções de si, do outro e do mundo. Quando temos verdades absolutas sobre as coisas que fazemos, temos maior dificuldade para conviver grupalmente. Nesse caso, os objetivos comuns favorecem a maior apreensão das mudanças por parte do profissional e flexibilidades necessárias para o trabalho em equipe. A aprendizagem em grupo é o desafio da sociedade moderna, contrária à tendência do individualismo ou da 76 SENGE, P. M. A quinta disciplina. São Paulo: Best Seller, 1990. 5 10 15 20 25 30 64 Unidade II Re vi sã o2 00 9: A na - D ia gr am aç ão : F ab io 2 9/ 05 /0 9 reclusão social. Como ser social que somos, é no grupo que interagimos com o outro, assumimos desafios internos de mudança e lapidamos nossos valores e atitudes, aprendendo como nos adaptarmos à diversidade ambiental e à temporalidade dos acontecimentos. O ensino formal, por exemplo, mostra o mundo em pedaços menores formando um todo, a partir de disciplinas, sequências ordenadas, classificadas, departamentalizadas, controladas e dirigidas para resultados previsíveis. Entretanto, descobrimos que o mundo é como um movimento integrado, um todo dinâmico, interdependente e relacional. A vida não é um acontecimento de fatos que se sequenciam linearmente, mesmo que em uma visão possível possamos estabelecer um padrão lógico de situações previsíveis, como se convencionou a pensar na estratégia de planejamento que as corporações executam todos os anos, confrontando informações passadas com os resultados obtidos em um período, possibilitando que os estrategistas gerem cenários futuros para tomadas de decisões, bem como indicadores de padrão de qualidade e excelência no processo. O raciocínio sistêmico nos ampara na visão do coletivo e nos protege das armadilhas do conhecimento e do “não-saber”. As lacunas de informações são preenchidas inteligentemente pelas similaridades e pela gestão de riscos, por aproximação e dinâmica própria de explicação e compreensão do contexto no qual nos encontramos. Pensar sistemicamente é o que propõe a missão da Fundação Nacional da Qualidade (FNQ). Na publicação denominada Fundamentos e critérios de excelência na gestão, um conjunto de indicadores orienta a prática e o modelo de gestão das empresas brasileiras candidatas ao Prêmio Nacional da Qualidade. A aplicação dos indicadores apresentados nos fundamentos e critérios de excelência do modelo FNQ possibilita a elaboração 5 10 15 20 25 30 65 APRENDIZADO ORGANIZACIONAL Re vi sã o2 00 9: A na - D ia gr am aç ão : F ab io 2 9/ 05 /0 9 ?-?sem-?mod de um diagnóstico que serve para avaliar os resultados, a liderança, as estratégias, o conhecimento corporativo, os processos, os clientes, as pessoas e a sociedade. O sistema de avaliação da prática de gestão identifica o estágio e a coerência do modelo de gestão corporativa, tendo em vista o aprendizado organizacional, que, no caso, é definido como a (...) busca de alcance de um novo nível de conhecimento por meio de percepção, reflexão, avaliação e compartilhamento de experiências, alterando princípios e conceitos aplicáveis a práticas, processos, sistemas, estratégias e negócios, e produzindo melhorias e mudanças na organização.77 Fonte: Modelo de excelência. http://www.fnq.org.br (acesso em 20/ 08/ 2008). 77 Fundação Nacional da Qualidade. Conceitos fundamentais da excelência em gestão. São Paulo: FNQ, 2006, p. 12 (disponível em www.fnq. org.br – acesso em 03/08/2008). 5 10 66 Unidade II Re vi sã o2 00 9: A na - D ia gr am aç ão : F ab io 2 9/ 05 /0 9 Aprender significa acumular conhecimentos de ordem prática e vivencial, mas também conceituar a própria prática, atribuindo significados aos fatos e às suas múltiplas inter-relações causais, enquanto significantes e matrizes do próprio aprendizado. O pensamento sistêmico estabelece a interdependência entre os diversos componentes da organização, bem como entre a organização e o ambiente externo. A implantação do modelo de excelência resulta do processo de aprendizagem na organização, e esta, por sua vez, como sugere o próprio modelo, é colocada em prática, pela internalização da cultura corporativa, tornando-a parte do trabalho e da rotina organizacional. Assim, o desenvolvimento organizacional é assegurado quando o conhecimento que a organização possui de si própria é preservado e valorizado no tempo e no ambiente em si. A organização, segundo o modelo FNQ de excelência na gestão, deve oportunizar condições concretas para que o conhecimento seja compartilhado e, com isso, o aprendizado seja operado coletivamente. Porém, a forma usual que assegura maior aprendizado é saber como gerenciar o conhecimento enquanto ativo empresarial, valorizando e perpetuando o capital intelectual, como forma de produzir novos conhecimentos, codificá-los, disseminá-los e apropriá-los. O aprendizado organizacional também promove a experimentação nas empresas, uma vez que usa o erro como instrumento pedagógico, incluindo novas possibilidades de desenvolvimento das práticas gerenciais, assim como estimula entre as partes interessadas o compartilhar de informações e conhecimentos corporativos. Essa cultura de trabalho em equipe consegue comprometer o colaborador na tarefa sob sua responsabilidade, desenvolve soluções empreendedoras, implementa melhorias no sistema organizacional como um todo e aborda a inovação como forma de sustentabilidade. 5 10 15 20 25 30 35 67 APRENDIZADO ORGANIZACIONAL Re vi sã o2 00 9: A na - D ia gr am aç ão : F ab io 2 9/ 05 /0 9 ?-?sem-?mod 7 MODELOS DE APRENDIZADO ORGANIZACIONAL Em estudo que aborda a proposta de um modelo integrado de aprendizagem organizacional que preencha as lacunas teóricas existentes nas diversas análises sobre o tema, Silvana Santana,78 pesquisadora da Universidade de Aveiro, em Portugal, em artigo intitulado Modelointegrado para o estudo da aprendizagem organizacional, desenvolve uma síntese sobre os diversos enfoques teóricos de sistematização de um modelo, que reproduzimos como contribuição para a análise. A autora chama a atenção para o fato de os modelos existentes na literatura deixarem lacunas teóricas que necessitam ser preenchidas com um modelo que consiga promover múltiplas aderências tanto no ponto de vista conceitual quanto na aplicação prática. Partindo desse cuidado teórico, começa a fundamentar os argumentos de um modelo integrado, a partir de Daft e Weik,79 que consideram o processo de aprendizagem em três fases: recolha de dados, interpretação e aprendizagem. Cada fase dessas se articula entre si, mas a interpretação da informação é restrita aos gestores que fazem parte da governança corporativa e tomam as decisões no âmbito das estratégias de mercado. Porém, neste modelo, segundo a crítica da pesquisadora, os autores deixam escapar a interdependência entre aprendizagem individual e aprendizagem organizacional, sugerindo uma dicotomia entre interpretação e aprendizagem propriamente dita. Scanning (recolha de dados) Aprendizagem (tomada de ação) interpretação (atribuição de significado) 78 Análise social. Aveiro, Portugal: Universidade de Aveiro. Vv. XL (175), 2005, 367-91. 79 DAFT, R. L.; WEICK, K. E. Toward a model of organisations as interpretation systems. In: Academy of Management Review, 9 (2), 1984, p. 284-95. 5 10 15 20 68 Unidade II Re vi sã o2 00 9: A na - D ia gr am aç ão : F ab io 2 9/ 05 /0 9 Partindo desta crítica, Santana explica que, no modelo, as ações individuais fundamentam-se pelas crenças individuais e que tais ações possibilitam a ação corporativa que produz uma resposta ambiental. Essa estrutura forma um ciclo contínuo que se retroalimenta, mas somente se completa quando a ação ambiental provoca um impacto nas crenças individuais, considerando-se que, se o ambiente permanece inalterado, os modelos mentais, bem como os valores que se associam às crenças dos indivíduos, não se modificarão, e as ações organizacionais seguem a mesma linha. Por outro lado, se ocorrerem mudanças ambientais, as crenças individuais sobre a natureza do ambiente podem se modificar, precipitando um conjunto de ações individuais e organizacionais e provocando um novo ciclo de aprendizagem. Conforme aponta a pesquisadora, o modelo desconsidera as interações entre o aprendizado individual e o aprendizado organizacional, deixando a entender que a interpretação em si e a aprendizagem são atividades desconectadas sócio- historicamente, o que seria uma contradição, considerando que os indivíduos pensam, sentem e fazem e é justamente essa integração sistêmica que atribui significado para a aprendizagem em suas múltiplas dimensões. Considerando as várias teorias que tratam da questão da aprendizagem, podemos estabelecer três dimensões do debate: 1) Aprendizagem decorrente do ensino, em que as pessoas sabem ou fazem algo e, por saberem e dominarem o modo e o meio de fazer, ensinam o que sabem para outras pessoas. 2) Aprendizagem decorrente de atividades da própria pessoa que aprende a partir da observação e da imitação, da investigação, da pesquisa, do estudo e da reflexão. 3) Aprendizagem decorrente da interação entre as pessoas, o que é manifestado pela troca de ideias, pelo diálogo, pela discussão e pela crítica. Obviamente que, após toda esta reflexão crítica e expositiva a respeito das diversas abordagens sobre aprendizagem organizacional, você deve estar um pouco confuso com tanta informação a respeito, mas o que podemos dizer para acalmar 5 10 15 20 25 30 35 69 APRENDIZADO ORGANIZACIONAL Re vi sã o2 00 9: A na - D ia gr am aç ão : F ab io 2 9/ 05 /0 9 ?-?sem-?mod sua ansiedade é que, quando estamos aprendendo algo novo, entramos no mundo do desconhecido e, portanto, em um território instável e arriscado por natureza. Entretanto, é por conta desse risco pioneiro e de uma curiosidade singular que como indivíduos ontológicos e reflexivos fomos capazes de evoluir tecnologicamente em direção a uma sociedade complexa. Dessa forma, nunca perca de vista que, se chegamos a este ponto, partimos de algum lugar e, provavelmente, este lugar já era complexo, por ser desconhecido naquele momento; agora, ele é mais complexo ainda, apesar de ser a síntese de sua própria simplificação enquanto resultado de nosso conhecimento e de nossa aprendizagem. Partindo dessa compreensão, construímos um macroprocesso do que abordamos até o momento, como forma de facilitar sua visão sistêmica sobre o assunto da disciplina Aprendizado Organizacional. Experiência Individual Existe liberdade e autonomia para aprender a nova tarefa? Tácito Vivencial Inovação Problematiza Conhecimento Explícito Aprendizado Organizacional Sistemas de liderança Estilos de aprender Maneiras de aprender Formal Inteligência Modelo mental Sim Não Domínio pessoal Raciocínio sistêmico Aprendizagem grupal O bj et iv o co m um Aprendizagem Modelo de gestão Gestão organizacional Fundamentos e critérios de excelência na gestão (FNQ) Organização empreendedora e aberta à mudança Prática de gestão Ferramentas de gestão Método científico Dedução Abdução Indução Aprendizagem espontânea Curva de exelência na gestão (FNQ) Curva de aprendizagem Estágios de aprendizagem Inteligências múltiplas Tipos de aprendizagem Vivencial Emocional Cognitiva Novas competências individuais e organizacionais Aprendizagem circuito único ou simples Aprendizagem circuito duplo Macro Processo Integrated System of Learning Organization - ISLO (2009) 5 10 15 70 Unidade II Re vi sã o2 00 9: A na - D ia gr am aç ão : F ab io 2 9/ 05 /0 9 Vale ressaltar que, como qualquer teoria, o que sistematizamos nestas linhas e resumimos neste sistema é um raciocínio elaborado a partir de nossa visão sobre o tema aprendizado organizacional, tendo como fundamento os principais autores e estudiosos citados no texto. Portanto, alertamos para que você olhe nossa abordagem como uma referência teórica inacabada e incompleta, o que significa dizer que estamos abertos a críticas e sugestões de melhoria no que denominamos de Integrated System of Learning Organization (ISLO), ou Sistema Integrado de Aprendizagem Organizacional. Optamos por batizar preliminarmente como modelo ISLO, com a sigla em inglês, por ser considerada uma linguagem universal do ponto de vista científico. Dessa maneira, por compreender que a aprendizagem começa com o �não saber, mas também por criarmos uma inovação na abordagem teórica e crítica sobre o assunto, submetemos a sua apreciação como aprendiz desta disciplina. Reflexão: Você conseguiria, após tudo que leu e estudou sobre o tema tratado nessas linhas, conceber uma organização sem aprendizagem? Seria possível entender a sociedade complexa sem uma referência ou um modelo de análise crítica e reflexiva da realidade? Será que você e eu conseguiríamos nos comunicar sem nos conhecermos pessoalmente, somente por este texto, se não tivéssemos uma matriz de aprendizagem incorporada desde criança, formando nossa personalidade e nossa visão sobre o mundo a nossa volta? Referências bibliográficas Aprendizagem e desenvolvimento intelectual na idade escolar. In: VYGOTSKY, L. S.; LURIA, A. R.; LEONTIEV, A. N. (Org.). Linguagem, desenvolvimento e aprendizagem. São Paulo: Ícone, 1998. AUSUBEL, D. P. A aprendizagem significativa: a teoria de David Ausubel.São Paulo: Moraes, 1982. 5 10 15 71 APRENDIZADO ORGANIZACIONAL Re vi sã o2 00 9: A na - D ia gr am aç ão : F ab io 2 9/ 05 /0 9 ?-?sem-?mod BARRETT, Richard. Libertando a alma da empresa – como transformar a organização numa entidade viva. São Paulo: Cultrix, 2000. BELNOSKI, Alexsandra Marilac; DZIEDZIC, Maurício. O ciclo de aprendizagem na prática de sala de aula. Athena (revista científica de educação), v. 8, n. 8, jan./jun. 2007. BOCK, Ana M. Bahia; FURTADO, Odair; TEIXEIRA, Maria de Lourdes T.; et. al. Psicologias – uma introdução ao estudo de psicologia. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 1993. CHOO, C.W. Information management for the intelligent organization: the art of scaning the enviroment. 3. ed. Medford, New Jersey: Information Today, 2002. DAFT, R. L.; WEICK, K. E. Toward a model of organisations as interpretation systems. Academy of Management Review, 9 (2), 1984, p. 284-95. DOWNS, Sylvia. Learning at work. Londres: Kogan Page, 1995. FREUD, Sigmund. Obras psicológicas completas de Sigmund Freud. Volume II – Estudos sobre a histeria. Tradução de Jayme Salomão. Rio de Janeiro: Imago, 1974. GARDNER, Howard. Inteligência – um conceito reformulado. Rio de Janeiro: Objetiva, 2000. GARVIN, David A. Aprendizagem em ação – um guia para transformar sua empresa em uma learning organization. Trad. de Carlos Henrique Trieschemann. Rio de Janeiro: Qualitymark, 2002. GOLEMAN, Daniel. Inteligência emocional. 11. ed. Rio de Janeiro: Objetiva, 1995. GUERREIRO, Evandro Prestes. Aprendizagem espontânea e infoinclusão social. In: Cidade digital – infoinclusão social e tecnologia em rede. São Paulo: SENAC, 2006. 72 Unidade II Re vi sã o2 00 9: A na - D ia gr am aç ão : F ab io 2 9/ 05 /0 9 HUBER, G. P. Organisational learning: the contributing processes and the literatures. Organization Science, 2. 1991. KOLB, David. Experiential learning. Hemel Hempstead: Prentice Hall, 1993. MARIOTTI, Humberto. Organizações de aprendizagem – educação continuada e a empresa do futuro. São Paulo: Atlas, 1999. MUMFORD, Alan. Aprendendo a aprender. Trad. Pedro M. Sá de Oliveira e Giorgio Cappelli. São Paulo: Nobel, 2001. OXFORD English Dictionary. 2. ed. Oxford: Oxford University Press, 1999. PIAGET, Jean. A epistemologia genética: sabedoria e ilusões da filosofia; problemas de psicologia genética. Trad. Nathanael C. Caixeiro; Zilda A. Daeir e Célia E. A. Di Piero. 2. ed. São Paulo: Abril Cultural, 1983 (Col. Pensadores). SANTAELLA, Lucia. Comunicação e pesquisa: projetos para mestrado e doutorado. São Paulo: Hacker Editores, 2001. SENGE, P. M. A quinta disciplina. São Paulo: Best Seller, 1990. __________. The leader’s new work: building learning organizations. Sloan Management Review, 1999. THOMAS, H. Randolph; MATHEWS, Cody T.; WARD, James G. Learning curve models of construction productivity. Journal of Construction Engineering and Management, 1986. v.112, n.2, p.245-57. VASCONCELOS, Isabella F. Gouveia de; MASCARENHAS, André Ofenhejm. Organizações em aprendizagem. São Paulo: Thomson Learning, 2007 (Col. Debates em Administração). WICK, Calhoun W.; LEÓN, Lu Stanton. Os desafios do aprendizado. Trad. Carmen Youssef. São Paulo: Nobel, 1997.
Compartilhar