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Ministério da Educação Secretaria de Educação Média e Tecnológica Centro Federal de Educação Tecnológica de Rio Pomba – MG Leite e Derivados Guia Prático Bruno Gaudereto Soares Apostila – 2004 Leite e Derivados Guia Prático Bruno Gaudereto Soares i ÍNDICE 1. OBTENÇÃO, CONSERVAÇÃO E TRANSPORTE DE LEITE HIGIÊNICO...............................................................1 1.1. OBTENÇÃO......................................................................................................................1 1.2. LEITE PURO E SÃO ...........................................................................................................1 1.3. INSTALAÇÕES..................................................................................................................2 1.4. VASILHAME .....................................................................................................................2 1.5. ASSEPSIA.........................................................................................................................2 1.6. ORDENHA ........................................................................................................................2 1.7. CONSERVAÇÃO ...............................................................................................................4 1.7.1. Especificações gerais para tanques comunitários.........................................................................................4 1.8. TRANSPORTE...................................................................................................................4 1.8.1. Carro com tanque isotérmico para coleta de leite a granel.....................................................................4 1.9. ACIDEZ ............................................................................................................................5 1.9.1. Acidez Natural e Acidez Desenvolvida.............................................................................................................5 1.10. RESFRIAMENTO ...............................................................................................................2 1.10.1. Equipamentos de Refrigeração..........................................................................................................................2 1.10.2. Os Tanques de Expansão: ...................................................................................................................................2 1.11. PASTEURIZAÇÃO..............................................................................................................3 1.12. ORDENHA MECÂNICA.......................................................................................................3 1.12.1. Vantagens..............................................................................................................................................................3 1.12.2. Desvantagens........................................................................................................................................................4 1.12.3. Linha de Ordenha.................................................................................................................................................4 2. CONSTITUINTES DO LEITE..............................................................................................................................................6 2.1. ÁGUA ...............................................................................................................................6 2.2. LACTOSE.........................................................................................................................6 2.3. PROTEÍNAS ......................................................................................................................7 2.4. GORDURAS......................................................................................................................7 2.5. SAIS MINERAIS ................................................................................................................7 2.6. VITAMINAS ......................................................................................................................8 3. PROPRIEDADES FÍSICO-QUÍMICAS..............................................................................................................................9 3.1. COR.................................................................................................................................9 3.2. SABOR E ODOR ................................................................................................................9 3.3. DENSIDADE......................................................................................................................9 3.4. ACIDEZ ............................................................................................................................9 3.5. PH .................................................................................................................................10 3.6. PONTO DE EBULIÇÃO .....................................................................................................10 3.7. PONTO DE CONGELAMENTO ...........................................................................................10 4. ANÁLISE E SELEÇÃO DO LEITE....................................................................................................................................11 4.1. TESTE DO ALIZAROL......................................................................................................11 4.2. ANÁLISE DE ACIDEZ PELO MÉTODO DORNIC ...................................................................12 4.3. DETERMINAÇÃO DA MATÉRIA GORDA DO LEITE .............................................................13 4.4. DENSIDADE...............................................................................................................14 5. FALSIFICAÇÃO DO LEITE...............................................................................................................................................16 Leite e Derivados Guia Prático Bruno Gaudereto Soares ii 5.1. PESQUISA DE ALCALINOS ...............................................................................................16 5.2. PESQUISA DE FORMOL...................................................................................................16 5.3. PESQUISA DE AMIDO ......................................................................................................17 5.4. PESQUISA DE CLORETOS ................................................................................................17 5.5. PESQUISA DE AÇUCARES ................................................................................................17 5.6. PESQUISA DE PERÓXIDO DE HIDROGÊNIO .......................................................................17 5.7. PESQUISAS DE HIPOCLORITOS.......................................................................................18 6. ESTABILIDADE TÉRMICA DO LEITE...........................................................................................................................19 6.1. ESTABILIDADE DAS PROTEÍNAS DO LEITE.....................................................................19 6.1.1. Proteínas..............................................................................................................................................................19 6.1.2. Estrutura das Proteínas....................................................................................................................................20 6.1.3. Proteínas do Leite ..............................................................................................................................................206.2. CONSTITUINTES .............................................................................................................22 6.2.1. Alterações da Proteína no Processamento....................................................................................................22 6.2.2. A Desnaturação ..................................................................................................................................................22 6.2.3. Alterações da Solubilidade ..............................................................................................................................23 6.2.4. Efeitos da pasteurização sobre as proteínas do leite ..................................................................................24 6.3. APLICAÇÕES TECNOLOÓGICAS .....................................................................................25 6.4. CONCLUSÃO ..................................................................................................................26 7. BENEFICIAMENTO DE LEITE..........................................................................................................................................27 7.1. FILTRAÇÃO E PASTEURIZAÇÃO ......................................................................................27 8. FABRICAÇÃO DE QUEIJOS ............................................................................................................................................30 8.1. QUEIJO ..........................................................................................................................30 8.2. COALHO ........................................................................................................................30 8.3. COAGULAÇÃO ...............................................................................................................31 8.4. TEMPERATURA DE COAGULAÇÃO...................................................................................31 8.5. ADIÇÃO DE COADJUVANTES DE COAGULAÇÃO ..............................................................31 8.6. ADIÇÃO DO COALHO .....................................................................................................32 8.7. PERÍODO DE COAGULAÇÃO............................................................................................32 8.8. PONTO DE CORTE ..........................................................................................................32 8.9. CORTE...........................................................................................................................32 8.10. AFINAMENTO DA MASSA................................................................................................33 8.11. DESCANSO....................................................................................................................33 8.12. MEXEDURA....................................................................................................................33 8.13. LAVAGEM OU DELACTOSAGEM DA MASSA ...................................................................34 8.14. AQUECIMENTO...............................................................................................................34 8.15. PONTO FINAL ................................................................................................................35 8.16. DESSORAGEM................................................................................................................35 8.17. PRÉ-PRENSAGEM ...........................................................................................................35 8.18. ENFORMAGEM ...............................................................................................................35 8.19. PRENSAGEM...................................................................................................................36 8.20. SALGA ...........................................................................................................................36 8.21. MATURAÇÃO.................................................................................................................37 8.22. FERMENTO LÁCTICO......................................................................................................38 8.22.1. Finalidade da utilização do fermento láctico ..............................................................................................38 8.22.2. Principais microorganismos empregados na elaboração de fermentos lácticos...................................40 9. QUEIJO MINAS FRESCAL...............................................................................................................................................41 Leite e Derivados Guia Prático Bruno Gaudereto Soares iii 10. QUEIJO MINAS PADRÃO............................................................................................................................................43 11. QUEIJO PRATO..............................................................................................................................................................45 12. MUSSARELA...................................................................................................................................................................48 13. QUEIJO PARMESÃO.....................................................................................................................................................51 14. RICOTA.............................................................................................................................................................................53 15. REQUEIJÃO .....................................................................................................................................................................56 16. QUEIJO FUNDIDO..........................................................................................................................................................58 17. FABRICAÇÃO DA MANTEIGA...................................................................................................................................60 17.1. OBTENÇÃO DO CREME ...................................................................................................61 17.2. PADRONIZAÇÃO E REDUÇÃO CREME..............................................................................61 17.3. PASTEURIZAÇÃO DO CREME...........................................................................................62 17.4. RESFRIAMENTO DO CREME............................................................................................62 17.5. MATURAÇÃO DO CREME ..............................................................................................63 17.6. BATEÇÃO DO CREME......................................................................................................63 17.7. SALGA DA MANTEIGA....................................................................................................63 17.8. MALAXAGEM.................................................................................................................63 17.9. MOLDAGEM E EMBALAGEM ...........................................................................................63 18. FABRICAÇÃO DE IOGURTE.......................................................................................................................................66 18.1. PROCEDIMENTOS...........................................................................................................66 19. FABRICAÇÃO DE DOCE DE LEITE...........................................................................................................................70 20. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS............................................................................................................................74Leite e Derivados Guia Prático Bruno Gaudereto Soares 1 1. OBTENÇÃO, CONSERVAÇÃO E TRANSPORTE DE LEITE HIGIÊNICO O leite é um alimento completo, constituindo-se uma importante fonte de nutrição humana. Estima-se que o leite possua aproximadamente 100.000 componentes distintos, sendo que até hoje somente foram identificados algo em torno de 87 constituintes. De um modo geral distinguimos sues componentes em seis grupos, que veremos adiante no Quadro 1. E por ser tão completo, também é um meio ideal e propício ao desenvolvimento de microorganismos fermentadores. Com o aumento do consumo surgiu a necessidade de aprimoramento das técnicas de higienização, obtenção, conservação e transporte do leite. Daí a importância de se estabelecer métodos de controle e produção que garantam a obtenção de um produto limpo e saudável. Estes métodos compreendem não somente a obtenção envolve desde o controle da saúde do animal até a entrega do produto final ao consumidor. Hoje, inclusive, já há a preocupação em se prever o uso que o consumidor possa a vir fazer do produto, e que este manuseio possa ser orientado para que se tenha maior segurança sobre as garantias estabelecidas entre o fabricante e o mercado consumidor. 1.1. OBTENÇÃO O leite deve provir de vacas sadias, ordenhadas em condições higiênicas por pessoas asseadas e isentas de doenças infecciosas. Deve ser recolhido em utensílios limpos e higienizados. 1.2. LEITE PURO E SÃO É o leite de bom sabor, que provém de vacas sadias, livre de impurezas e com baixa contagem de microorganismos, não patogênicos e sem (nenhum) patogênicos. O Regulamento Técnico de Produção, Identidade e Qualidade de Leite assim define: “Entende-se por leite, sem outra especificação, o produto oriundo da ordenha completa e ininterrupta, em condições de higiene, de vacas sadias, bem alimentadas e descansadas. O leite de outros animais deve denominar-se segundo a espécie de que proceda”. “Entende-se por” “leite cru refrigerado”, o produto definido em 2.1.1, refrigerado e mantido abaixo das temperaturas constantes da tabela 2 do presente Regulamento Técnico, transportado em carro-tanque isotérmico da propriedade rural para um posto de refrigeração de leite ou estabelecimento industrial adequado, para ser processado e que não seja destinado diretamente ao consumidor final.”. Leite e Derivados Guia Prático Bruno Gaudereto Soares 2 1.3. INSTALAÇÕES Adequadas, sem corrente de ar, de fácil manutenção e limpeza, livre de resíduos fecais e alimentares. Condições Higiênico-Sanitárias Gerais para a Obtenção da Matéria -Prima: Deverão ser seguidos os preceitos contidos no "Regulamento Técnico sobre as Condições Higiênico-Sanitárias e de Boas Práticas de Fabricação para Estabelecimentos Elaboradores / Industrializadores de Alimentos, item 3: Dos Princípios Gerais Higiênico-Sanitários das Matérias-Primas para Alimentos Elaborados / Industrializados", aprovado pela Portaria no 368 / 97 - MA, de 04 de setembro de 1997, para os seguintes itens: · Localização e adequação dos currais à finalidade; · Condições gerais das edificações (área coberta, piso, paredes ou equivalentes), relativas à prevenção de contaminações; · Controle de pragas; · Água de abastecimento; · Eliminação de resíduos orgânicos; · Rotina de trabalho e procedimentos gerais de manipulação; · Equipamentos, vasilhame e utensílios; · Proteção contra a contaminação da matéria -prima; · Acondicionamento, refrigeração, estocagem e transporte. · Condições Higiênico-Sanitárias Específicas para a Obtenção da Matéria -Prima: 1.4. VASILHAME Próprio e sanificado antes e após o uso (solução de iodo a 0,1%). 1.5. ASSEPSIA · mãos do ordenhador. · úbere e tetos do animal. Com solução de iodo a 0,1%, devendo ser enxugados logo após com toalhas de papel descartável. 1.6. ORDENHA Somente devem ser ordenhadas vacas sadias, e por pessoas asseadas e isentas de qualquer doença infecciosa, previamente submetidas à limpeza e assepsia. O leite deve ser recolhido em utensílios limpos e livres de bactérias nocivas e matérias estranhas. Devem-se desprezar os primeiros jatos de leite, colhendo-os em uma “caneca-telada” (detecção de mamite). Isto porque microorganismos penetram no teto, causando o início de uma contaminação ou até de mamite. Leite e Derivados Guia Prático Bruno Gaudereto Soares 3 · animais com ferimentos no úbere e tetos devem ser ordenhados por último. · animais com suspeita de doença devem ser isolados, medicados e só reintegrados ao rebanho após o restabelecimento. Estes procedimentos devem ser orientados por um veterinário. Após a ordenha higienizar os tetos com solução de iodo a 0,1%, glicerinada. As tetas do animal a ser ordenhado devem sofrer prévia lavagem com água corrente, seguindo-se secagem com toalhas descartáveis e início imediato da ordenha, com descarte dos jatos iniciais de leite em caneca de fundo escuro ou em outro recipiente específico para essa finalidade. Em casos especiais, como os de alta prevalência de mamite causada por microrganismos do ambiente, pode-se adotar o sistema de desinfecção das tetas antes da ordenha, mediante técnica e produtos desinfetantes apropriados, adotando-se cuidados para evitar a transferência de resíduos desses produtos para o leite (secagem criteriosa das tetas antes da ordenha); Após a ordenha, desinfetar imediatamente as tetas com produtos apropriados. Os animais devem ser mantidos em pé, pelo tempo suficiente para que o esfíncter da teta volte a se fechar. Para isso, recomenda -se oferecer alimentação no cocho após a ordenha; O leite obtido deve ser filtrado em recipiente apropriado de aço inoxidável, náilon, alumínio ou plástico atóxico. 1 - Cisterna; 2 – Cisterna do teto; 3 – Canal do teto; 4 – Alvéolo. Célula Secretora de Leite Leite e Derivados Guia Prático Bruno Gaudereto Soares 4 1.7. CONSERVAÇÃO O leite deverá ser conservado em tanques de expansão em aço inoxid ável com acabamento sanitário, devendo ainda estar resfriado a no máximo 4ºC em até duas horas após a ordenha. Mantido sob refrigeração por no máximo 48 horas após a ordenha até o momento do transporte, devendo chegar à plataforma da unidade de processamento à 7ºC; 1.7.1. ESPECIFICAÇÕES GERAIS PARA TANQUES COMUNITÁRIOS 1.7.1.1. Será admitido o uso coletivo de tanques de refrigeração a granel ("tanques comunitários"), por produtores de leite. A localização do equipamento deve ser estratégica, facilitando a entrega do leite de cada ordenha no local onde o mesmo estiver instalado. 1.7.1.2. O leite obtido por esses produtores deverá chegar ao local onde estiver localizado o tanque comunitário, no máximo até 60 (sessenta) minutos após cada ordenha. Não será permitido acumular, em determinada propriedade rural, a produção de mais de uma ordenha para enviá -la uma única vez por dia ao tanque comunitário. 1.7.1.3. Os latões devem ser higienizados logo após a entrega do leite, através do enxágüe com água corrente e a utilização de detergentes biodegradáveis e escovas apropriadas. 1.7.1.4. A capacidade máxima do tanque de refrigeração para uso coletivo deverá ser dimensionada de modo a propiciar condições mais adequadas de operacionalização do sistema, particularmente no que diz respeito aos processos de lavagem e santificação de latões e velocidade de refrigeração da matéria-prima. 1.8. TRANSPORTE O leite deverá ser transportado em caminhões com tanques isotérmicos em açosinoxidáveis, dotados de mangote flexível e bomba sanitários auto-aspirante, podendo ainda ser dotados de sistema de medição de vazão e sistema computadorizado para registro dos dados de coleta. “O processo de coleta de Leite Cru Refrigerado a Granel consiste em recolher o produto em caminhões com tanques isotérmicos construídos intername nte de aço inoxidável, através de mangote flexível e bomba sanitária, acionada pela energia elétrica da propriedade rural, pelo sistema de transmissão ou caixa de câmbio do próprio caminhão, diretamente do tanque de refrigeração por expansão direta...” 1.8.1. CARRO COM TANQUE ISOTÉRMICO PARA COLETA DE LEITE A GRANEL Além das especificações gerais dos carros-tanque, contidas no presente Regulamento, deverão ser observadas mais as seguintes: 1.8.1.1. A mangueira coletora deverá ser constituída de material atóxico, apresentar-se internamente lisa e fazer parte dos equipamentos do carro-tanque. No caso da coleta de diferentes tipos de leite, a propriedade produtora de leite tipo B deverá dispor de sua própria mangueira; Leite e Derivados Guia Prático Bruno Gaudereto Soares 5 1.8.1.2. Deverá ser provido de caixa isotérmica de fácil higienização para transporte de amostras e local para guarda dos utensílios e aparelhos utilizados na coleta; 1.8.1.3. Deverá ser dotado de dispositivo para guarda e proteção da ponteira, da conexão e da régua de medição do volume de leite. 1.8.1.4. Deverá ser, obrigatoriamente, submetido à lavagem e higienização após cada descarregamento, juntamente com os seus componentes e acessórios. O transporte do leite deve ser feito o mais rápido possível, para que o mesmo seja tratado e industrializado, aumentando assim a sua vida útil (self life) e sua utilização na alimentação humana. Todos estes cuidados têm como objetivo garantir que o leite chegue à indústria em condições microbiológicas e físico-químicas adequadas ao processamento. Este último referencial, o físico-químico, é o mais utilizado para a seleção do leite, nele sendo avaliados aspectos tais como: · acidez · densidade · gordura · ponto de congelamento · sabor e odor · cor Destes o primeiro a ser analisado é a acidez. 1.9. ACIDEZ A acidez do leite é um referencial, um parâmetro de avaliação das condições de obtenção, conservação e transporte do leite. Logo após a ordenha o leite já apresenta caráter ácido, devido à presença de caseína, fosfatos, albumina, dióxido de carbono e citratos. Entretanto esta acidez comumente é expressa em valores percentuais de ácido láctico. 1.9.1. ACIDEZ NATURAL E ACIDEZ DESENVOLVIDA Chamamos de acidez natural àquela observada no momento em que o leite é ordenhado, podendo oscilar entre 0,13 a 0,17%. Acidez desenvolvida é aquela originada pela ação de microorganismos fermentadores do leite. Os valores médios padrão estão entre 0,14 a 0,15%. C1 2H2 2O1 1, H2O è 4 CH3 – CHOH - COOH Lactose Hidratada Ácido Lático Leite e Derivados Guia Prático Bruno Gaudereto Soares 2 Fatores que influenciam o desenvolvimento microbiano É importante notar que existem vários fatores, intrínsecos ao leite, que influenciam e propiciam ou não o desenvolvimento microbiano e que, portanto, nem sempre podem ser controlados. O que reforça a necessidade de se implementar esforços e técnicas para minimizar a contaminação do leite. · Nutrientes · Umidade · Temperatura · pH · Disponibilidade de oxigênio 1.10. RESFRIAMENTO O abaixamento da temperatura é uma maneira rápida e eficiente para diminuir a atividade microbiana. 1.10.1. EQUIPAMENTOS DE REFRIGERAÇÃO 1.10.1.1. Ter capacidade mínima de armazenar a produção de acordo com a estratégia de coleta. 1.10.1.2. Ser dimensionado de modo tal que permita refrigerar o leite até temperatura igual ou inferior a 4ºC (quatro graus Celsius) no tempo máximo de 03 (três) horas após o término da ordenha, independentemente de sua capacidade; 1.10.1.3. O motor do resfriador deverá ser instalado em local arejado. 1.10.2. OS TANQUES DE EXPANSÃO: 1.10.2.1. Deverão ter a parede interna de aço inoxidável, bem como apresentar dupla parede para expansão de gás, o qual não poderá apresentar qualquer contato direto com o leite. 1.10.2.2. Deverão ser instalados a uma altura conveniente do piso, para facilitar as operações de descarga e limpeza. 1.10.2.3. Poderão ser dotados de passador com tela de aço inoxidável ou outro material adequado, com malha fina (0,15 a 0,20 mm de permeação), instalado na sua abertura e removível para higienização. Deverá ser provido de agitador em inox com 30 a 40 rotações por minuto e ser provido de termômetro e termostato. Leite e Derivados Guia Prático Bruno Gaudereto Soares 3 1.10.2.4. Recomenda-se que as tampas dos tanques de expansão possam se abrir completamente ou em duas bandeiras, visando melhores condições de limpeza e sanificação do equipamento. 1.10.2.5. Recomenda-se a utilização de equipamento de refrigeração com sistema automático de aspersão de água e de soluções com detergentes e sanificantes, do tipo "spray ball" ou similar. Os registros de saída dos tanques de expansão deverão ser do mesmo diâmetro das conexões das mangueiras utilizadas na transferência do leite para o carro-tanque, não sendo permitido o transvase intermediário em latões. 1.11. PASTEURIZAÇÃO A pasteurização é um método de tratamento do leite que equaliza tempo e temperatura visando, ao mesmo tempo, melhorar suas condições microbiológicas, aumentando sua vida útil e utilizações, e preservar ao máximo possível seus atributos nutricionais. A pasteurização elimina · a totalidade da flora patogênica. · a maioria da flora banal (resta ± 0,1%). “A qualidade do produto final depende, diretamente, da qualidade da matéria prima”. “Produto de boa qualidade vende melhor e com preço maior”. 1.12. ORDENHA MECÂNICA Os freqüentes aumentos nos custos de nos diversos setores de produção e industrialização, têm propiciado cada vez mais a implementação de sistemas mecanizados, pois estes possuem maior eficiência e produtividade. No setor de produção de leite a mecanização da ordenha veio suprir a carência de mão-de-obra especializada e seu crescente custo, com ganhos de produtividade e qualidade. 1.12.1. VANTAGENS · Ganho de tempo. · Diminui mão-de-obra e abre outras opções da mesma (mulher). · Melhor higiene. · Melhor rendimento por vaca (sucção = a do bezerro). · Fácil manejo Leite e Derivados Guia Prático Bruno Gaudereto Soares 4 1.12.2. DESVANTAGENS · Alto custo de implantação (plantel que justifique, aparelhagem e instalações). · Possibilidade de não-adaptação de alguns animais. A implantação de um sistema de ordenha mecânica requer planejamento e preparação de mão-de-obra para seu manuseio e manutenção. Por ser um equipamento caro e sensível deve ser utilizado criteriosamente e, por se tratar de um sistema fechado, deve obedecer a uma rigorosa metodologia de limpeza e sanificação. Caso contrário poderão ocorrer constantes problemas de funcionamento do equipamento e contaminação do leite pelo próprio sistema. Também os animais devem ser submetidos a uma rigorosa higienização, para que não disseminem infecções entre os tetos de um mesmo animal ou para outros. A lavagem do úbere da vaca, além da limpeza, estimula adescida do leite. A seleção dos animais que serão submetidos à ordenha mecânica é necessária, devendo para isso ser observado o seguinte aspecto: · Idade do animal® Preferencialmente vacas de 1ª e 2ª cria. · Características ® Aptidão leiteira; Comportamento do animal. É bom lembrar que os custos de implantação da ordenha mecânica se estendem também à adequação das instalações, ou seja, a estrutura física do estábulo. 1.12.3. LINHA DE ORDENHA A linha de ordenha é outro ponto importante a ser observado. Tirando-se o leite em uma mesma seqüência todos os dias são possíveis evitar a propagação de doenças (mesmo estando garantida a higiene da ordenhadeira, úbere da vaca, ambiente e pessoal). 1.º - Vacas de 1ª cria ou mais novas. 2.º - Vacas que nunca tiveram mamite ou mastite . 3.º - Vacas portadoras de doenças no úbere (as que tiveram e depois as que ainda estão acometidas). Nos casos de infecções do úbere é aconselhável que se faça a ordenha manual. Alguns aspectos importantes sobre limpeza, higiene na ordenha e manuseio de equipamentos: · A higienização do equipamento deve ser feita antes e imediatamente após o uso do mesmo, devendo observar-se, para tanto, as instruções do fabricante; · Também as vacas, demais instalações e operador devem ser submetidos à higienização prévia e posterior; · Devem-se desprezar os primeiros jatos de leite, colhendo-os em um recipiente à parte; Leite e Derivados Guia Prático Bruno Gaudereto Soares 5 · Alguns equipamentos de sistema em linha (espinha de peixe) podem ser limpos e higienizados mediante circulação de soluções de limpeza e desinfecção. Entretanto suas partes móveis devem ser desmontadas para que se proceda a uma higienização mais rigorosa; · Desconectam-se os copos e mangueiras enxaguando-os em seguida com água fria, para retirar os resíduos de leite; · Em seguida usa-se uma solução de detergente sem cheiro (conforme a indicação do fabricante) para retirar a gordura e os resíduos mais resistentes ao enxágüe; · Novo enxágüe (água quente ou fria, conforme a resistência do equipamento e indicação do fabricante); · Mergulha-se em solução anti-séptica (cloro, iodo ou quaternário de amônia); · Deixa-se em local fresco, arejado e limpo para secar; No momento do uso faz-se nova desinfecção, antes da montagem. Devendo, também, ser feita a assepsia da tubulação de vácuo (circulando-se uma solução alcalina quente e procedendo-se o enxágüe com água quente). Leite e Derivados Guia Prático Bruno Gaudereto Soares 6 2. CONSTITUINTES DO LEITE O conhecimento da composição do leite é fundamental para que se possa determinar sua utilização no processo de industrialização e para se estabelecer sua qualidade e valor nutricional. Quadro 1 - A composição do leite Componentes % Água 87,3 Lactose 4,6 Proteínas (não assimiláveis) 3,8 Gorduras 3,6 Sais Minerais 0,7 2.1. ÁGUA Quantitativamente é o constituinte mais importante, no qual estão dissolvidos, dispersos ou emulsionados os outros componentes. Esta disposta como água livre e ligada a proteínas, lactose e sais. 2.2. LACTOSE É o glúcide característico do leite, sendo formado por glicose e galactose. É o principal constituinte sólido e também o menos variável. É pouco doce, pouco solúvel e passível de escurecimento mediante tratamentos térmicos. Pode ocasionar distúrbios digestivos quando mal digerida, problema este que pode ter origem congênita. Como alternativas de consumo podem ser utilizados leites fermentados, queijos e leite hidrolisado. C12H22O11, H2O è C6H12O6 + C6H12O6 Lactose Hidratada Glucose Galactose Leite e Derivados Guia Prático Bruno Gaudereto Soares 7 2.3. PROTEÍNAS Estão dispostos como compostos nitrogenados protéicos (95%) e compostos nitrogenados não-proteicos (5%). Destes 95%CNP, 80% constitui o nitrogênio caseínico e 20% o nitrogênio não- caseínico. Sua composição e distribuição das frações protéicas são influenciadas por fatores como: · temperatura ambiente · doenças do animal · estágio de lactação · número de parições · raça · alimentação Enfim, todos estes, fatores que influenciam no metabolismo do animal. 2.4. GORDURAS Esta disposta em glóbulos envoltos por uma membrana lipoprotéica, sendo este o constituinte mais variável, em função de fatores como: · alimentação · raça · estação do ano · período de lactação 2.5. SAIS MINERAIS Associados às proteínas, conferem a elas maior estabilidade (o fosfato de cálcio participa da estrutura das micelas de caseína). Durante a pasteurização do leite ocorre insolubilização de sais de cálcio havendo, portanto, necessidade de reposição destes sais para o processamento de queijos. Entre os que se encontram em maiores teores estão: · Cloro, fósforo, potássio, sódio, cálcio e magnésio. . Entre os de menor teor: · ferro, alumínio, bromo, zinco e manganês. Leite e Derivados Guia Prático Bruno Gaudereto Soares 8 2.6. VITAMINAS Podem ser detectadas todas as vitaminas conhecidas, sendo que algumas se encontram associadas aos glóbulos de gordura (A, D, E K) e as outras dispersas na fase aquosa. Com exceção da vitamina K, que é sintetizada no sistema digestivo, a concentração das vitaminas lipossolúveis está relacionada à alimentação do gado. Leite e Derivados Guia Prático Bruno Gaudereto Soares 9 3. PROPRIEDADES FÍSICO-QUÍMICAS 3.1. COR A coloração do leite está relacionada aos seus componentes da seguinte maneira: · A cor branca é resultante da dispersão da luz refletida pelas partículas coloidais de caseína, fosfato de cálcio e pelos glóbulos de gordura. · a cor amarelada é devida ao caroteno, pigmento lipossolúvel presente nos glóbulos de gordura. O desenvolvimento microbiano pode propiciar o aparecimento de colorações anormais. 3.2. SABOR E ODOR Quando obtido sob condições ideais, apresenta sabor pouco pronunciado, entre o doce e o salgado, sem acidez perceptível ao paladar ou sabor amargo. Entretanto o leite pode apresentar alterações de sabor e odor, que podem se apresentar mais pronunciados, devido a fatores como: · ambiente de ordenha; · alimentação (silagem, ração); · saúde animal (mamite). 3.3. DENSIDADE O leite normal apresenta densidade, à 15º C, entre 1028g/litro a 1034g/litro. Alterações nestes valores podem indicar tentativa de fraude, por adição de soluto ou solvente, misturas de ambos ou até desnate. 3.4. ACIDEZ Logo após a ordenha o leite já apresenta reação ácida a fenolftaleína, isto devido à presença de caseína, fosfatos, albumina, dióxido de carbono e citratos. A isto chamamos de acidez natural, que pode oscilar entre 0,13% e 0,17%, valoresestes expressos como ácido láctico. Entretanto o desenvolvimento microbiano pode elevar a acidez do leite através do desdobramento da lactose, para obtenção de energia, ocasionando a formação de ácido láctico e outros compostos de caráter ácido, ao que chamamos de acidez desenvolvida. Leite e Derivados Guia Prático Bruno Gaudereto Soares 10 3.5. PH O leite apresenta um pH médio de 6, 8, podendo apresentar variações conforme o período de lactação, infecções e desenvolvimento microbiano, alimentação e época do ano (que podem influenciar na composição do leite). O colostro, ao primeiro dia apresenta pH de 6,25 e ao terceiro dia 6,46. Leite mamitoso pode apresentar variações, que tendem ao alcalino, que podem atingir um pH de até 7,5. 3.6. PONTO DE EBULIÇÃO Entre 100º e 101º C, ao nível do mar. A adição de substâncias pode influenciar e alterar o ponto de ebulição. 3.7. PONTO DE CONGELAMENTO Pode variar entre -0,53º a -0,56ºH (Hortvet) ou -0,512° a -0,531°C (Celsius), valores estes que oscilam conforme a composição do leite e podem servir como referencial para detecção de fraudes. Conversão: °C = 0,9656 x °H °H = 1,0356 x °C Leite e Derivados Guia Prático Bruno Gaudereto Soares 11 4. ANÁLISE E SELEÇÃO DO LEITE 4.1. TESTE DO ALIZAROL É um teste rápido, eficiente e simples de se fazer uma avaliação qualitativa do leite, podendo-se detectar variações da acidez do leite que vão do ácido ao alcalino. Nos casos em que se confirmam alterações para ácido ou alcalino é necessário, então a realização de testes quantitativos ou mais específicos. Essas variações podem se originar da fermentação bacteriana, que acidifica o leite ao desdobrar a lactose em ácido láctico e água, ou da adição de substâncias alcalinas (redutoras), o que ocasiona elevação do pH e constitui ato fraudulento. Por outro lado, o leite mamitoso também pode apresentar pH alcalino. MATERIAL NECESSÁRIO · 01 Erlemmeyer de 50 cc, becker, tubo de ensaio ou mesmo aparelhos próprios. · 02 Pipeta graduada de 10 cc, ou 1 pistola de alizarol. Reagente necessário · Solução alcoólica a 75º GL, pH 6, 8, de Alizarina vermelha (Alizarol). Processo · Toma-se no erlemmeyer, com o auxílio de pipeta, 2 cc de leite a ser testado. Em seguida, com o auxílio de outra pipeta, adiciona-se ao leite 2 cc do Alizarol e agita-se a mistura. Quadro 2 - Interpretação dos resultados Coloração Coagulação Interpretação róseo-salmão Não normal róseo-salmão Sim desequilíbrio salino amarela Não ácido amarela Sim muito ácido violeta Não alcalino/água violeta Sim alcalino/mamite No caso de leite com desequilíbrio salino, ao procedermos ao teste de acidez pelo método Dornic, verificaremos sua normalidade quanto ao grau de acidez. Leite e Derivados Guia Prático Bruno Gaudereto Soares 12 4.2. ANÁLISE DE ACIDEZ PELO MÉTODO DORNIC O leite normal apresenta-se ligeiramente ácido (pH 6,8) ao sair do úbere da vaca. Mas em função do desdobramento da lactose, pela ação dos microorganismos, em ácido láctico e água, o pH do meio tende a baixar, podendo chegar à coagulação do leite. Assim, faz-se necessário selecionar todo o leite para que não se tenham problemas por misturar leite ácido com leite normal. Para isso, Dornic idealizou um processo muito simples e bastante eficiente, o qual ficou conhecido com o seu nome: Método ou Processo Dornic. Material necessário · 01 Erlemmeyer de 125 cc. · 01 Acidímetro Dornic ou bureta. · 02 Pipetas graduadas de 10 cc. Reagentes necessários · Solução Dornic (solução de hidróxido de sódio - NaOH - N/9). · Solução alcoólica de Fenolftaleína a 1%. Processo · Toma-se no erlemmeyer, com o auxílio de uma pipeta, 10 cc de amostra do leite a ser analisado. Adiciona-se 3 a 5 gotas de solução de Fenolftaleína, agitando-se em seguida a mistura para homogeneizá-la. · Com o auxílio do Acidímetro Dornic (bureta ou pipeta graduada de 10 cc) goteja-se a solução Dornic, sob constante agitação, até o aparecimento e permanência de coloração ligeiramente rósea. Estando terminado o processo de titulação, procede-se à leitura da quantidade de solução Dornic gasta na reação. Interpretação dos Resultados · Cada 0,1 cc gasto da solução Dornic, corresponderá a 1º Dornic (ºD), que por sua vez corresponde a 0,1g de ácido láctico por litro de leite. · Assim, para um leite normal, que deve apresentar acidez entre 16º a 18ºD, serão gastos de 1,6 a 1,8 cc da referida solução. · 0,1 cc sol. Dornic gastos = 1ºD = 0,1g ác. láctico/litro de leite. Leite e Derivados Guia Prático Bruno Gaudereto Soares 13 4.3. DETERMINAÇÃO DA MATÉRIA GORDA DO LEITE Em média, o leite apresenta 3,6% de matéria gorda. Este percentual pode variar em função de fatores tais com: a raça do animal, o período de lactação e a alimentação. Por se apresentar interligada a outros componentes, a gordura fornece informações úteis sobre a integridade do leite. Dentre os vários processos utilizados para a determinação da matéria gorda do leite o mais comum é o Processo Butirométrico de Gerber. Este processo consiste na propriedade que tem o ácido sulfúrico (H2SO4) de dissolver a caseína sem atacar a matéria gorda, quando em concentração adequada. Material necessário · 01 Butirômetro de Gerber. · 01 Pipeta automática de 10 cc (bico-de-papagaio). · 01 Pipeta automática de 1 cc (bico-de-papagaio). · 01 Erlemmeyer de 500 cc (com rolha de adaptação para a pipeta automática). · 01 Erlemmeyer de 250 cc (com rolha de adaptação para a pipeta automática). · 01 Pipeta volumétrica de 11 cc. · 01 Centrífuga de 1200 rpm. Reagentes necessários · Ácido sulfúrico (H2SO4) D 1820-1825. · Álcool amílico D 815. Processo · Coloca-se no butirômetro de Gerber, com o auxílio da pipeta automática, 10 cc de Ácido sulfúrico (H2SO4) D 1820-1825. · Adiciona-se, lenta e progressivamente, com o auxílio da pipeta volumétrica, 11 cc da amostra do leite a ser analisado. Direcionando o fluxo do leite contra a parede de vidro do butirômetro, não contra o ácido sulfúrico. · Adiciona-se, com o auxílio da pipeta automática, 1 cc de álcool amílico, com a finalidade de clarear a separação da matéria gorda. · Limpa-se a “boca” do butirômetro, fechando-o em seguida com uma rolha de borracha. · Enrola-se o butirômetro em uma toalha, procedendo a seguir uma lenta agitação, através de inversões, até que a caseína seja completamente queimada pelo ácido sulfúrico. Atenção para o aquecimento resultante da reação. · Leva-se o butirômetro à centrífuga, a 1200 rpm, por 5 minutos. · Terminada a centrifugação, leva-se o butirômetro ao banho-maria por 3 a 5 minutos, a uma temperatura de 65º a 70º C. Leite e Derivados Guia Prático Bruno Gaudereto Soares 14 Interpretação dos Resultados · Retira-se e procede-se a leitura. Para tal, zeramos a coluna de gordura na escala do butirômetro com ajustes na rolha de borracha. A leitura é feita observando-se o menisco. Cada divisão da corresponde a 0,1% de matéria gorda. Se acaso for realizada uma só análise deve-se colocar, na centrífuga, no lado oposto ao do butirômetro com a amostra, um outro cheio de água para fazer o balanceamento da centrífuga. 4.4. DENSIDADE A densidade do leite é um ponto importante aser considerado na seleção do leite visto que a incidência de tentativas de fraude, por adição de solventes (água), solutos (sal, açúcar) e até mesmo mistura destes, é grande. É situada entre 1028g/litro e 1034g/litro à temperatura de 15º C. Material necessário · 01 proveta de 250 ml; · 01 termolactodensímetro. Processo · Transferir para a proveta 250 ml de amostra de leite; · introduzir cuidadosamente o termolactodensímetro · após a estabilização proceder à leitura da densidade e da temperatura e fazer a correção da densidade lida para densidade a 15º C, através da fórmula abaixo ou de tabela de correção. Formula: d15 = d lida + (T - 15) x K Onde: · d15: densidade corrigida para 15º C; · dlida: densidade lida no termolactodensímetro; · T: temperatura lida no termolactodensímetro; · K: fator de correção: ¾ K = 0,20 (temperatura até 25º C); ¾ K = 0,25 (temperatura entre 25,1º e 30,0º C); ¾ K = 0,30 (temperatura superior a 30,1º C). Leite e Derivados Guia Prático Bruno Gaudereto Soares 15 Tabela de Correção de Densidade para a Temperatura de 15º C DENSIDADE LIDA 18 19 20 21 22 23 24 25 26 27 28 29 30 31 32 33 34 35 T 16 18.1 19.1 20.1 21.1 22.2 23.2 24.2 25.2 26.2 27.2 28.2 29.2 30.2 31.2 32.2 33.2 34.2 35.2 E 17 18.3 19.3 20.3 21.4 22.4 23.4 24.4 25.4 26.4 27.4 28.4 29.4 30.4 31.4 32.4 33.4 34.4 35.4 M 18 18.5 19.5 20.5 21.6 22.6 23.6 24.6 25.6 26.6 27.6 28.6 29.6 30.6 31.7 32.7 33.7 34.7 35.7 P 19 18.7 19.7 20.7 21.8 22.8 23.8 24.8 25.8 26.9 27.9 28.9 29.9 30.9 32.0 33.0 34.0 35.0 36.0 E 20 18.9 19.9 20.9 22.0 23.0 24.0 25.0 26.0 27.1 28.2 29.2 30.2 31.2 32.3 33.3 34.3 35.3 36.3 R 21 19.1 20.1 21.1 22.2 23.2 24.2 25.2 26.2 27.3 28.4 29.4 30.4 31.4 32.5 33.6 34.6 35.6 36.6 A 22 19.3 20.3 21.3 22.4 23.4 24.4 25.4 26.4 27.5 28.6 29.6 30.6 31.6 32.7 33.8 34.9 35.9 36.9 T 23 19.5 20.5 21.5 22.6 23.6 24.6 25.6 26.6 27.7 28.8 29.9 30.9 31.9 33.0 34.1 35.2 36.2 37.2 U 24 19.7 20.7 21.7 22.8 23.8 24.8 25.8 26.8 27.9 29.0 30.1 31.2 32.2 33.3 34.4 35.5 36.5 37.5 R 25 19.9 20.9 21.9 23.0 24.1 25.1 26.1 27.1 28.2 29.3 30.4 31.5 32.5 33.6 34.7 35.8 36.8 37.8 A 26 20.1 21.1 22.1 23.2 24.3 25.3 26.3 27.3 28.4 29.5 30.6 31.7 32.7 33.8 34.9 36.0 37.1 38.1 27 20.3 21.3 22.3 23.4 24.5 25.5 26.5 27.5 28.6 29.7 30.8 31.9 33.0 34.1 35.2 36.3 37.4 38.4 C 28 20.5 21.5 22.5 23.6 24.7 25.7 26.7 27.7 28.9 30.0 31.1 32.2 33.3 34.4 35.5 36.6 37.7 38.7 E 29 20.7 21.7 22.7 23.8 24.9 26.0 27.0 28.0 29.2 30.3 31.4 32.5 33.6 34.7 35.8 36.9 38.0 39.1 N 30 21.0 22.0 23.0 24.1 25.2 26.3 27.3 28.3 29.5 30.6 31.7 32.8 33.9 35.1 36.2 37.3 38.4 39.5 T 31 21.3 22.3 23.3 24.4 25.5 26.6 27.6 28.6 29.8 30.9 32.0 33.1 34.2 35.5 36.6 37.7 38.8 39.9 Í 32 21.6 22.6 23.6 24.7 25.8 26.9 27.9 28.9 30.1 31.2 32.3 33.4 34.5 35.9 37.0 38.1 39.2 40.3 G 33 21.9 22.9 23.9 25.0 26.1 27.2 28.2 29.2 30.4 31.5 32.6 33.7 34.8 36.3 37.4 38.5 39.6 40.7 R 34 22.2 23.2 24.2 25.3 26.4 27.5 28.5 29.5 30.7 31.8 32.9 34.1 35.2 36.7 37.8 38.9 40.0 41.1 A 35 22.5 23.5 24.5 25.6 26.7 27.8 28.8 29.8 31.0 32.1 33.2 34.5 35.6 37.1 38.2 39.3 40.4 41.5 D Tratando -se de leitura cuja temperatura seja superior a 35º C junte-se 0,3 para cada grau de temperatura quando a A densidade não exceder de 1028 e 0,4 de 1029 em diante. Leite e Derivados Guia Prático Bruno Gaudereto Soares 16 5. FALSIFICAÇÃO DO LEITE Existem pessoas que, por falta de escrúpulos (e educação), tentam fraudar o leite, causando prejuízos a quem compra e consome o leite. É por isso que o leite é submetido a uma bateria de testes, com os quais podem ser detectados estes problemas. É comum a adição de conservantes e redutores, tais como: · bicarbonato de sódio; · hidróxido de sódio (soda cáustica); · formol; · ácido bórico; · peróxido de hidrogênio (água oxigenada - peridrol*) · bicromato de potássio; · ácido salicílico e outros. Outros tentam aumentar o volume do leite adicionando água. Alguns água e sal, tentando corrigir a densidade. Para este mesmo fim também usam: · amido; · urina; · açúcar e outros. Mas estas fraudes podem perfeitamente ser detectadas em testes rápidos de laboratório. 5.1. PESQUISA DE ALCALINOS · 05 cc de amostra do leite; · 10 cc de álcool absoluto; Filtra-se o precipitado, e adiciona-se algumas gotas de ácido rosálico a 1%. · Reação Positiva ® aparecimento de cor vermelho-carmim. · Reação Negativa ® aparecimento de cor laranja. 5.2. PESQUISA DE FORMOL Adiciona-se ao ácido sulfúrico que será utilizado na análise de gordura, algumas gotas (± 5/litro) de solução de percloreto de ferro a 2% ou floroglucina. Procede-se a análise de gordura normalmente. · Reação Positiva ® abaixo da coluna de gordura apresenta coloração violácea. Leite e Derivados Guia Prático Bruno Gaudereto Soares 17 5.3. PESQUISA DE AMIDO · Pipetar, para um tubo de ensaio, 5ml de amostra de leite; · ferver em chama de lamparina ou bico de Bunsen; · resfriar em água corrente; · acrescentar 5 gotas de solução de lugol. · Reação positiva (presença de amiláceos) ® aparecimento de coloração azul. 5.4. PESQUISA DE CLORETOS Misturar em um tubo de ensaio: · 1 ml de leite; · 1 ml de nitrato de prata 10% (m/v); · 1 ml de cromato de potássio 5% (m/v) · Reação positiva (presença de cloretos) ® coloração amarela. 5.5. PESQUISA DE AÇUCARES Misturar em um tubo de ensaio: · 1 ml de leite; · 1 ml de ácido clorídrico p. a. · agitar até a dissolução; · deixar em banho-maria por 2 a 3 minutos. · Reação positiva (presença de açucares) ® coloração escura. 5.6. PESQUISA DE PERÓXIDO DE HIDROGÊNIO Técnica 1 · Pipetar, para um tubo de ensaio, 5 ml de amostra de leite; · acrescentar 2 ml de ácido clorídrico p. a. e agitar; · acrescentar uma gota de formol e agitar; · aquecer em chama de lamparina ou bico de Bunsen. · Reação positiva ( presença de peróxido) ® coloração violácea. Leite e Derivados Guia Prático Bruno Gaudereto Soares 18 Técnica 2 (leite cru) Misturar em um tubo de ensaio: · 5 ml de amostra de leite; · 0,5 ml de guaiacol 1% (v/v) SR. · Reação positiva (presença de peróxido) ® coloração salmão. 5.7. PESQUISAS DE HIPOCLORITOS Misturar em um tubo de ensaio: · 1 ml de leite · 1 ml de iodeto de potássio 10% (m/v) SR. · Reação positiva (presença de hipocloritos) ® coloração alaranjada. Leite e Derivados Guia Prático Bruno Gaudereto Soares 19 6. ESTABILIDADE TÉRMICA DO LEITE APLICAÇÕES TECNOLÓGICAS A Estabilidade Térmica do Leite (ETL) constitui um importante capítulo da química e tecnologia do leite, em especial no estudo dos processos de tratamento térmico. Nele são abordadas questões relativas as aplicações específicas para estabilização do leite nos diferentes processos de tratamento térmico e acerca das aplicações no desenvolvimento e aprimoramento dos derivados lácteos. 6.1. ESTABILIDADE DAS PROTEÍNAS DO LEITE A estabilidade térmica do leite (ETL) pode ser definida pela relação entre a temperatura, o pH e o tempo necessário para originar coagulação visível (ALMEIDA, Maria Cecília Freitas). Por estar correlacionada a muitas variáveis da composição do leite (pH, equilíbrio salino, teor de uréia, estabilidade das micelasde caseína – fatores estes ligados às variáveis da composição do leite, período de lactação, alimentação, doenças do úbere entre outros) e aos fatores ambientais (tempo e temperatura), constitui um estudo complexo e enganoso. Antes, para melhor compreender a ETL, é importante conhecer a estrutura e o comportamento das proteínas no leite mediante as variáveis expostas. 6.1.1. PROTEÍNAS Proteínas são polímeros de alto peso molecular, formados por cadeias de aminoácidos, unidos entre si por ligações peptídicas. As propriedades de uma proteína são determinadas pelo número e espécie dos resíduos de aminoácidos, bem como pela seqüência desses compostos na molécula. Por serem macromoléculas muito complexas, as proteínas são compostos sem odor e sem sabor. Podem ser classificadas em três grupos principais: proteínas simples, conjugadas e derivadas, sendo que apenas os dois primeiros grupos são encontrados na natureza. Proteínas simples são aquelas das quais, por hidrólise, resultam aminoácidos como únicos produtos. Neste grupo temos como exemplos: albuminas, globulinas, glutelinas, prolaminas, protaminas, histonas e escleroproteínas. Proteínas conjugadas são mais complexas. Os compostos protéicos se encontram conjugados com substâncias de caráter não protéico, formando complexos mais ou menos estáveis (um grupo prostético ligado a compostos iônicos polares e não polares). Neste grupo podemos citar: cromoproteínas, lipoproteínas, nucleoproteínas, glicoproteínas (ou mucoproteínas), fosfoproteínas, metaloproteínas. Proteínas derivadas são compostos obtidos por meio de proteólise, pela ação de ácidos, bases ou enzimas. Neste grupo estão: proteínas derivadas primárias e proteínas derivadas secundárias. Leite e Derivados Guia Prático Bruno Gaudereto Soares 20 6.1.2. Estrutura das Proteínas Normalmente, os compostos protéicos existentes no organismo têm peso molecular de mesma ordem de grandeza, e tem formato esférico ou elipsóide. Para que uma proteína adquira e mantenha essas formas são necessárias muitas complexas interligações. A estrutura primária de uma proteína corresponde à seqüência dos aminoácidos da sua cadeia peptídica, desconsiderados outros tipos de ligações como interações causadas por forças de Van der Waals, ou ligações de hidrogênio. A estrutura secundária é resultante das dobras ou enrolamentos que a cadeia péptica sofre, sobre si mesma, adquirindo diferentes conformações. Entre estas conformações, as de menor energia livre, portanto as mais estáveis, são aquelas nas quais todos os grupos –NH das ligações peptídicas estão unidos aos grupos –C=O por ligações de hidrogênio. A estrutura terciária se refere às dobras e enrolamentos posteriores que as cadeias pépticas sofrem, resultando em uma estrutura mais complexa e compacta. Sua estabilização é atribuída a ligações covalentes (por exemplo: -S-S-, em proteínas ricas em aminoácidos contendo enxofre) e mesmo a ligações eletrovalentes causadas pela atração que exercem entre si, cadeias laterais carregadas positiva e negativamente. A estrutura quaternária é resultante da associação de duas cadeias peptídicas. Nela estão envolvidas as mesmas ligações das estruturas secundárias e terciárias, com exceção das ligações covalentes. A conformação tridimensional das proteínas não é alterada em meio aquoso ou em soluções diluídas de sais, propriedade esta muito importante, uma vez que as reações biológicas das proteínas se dão nesses meios. 6.1.3. PROTEÍNAS DO LEITE Estão dispostas como compostos nitrogenados protéicos (95%) e compostos nitrogenados não-proteicos (5%). Destes 95% CNP, 80% constitui o nitrogênio caseínico e 20% o nitrogênio não- caseínico. Sua composição e distribuição das frações protéicas são influenciadas por fatores como: · temperatura ambiente; · doenças do animal; · estágio de lactação; · número de parições; · raça; · alimentação. Enfim, todos estes, fatores que influenciam no metabolismo do animal. As caseínas constituem o principal grupo protéico do leite. São um grupo de fosfoproteínas específicas do leite, dispostas na forma de micelas com 20 a 300 nm de diâmetro. Precipitam por ação enzimática, calor e com acidificação a pH 4,6. O complexo caseínico é formado por submicelas com 10 a 20 nm de diâmetro, chamadas submicelas, contendo diferentes moléculas de caseínas unidas por Leite e Derivados Guia Prático Bruno Gaudereto Soares 21 Lactose Sintetase interações hidrofóbicas e, principalmente, por fosfato de cálcio coloidal. Nesta categoria estão incluídos quatro tipos de cadeias polipeptídicas, designadas como aS1, aS2, b e k-caseínas, junto com alguns derivados originados da proteólise destas. A k-caseína possui regiões hidrofílicas que ficam orientadas para a parte externa da micela. As demais ficam voltadas para a parte hidrofóbica, sendo orientadas para o interior da micela. A estabilidade da micela de caseína está ligada a fatores tais como a concentração salina, o pH, a temperatura, enzimas, agentes desidratantes, oxidantes e redutores; indutores de pontes de hidrogênio, detergentes, fenol, etc. (Furtado, 1989) As soroproteínas apresentam um comportamento diferente das caseínas no que se refere à estabilidade, mantendo-se solúveis a pH 4,6 e nem sofrendo desestabilização por ação enzimática. Assim, ficam integradas ao soro após a precipitação do leite. Constituem um grupo bastante diversificado. Entretanto são desestabilizadas pelo calor. Possuem estrutura tridimensional compacta, de forma globular. Estão distribuídas como a-lactoalbumina, b -lactoglobulina, albumina de soro bovino (BSA), imunoglobulinas e peptídeos de baixo peso molecular, originados dos processos de hidrólise das caseínas. A a-lactoalbumina tem papel fundamental na biossíntese da lactose na célula secretora do leite, interagindo com a enzima galatosiltransferase, formando a enzima lactose sintetase, a qual catalisa a reação: Glicose + UDP-Galactose Lactose + UDP A b -lactoalbumina representa 50% do total das proteínas do soro. Ainda não tem função biológica estabelecida, mas suspeita-se que esteja envolvida no metabolismo do fósforo. A albumina do soro bovino (BSA) é um componente do soro sanguíneo e o aumento do teor deste componente no leite pode evidenciar um quadro de infecção mamária, fato este que ocasiona um aumento da permeabilidade do epitélio mamário, o que explica a variação. As imunoglobulinas são glicoproteínas que atuam como anticorpos durante a resposta imunológica do organismo frente ao antígeno. Estão entre as soroproteínas mais sensíveis ao calor. Outra parcela das proteínas do leite encontra-se associada à membrana do glóbulo de gordura. São de difícil estudo, pois apresentam forte interação entre si e com os lipídeos, além de muitas serem insolúveis (Furtado, 1989). Leite e Derivados Guia Prático Bruno Gaudereto Soares 22 Concentração das proteínas no leite (tabela adaptada) 6.2. CONSTITUINTES Concentração no leite g/kg Porcentagem (% P/P) de Nitrogênio Protéico Proteína Total (NP) 33.0 100 Caseína Total (NC) 26.0 79.5 Soroproteínas (NSP) 6.3 19.3 Proteínas associadas à membrana do glóbulo de gordura 0.4 1.2 aS1-caseína 10.0 30.6 aS2-caseína 2.6 8.0 b-caseína 9.3 28.4 g-caseína 0.8 2.4 k-caseína 3.3 10.1 a-lactoalbumina 1.2 3.7 b-lactoglobulina 3.2 9.8 Albumina do soro bovino (BSA) 0.4 1.2 Imunoglobulinas 0.7 2.1 Outras (incluindo proteose-peptona) 0.8 2.4 WALSTRA & JENNESS 6.2.1. ALTERAÇÕES DA PROTEÍNA NO PROCESSAMENTODurante o processamento e armazenamento do alimento, podem ocorrer diversas reações degradativas. Isto pode resultar em perdas de funcionalidade e qualidade nutricional. Podem ocorrer ainda, alterações do flavor, desejáveis ou não. As alterações podem ocorrer mediante aquecimento na presença ou ausência de carboidratos, ph extremo e exposição a condições oxidativas. A maioria dos procedimentos comerciais, como desidratação e enlatamento, resulta em efeitos não-significativos na qualidade da proteína. Entretanto, existem exceções como condições em que o alimento é exposto a pH é elevado, aquecimento severo ou a lipídios oxidados. Em condições alcalinas, por exemplo, ocorre a racemização de aminoácidos e ligações cruzadas, com perda de qualidade nutricional e mudanças na funcionalidade. Em meio ácido, o triptofano (aminoácido essencial ao organismo, cristalino, que se pode considerar um derivado do indol) é rapidamente destruído, ainda mais à temperatura elevada. 6.2.2. A DESNATURAÇÃO A desnaturação é, normalmente, resultante da combinação de vários fatores, os quais rompem à conformação original da proteína. Do ponto de vista tecnológico, a desnaturação interfere em propriedades importantes da proteína. A proteína desnaturada é mais sensível à hidrólise pelas enzimas proteolíticas, aumentando sua digestibilidade e utilização. A estabilidade aumenta com a solvatação. Em proteínas globulares os aminoácidos hidrofóbicos localizam-se na parte interna dos glóbulos, enquanto os grupos hidrofílicos estão situados na parte externa e expostos ao solvente (água). Camadas de água ficam ligadas à superfície da proteína (0,2 a 0,5 g de água/ g de proteína). No caso da gelatina, esta proporção pode chegar à 99 vezes o peso da Leite e Derivados Guia Prático Bruno Gaudereto Soares 23 proteína (colágeno desnaturado). Outro ponto importante é que a hidratação aumenta a estabilidade à desnaturação e à subseqüente precipitação. A proteína também pode reagir com os constituintes da fumaça, em processos de defumação, ocorrendo desnaturação. Isto ocorre geralmente na camada superficial, com formação de pontes metilênicas durante a reação com o formaldeído (constituinte da fumaça) com grupos amina das proteínas. 6.2.3. Alterações da Solubilidade A solubilidade das proteínas está ligada a três fatores principais: · grau de hidratação; · densidade e distribuição das cargas ao longo da cadeia; · presença de substâncias não-protéicas, como fosfatos, carboidratos e lipídeos. A insolubilidade completa das proteínas produz um precipitado, quando várias moléculas do poplipeptídeo se aproximam de tal forma que produzem agregados protéicos grandes o suficiente para serem visíveis. Isto ocorre quando o pH atinge o ponto isoelétrico (pI) da proteína. A combinação de sais, solvente e a temperatura podem ser manipuladas para alterar as propriedades solventes da água e, conseqüentemente, alterar a solubilidade da proteína. Concentração de distribuição de sais no leite Constituinte Concentração (mg/l) Solúvel (%) Coloidal (%) Cloreto 1200 100 0 Fosfato 750 43 57 Citrato 1750 93 6 Cálcio 1200 34 66 Fonte: Fox, 1991 O pH isoelétrico (pI) da proteína corresponde ao pH onde o número da suas cargas positivas e negativas se igualam. A maioria das proteínas tem ponto isoelétrico do lado ácido (carga positiva no pH fisiológico), devido ao maior número dos aminoácidos lisina (aminoácido natural, básico, que contém outro grupo amina, além daquele adjacente à carboxila, e que é essencial ao crescimento normal em crianças e à manutenção do equilíbrio nitrogenado no adulto - fórm.: C6H14N2O2) e arginina (Aminoácido natural cristalino, básico, essencial, que contém um grupo guanidina - fórm.: C6H14N4O2) em sua molécula. A distribuição de aminoácidos hidrofóbicos ou hidrofílicos na superfície da proteína determina a solubilidade em diferentes solventes (Araújo, 1995). O efeito do pH na dissociação de grupos funcionais da proteína altera as cargas e, portanto, a magnitude das forças atrativas e repulsivas. A dependência do pH é ilustrada no gráfico abaixo. O ponto mínimo da curva representa o ponto isoelétrico (predominam forças de atração). Com o aumento da dissociação dos grupos funcionais da proteína em ambos os lados do pI , ocorre a predominância de cargas repulsivas adjacentes e a capacidade de retenção de água aumenta. Neste caso, os valores máximos correspondem aos de pH 2,2 e 11, com os grupos funcionais completamente dissociados (Araújo, 1995). Leite e Derivados Guia Prático Bruno Gaudereto Soares 24 Fen -Ser-Leu-His-Pro -Pro- 100 Met-Ala-Ile-Pro -Pro- 110 140 120 100 80 60 40 C R A (% ) 2 4 6 13 pH Influência do pH na CRA em carne Na fabricação de queijo, na precipitação da caseína com a adição de renina ao leite, ocorre hidrólise da ligação peptídica entre os aminoácidos Fen105 – Met106 da k-caseína, resultando em dois macropeptídeos: ácido e básico. A liberação do macropeptídeo hidrofílico (ácido) reduz as cargas da superfície e, conseqüentemente, aumenta as interações hidrofóbicas responsáveis pela coagulação (Araújo, 1995). Ação da renina sobre a caseína 6.2.4. EFEITOS DA PASTEURIZAÇÃO SOBRE AS PROTEÍNAS DO LEITE A pasteurização do leite do leite em sistema HTST (pasteurização rápida), onde o leite é aquecido a aproximadamente 72 a 74º C por 15 a 20 segundos, produz mudanças físico-químicas nas diferentes frações protéicas (ver tabela), afetando a distribuição do nitrogênio. (Furtado, 1989) Tabela – Distribuição do nitrogênio no leite cru, pasteurizado e fervido Distribuição percentual FRAÇÃO NITROGENADA Cru Pasteurizado Fervido N-Total 100,0 100,0 100,0 N-caseína 78,3 ± 0,5 80,1 ± 0,6 90,5 ± 1,9 NCN 21,7 ± 0,5 19,9 ± 0,6 9,5 ± 1,9 N-soroproteína 16,2 ± 0,9 14,3 ± 0,9 3,9 ± 1,8 N-Lg 8,4 ± 1,3 6,9 ± 1,2 0,2 ± 0,2 NPN 5,5 ± 0,7 5,6 ± 0,6 5,6 ± 0,6 Em:WOLFSCHOON-POMBO et ali (74) H2N HOOC Hidrofóbico Hidrofílico Renina Leite e Derivados Guia Prático Bruno Gaudereto Soares 25 Dentre as alterações ocorridas podemos ressaltar as associações entre soroproteínas (a- lactoalbumina e b -lactoglobulina) e entre estas e as caseínas, em especial com a k-caseína. As soroproteínas, termicamente menos estáveis, sofrem desnaturação (desdobrando-se), ficando expostos os grupos funcionais internos, resultado das modificações ocorridas estruturas quaternária, terciária e secundária. Este aspecto pode ser explorado favoravelmente sob o ponto de vista tecnológico, levando-se em consideração a agregação destas às caseínas e o conseqüente aumento do tamanho das micelas. Contribuem ainda para a estabilidade destas e melhor hidratação. O calor promove a desidratação das proteínas e precipitação de fosfatos que têm a sua solubilidade reduzida com a elevação da temperatura, formando a pedra de leite nos trocadores de calor, além de dificultar a precipitação da caseína pela renina (enzima ativa na coagulação do leite e presente nas mucosas intestinais; quimosina). A pasteurização também provoca inativação de grupos enzimáticos e eliminação de efeitos tóxicos de várias proteínas (toxinas microbianas e inibidores enzimáticos naturais). Alguns efeitos da temperatura sobre a ETL: 80ºC · Desnaturação b-Lg; · Complexo b-Lg/k-CN 90º C · Estabilização do complexo. 100º C · Modificação da superfície micelar. >110ºC · Depende do pH. 140º C · Diminui a estabilidade durante a estocagem; · Proteases termoresistentes (psicotróficos) podem ocasionar coagulação doce durante a estocagem; · Formação incompleta dos complexos estabilizadores 6.3. APLICAÇÕES TECNOLÓGICAS O efeito do tratamento térmico a 90ºC, com estabilização do complexo protéico, é especialmente benéfico em produtos que serão expostos a condições críticas de estabilidade, tais como Leite UHT e Iogurte. Outrossim, em produtos precipitados, pode auxiliar no aumento do rendimento de fabricação, com a agregação das soroproteínas às caseínas. Além de melhorar a hidratação da mesma. Analisando a fabricação do requeijão, além do já citado ganho de rendimento, a melhoria da solubilidade protéica pode contribuir para a diminuição da utilização de sais fundentes, com notória economia de ingredientes. Há, ainda, melhoria da digestibilidade do grupo protéico e aumento da qualidade protéica uma vez que as soroproteínas apresentam valores em escala mais elevados nos quesitos citados. Leite e Derivados Guia Prático Bruno Gaudereto Soares 26 6.4. CONCLUSÃO O estudo da estabilidade térmica do leite (ETL) é sem dúvida relevante e requer aprofundamento. Os ganhos tecnológicos auferidos com a observação dos preceitos que regem a ETL, dos seus grupos protéicos, são muitos e precisam ser mais difundidos no meio laticinista, digo nas pequenas empresas. Com as transformações impostas pelos tempos modernos, estas necessitam cada vez mais se embasarem tecnologicamente. Com fundamentos e conceitos evoluídos e transcritos em práticas viáveis de fabricação, tecnológica e financeiramente. Leite e Derivados Guia Prático Bruno Gaudereto Soares 27 7. BENEFICIAMENTO DE LEITE Como sabemos, o leite constitui-se em excelente meio de cultura para microorganismos, devendo, portanto, ser resfriado e transportado o mais rápido possível até o posto de beneficiamento. Ao chegar no posto de beneficiamento, o leite passará por provas analíticas que visam avaliar as condições em que o mesmo se encontra, determinando assim o fim para o qual servirá na indústria. As análises realizadas mais comumente são: · teste do Alizarol; · acidez Dornic; · matéria gorda; · densidade; · detecção de água; · determinação do extrato seco; · conservadores e outros. Nas fábricas de queijos são realizados testes como a redutase e lactofermentação, que indicam de maneira rápida, mas não muito precisa, o índice de contaminação ou mesmo de higiene do leite. 7.1. FILTRAÇÃO E PASTEURIZAÇÃO Após ser classificado e considerado apto, o leite passará então pelo beneficiamento propriamente dito. · Posto de Resfriamento ® o leite é simplesmente recebido, selecionado e resfriado, até que seja transportado até a usina de beneficiamento e/ou uma fábrica. · Usina de Beneficiamento e Transformação ® o leite será efetivamente beneficiado - filtrado, clarificado, padronizado, pasteurizado e, até, homogeneizado - industrializado. Desta forma o leite passará pela “desnatadeira” (ou filtro-padronizadora- centrífuga) que faz a clarificação e a padronização da matéria gorda do leite. Leite e Derivados Guia Prático Bruno Gaudereto Soares 28 Em seguida passará pelo pasteurizador de placas, onde será submetido a uma temperatura de 72º a 75ºC/15 segundos (HTST), e será resfriado imediatamente à temperatura de 4ºC se for leite para envase, ou 32ºc para fabricação de queijos. Esquema de Funcionamento do Pasteurizador à Placas Leite e Derivados Guia Prático Bruno Gaudereto Soares 29 Circuito de Pasteurização do leite Quadro 3 - Demonstrativo do Desenvolvimento Microbiano Temperatura do Nº de microorganismos/cm3 leite Tempo início > 10 min. > 30 min. > 60 min. > 120 min. L. Past. ± 37º C 1.000 2.000 8.000 64.000 4.096.000 L. Cru ± 37º C 10.000 20.000 80.000 640.000 40.960.000 Leite e Derivados Guia Prático Bruno Gaudereto Soares 30 8. FABRICAÇÃO DE QUEIJOS 8.1. QUEIJO “Queijo é o produto obtido pela coagulação do leite, seguida de uma desidratação da coalhada, podendo ser fresco ou maturado”. (MUNCK e DUTRA, 1996). O queijo é um alimento de alto valor nutricional, visto que apresenta altos teores de proteínas, gorduras, sais minerais e vitaminas. É importante notar que seu valor nutritivo é comparável ao da carne, sendo que em alguns tipos de queijo chega mesmo a superá-la. É também excelente complementador da dieta alimentar infantil, uma vez que fornecem consideráveis teores de cálcio e fósforo, fundamentais na constituição dos ossos e dentição. Sua composição pode variar em função da composição do leite, tratamentos e aditivos que o leite pode receber e de acordo com o tipo de queijo, que pode apresentar significativas diferenças no teor de umidade. 8.2. COALHO É um composto de substâncias enzimáticas, extraído do quarto estômago (abomaso) de bovinos lactentes, ao qual podemos chamar de coalho de origem natural. Existem também coalhos adicionados de enzimas de origem suína, coalhos químicos ou artificiais, bacterianos e fúngicos. Recentemente foram lançados no mercado os coalhos genéticos, que apresentam enzimas similares às do coalho natural com maior grau de pureza, sendo produzidos por bactérias geneticamente modificadas. Pode ser encontrado sob a forma líquida ou em pó, o que não implica em diferenças quanto a sua utilização, modificando apenas sua dosagem, conservação e validade que são orientadas pelo fabricante. Normalmente, a dosagem recomendada pelo fabricante deve ser suficiente para coagular o leite em aproximadamente 45 minutos à temperatura de 32ºC, sendo que em caso de dúvida é recomendável fazer um teste para determinação da força do coalho. Este teste é relativamente simples e consiste em observar o tempo que 1g ou ml (ou medida, quando não se possui balança apropriada) do coalho gasta para coagular 1 litro de leite à temperatura de 32º C, fazendo-se após um cálculo, via regra de três, para ajustar o valor obtido para 100 litros de leite. É importante observar que, seja o coalho liquido ou em pó, a diluição do mesmo em água, isenta de contaminação ou cloro, favorece a boa distribuição e a formação de um coágulo uniforme. De um modo geral os coalhos comercializados no Brasil apresentam, entre coalhos líquidos e em pó, um “poder coagulante” que oscila entre 1:10. 000 a 1:100.000 (leia-se, por exemplo, neste segundo caso um para cem mil), ou seja, 1 litro ou kg de coalho deverá coagular de 10.000 a 100.000 litros de leite. Leite e Derivados Guia Prático Bruno Gaudereto Soares 31 Assim, dispondo de um coalho com poder coagulante igual a 1:80. 000, para coagular 100 litros de leite necessitaríamos de 1,25 g do referido. 1.000 g de coalho _______________ 80.000 litros de leite X g de coalho _______________ 100 litros de leite X = 1,25 g de coalho É importante observar as recomendações para conservação do coalho sugeridas pelo fabricante, caso contrário poderá haver um declínio do poder de coagulação, ou mesmo inutilizarão, do produto. De um modo geral, o coalho deve
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