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Corpo e formação (inicial e continuada) de pedagogos(as) REVELAR A NECESSIDADE DE TRAZER À TONA A DISCUSSÃO A RESPEITO DO CORPO DE FUTUROS (AS) PROFESSORES (AS), NO SEU PROCESSO DE APRENDIZAGEM AO LONGO DA VIDA. AUTOR(A): PROF. MONICA DE AVILA TODARO AUTOR(A): PROF. FILOMENA DE CARLO S FABRIN "Seu corpo é seu templo. Cuidar dele deve ser sua religião” (autor desconhecido). A Pedagogia é um campo especí fico da prática social da educação que, para formar seu profissional, inclui subsí dios de outras áreas que a enriquecem. Em oposição à herança de uma educação corporal militarista, higienista, tecnicista e esportivista que marcou o contexto educacional brasileiro, desde o Império, reconhece-se a necessidade de formar um (a) novo (a) pedagogo (a) que compreenda as questões afetas ao corpo e ao movimento como sendo vinculadas aos contextos sociais e culturais dos indiví duos (Lombardi, 2014, p.34). Não se pode negar o quanto o trabalho docente exige do corpo do professor. Por meio de seu corpo são vivenciadas emoções como tristeza, medo, raiva etc. A emoção pode ser definida como um conjunto de respostas desencadeadas por partes do corpo, cujo resultado final é o estado emocional, definido pelas alterações de determinadas propriedades do corpo. Além disso, a concepção de corpo-máquina está presente no fazer pedagógico e pode ser revelada pela atuação carregada de exigência fí sica (no caso, por exemplo, do trabalho com as crianças bem pequenas) e esforço intelectual e emocional (no caso dos (as) professores (as) das crianças maiores).O que gostarí amos de apresentar nesta aula é o conceito de corpo enquanto experiência, concepção que se insere em uma ideologia holí stica e que preconiza o homem como um ser total que, como todo ser vivo, tem a capacidade de se autorregular. Essa autorregulação tem a ver com a busca de um estado de equilí brio fí sico, psí quico, social e em suas relações com o meio ambiente (Bolsanello, 2005). O estudo da corporeidade na Pedagogia refere-se aos modos de conceber os processos de ensino e de aprendizagem, considerando o papel da experiência na construção do conhecimento (Lombardi, 2014, p. 40). Entende-se experiência como as situações às quais os indiví duos estão expostos e que são resultantes da interação destes com algum dos muitos aspectos do mundo em que vive. O futuro pedagogo está na posição de aprendiz porque é estudante universitário e, nessa condição, vive e experiencia o mundo a partir de seu corpo; e quando se formar será professor de outras pessoas e continuará tendo experiências e aprendendo com elas. Sabe-se que a experiência está profundamente relacionada com a aprendizagem. O conceito sem experiência pode parecer vazio. Seriam palavras, palavras e mais palavras. Assim como uma experiência não nomeada, não conceitualizada, não possibilita a apropriação. A aprendizagem, por sua vez, está profundamente relacionada ao crescimento, não existe possibilidade de crescer sem aprender. Para aprender, não basta só olhar, mas ver; não basta só ouvir, mas escutar. Para que o olhar possa transformar- se em ver e ouvir em escutar, o intervalo estabelecido entre eles necessita ser preenchido pela nomeação possibilitada pelo pensamento (Furlanetto, 2000). O corpo se comunica de modo não verbal e a isso denominamos Linguagem Corporal. Se consideramos a linguagem corporal plena de significados e simbolismos como expressão de nossa humanidade, acordamos em considerar estas múltiplas expressões do movimento humano como manifestações da cultura? Teria sentido imaginarmos, portanto, um professor robotizado? Todaro (2014) defende a ideia de que devemos abandonar a concepção mecânica de ensino enquanto mera transmisso de conhecimento de uma mente para outras. Para a autora, os futuros educadores reconhecem a necessidade de adaptar-se às novas demandas para o desempenho de um trabalho profissional de qualidade. Porém, ainda no ponto de vista da autora, pouco destes vivenciam seus corpos como instância estruturante do ser educador. Faz-se necessário, portanto, vivenciar o próprio corpo como estudante de Pedagogia ao mesmo tempo em que se reflete acerca do corpo de seus futuros alunos: crianças, adolescentes, jovens, adultos e idosos (p. 110). A dimensão humana da docência precisa ser lembrada a todo o momento, ao longo da vida, e não somente durante a formação inicial, pois na relação professor-aluno nos defrontamos com marcas da escolarização em nossos corpos.Visto que a mobilidade do corpo toca todas as áreas da vida humana, educar-se para o autocuidado tem aplicações das mais variadas. Dependendo da história de vida de cada professor, de suas necessidades e de seu engajamento no processo educacional, a consciência corporal pode auxiliar: na diminuição de sintomas de stress; na melhora da percepção motora; na prevenção de problemas músculo esqueléticos resultantes de movimentos repetitivos; no desenvolvimento da capacidade de concentração; na recuperação do esgotamento fí sico e mental; na respiração; na melhora da flexibilidade muscular e amplitude articular; no relaxamento de tensões excessivas e ativação de músculos pouco utilizados; na transformação de hábitos posturais inadequados; no desenvolvimento da capacidade de expressão e, portanto, na melhora da saúde como um todo (Bolsanello, 2005). Mas e os futuros professores? Já perceberam o quão pouco sabem de si e indagam sobre seus corpos? Cuidam-se pensando no que os espera no campo profissional? Praticam alguma atividade fí sica ou terapêutica que possa auxiliá-los na tomada de consciência em relação ao seu corpo? Essas reflexões nos levam a compreender que o futuro professor precisa desenvolver nele mesmo determinadas habilidades, atitudes, sentimentos, que são o sustentáculo da atuação relacional: olhar, ouvir, falar, prezar. Um olhar atento, sem pressa, que preste atenção no outro, em seus saberes, dificuldades, angústias e alegrias. Um ouvir ativo, uma escuta profunda direcionada à apreensão do outro como uma pessoa resultante da integração de seus conjuntos funcionais: movimento, afetividade e cognição. Este olhar/ouvir pode conduzir a uma melhor compreensão do outro e desencadear ações pedagógicas mais adequadas (Almeida, 2007, p. 70). Na relação interpessoal, podemos perceber o outro por meio da leitura de seu corpo; um corpo-texto que nos oferece informações de quem somos, do que sentimos e do quão disponí vel estamos para essa relação. Ao atuarmos na escola, entramos em contato com emoções, sentimentos, paixão, percepções e pensamentos que emanam dos corpos das pessoas que estão ao nosso redor. Será que se não estivermos atentos ao que se passa conosco, estaremos aptos a compreender o que se passa com nossos (as) alunos (as)? Nos tempos atuais, o ser humano corre o risco de se tornar cada vez mais descorporalizador, isto é, independente da comunicação empática de seu corpo com o mundo. Tal fato, de acordo com Gonçalves (1994), pode vir a reduzir sua capacidade de percepção sensorial e levar ao controle de seus afetos, transformando a livre manifestação de seus sentimentos em expressões e gestos formalizados. Se tivemos, ao longo de nosso processo de escolarização, nossos corpos, movimentos e expressividade reprimidos, talvez passemos a exigir daqueles que chamaremos de alunos movimentos padronizados e contenção motora, acreditando que, com isso, estaremos disciplinando-os. Sabe-se que a criança aprende de forma integrada, na vivência com outras pessoas, com a natureza e por meio de objetos. Ao desprezarmos o corpo, o movimento e a expressividade das crianças, também desvalorizamos suas experiências afetivas. Nem todas as escolas nas quais os profissionais de educação trabalham ou trabalharão valorizarão a vivência do corpo para além da mente. A divisão rígida de espaços e tempos escolares é, ainda, o que prevalece em muitas escolas. Alfabetizar-se cada vez mais cedo é, por exemplo, para alguns que trabalham nas escolas,mais importante do que brincar. Abandonar a ideia tradicional de que corpos imóveis são corpos disciplinados exige uma nova postura diante dos desafios que a escola apresenta no século XXI. Professores (as) podem e devem refletir a respeito da necessidade de libertar-se: da ideia de separação entre corpo e mente; de normas rí gidas e condicionantes do comportamento humano; de uma imagem corporal distorcida; da imagem de corpo idealizado, imposta pelos meios de comunicação; de nossa imobilidade; das crenças que nos foram impostas na relação com o corpo; do desgaste inútil relativo ao uso inadequado de nosso tônus muscular; dos maus hábitos corporais; das proibições ligadas aos movimentos (Todaro, 2014, p. 113). A tomada de consciência corporal de si, a leitura adequada da linguagem corporal do outro e a consciência crí tica do mundo com certeza enriquecerão o futuro professor para o trabalho com seu corpo e o das demais pessoas na ação educativa. Tal busca, apesar de desafiadora, não termina ao fim da graduação. Aos futuros professores, e também aos professores já no exercí cio da docência, cabe a responsabilidade de cuidar de si mesmos. Porém, é preciso lutar, junto aos sindicatos que nos representam, por condições de trabalho que nos permitam viver e atuar com qualidade. A tarefa de ensinar e educar para além de todo estereótipo exige libertação. Todo ato de liberdade se insere em determinadas circunstâncias existenciais históricas que o possibilitam ou o cerceiam. A atuação profissional do docente, na contemporaneidade, se dá de forma fragmentária. Daí , talvez, a dificuldade de nos percebermos como seres inteiros. ATIVIDADE FINAL A presença de disciplinas que tratam das questões ligadas ao corpo na matriz curricular dos cursos de Pedagogia revela a importância de refletir a respeito do tema ainda na formação inicial de professores. A afirmativa acima é A. Verdadeira porque não há como mudar nossas atitudes, sem rever nossos preconceitos. B. Falsa porque de nada adianta inserir no currículo uma disciplina como "Linguagem Corporal". C. Verdadeira porque é nos cursos de Pedagogia que se formará o educador físico. D. Falsa porque o corpo é um tema menos importante que a alfabetização no currículo. REFERÊNCIA ALMEIDA, Laurinda, R. O relacionamento interpessoal na coordenação pedagógica. In: ALMEIDA, L. R.; PLACCO, V. M. N. S. (orgs). O coordenador pedagógico e o espaço da mudança. 6. ed. São Paulo: Loyola, 2007. BOLSANELLO, Debora. Educação somática: o corpo enquanto experiência. Motriz, Rio Claro, v.11 n. 2 p. 89- 96, mai./ago. 2005. FABRIN, F. C. S.; NÓBREGA, M. L. S. & TODARO, M. A. (Org). Corpo e educação: desafios e possibilidades. Jundiaí-SP: Paco editorial, 2014. FURLANETTO, Ecleide Cunico. Como nasce um professor? Uma reflexão sobre o processo de individuação e formação. São Paulo: Paulus, 2000. GONÇALVES, M. A. S. Sentir, pensar, agir: corporeidade e educação. Campinas-SP: Papirus, 1994.