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Junho, 2020 Módulo 1 Oncogenética Aula ministrada por Dra. Polyana Cordeiro A oncogenética é a base da oncologia, fundamental para compreensão de diversos conceitos. Essa área estuda os mecanismos moleculares e celulares pertinentes à oncologia, fornecendo informações que contribuem para melhor entendimento da fisiopatologia dos tumores. Assim, através da oncogenética é possível prever alguns comportamentos tumorais, desenvolver intervenções terapêuticas eficientes, estabelecer prognósticos mais precisos, dentre outras vantagens. Antes de tudo, é importante revisar alguns conceitos básicos sobre genética. - O material genético humano é o DNA, uma molécula de fita dupla que se encontra dentro do núcleo das células. - O DNA é um ácido nucléico composto por nucleotídeos que, por sua vez, são formados por bases nitrogenadas. A sequência de três bases nitrogenadas forma um códon e cada códon codifica um aminoácido. A combinação de aminoácidos formam as proteínas. CICLO CELULAR LiOnCC-UFF 2020 1 Junho, 2020 - O ciclo celular é composto por duas fases: a mitose, subdividida em prófase, metáfase, anáfase e telófase, e pela fase de intérfase, composta pelas etapas G1, S e G2. - Quando a célula não está realizando o processo de divisão celular, ou seja, está cumprindo suas atividades e funções celulares normais, ela se encontra na fase G0, como representado na imagem acima. - Ao longo do ciclo celular, têm-se os chamados "pontos de checagem" em que ocorre uma autoanálise da célula se seu processo de divisão e seus produtos estão corretos até esses pontos. Em uma célula normal, a divisão celular só continua se estiver tudo ocorrendo de maneira adequada, livre de erros genéticos. MUTAÇÃO As células normais podem sofrer alterações no código genético, gerando o que chamamos de mutações. Essas mutações podem ser do tipo somáticas, que são adquiridas ao longo da vida, ou germinativas, passadas dos genitores para a prole - hereditárias. A mutação gênica pode ocorrer por diferentes mecanismos, como deleção ou substituição de bases nitrogenadas. A alteração das bases nitrogenadas acarretará a formação de um outro códon, e o resultado final será a produção de proteínas modificadas. Vale ressaltar que a maioria das mutações que culminam no desenvolvimento dos cânceres são esporádicas (somáticas), e não familiares (sabe-se que tem um padrão familiar, mas não é possível identificar qual) ou hereditárias (um gene mutante conhecido é passado por gerações). Sabe-se que fatores externos, como estilo de vida e meio ambiente, podem apresentar potencial mutagênico, favorecem o surgimento de mutações, dependendo do tipo, duração e qualidade da exposição do indivíduo a eles. Alguns já conhecidos são: dietas ricas em gorduras, consumo excessivo de álcool, tabagismo, sedentarismo, exposição prolongada a organofosforados, radiação, dentre outros. MICROAMBIENTE TUMORAL O microambiente tumoral é um tecido complexo, composto por células tumorais e não-tumorais, vasos e metabólitos. A interação entre esses elementos é fundamental para a progressão tumoral e permite compreender melhor alguns aspectos da doença. Dentre as células não-tumorais podemos ressaltar as células imunes, células endoteliais e fibroblastos. LiOnCC-UFF 2020 2 Junho, 2020 PROTO-ONCOGENES São genes normais que produzem proteínas reguladoras do crescimento e da diferenciação celular. Quando sofrem mutações, podem ser ativados indiscriminadamente e se tornarem os oncogenes, levando a uma proliferação celular descontrolada e o desenvolvimento de tumores. GENES SUPRESSORES DE TUMORES São genes que auxiliam no controle de qualidade da divisão celular, fornecem mecanismos para reparação de erros do DNA e indução de apoptose. Quando esses genes não funcionam adequadamente, cria-se condições propícias para o desenvolvimento de tumores. Um exemplo desse tipo de gene supressor é o P53, que se encontra frequentemente mutado em pacientes com câncer. OS HALLMARKS DO CÂNCER “The Hallmarks of Cancer” se trata de um artigo publicado pelos autores e pesquisadores oncológicos Douglas Hanahan e Robert Weinberg, em 2000, na revista científica “Cell”. O artigo apresenta um conjunto de alterações comuns que seriam adquiridas por células normais ao se tornarem neoplásicas, regendo o comportamento tumoral e viabilizando a existência do mesmo no organismo. Tais características permitiriam abordar os mais diversos tipos de câncer a partir de uma lógica comum, racionalizando sua análise apesar de sua complexidade. São elas: 1) Proliferação celular sustentada: é a capacidade de sustentar a proliferação celular crônica. Em condições normais, as células saudáveis necessitam de sinalização externa para crescerem e se dividirem. As células tumorais, no entanto, são autossuficientes e conseguem manter esse estímulo constantemente, seja pela ativação contínua da via de sinalização ou pela desativação do feedback negativo que levaria à interrupção da sinalização. ”Driver mutations” são mutações responsáveis por alterar os genes normais, levando à estimulação e sustentação dos ciclos de divisão celular. 2) Insensibilidade à supressão de crescimento tumoral: células tumorais são insensíveis aos estímulos inibitórios de crescimento. Em tumores, os genes supressores de tumores geralmente são mutantes, logo, as proteínas supressoras de tumores estão alteradas e o LiOnCC-UFF 2020 3 Junho, 2020 controle de qualidade do ciclo celular está prejudicado, permitindo a proliferação de células “defeituosas”. Além disso, células tumorais não respondem a um mecanismo chamado “inibição por contato”, de forma que continuam a crescer e se dividir mesmo quando invadem o espaço de outras células e tecidos adjacentes. 3) Resistência à morte celular: as células tumorais desenvolvem mecanismos de resistir ou diminuir a apoptose, sendo o principal deles a perda da função supressora de tumor do TP53. Outros mecanismos que podem ser citados são: o aumento da expressão de reguladores anti- apoptóticos da família Bcl-2, downregulation de fatores pró-apoptóticos como Bax ou redução do circuito extrínseco da morte programada. 4) Potencial replicativo infinito: na extremidade dos cromossomos, encontram-se os telômeros, arranjos de DNA que não codificam proteínas, mas servem para proteger o restante do material genético. Em células normais, a cada divisão celular, perde-se um fragmento desse telômero sucessivamente até que ele fique tão curto ao ponto de não ser dividido, momento em que tal célula atinge a senescência e para de se dividir ou ativa a cascata de apoptose. No caso das células tumorais, o potencial replicativo é muito maior por conta da expressão aumentada da enzima telomerase, cuja função é refazer esses telômeros ao final de cada ciclo de divisão celular, tornando essas células “imortais”. 5) Invasão tecidual e Metástase: um dos mecanismos mais importantes para sobrevivência e manutenção tumoral é a capacidade de invasão tecidual contígua e metástase, possibilitando que a doença estabeleça vários focos à distância e dificultando sua eliminação. Sabe-se que, durante a progressão tumoral, a proliferação intensa e algumas alterações genéticas da célula mutante favorecem sua translocação entre os tecidos e eventual quebra da membrana basal com chegada à corrente sanguínea. 6) Indução da angiogênese: durante a progressão tumoral, um “interruptor angiogênico” está ativado e sempre “ligado”, estimulando constantemente a formação de novos vasos. Dessa forma, os tumores conseguem uma fonte constante de oxigênio e nutrientes e também uma forma de excretar metabólicos, garantindo seu crescimento e viabilidade pela alta vascularização local. Em 2011, os autores publicaram um novo artigo, ”Hallmarks of Cancer: the Next Generation”, no qual apresentaram novos conceitos e acrescentaram 2 hallmarks: LiOnCC-UFF 2020 4 Junho, 2020 7) Evasão do sistemaimune: as células tumorais são capazes de se camuflar do sistema imunológico modificando suas partículas expressas na membrana celular, a fim de não serem identificadas e combatidas pelas células de defesa. 8) Desregulação do metabolismo energético: células tumorais utilizam vias alternativas para obtenção de energia. Estudos mostram que, mesmo na presença de oxigênio, as células neoplásicas podem reprogramar seus mecanismos e obter energia principalmente por glicólise. Para compensar a produção de menos ATP, em comparação à fosforilação oxidativa mitocondrial, as células tumorais apresentam uma expressão aumentada de transportadores de glicose, captam e utilizam cerca de 20 vezes mais glicose do que células normais, atividade visualizada em exames como o PET-CT. Ainda no artigo de 2011, os autores propõem duas características que seriam “facilitadoras” da progressão tumoral: 1) Instabilidade genômica e mutações: o acúmulo de mutações é o que permite que o tumor adquira os “hallmarks” mencionados anteriormente. Algumas mutações conferem vantagens adaptativas que são passadas adiante para as células-filhas, dessa forma, a tumorigenese pode LiOnCC-UFF 2020 5 Junho, 2020 ser explicada como uma série de expansões clonais bem-sucedidas. Além disso, a mutação de genes supressores de tumores e de genes responsáveis por manter a estabilidade genômica (“caretakers genes”) cria circunstâncias que permitem a progressão tumoral. 2) Inflamação promotora: grande parte dos tumores apresenta infiltrados de células imunológicas. Estudos demonstraram que esses infiltrados de células de defesa, especialmente do sistema imunológico inato, beneficiam a progressão tumoral, fornecendo metabólitos como fatores de crescimento, fatores pró-angiogênese, fatores anti-apoptóticos, etc. Além disso, a inflamação ocasiona a liberação de metabólitos tóxicos e oxidativos, com potencial mutagênico, o que pode acelerar o acúmulo de mutações e a malignização do tumor. LiOnCC-UFF 2020 6 Junho, 2020 Resumo: Carollina Cecim, Sofia Devito, Nathália Chalaça. Resumo baseado na videoaula da Dra. Polyana Cordeiro ministrada ao I Curso de Introdução à Oncologia da Liga de Oncologia Clínica e Cirúrgica da Universidade Federal Fluminense e no artigo “Hallmarks of Cancer: The Next Generation” dos autores Douglas Hanahan e Robert Weinberg, publicado na revista “Cell” em 2011 - volume 144, 5ª edição. Referência de imagens: https://www.biologianet.com/biologia-celular/ciclo-celular.htm https://www.cell.com/fulltext/S0092-8674(11)00127-9 LiOnCC-UFF 2020 7 https://www.biologianet.com/biologia-celular/ciclo-celular.htm https://www.cell.com/fulltext/S0092-8674(11)00127-9
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