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Topicos constitucionais - Renato Brasileiro


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RENATO BRASILEIRO DE LIMA
Para Rento Brasileiro a redação original do art. 2º §1º da Lei 8072/90 que dispunha que o condenado pela prática de crimes hediondos e equiparados devia cumprir sua pena em regime integralmente fechado gerou grande discussão no meio jurídico, sendo que grande parte da doutrina sempre sustentou que essa vedação era incompatível com o princípio da individualização da pena. Tal princípio está previsto no artigo 5º, XLVI da Constituição Federal e segundo afirma o autor ao parafrasear Alberto Silva Franco, tal princípio garante a todo cidadão, condenado num processo-crime, uma pena particularizada, pessoal, distinta e, portanto, inextensível a outro cidadão, em situação fática igual ou assemelhada. Trata-se, pois de verdadeiro direito fundamental do cidadão posicionado frente ao poder repressivo do Estado. Dessa forma afirma, ainda, que “não é possível, em face da ordem constitucional vigente, a cominação legal de pena, exata na sua quantidade, nem a aplicação ou execução de pena, sem intervenção judicial, para efeito de adaptá-la ao fato concreto, ao delinquente ou às vicissitudes de seu cumprimento”.
Segundo Brasileiro são três momentos em que se deve dar a individualização:
a) Individualização legislativa: quando da edição da norma deve-se selecionar os fatos que devem ser punidos, ou seja, deve-se definir os bens jurídicos que devem ser tutelados pela novel. Definido tais fatos se definirá as respectivas sanções, estabelecendo seus limites e critérios para a fixação da pena.
b) Individualização judicial: Esta fase ocorre perante o juiz de direito, o qual em sua sentença deverá aplicar a legislação (geral) ao caso concreto analisando todas as particularidades do fato, e do autor e até mesmo da própria vítima. Tal procedimento está previsto no artigo 68 do CP.
c) Individualização executória: é nesta fase em que deve ser analisada as particularidades do indivíduo concedendo a devida forma de execução de sua pena.
Contudo, apesar de toda essa aversão a previsão legal do cumprimento integral da pena em regime fechado, tal procedimento perdurou por alguns anos no ordenamento pátrio. Contudo tal entendimento sofreu o primeiro golpe com a edição da lei que define os crimes de tortura (lei 9.455/97) que definiu que o regime do cumprimento da pena para a prática deste crime o regime aberto. Percebe-se que apesar de sutil teve grande repercussão, pois apesar de se tratar de crime hediondo por equiparação aquele que pratica a tortura não deveria mais cumprir a pena na sua integralidade, mas sim apenas iniciar o seu cumprimento no regime fechado. Para parte da doutrina tal fato representava uma revogação tácita da redação original do art. 2º, §1º da lei 8.072/90. Tal entendimento se baseara no princípio da isonomia, pois como o crime de tortura se equiparava aos crimes hediondos, porque os demais deveriam ter a sua pena executada de forma distinta? Entendeu a doutrina que tal benefício deveria ser estendido aos demais crimes descritos na lei de crimes hediondos. 
		Mesmo com a pressão doutrinária não foi esse o entendimento do STF há época sendo motivo inclusive de edição da sumula 698, a qual definiu claramente não se estender aos demais crimes hediondos a admissibilidade de progressão no regime de execução da pena.
		Apesar da existência da súmula 698, tal assunto foi discutido novamente em 2006 quando ao julgar o HC 82959 o STF mudou o seu posicionamento e acabou por declarar a inconstitucionalidade da redação original do art. 2º, §1º da Lei 8.072/90. Em sua decisão a suprema corte reconheceu o princípio da individualização da pena, sob o argumento que não compete ao poder legislativo excluir qualquer das fases da individualização da pena sob o argumento de violar o artigo 5º, XLVI da Constituição Federal, uma vez que, segundo Brasileiro, o juiz da vara de execuções deve possuir instrumentos para buscar a individualização do cumprimento da reprimenda imposta ao condenado, sobretudo se considerarmos que a progressão no regime de cumprimento da pena, nas espécies fechado, semi-aberto e aberto, tem como razão maior a ressocialização do preso que, mais dia ou menos dia, voltará ao convívio social.
		Apesar desta decisão ser no bojo da análise de uma ação de habeas corpus, ou seja, uma declaração de inconstitucionalidade em controle difuso, o STF conferiu eficácia erga omnes à decisão do HC 82959/SP, aplicando, por analogia, o quanto disposto no artigo 27 da Lei nº 9.868/99, que se refere a julgamento de hipóteses de controle concentrado ou abstrato de constitucionalidade. Segundo o autor, em nome da segurança jurídica e do excepcional interesse social em torno da matéria, apesar de se tratar de controle incidental de inconstitucionalidade, o Supremo deliberou pela extensão dos efeitos da decisão a outras situações fáticas suscetíveis de serem beneficiadas pela declaração in concreto da inconstitucionalidade da redação original do artigo 2º, §1º da Lei nº 8.072/90. Logo, como a decisão proferida pelo STF no julgamento do referido HC é dotada de eficácia erga omnes tal admissibilidade foi estendida a outros processos, beneficiando todos àqueles que ainda não tivessem cumprido suas penas na integralidade e desde que preenchessem os requisitos objetivos e subjetivos para a progressão. 
		Para não restar dúvidas quanto ao efeito erga omnes da referida decisão foi editada a súmula vinculante 26 : “para efeito de progressão de regime no cumprimento de pena por crime hediondo ou equiparado, o juízo da execução observará a inconstitucionalidade do art. 2º da lei 8.072 de 25 de julho de 1990, sem prejuízo de avaliar se o condenado preenche, ou não, os requisitos objetivos e subjetivos do benefício, podendo determinar, para tal fim, de modo fundamentado, a realização de exame criminológico”. 
		Finalizando tal discussão foi editada a lei 11.464/07, a qual alterou a redação do artigo 2º da lei de crimes hediondo passando a ser “ a pena por crime previsto neste artigo será cumprida incialmente em regime fechado”. Contudo a edição desta nova norma gerou o novatio legis in pejus, pois passou a considerar que todos os indivíduos que praticarem conduta tipificada como hediondo deve iniciar o cumprimento da pena em regime fechado, contrariando o previsto no artigo 33, §2º do Código Penal. Em tal artigo do CP é previsto o escalonamento do quantum da pena e o respectivo regime inicial a ser adotado. Como prevê os princípios do direito penal, uma norma mais gravosa esta só pode se aplicar a casos ocorridos após a sua vigência, assim os crimes hediondos praticados até 2007 estão submetidos, quanto ao regime de cumprimento de pena, aos artigos 33, c.c. o artigo 59 ambo do Código Penal. Se não bastasse a definição do regime inicial de cumprimento da pena, a novel também definiu um novo critério objetivo para a progressão de regime, qual seja, definiu que quando da prática de crimes previstos como hediondos o indivíduo somente poderá progredir de regime se cumpridos 2/5 da pena se primário e 3/5 se reincidente.
Bibliografia
Lima de, Renato Brasileiro, Legislação Criminal Especial Comentada, 2ª ed., Salvador: Editora Jus Podivm, 2014

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