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NÚCLEO DE PÓS-GRADUAÇÃO CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO Coordenação Pedagógica – IBRA DISCIPLINA LEUCEMIAS: FISIOPATOLOGIA, CLASSIFICAÇÃO E TRATAMENTO SUMÁRIO 1. DEFINIÇÃO E VISÃO GERAL DE LEUCEMIA ............................................ 3 2. VISÃO GERAL DA LEUCEMIA AGUDA ...................................................... 6 3. LEUCEMIA LINFOCÍTICA AGUDA (LLA) .................................................. 12 4. LEUCEMIA LINFOCÍTICA CRÔNICA (LLC) .............................................. 19 5. LEUCEMIA MIELOIDE AGUDA (LMA) ...................................................... 27 6. LEUCEMIA MIELOIDE CRÔNICA (LMC) .................................................. 33 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ................................................................. 41 1. DEFINIÇÃO E VISÃO GERAL DE LEUCEMIA Fonte: gettyimages A leucemia é uma doença maligna dos glóbulos brancos, geralmente, de origem desconhecida. Tem como principal característica o acúmulo de células doentes na medula óssea, que substituem as células sanguíneas normais. A medula óssea é o local de fabricação das células sanguíneas e ocupa a cavidade dos ossos, sendo popularmente conhecida por tutano. Nela são encontradas as células que dão origem aos glóbulos brancos (leucócitos), aos glóbulos vermelhos (hemácias ou eritrócitos) e às plaquetas. Na leucemia, uma célula sanguínea que ainda não atingiu a maturidade sofre uma mutação genética que a transforma em uma célula cancerosa. Essa célula anormal não funciona de forma adequada, multiplica-se mais rápido e morre menos do que as células normais. Dessa forma, as células sanguíneas saudáveis da medula óssea vão sendo substituídas por células anormais cancerosas. Existem mais de 12 tipos de leucemia, sendo que os quatro primários são leucemia mieloide aguda (LMA), leucemia mieloide crônica (LMC), leucemia linfocítica aguda (LLA) e leucemia linfocítica crônica (CLL). A malignização costuma ocorrer nas células-tronco pluripotentes, embora, de vez em quando, ocorra na célula-tronco diferenciada com capacidade mais limitada de autorrenovação. Proliferação anormal, expansão clonal e diminuição de apoptose (morte celular programada) acarretam substituição dos elementos sanguíneos normais por células malignas. As manifestações da leucemia ocorrem por: Supressão da formação de células sanguíneas normais. Infiltração dos órgãos por células leucêmicas. Os fatores inibitórios produzidos pelas células leucêmicas e a substituição do espaço medular podem suprimir a hematopoese normal, com anemia, trombocitopenia e granulocitopenia resultantes. A infiltração do órgão resulta em aumento hepático, esplênico e dos linfonodos e, algumas vezes, comprometimento renal e gonadal. A infiltração da meninge resulta em características clínicas associadas ao aumento da pressão intracraniana (p. ex., paralisias do nervo craniano). Inicialmente as leucemias eram denominadas agudas ou crônicas de acordo com a expectativa de vida, mas agora são classificadas segundo o fenótipo celular e o grau de diferenciação na apresentação inicial. Leucemias agudas contêm células predominantemente imaturas, mal diferenciadas (em geral, formas blásticas). As leucemias agudas se dividem em leucemia linfocítica aguda (LLA) e leucemia mieloide aguda (LMA), que podem ser subdivididas ainda mais pela classificação franco-anglo-americana (FAA) (Classificação franco-americana-britânica (FAB) de leucemias agudas). Leucemias crônicas têm células mais maduras do que as leucemias agudas. Elas geralmente se manifestam como leucocitose anormal com ou sem citopenia em uma pessoa do contrário assintomática. Os achados e o tratamento diferem significativamente entre a leucemia linfocítica aguda (LLC) e a leucemia mieloide aguda (LMC). As síndromes mielodisplásicas consistem na insuficiência progressiva da medula óssea, mas com uma proporção insuficiente de blastos (< 30%) para confirmar o diagnóstico definitivo de LMA; 40 a 60% dos casos evoluem para LMA. A reação leucemoide corresponde a uma acentuada leucocitose granulocítica (ou seja, leucócitos > 50.000 células/μL) produzida pela medula óssea normal em resposta à infecção sistêmica ou ao câncer. Embora não seja uma doença neoplásica, a reação leucemoide com contagem de leucócitos muito alta pode exigir exames para excluir LMC. 2. VISÃO GERAL DA LEUCEMIA AGUDA Esses linfócitos [leucemia linfocítica aguda (LLA)] ou células mieloides [leucemia mieloide aguda (LMA)] proliferam, substituindo o tecido normal da medula óssea e as células hematopoéticas e induzindo anemia, trombocitopenia e granulocitopenia. Como são oriundas do sangue, podem infiltrar vários órgãos e locais, incluindo fígado, baço, linfonodos, SNC, rins e gônadas. Os sintomas podem se manifestar apenas por alguns dias ou semanas antes do diagnóstico. A hematopoese alterada provoca os sintomas mais comuns (anemia, infecção, hematoma fácil e sangramento). Outros sinais e sintomas normalmente não são específicos (p. ex., palidez, fadiga, febre, fraqueza, perda de peso, taquicardia, dor no peito) e são atribuídos à anemia e ao estado hipermetabólico. Em geral, a causa da febre não é encontrada, embora a granulocitopenia possa ocasionar infecção bacteriana rapidamente progressiva e potencialmente fatal. O sangramento é quase sempre manifestado por petéquias, hematoma fácil, epistaxe, sangramento nas gengivas ou irregularidade menstrual. Hematúria e sangramento GI não são comuns. Leucemia Cutânea Localizada A infiltração periosteal e da medula óssea pode causar dores ósseas e nas articulações, em especial nas crianças com LLA. O envolvimento inicial do SNC ou a meningite leucêmica (manifestando-se como dores de cabeça, vômito, irritabilidade, paralisias dos nervos cranianos, convulsões e papiledema) são incomuns. A infiltração extramedular por células leucêmicas pode causar linfadenopatia, esplenomegalia, hepatomegalia e leucemia cutânea (exantema não pruriginoso elevado). A hiperplasia gengival pode ser proeminente, particularmente nas leucemias monocíticas agudas. Hemograma e esfregaço periférico são os primeiros exames efetuados; pancitopenia e blastos periféricos sugerem leucemia aguda. Blastócitos no esfregaço periférico podem chegar a 90% da contagem de leucócitos. A biópsia da medula óssea (por aspirado ou agulha) é rotineiramente feita, embora o diagnóstico geralmente possa ser realizado a partir de esfregaços de sangue periférico. Os blastócitos na medula óssea estão classicamente entre 25 e 95%. A anemia aplásica, as infecções virais, como a mononucleose infecciosa, e as deficiências de vitamina B12 e folato devem ser consideradas no diagnóstico diferencial da pancitopenia grave. As reações leucemoides à doença infecciosa (como a tuberculose) raramente se manifestam com contagens altas de blastócitos. Os estudos histoquímicos, citogenéticos, de imunofenotipagem e de biologia molecular ajudam a distinguir os blastos de LLA daqueles de LMA ou outros processos da doença. As células específicas T e B e os anticorpos monoclonais mieloides/antígeno, juntamente com citometria de fluxo, são essenciais para a classificação das leucemias agudas, o que é fundamental para o tratamento. Leucemia cutânea disseminada TC de crânio é feita em pacientes com sintomas relacionados ao sistema nervoso central. Deve-se fazer radiografia de tórax para detectar massas mediastinais, especialmente antes do paciente receber anestesia. TC, RM ou ultrassonografia abdominal podem ajudar a avaliar esplenomegalia ou infiltração leucêmica em outros órgãos. A ecocardiografia costuma ser feita para avaliar a função cardíaca ao início da doença. A cura é uma meta realista para LLA e LMA,em especial para pacientes mais jovens. O prognóstico é pior para bebês e idosos e naqueles com disfunção renal ou hepática, envolvimento de SNC, envolvimento testicular, mielodisplasia ou alta contagem de leucócitos (> 25.000/μL). A sobrevida em casos de leucemia aguda não tratada é geralmente de 3 a 6 meses. O prognóstico varia de acordo com múltiplas variáveis, como idade do paciente, cariótipo, resposta à terapia e estado funcional. Blastócitos no sangue periférico A meta de tratamento é a remissão completa, incluindo resolução das características clínicas anormais, restauração das contagens sanguíneas normais e hematopoese normal com < 5% dos blastócitos na medula óssea, e eliminação do clone leucêmico. Embora os princípios básicos de tratamento de LLA e LMA sejam similares, os regimes de medicamentos são diferentes. A natureza complexa da situação clínica do paciente e os protocolos de tratamento disponíveis requerem uma equipe com experiência. Sempre que possível, os pacientes devem ser tratados em centros médicos especializados, em particular durante fases críticas (p. ex., indução à remissão). Transfusões de plaquetas, eritrócitos e granulócitos são administradas conforme necessário em pacientes com sangramento, anemia e neutropenia, respectivamente. A transfusão profilática de plaquetas é feita quando estas caem para < 10.000/μL; limiar maior (20.000/μL) é usado para pacientes com a tríade de febre, CID e mucosite secundária à quimioterapia. A anemia (hemoglobina < 8 g/dL) é tratada com transfusões de papa de hemácias. Transfusões de granulócitos podem ajudar pacientes neutropênicos com gram-negativo ou outras infecções graves, mas não apresentam benefício comprovado como profilaxia. Antimicrobianos são muitas vezes necessários porque os pacientes são neutropênicos e imunodeprimidos; nesses pacientes, as infecções podem evoluir rapidamente, com breve pródromo clínico. Após estudos e culturas apropriadas, pacientes febris e os afebris com contagem de neutrófilos < 500/μL devem iniciar tratamento com antibiótico bactericida de largo espectro que inclui cobertura para microrganismos Gram-positivos e Gram-negativos (p. ex., ceftazidima, imipeném e cilastatina). As infecções fúngicas, em especial pneumonias, estão se tornando mais comuns; essas são difíceis de diagnosticar, assim TC de tórax de ser feita precocemente (i.e., < 72 h), dependendo do grau de suspeita) para detectar pneumonia fúngica. Terapia antifúngica empírica deve ser administrada se a terapia antibacteriana não for eficaz em 72 h. Em pacientes com pneumonite refratária, deve-se suspeitar de Pneumocystis jirovecii ou infecção viral e confirmada por broncoscopia e lavagem broncoalveolar, tratando-a adequadamente. A terapia empírica com SMX-TMP, anfotericina B e aciclovir, ou outros análogos geralmente associados às transfusões de granulócitos, com frequência, é necessária. Em pacientes com imunossupressão fármaco-induzida com risco de infecções oportunistas, SMX- TMP poderia ser administrado para prevenir a pneumonia por P. jirovecii. A hidratação (duas vezes o volume diário de manutenção), a alcalinização da urina (pH de 7 a 8) e o monitoramento dos eletrólitos podem prevenir a hiperuricemia, a hiperfosfatemia, a hipocalcemia e a hiperpotassemia (ou seja, a síndrome da lise tumoral) causadas pela rápida lise das células leucêmicas durante a fase inicial do tratamento (particularmente na LLA). A hiperuricemia pode ser minimizada reduzindo a conversão da xantina em ácido úrico administrando alopurinol (inibidor da xantina oxidase) ou rasburicase (uma enzima recombinante de urato oxidase) antes de começar a quimioterapia. Apoio psicológico pode ajudar os pacientes e seus familiares a superar o choque da doença e os rigores do tratamento para condição potencialmente fatal. 3. LEUCEMIA LINFOCÍTICA AGUDA (LLA) Fonte: Farmaceuticas Leucemia linfocítica aguda (LLA) é o câncer pediátrico mais comum; também atinge adultos de todas as idades. A transformação maligna e a proliferação descontrolada de uma célula progenitora hematopoética de longa vida, anormalmente diferenciada, resultam em alto número de blastos circulantes, substituição da medula normal por células malignas e potencial para infiltração leucêmica em SNC e órgãos abdominais. Os sintomas incluem fadiga, palidez, infecção, dor óssea, hematoma fácil e sangramento. O exame do esfregaço do sangue periférico e da medula óssea fornece, em geral, o diagnóstico. O tratamento compreende, tipicamente, uma combinação quimioterápica para atingir a remissão, quimioterapia intratecal para profilaxia do SNC e/ou irradiação cerebral para infiltração leucêmica intracerebral, quimioterapia de consolidação com ou sem transplante das células-tronco e manutenção da quimioterapia por 1 até 3 anos para evitar recidiva. Dois terços de todos os casos de leucemia linfocítica aguda ocorrem em crianças, com auge da incidência entre 2 e 5 anos de idade; a LLA é o câncer mais comum nas crianças e a segunda causa de morte mais frequente em crianças com < 15 anos de idade. O segundo aumento da incidência ocorre após os 45 anos de idade. Os fatores prognósticos ajudam a determinar o protocolo de tratamento e a intensidade. Fatores prognósticos favoráveis são: 3 a 9 anos Contagem de leucócitos < 25.000 células/μL (< 50.000/μL em crianças) Morfologia FAB L1 Cariótipo da célula leucêmica com > 50 cromossomos e t(12;21) Ausência de doença do SNC no diagnóstico Fatores desfavoráveis incluem: Cariótipo da célula leucêmica com cromossomos com números normais, mas anormais na morfologia (pseudodiploides) Presença de cromossomo Philadelphia (Ph) t(9;22) Idade mais avançada em adultos Imunofenótipo de célula B com imunoglobulina de superfície ou citoplasmática Precursor inicial do fenótipo das células T; assinatura molecular do tipo BCR-ABL Baixo número de cromossomos nas células leucêmicas Assinatura molecular semelhante a BCR/ABL Independentemente dos fatores de risco, a probabilidade de remissão inicial é ≥ 95% em crianças e 70 a 90% em adultos. Das crianças, 75% ou mais têm sobrevida livre de doença contínua por 5 anos e parecem curadas. Dos adultos, 30 a 40% têm sobrevida livre de doença contínua por 5 anos. Imatinibe melhora o resultado em adultos e crianças com LLA positiva para cromossomo Ph. A maioria dos protocolos investigatórios seleciona os pacientes com fatores de risco menores para terapia mais intensa, porque o aumento de risco e a toxicidade do tratamento são contrabalançados com o risco maior de falha do tratamento causar a morte. As quatro fases gerais do tratamento com quimioterapia para LLA incluem: Indução da remissão Profilaxia do SNC Consolidação ou intensificação pós-remissão Manutenção Terapia de indução O objetivo é induzir a remissão. Vários regimes enfatizam a introdução precoce de um regime intensivo com múltiplos medicamentos. A remissão pode ser induzida com prednisona oral diária e vincristina intravenosa semanal com adição de antraciclina ou asparaginase. Outros medicamentos e combinações que podem ser introduzidos precocemente no tratamento são citarabina, etoposida e ciclofosfamida. Em alguns regimes, dose intermediária ou alta de metotrexato IV é administrada juntamente com resgate de leucovorina. As combinações e suas dosagens são modificadas de acordo com a presença dos fatores de risco. O imatinibe pode ser adicionado ao regime de medicamentos para pacientes com LLA cromossomo Ph-positiva. Profilaxia do SNC Um importante local de infiltração leucêmica são as meninges; profilaxia e tratamento podem incluir metotrexato intratecal, citarabina e corticoides em combinação ou metotrexato e citarabina isoladamente. A irradiaçãodos nervos cranianos ou do cérebro todo pode ser necessária e, muitas vezes, é utilizada em pacientes de alto risco de doença do SNC (p. ex., alta contagem de leucócitos, LDH sérica alta, fenótipo da célula B), mas tem sido usada com menos frequência atualmente. Terapia de consolidação O objetivo da consolidação é prevenir um novo crescimento leucêmico. A terapia de consolidação geralmente dura alguns meses e combina medicamentos que têm mecanismos de ação diferentes do que os medicamentos usados em regimes de indução. Recomenda-se transplante de células-tronco alogênicas como a tratamento de consolidação da LLA com cromossomo Ph-positivo para os adultos ou nas recidivas ou remissões secundárias ou mais tardias. Terapia de manutenção A maioria dos regimes inclui terapia de manutenção com metotrexato e mercaptopurina. A duração do tratamento normalmente é 2½ a 3 anos, mas pode ser menor ao usar esquemas mais intensivos nas fases iniciais. Testes clínicos com anticorpos monoclonais direcionados contra as proteínas de superfície das células leucêmicas estão em andamento, com alguns novos agentes mostrando ser promissores. A terapia em geral é curta e intensiva nos casos de leucemia de Burkitt ou LLA com células B maduras (morfologia FAB L3). Para pacientes em remissão completa contínua durante 1 ano após a suspensão do tratamento, o risco de recidiva é pequeno. Recidiva As células leucêmicas podem reaparecer na medula óssea, no SNC, nos testes ou em outros locais. A recidiva na medula óssea é particularmente perigosa. Embora um novo ciclo de quimioterapia possa induzir uma segunda remissão em 80 a 90% das crianças (30 a 40% dos adultos), as remissões subsequentes tendem a ser breves. A quimioterapia faz com que apenas alguns pacientes com recidiva precoce de câncer da medula óssea alcancem a cura ou remissões secundárias prolongadas livres da doença. Novas estratégias imunoterápicas mostram resultados iniciais impressionantes na LLA recidivante e/ou refratária. Os anticorpos, como o blinatumomabe, que aproximam muito as células T dos blastos leucêmicos, demonstram atividade na LLA recidivante. As células T do receptor de antígeno quimérico, provenientes das células T do paciente após aférese, induzem remissão nos pacientes recidivantes com notável eficácia, embora apresente toxicidade importante. Se houver um irmão ou irmã com HLA compatível disponível, o transplante de células-tronco oferece a melhor esperança de remissão prolongada ou cura. Células de outros parentes ou de doadores compatíveis sem parentesco, às vezes, são usadas. Transplante raramente é realizado em pacientes com > 65 anos porque a probabilidade de sucesso é muito pequena e os efeitos adversos provavelmente serão fatais. Quando a recidiva envolve o SNC, o tratamento inclui metotrexato intratecal (com ou sem citarabina ou corticoides) duas vezes/semana até todos os sinais desaparecerem. A maioria dos regimes inclui quimioterapia de reindução sistêmica pela probabilidade de disse-minação sistêmica dos blastócitos. O papel do uso contínuo do medicamento intratecal ou da irradiação do SNC não é claro. A recidiva testicular pode ser clinicamente evidenciada por edema firme e indolor em um testículo ou identificada na biópsia. Se houver envolvimento testicular unilateral clinicamente evidente, o testículo aparentemente não envolvido deve ser submetido à biópsia. O tratamento consiste em radioterapia do testículo envolvido e administração de terapia de reindução sistêmica, como no caso de recidiva isolada de SNC. 4. LEUCEMIA LINFOCÍTICA CRÔNICA (LLC) O tipo mais comum de leucemia no mundo ocidental, a leucemia linfática crônica (LLC) envolve linfócitos neoplásicos (quase sempre células B) defeituosos com aspecto maduro com um ciclo vital anormalmente longo. Sangue periférico, medula óssea, baço e linfonodos são infiltrados. Os sintomas podem estar ausentes ou incluir linfadenopatia, esplenomegalia, hepatomegalia e sintomas não específicos atribuíveis à anemia (fadiga, mal-estar) e imunossupressão (p. ex., febre). O diagnóstico é feito por exame do esfregaço de sangue periférico e punção da medula óssea. O tratamento, retardado até os sintomas se desenvolverem, é direcionado ao aumento da sobrevida e à diminuição dos sintomas e pode envolver clorambucila ou fludarabina, prednisona, ciclofosfamida e/ou doxorrubicina. Anticorpos monoclonais, como alentuzumabe, rituximabe e obinutuzumabe, são cada vez mais utilizados. A radioterapia paliativa é reservada aos pacientes nos quais a linfadenopatia ou a esplenomegalia interfere em outros órgãos. A incidência da leucemia linfocítica crônica aumenta com a idade; 75% dos casos são diagnosticados em pacientes com > 60 anos. A LLC é duas vezes mais comum em homens. Embora a causa seja desconhecida, alguns casos são familiares. A LLC é rara no Japão e na China, e a incidência não parece aumentar entre os japoneses expatriados nos EUA, sugerindo a importância dos fatores genéticos. A LLC é mais comum entre descendentes de judeus do leste europeu. Em cerca de 98% dos casos, as células B CD5+ sofrem transformação maligna, com linfócitos inicialmente se acumulando na medula óssea e, então, se disseminam para os linfonodos e outros tecidos linfoides, eventualmente induzindo esplenomegalia e hepatomegalia. Com o progresso da doença, a hematopoese anormal resulta em anemia, neutropenia, trombocitopenia e diminuição da produção de imunoglobulina. Muitos pacientes desenvolvem hipogamaglobulinemia e resposta deficiente do anticorpo, talvez relacionada ao aumento da atividade supressora da célula T. Os pacientes apresentam suscetibilidade elevada às doenças autoimunes caracterizadas por anemias imuno-hemolíticas (normalmente com teste de Coombs positivo) ou trombocitopenia e aumento modesto no risco de desenvolvimento de outros cânceres. Em 2 a 3% dos casos, a expansão clonal é do tipo célula T e até esse grupo apresenta um subtipo (p. ex., linfócitos granulares grandes com citopenias). Além disso, outros padrões leucêmicos crônicos têm sido categorizados sob LLC: Leucemia prolinfocítica Fase leucêmica do linfoma cutâneo da célula T (i. e., síndrome de Sézary) Leucemia de células pilosas Linfoma progredindo para leucemia (i. e., alterações leucêmicas vistas em estádios avançados de linfoma maligno) A diferenciação desses subtipos de LCC típica costuma ser feita por meio de microscopia de luz e fenotipagem. A LLC é confirmada por exames de esfregaço de sangue periférico e medula óssea; a característica patognomônica é o aumento constante da linfocitose periférica absoluta (> 5.000/μL) e elevação dos linfócitos (> 30%) na medula óssea. O diagnóstico diferencial é simplificado por exame de imunofenótipo. Outros achados ao diagnóstico podem ser hipogamaglobulinemia (< 15% dos casos) e, raramente, aumento da desidrogenase láctica. Cerca de 10% dos casos se manifestam com anemia moderada (algumas vezes imuno-hemolíticas) e/ou trombocitopenia. Um pico de imunoglobulina sérica monoclonal do mesmo tipo pode ser encontrado na superfície da célula leucêmica em 2 a 4% dos casos. O estadiamento clínico é útil para o prognóstico e o tratamento. Duas estratégias comuns são o estadiamento de Rai e e a classificação de Binet, primariamente com base nas alterações hematológicas e na extensão da doença. A sobrevida média do paciente com LLC de células B ou suas complicações é cerca de sete a dez anos. Pacientes em estádios de 0 a II de Rai ao diagnóstico podem sobreviver por 5 a 20 anos sem tratamento. Pacientes em estádio III ou IV de Rai têm maior probabilidade de morrer em três a quatro anos do diagnóstico. A progressão para insuficiência da medula óssea é, em geral, associada à curta sobrevida. Os pacientescom LLC têm maior probabilidade de desenvolver câncer secundário, em especial o câncer de pele. Embora a LLC seja progressiva, alguns pacientes podem ficar assintomáticos por anos; a terapia não é indicada até ocorrer progressão ou sintomas. A cura quase sempre não é possível e por isso o tratamento tenta melhorar os sintomas e prolongar a vida. Tratamento de suporte inclui: A transfusão de papa de hemácias ou injeções de eritropoetina para anemia. Transfusões de plaquetas para sangramento associado com trombocitopenia. Antimicrobianos para infecções bacterianas, fúngicas ou virais. Como a neutropenia e a agamaglobulinemia limitam a morte bacteriana, a terapia com antibióticos deve ser bactericida. As infusões terapêuticas de gamaglobulina devem ser consideradas para o paciente com hipogamaglobulinemia e nas infecções de repetição ou refratárias, ou para profilaxia, quando ≥ 2 infecções graves ocorrerem em até seis meses. A terapia específica inclui: Quimioterapia Corticoides Terapia com anticorpo monoclonal Radioterapia Essas modalidades podem aliviar os sintomas e prolongar a sobrevivência. O excesso de tratamento é mais perigoso que a falta de tratamento. Pode-se instituir quimioterapia quando os sintomas começam. Os sinais e sintomas que indicam tratamento imediato são: Sinais e sintomas constitucionais (febre, sudorese noturna, fadiga extrema e perda ponderal) Hepatomegalia significativa, esplenomegalia ou linfadenopatia Linfocitose > 100.000 células/μL Infecções acompanhadas de anemia, neutropenia ou trombocitopenia. Fonte: Agência Nacional de Saúde Suplementar Medicamentos alquilantes, em especial clorambucila, sozinha ou com corticoides, são bastante comuns na terapia de LLC de células B. No entanto, a fludarabina é mais eficaz. A combinação de quimioterapia com fludarabina, ciclofosfamida e rituximabe, com mais frequência, induz remissões completas. As remissões são mais longas e a sobrevida é prolongada. Interferona- alfa, desoxicoformicina e 2-clorodesoxiadenosina são altamente eficazes para leucemia de células pilosas. Os pacientes com leucemia prolinfocítica e leucemia-linfoma normalmente necessitam quimioterapia com múltiplos medicamentos e, em geral, respondem apenas parcialmente. O ibrutinibe é um inibidor oral recente da tirosinaquinase de Bruton. A tirosinaquinase de Bruton é uma enzima essencial para a ativação de várias vias a jusante mediadas por células B que aumentam a sobrevida das células na LLC. O ibrutinibe parece ser muito ativo na LLC e induziu remissões duradouras em alguns pacientes com LLC recidivante ou refratária. Seu papel como agente único ou como parte de uma quimioterapia combinada está evoluindo. A anemia imuno-hemolítica e a trombocitopenia são indicações para terapia com corticoide. Dose de 1 mg/kg de prednisona, VO, uma vez/dia pode ocasionalmente resultar em rápida e surpreendente melhora em pacientes com LLC avançada, embora a resposta, muitas vezes, seja breve. As complicações metabólicas e o aumento da taxa e da gravidade de infecções previnem seu uso prolongado. A prednisona utilizada com fludarabina aumenta o risco de infecções por Pneumocystis jirovecii e Listeria. Rituximabe é o primeiro anticorpo monoclonal usado, com sucesso, no tratamento de cânceres linfoides. Pacientes que não passaram por tratamento prévio, a taxa de resposta é 75%, com 20% dos pacientes alcançando remissão completa. Alentuzumabe tem taxa de resposta de 33% em pacientes anteriormente tratados refratários à fludarabina e 75 a 80% de taxa de resposta em pacientes anteriormente não tratados. Mais problemas com imunossupressão ocorrem com alentuzumabe do que com rituximabe. Rituximabe tem sido combinado com fludarabina e ainda com fludarabina e ciclofosfamida; essas combinações têm melhorado acentuadamente a taxa de remissão completa tanto em pacientes anteriormente tratados como em não tratados. Hoje em dia, o alentuzumabe é combinado com rituximabe e com quimioterapia para tratar doenças residuais mínimas e tem eliminado, de modo eficaz, a infiltração na medula óssea. Ocorreu reativação do citomegalovírus e de outras infecções oportunistas com o alentuzumabe. Pode ocorrer reativação da hepatite B com o uso de rituximabe. O obinutuzumabe é um anticorpo monoclonal mais recente que tem por alvo a mesma proteína de superfície das células da LLC que o rituximabe. Descobriu-se recentemente que a combinação de obinutuzumabe e clorambucil é superior ao rituximabe para prolongar a sobrevida livre de progressão da doença e alcançar uma resposta completa ao tratamento. A associação de obinutuzumabe e clorambucil já foi aprovada como tratamento de primeira linha para pacientes idosos ou pacientes frágeis com comorbidades. No caso específico da LLC com deleção do 17p, o inibidor da tirosina quinase de Bruton, ibrutinibe, mostrou excelente atividade. Ibrutinibe como monoterapia é um tratamento de primeira linha aprovado para esses pacientes. Isso é diferente do grupo de pacientes com LLC e anomalias de deleção no 11q, que parecem se beneficiar mais do tratamento inicial com alquilantes. Nos pacientes com doença recidivante ou refratária, as novas opções são o idelalisibe (um inibidor da fosfoinositida 3-quinase) com rituximabe e a monoterapia com ibrutinibe. Em geral, os anticorpos monoclonais são bem tolerados, embora possam causar reações alérgicas e imunossupressão significativa. Esse perfil de toxicidade favorável permite que esses fármacos sejam combinados à quimioterapia convencional, muitas vezes com excelente eficácia clínica. Irradiação local para tratamento paliativo pode ser administrada nas áreas de linfadenopatia ou para envolvimento do fígado e baço que não responde à quimioterapia. A irradiação total do corpo em doses pequenas é às vezes bem- sucedida para melhor temporariamente os sintomas. 5. LEUCEMIA MIELOIDE AGUDA (LMA) Fonte: Hospital Israelita Albert Einstein Na leucemia mieloide aguda (LMA), a transformação maligna e a proliferação descontrolada de uma célula progenitora mieloide de longa vida, anormalmente diferenciada, resultam em números circulantes altos de formas sanguíneas imaturas e substituição da medula óssea por células malignas. Os sintomas incluem fadiga, palidez, hematomas fáceis e sangramento, febre e infecção; os sintomas de infiltração leucêmica extramedular estão presentes em apenas 5% dos pacientes (frequentemente com manifestações cutâneas). O diagnóstico é obtido por exame do esfregaço do sangue periférico e da medula óssea. O tratamento inclui quimioterapia de indução para atingir a remissão e quimioterapia pós-remissão (com ou sem transplante de células- tronco) para evitar recidiva. A incidência da leucemia mieloide aguda aumenta com a idade; é a leucemia aguda mais comum em adultos, com média de idade de início aos 50 anos. LMA pode ocorrer como um câncer secundário após rádio ou quimioterapia para um tipo diferente de câncer. A LMA secundária é difícil de tratar somente com quimioterapia. LMA tem numerosos subtipos que se distinguem por morfologia, imunofenótipo e citoquímica. Cinco classes são descritas, com base no tipo predominante de célula, incluindo: Mieloide Mieloide-monocítica monocítica Eritroide Megacariocítica Leucemia promielocítica aguda (LPA) é um subtipo particularmente importante, representando 10 a 15% de todos os casos de LMA, atingindo um grupo etário mais jovem (média de 31 anos) e principalmente hispânicos, em que o paciente normalmente apresenta distúrbio de coagulação. As taxas de indução de remissão estão na faixa de 50 a 85%. A sobrevida livre da doença a longo prazo ocorre em 20 a 40% dos pacientes e aumenta para 40 a 50% em pacientes mais jovens tratados com quimioterapia intensivaou transplante de células-tronco. Leucemia promielocítica aguda Os fatores prognósticos ajudam a determinar o protocolo e a intensidade de tratamento; em pacientes com fortes características prognósticas negativas são normalmente aplicadas formas mais intensivas de terapia, porque acredita- se que os benefícios potenciais justifiquem o aumento da toxicidade do tratamento. O cariótipo das células leucêmicas é um importante fator prognóstico. O rearranjo cromossômico específico de diferentes formas da LMA afeta o resultado. Três grupos clínicos foram identificados: favorável, intermediário e ruim. Pacientes com citogênese t(8;21), t(15;17) e inv(16) geralmente têm resposta favorável à terapia, remissão duradoura e melhor sobrevida. Pacientes com cariótipo normal tem prognóstico intermediário, e pacientes com prognóstico ruim são aqueles com deleção do cromossomo 5 ou 7, trissomia do 8 ou cariótipo com > 3 anomalias. As anomalias genéticas moleculares são cada vez mais importantes para refinar o prognóstico e a terapia na LMA. A maior parte dos pacientes com blastos citogeneticamente normais pode atualmente ser mais bem caracterizada. Pacientes com mutações na nucleofosmina (NPM1) ou CEBPA têm prognóstico mais favorável. Mutações na quinase Flt3, por outro lado, têm pior prognóstico (inclusive para os pacientes que também têm mutação a NPM1 que costuma ser favorável). leucemia linfocítica aguda sem maturação Outros fatores negativos incluem avanço da idade, uma fase mielodisplásica precedente, leucemia secundária, alta contagem de leucócitos e ausência de bastonetes de Auer. Exceto na LMA, as classificações FAA ou da OMS isoladamente não preveem uma resposta. Tenta induzir a remissão e difere bastante de LLA no fato de que a LMA responde a poucos medicamentos. O regime básico de indução inclui citarabina por infusão intravenosa contínua ou altas doses por cinco a sete dias; daunorrubicina ou idarrubicina é administrada intravenosamente por três dias durante esse período. Alguns regimes incluem 6-tioguanina, etoposida, vincristina e prednisona, mas suas contribuições não são claras. O tratamento geralmente resulta em mielossupressão significativa, com infecção ou sangramento. Há um período de latência significativo antes da recuperação da medula. Durante esse período, o rigor das profilaxias e do tratamento de suporte é crucial. Na LPA e alguns outros casos de LMA, a CID pode estar presente quando leucemia é diagnóstica e pode piorar à medida que a lise da célula leucêmica libera pró-coagulante. Na LPA, com a translocação t(15;17), o ácido all-trans- retinoico (tretinoína) corrige a CID em 2 a 5 dias; combinado com daunorrubicina ou idarrubicina, esse regime pode induzir a remissão em 80 a 90% dos pacientes e a sobrevida a longo prazo em 65 a 70%. O trióxido arsênico também é muito ativo em LPA. TA tretinoína e o trióxido de arsênio sem quimioterapia citotóxica convencional foram bem-sucedidos na LPA, e essa estratégia está sendo avaliada em outros estudos em ensaios clínicos. O teste molecular das mutações que podem ser alvos (p. ex., IDH, Flt3) está se tornando rotina no diagnóstico. Após a remissão, muitos regimes envolvem uma fase de intensificação com esses ou outros medicamentos. Regimes de altas doses de citarabina podem prolongar a duração da remissão, em particular quando administrados para consolidação em pacientes com < 60 anos de idade. A profilaxia do SNC não é normalmente administrada para pacientes adultos porque, com melhor controle da doença sistêmica, a leucemia do SNC é uma complicação menos frequente. A terapia de manutenção não tem papel demonstrado em pacientes com LMA que tenham feito terapia de consolidação. Pacientes que não responderam ao tratamento e pacientes mais jovens que estão em remissão, mas têm alto risco de recidiva (geralmente identificados por certas anormalidades cromossômicas) podem receber quimioterapia com altas doses e transplante de células-tronco. Locais extramedulares não são envolvidos em recidivas isoladas com frequência. Quando a recidiva acontece, quimioterapia adicional para pacientes que não podem se submeter ao transplante de células-tronco é menos efetiva e pouco tolerada. Outro ciclo de quimioterapia é mais eficaz nos pacientes mais jovens e naqueles cuja remissão inicial durou > 1 ano. 6. LEUCEMIA MIELOIDE CRÔNICA (LMC) A leucemia mieloide crônica (LMC) ocorre quando a célula-tronco pluripotente sofre transformação maligna e mieloproliferação clonal, causando superprodução de granulócitos imaturos. Inicialmente assintomática, a progressão da LMC é insidiosa, com estádio “benigno” não específico (fraqueza, anorexia, perda de peso), eventualmente abrindo caminho para uma fase acelerada ou blástica com sinais mais perigosos, como esplenomegalia, palidez, hematomas fáceis e sangramento, febre, linfadenopatia e alterações cutâneas. Esfregaço de sangue periférico, punção de medula óssea e demonstração de cromossomo Filadélfia são diagnósticos. O tratamento é feito com imatinibe, que melhora de modo significativo a resposta e prolonga a sobrevida. O potencial de cura do imatinibe é indefinido. Os agentes mielossupressores (p. ex., hidroxiureia), transplante de células-tronco e interferona-alfa também são utilizados. A LMC representa cerca de 15% de todas as leucemias adultas. Pode ocorrer em qualquer idade, embora não seja comum antes dos dez anos, e a média de idade no diagnóstico é de 45 a 55 anos. A LMC pode acontecer em ambos os sexos. A LMC clássica é induzida pela translocação conhecida como cromossomo Philadelphia (Ph). É uma translocação recíproca t(9;22) na qual um pedaço do cromossomo 9 contendo o oncogene c-abl é translocado para o cromossomo 22 e fundido no gene BCR. O produto da fusão BCR-ABL é essencial na patogênese e expressão da LMC e resulta na produção de uma tirosinoquinase constitutivamente específica. A LMC ocorre quando uma célula progenitora hematopoética pluripotente anormal inicia a produção excessiva de granulócitos, primariamente na medula óssea, mas também em locais extramedulares (p. ex., baço, fígado). Embora a produção de granulócitos predomine, o clone neoplásico inclue eritrócitos, megacariócitos, monócitos e mesmo algumas células B e T. As células-tronco normais são retidas e podem emergir após a supressão por medicamento do clone da LMC. A LMC tem três fases: Fase crônica: uma fase inicial indolente que pode durar de meses a anos Fase acelerada: falha do tratamento, piora da anemia, trombocitopenia ou trombocitose progressiva, esplenomegalia persistente ou agravada, evolução clonal, aumento dos níveis séricos de basófilos e aumento dos níveis de blastos na medula óssea ou no sangue Fase blástica: acúmulo de blastos fora da medula (p. ex., ossos, sistema nervoso central, linfonodos e pele), aumento do número de blastos no sangue ou na medula para > 20% A fase blástica causa complicações fulminantes, lembrando aquelas da leucemia aguda, incluindo sepse e sangramento. Alguns pacientes progridem diretamente da fase crônica para a fase blástica. Os pacientes são geralmente assintomáticos a princípio, com início insidioso de sintomas não específicos (p. ex., fadiga, fraqueza, anorexia, perda de peso, febre, suores noturnos, sensação de plenitude abdominal), que podem requerer a avaliação. No início, palidez, sangramento, hematoma fácil e linfadenopatia são incomuns, mas esplenomegalia moderada ou ocasionalmente extrema é usual (60 a 70% dos casos). Com a progressão da doença, a esplenomegalia pode aumentar e ocorrem palidez e sangramento. Febre, linfadenopatia acentuada e envolvimento da pele maculopapular são desenvolvimentos preocupantes. A LMC é diagnosticada, com mais frequência, pelo hemograma obtido demodo incidental ou durante avaliação de esplenomegalia. A contagem de granulócitos é elevada, geralmente < 50,000/μL nos pacientes assintomáticos e 200.000/μL a 1.000.000/μL nos pacientes sintomáticos. A contagem de plaquetas é normal ou moderadamente elevada. O nível de hemoglobina costuma ser > 10 g/dL. O esfregaço periférico pode ajudar a diferenciar a LMC da leucocitose de outra etiologia. Na LMC, o exame direto de sangue periférico muitas vezes revela granulócitos imaturos, bem como eosinofilia e basofilia absolutas. Entretanto, nos pacientes com leucometria ≤ 50.000 células/μL e mesmo em alguns com contagem mais alta de leucócitos, os granulócitos imaturos podem não ser vistos, fazendo com que a ausência de granulócitos imaturos não seja diagnóstica. Leucocitose em pacientes com mielofibrose normalmente está associada a eritrócitos nucleados, eritrócitos em forma de lágrima, anemia e trombocitopenia. A reação leucemoide, definida como neutrofilia > 50.000 células/mL não causada por malignização de célula-tronco hematopoiética, pode resultar de várias causas (p. ex., câncer, infecção, inflamação, outros estímulos como sangramento, substâncias químicas ou choque elétrico). Em geral, a causa é aparente, mas a neutrofilia benigna aparente pode ser mimetizada pela leucemia mieloide crônica ou LMC. O nível de fosfatase alcalina leucocitária costuma ser baixo na LMC e elevado em reações leucemoides. O exame da medula óssea deve ser feito para avaliar o cariótipo, bem como a celularidade e a extensão da mielofibrose. Confirmar o diagnóstico identificando o cromossomo Ph em amostras examinadas por testes citogenéticos ou moleculares. A anomalia citogenética Ph clássica não ocorre em 5% dos pacientes, mas o uso de hibridização fluorescente in situ (FISH) ou reação em cadeia da polimerase com transcrição reversa (RT-PCR) pode confirmar o diagnóstico. Durante a fase acelerada da doença, anemia e trombocitopenia quase sempre se desenvolvem. Os basófilos podem aumentar e a maturação do granulócito pode ser defeituosa. A proporção de células imaturas e o nível da fosfatase alcalina leucocitária podem aumentar. Na medula óssea, a mielofibrose pode se desenvolver e os sideroblastos podem ser vistos ao microscópio. A evolução do clone neoplásico pode estar associada ao desenvolvimento de novos cariótipos anormais, geralmente um cromossomo 8 extra ou isocromossomo 17. A evolução posterior pode levar a uma fase blástica com mieloblastos (60% dos pacientes), linfoblastos (30%) e megacariocitoblastos (10%). Em 80% desses pacientes, ocorrem anormalidades cromossômicas adicionais. Com imatinibe, a sobrevivência é > 90% em cinco anos após o diagnóstico para LMC na fase crônica. Antes da utilização do imatinibe, 5 a 10% dos pacientes com tratamento morriam em até dois anos após o diagnóstico; 10 a 15% morriam a cada ano depois disso. A sobrevida média era de 4 a 7 anos. A maioria (90%) das mortes ocorreu após a fase blástica ou acelerada da doença. A sobrevida média após a crise blástica foi cerca de 3 a 6 meses ou mais, se a remissão foi alcançada. Esfregaço de sangue periférico na fase crônica da leucemia mielógena crônica A LMC negativa para o cromossomo Ph, a leucemia neutrofílica crônica e a leucemia mielomonocítica crônica têm pior prognóstico do que a LMC positiva para o cromossomo Ph e são consideradas síndromes mielodisplásicas. Esfregaço de sangue periférico na fase blástica da leucemia mielógena crônica Excetuando-se os casos de transplante de células-tronco bem-sucedido, não se sabe se o tratamento é curativo. Mas ao utilizar inibidores de tirosinaquinase a sobrevida é prolongada, mas a sobrevida geral máxima ainda não foi alcançada. Alguns pacientes talvez consigam interromper os inibidores da tirosina quinase e manter a remissão. Ainda não se conhece a duração dessas remissões. Imatinibe e várias drogas mais recentes (dasatinibe, nilotinibe) inibem a tirosinoquinase específica que resulta do produto do gene BCR-ABL. Os inibidores de tirosinaquinase (ITQs) são extremamente eficazes para alçançar remissões clínicas e citogenéticas completas da LMC cromossomo Ph-positiva e são claramente superiores a outros regimes (p. ex., interferona com ou sem citarabina). Imatinibe também é superior a outros tratamentos nas fases blástica e acelerada. Na fase blástica, as combinações de quimioterapia com imatinibe têm uma taxa de resposta mais alta do que terapia somente com ambas as abordagens. A tolerância ao tratamento é excelente. O alto nível de remissões completas e duráveis associado à terapia com ITQs levou à perspectiva de cura da doença. Mas os produtos do gene de alguma mutações BCR-ABL, particularmente a mutação T315I, são resistentes aos ITQs atuais e continuam a ser muito difíceis de controlar. O ponatinibe tem atividade para os pacientes com a mutação T315I. Regimes quimioterápicos mais antigos são reservados para pacientes negativos para BCR-ABL, para aqueles que têm recidiva após receberem um ITQ e aqueles na fase blástica. Os agentes principais são bussulfano, hidroxiureia e interferona. A hidroxiureia é a mais fácil de monitorar e tem menos efeitos adversos. A dose inicial é geralmente 500 a 1.000 mg, VO, duas vezes/dia. As contagens sanguíneas devem ser realizadas a cada uma a duas semanas e as doses devem ser ajustadas de acordo. O bussulfano costuma causar mielossupressão geral inesperada, e o interferon causa síndrome gripal, o que frequentemente é inaceitável para os pacientes; a forma peguilada do interferon é mais bem tolerada e mais bem aceita pelos pacientes. O principal benefício do uso de hidroxiureia, bussulfano e interferon é a redução da esplenomegalia dolorosa e da adenopatia, e o controle da carga tumoral para reduzir a incidência de lise tumoral e gota. Nenhuma dessas terapias prolonga o intervalo de sobrevida média em > um ano em comparação aos pacientes não tratados; dessa maneira, a redução de sintomas é a principal meta e a terapia não é continuada em vista dos sintomas tóxicos significativos. Transplante alogênico de células-tronco pode ser útil para pacientes refratários à terapia. Embora a irradiação esplênica raramente seja utilizada, ela pode ser útil em casos de LMC refratária ou em pacientes terminais com esplenomegalia acentuada. A dosagem total costuma se estender de 6 a 10 Gy administradas em frações de 0,25 a 2 Gy/dia. O tratamento deve começar com doses muito baixas e avaliação cuidadosa da contagem de leucócitos. A resposta em geral é desapontadora. A esplenectomia pode aliviar o desconforto abdominal, diminuir a trombocitopenia e abrandar as necessidades de transfusão quando a esplenomegalia não puder ser controlada com quimioterapia ou irradiação. Esplenectomia não provou ter papel significativo durante a fase crônica de LMC. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BAIN, Barbara J. Células sanguíneas: um guia prático. 4.ed. Porto Alegre: Artmed, 2007. 487 p. BRASIL, Ministério da Saúde. Manual de diagnóstico e tratamento da doença de Von Willebrand. Brasília: Ministério da Saúde, 2006. 43 p. CARVALHO, MG et al. Software: Infoblood. CARVALHO, William de Freitas. Técnicas médicas de hematologia e imuno- hematologia. 8.ed. Belo Horizonte: COOPMED, 2008. 281 p. FAILACE, RENATO. Hemograma, manual de interpretação. 5ª ed. Porto Alegre: Artmed, 2009. 298p. FIGUEIREDO, Maria Stella; KERBAUY, José; LOURENÇO, Dayse Maria; SCHOR, Nestor. ESCOLA PAULISTA DE MEDICINA. Guia de hematologia. Barueri,SP: Manole, 2010. xviii, 662 p. GIRELLO, AL Fundamentos da Imuno-Hematologia Eritrocitária. 3ª ed. São Paulo: Senac. HARMENING, DM. Técnicas Modernas em Banco de Sangue e Transfusão. 4ª ed. Rio de Janeiro: Revinter, 2006. HOFFBRAND, A. V; MOSS, P. A. H. 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