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Rayane Aguiar – P8 Artrite Reumatóide Introdução A Artrite Reumatoide (AR) é uma doença inflamatória crônica que evolui com um processo insidioso que, muitas vezes, leva a deformidades das articulações. Pode envolver diversos órgãos e sistemas. Tem períodos de remissão e exacerbação. Possui processo contínuo de lesão tecidual, provocando destruição da cartilagem, erosão óssea e posterior deformidade articular. Epidemiologia Acomete principalmente pacientes entre 35 a 55 anos, 4ª a 6ª década de vidas. A proporção é maior entre as mulheres 3:1, relação com HLA-DR4 em 70% dos casos e a frequência até quatro vezes maior em parentes de primeiro grau de indivíduos afetados. Fatores de risco: tabagismo, exposição à sílica e consumo de café. Já o estrogênio, como anticoncepcional, seria um fator protetor. Patogênese A inflamação das membranas sinoviais (sinovite), que acaba determinando a erosão da cartilagem articular e do osso subcondral, é a principal causa da patogenia da AR. Um gatilho, um agente infeccioso ou o tabagismo, que estimula o sistema imunológico do indivíduo geneticamente predisposto. O processo imunológico não é interrompido após iniciado. Linfócitos CD4+ migram para a membrana sinovial (sinóvia). A partir daí, eles ativam os macrófagos e linfócitos B. Nesse momento, o processo de autoperpetuação do processo inflamatório tem início, pois a produção e a liberação desordenada de citoquinas (TNF-alfa) e quimiocinas são responsáveis por tal manutenção. “As características patológicas da AR são a inflamação e proliferação sinovial, as erosões ósseas focais e o afinamento da cartilagem articular.” Fator Reumatoide (FR) O fator reumatoide é um autoanticorpo, na maior parte das vezes, do tipo IgM, que reconhece a porção Fc de anticorpos IgG. Ele é produzido por linfócitos B, que se transformam em plasmócitos. É importante lembrar que títulos altos indicam pior prognóstico. Também é encontrado em outras doenças do tecido conectivo, por isso sua especificidade não é tão alta quanto os anticorpos anti- CCP. Possui baixa especificidade, pois é encontrado em outras patologias e até mesmo em pacientes hígidos. Anticorpos anti-CCP Anticorpos anti-CCP e o FR podem ser encontrados no soro de pacientes bem antes da doença clínica surgir. Além disso, deve-se ressaltar que o tabagismo está quase que exclusivamente relacionado com a AR positiva para o fator reumatoide e para o anticorpo anti-CCP. Este último parece exacerbar a resposta inflamatória sinovial. Lembre-se sempre de que, a alta especificidade para AR é igual à anti-CCP. A sua presença indica fortemente a possibilidade da doença. Também costuma estar presente nos pacientes com vasculite reumatoide. O anticorpo anti-CCP é muito específico para a artrite reumatoide. As quimiocinas (leucotrieno B4, C3a e C5a) atraem os neutrófilos para o local da inflamação. Manifestações clínicas A doença apresenta-se de forma insidiosa com sintomas típicos de dor articular e rigidez em um período de semanas a meses. O quadro de dor da artrite reumatoide, assim, como das demais doenças inflamatórias tende a ser pior pela manhã ou com repouso prolongado. Além disso, os movimentos leves aliviam a dor. Já na osteoartrite, a dor tende a piorar com os movimentos. A rigidez matinal, de mais de uma hora, é um achado frequente nas artrites inflamatórias e serve para diferenciação com as artrites não inflamatórias, como a osteoartrite, em que a rigidez é menor do que 1 hora. Os sintomas gerais como fadiga, anorexia, mal-estar e dor muscular também podem ser descritos. Com o passar do tempo, a doença evolui para a forma clássica. Forma clássica da artrite reumatoide Artrite simétrica crônica das pequenas articulações das mãos (interfalangeanas proximais e metacarpofalangeanas), das pequenas articulações dos pés e punhos, poupando as articulações interfalangeanas distais das mãos. Qualquer que seja a forma inicial da doença, o paciente apresentará dor e rigidez articular com a intensidade Rayane Aguiar – P8 Artrite Reumatóide cada vez maior, junto com a deterioração da função articular. Ele relatará que as atividades diárias estão cada vez mais difíceis. OBS: Pensar em osteoartrite e artrite psoriásica em caso de acometimento das interfalangeanas distais. Artrite psoriásica é uma forma de apresentação da psoríase e pode manifestar-se de várias formas que simulam outras artropatias. Em, aproximadamente, 15% dos casos a patologia manifesta- se junto com a artrite. Rigidez matinal na osteoartrite e na artrite reumatoide A rigidez matinal da artrite reumatoide é maior do que 1 hora, já a rigidez da osteoartrite é menor do que 1 hora, variando de acordo com a prova e a referência para até menor do que 30 minutos. Não confundir rigidez matinal com dor articular! Rigidez matinal na osteoartrite < 30 minutos Rigidez matinal na artrite reumatoide > 1 hora Manifestações articulares da AR A patogênese da artrite reumatoide é a sinovite. O sintoma mais comum é a dor articular agravada pelo repouso articular (dor inflamatória), sendo pior pela manhã e pela noite. A dor que piora com o movimento é a dor da osteoartrose/osteoartrite, pois é uma doença de desgaste das articulações. Pode encontrar aumento do volume articular devido ao acúmulo de líquido sinovial, hipertrofia da sinóvia e espessamento da cápsula articular. O padrão de acometimento é simétrico, diferentemente da osteoartrite. Lembrando de que na osteoartrite primária de mãos também pode ocorrer o acometimento simétrico. Articulações mais acometidas por ordem de frequência: 1.Interfalangeanas proximais e metacarpofalangeanas; 2. Pequenas articulações dos pés; 3. Punhos; 4. Joelhos e cotovelos; 5. Ombros; 6. Articulação Coxo-femoral; 7. Articulação atlantoaxial. Alteração das mãos: Tumefação das articulações interfalangeanas proximais, com evolução para um clássico desvio ulnar dos dedos. Como as articulações interfalangeanas distais costumam ser poupadas, este é um bom sinal para se diferenciar a AR da osteoartrite e da artrite psoriásica (interfalangeanas distais). A conhecida alteração em “pescoço de cisne” é a flexão das interfalangeanas distais com hiperextensão das interfalangeanas proximais. Já a alteração em “abotoadura” é a hiperflexão das interfalangeanas proximais, com hiperextensão das distais. Alteração dos punhos: Entre as deformidades, o punho em “Dorso de Camelo”. Pode haver, também, compressão do nervo mediano, levando à síndrome do túnel do carpo. Utiliza-se duas manobras semiológicas para precipitar os sintomas: Tinel e Phalen. Alteração dos Joelhos: Derrames articulares são comuns, percebido pelo sinal da tecla (paciente em decúbito dorsal e joelho estendido, percebe-se a flutuação ou sensação de que a patela afunda). Atenção ao cisto de Baker da artrite reumatoide (também pode ocorrer em pessoas sem doença articular), Ele simula, clinicamente, a trombose venosa profunda quando se rompe, ou seja, com dor e edema (síndrome de pseudotromboflebite). O tratamento pode ser realizado através de infiltração articular com corticoides. Alterações da coluna vertebral: O pescoço pode ser acometido em até 70% dos pacientes com artrite reumatoide, sendo a subluxação atlanto-axial (C1 sobre C2) encontrada em 1/3 dos casos. O principal sintoma é a rigidez cervical. Ao exame físico, evidencia- se dor e crepitação à flexão e extensão da cabeça. Rayane Aguiar – P8 Artrite Reumatóide Alterações dos cotovelos: O acometimento mais comum é a contratura em flexão. No entanto, o encarceramento dos nervos ulnar e radial pode acontecer. Alterações das articulações cricoaritenoides: Os pacientes com estridor, rouquidão e disfagia podem ser associados ao acometimentodessas articulações. No entanto, também é um achado muito raro. Manifestações extra articulares da AR São encontradas principalmente em pacientes com altos títulos de fator reumatoide e/ou anti-CCP. FR e o anti-CCP altos são indicativos de pior prognóstico da doença!!! Nódulos Reumatoides = Principal manifestação extra- articular da doença. Manifestações cutâneas da AR: são os nódulos subcutâneos, o eritema palmar, a vasculite necrosante e os infartos acastanhados distais. * Nódulos subcutâneos: são a principal manifestação extra-articular da doença. Eles estão presentes em cerca de 20 a 35% dos casos e são associados a altos títulos de fator reumatoide. São mais frequentemente encontrados nos casos graves, não são dolorosos e indicam doença cronicamente ativa. * Vasculite: cursa com a forma cutânea leucocitoclástica, que são micro infartos acastanhados nas polpas digitais e unhas. Já a forma necrosante grave afeta as pequenas e médias artérias e não é diferenciável da encontrada na poliarterite nodosa clássica. Manifestações cardíacas da AR: deve saber que a causa mais comum de morte em pacientes com AR é a doença cardiovascular. A pericardite é a mais comum manifestação cardíaca da artrite reumatoide. Em geral, são pacientes soropositivos e apresentam nódulos reumatoides. As outras manifestações são IAM por vasculite das coronárias, nódulos reumatoides no miocárdio e distúrbios de condução. Manifestações renais da AR: Apesar de os rins serem poupados na artrite reumatoide, a glomerulonefrite mesangial é o achado histopatológico mais comum em biópsias. Manifestações neurológicas da AR: A vasculite reumatoide da “vasa nervorum”, como na poliarterite nodosa (PAN), pode originar mononeurite múltipla, evoluindo com perda sensitiva difusa em uma ou mais extremidades. Não esquecer de que pode estar associada à queda do punho ou pé. Manifestações pulmonares da AR: A doença pleural é a forma mais comum. O paciente pode cursar com dor torácica pleurítica, dispneia e efusão pleural. O derrame pleural e a pleurite são complicações sistêmicas clássicas da AR. No derrame, encontramos exsudato com fator reumatoide positivo e níveis baixos de glicose, de complemento e do pH. Os nódulos reumatoides no parênquima pulmonar estão presentes em pacientes soropositivos (fator reumatoide positivo) com sinovite generalizada e outros nódulos pelo corpo. Podem ser confundidos com câncer de pulmão. A síndrome de Caplan, é a pneumoconiose dos mineiros de carvão ou a silicose que ocorre em pacientes com nódulos pulmonares reumatoides. A pneumopatia intersticial ou fibrose pulmonar é uma manifestação típica e frequente da AR. Ela está associada à doença de pior prognóstico, crônica, que predomina em bases pulmonares, e o paciente cursa com dispneia, tosse crônica e crepitações bi-basais. A espirometria apresenta padrão restritivo. As demais manifestações pulmonares da AR são cavitação, pneumotórax e bronquiolite constritiva. Manifestações oftalmológicas da AR: A síndrome de Sjögren secundária (olho seco, boca seca etc.) é a alteração ocular mais comum na AR. A episclerite cursa com eritema e dor leve no olho. É a inflamação da camada que se localiza entre a conjuntiva e a esclera. Já a esclerite cursa com dor e pode evoluir para adelgaçamento da esclera, podendo chegar até a escleromalácia perfurante. A Síndrome de Felty acontece quando a AR está associada à esplenomegalia e neutropenia (granulocitopenia). Podemos encontrar também anemia, trombocitopenia, febre, linfonodomegalia e hepatomegalia. Essa associação geralmente ocorre na fase tardia da AR destrutiva. Rayane Aguiar – P8 Artrite Reumatóide Diagnóstico da artrite reumatóide O diagnóstico em um paciente com artrite reumatoide clássica é facilmente realizado. Muitas vezes, o examinador utilizará os itens do quadro abaixo para apresentar a questão. Fator reumatóide: FR é encontrado em 70 a 80% dos pacientes com AR. Assim, cerca de 1/3 dos doentes é soronegativo. Anti-CCP: é o exame com maior especificidade para a AR. Sua negatividade não afasta a confirmação, pois a sensibilidade é muito baixa (cerca de 70%). Tratamento da artrite reumatóide Para que se aperfeiçoe o tratamento das artropatias inflamatórias, é necessária a avaliação periódica da resposta clínica e laboratorial ao esquema terapêutico instituído. Imediatamente após o diagnóstico, uma droga modificadora da doença (DMARDs), principalmente o metotrexato, deve ser prescrita e o tratamento ajustado para atingir a remissão. Essas drogas imunomoduladoras (metotrexato, hidroxicloroquina, sulfassalazina, leflunomida) também têm efeito anti- inflamatório, mas o mais importante é que são capazes de alterar o curso da doença. Por isso, são chamadas de drogas antirreumáticas modificadoras de doença (DMARDs). As drogas de efeito anti-inflamatório (salicilatos, AINES, glicocorticoides e inibidores seletivos da Cox-2) foram as responsáveis pelo melhor controle dos sintomas de dor e inflamação da AR. Portanto, essas drogas controlam os sintomas da doença, mas não alteram o curso da patologia. Os imunossupressores (ciclofosfamida, azatioprina e ciclosporina) são medicamentos prescritos em vasculite reumatoide necrosante ou em casos refratários às DMARDs. Outras drogas que podem ser utilizadas, nesses casos, são os medicamentos biológicos: neutralizadores do TNF-alfa (etanercepte, infliximabe, adalimumabe, golimumabe, certolizumabe pegol), inibidor da interleucina 6 (tocilizumabe), bloqueador da coestimulação do linfócito T (abatacepte), depletor do linfócito B (rituximabe). Importante sobre o tratamento da AR - Iniciar a terapia com DMARD imediatamente! - Os corticosteroides e os anti-inflamatórios não hormonais são muito úteis na doença inicial e nas exacerbações, para aliviar sintomas. Porém, devem ser usados sempre na menor dose e pelo menor tempo possível! - Segundo o Harrison, e na prática clínica, realiza-se a vacinação antipneumocócica e contra a influenza em todos os pacientes devido à terapia de imunossupressão, que, muitas vezes, é necessária. - Não utilizar vacinas de vírus vivos. - Atualmente, não se usa mais D-penicilamina e sais de ouro. Rayane Aguiar – P8 Artrite Reumatóide DMARDs (Drogas Modificadoras da Atividade da Doença): Iniciar o mais breve possível as DMARDs após o diagnóstico com o intuito de diminuir o aparecimento de erosões ósseas e o avanço da incapacidade. Metotrexato: droga de escolha inicial é um imunossupressor antagonista do ácido fólico. A sua escolha deve-se ao fato de ter uma ação mais rápida quando comparada com as demais DMARDs (3 a 6 semanas contra 3 a 6 meses). Deve-se associar ácido fólico para diminuição do efeito tóxico. A melhora clínica máxima pode ser observada após 6 meses de tratamento. Os efeitos colaterais são: teratogênese, estomatite e hepatotoxidade, podendo levar à hepatite crônica e à cirrose. Outras DMARDs sintéticas A hidroxicloroquina e a cloroquina são agentes antimaláricos com efeito imunomodulador desconhecido. Apesar de eficácia inferior, quando comparadas com as demais DMARDs, a vantagem é o menor número de efeitos adversos. Ela é utilizada para tratar a doença precoce e branda. Sulfassalazina: também tem um efeito imunomodulador desconhecido. É mais utilizada em pacientes com doença leve à moderada, em combinação com o metotrexato, por exemplo. Leflunomida: atua sobre a diidroorato redutase e inibe a síntese das pirimidinas; afeta o ciclo celular e inibe a síntese de DNA; inibe as células T e células mononucleares. Pode ser usada em substituição ao metotrexato ou associada a ele. Tem um perfil de toxicidade semelhante ao metotrexato, sendo teratogênica e hepatotóxica. DMARDs biológicas:drogas da classe são: abatacepte (bloqueador da coestimulação do linfócitoT), rituximabe (depletor de linfócito B) e tocilizumabe (bloqueador do receptor de interleucina-6). Em resumo, essas drogas são utilizadas em pacientes que persistem com atividade da doença apesar do tratamento com pelo menos dois esquemas de DMARDs sintéticos. Elas devem ser utilizadas em associação com uma droga sintética, preferencialmente o metotrexato. AINEs – (ibuprofeno, naproxeno, cetoprofeno, indometacina e outros): Os anti-inflamatórios não esteroides agem promovendo analgesia e desinflamação imediata do tecido osteoarticular, por isso são indicados no início do tratamento, pois as drogas modificadoras da doença (DMARDs) demoram de semanas a meses para atuarem na dor e na inflamação. Ação dos AINES Os AINEs inibem a enzima ciclooxigenase (COX) que participa do processo inflamatório. O grande problema é que a COX-1 é responsável pela proteção da mucosa gastroduodenal, da função plaquetária e renal, sem participação na inflamação. Somente a COX-2 é responsável pela produção das prostaglandinas durante a inflamação, além de papel fisiológico com a COX-1 na proteção renal. Os inibidores seletivos da COX-2 são utilizados para pacientes com maior risco de efeitos colaterais gastrointestinais. Indicações de inibidores seletivos da COX-2 - História de úlcera péptica; - Uso de corticoides ou de anticoagulantes; - Idade acima de 65 anos; - Pacientes que necessitam de altas doses de AINEs para controle dos sintomas. Obs.: Quando os inibidores seletivos da COX-2 são utilizados em conjunto com AAS, a vantagem na proteção contra úlcera péptica parece ser anulada. Corticoides: Quando utilizados, eles provocam melhora dos sintomas em doses de 7,5 mg/dia de prednisona. Essa posologia pode diminuir a progressão das erosões ósseas. No entanto, elas podem provocar efeitos de longo prazo como osteoporose. Outra indicação são os pulsos mensais de metilprednisolona em casos sistêmicos graves como a vasculite necrosante. FALHA NA TERAPÊUTICA - Drogas imunossupressoras são drogas utilizadas em casos de manifestações extra- articulares, como na vasculite necrosante. As drogas imunossupressoras são ciclofosfamida, azatioprina, ciclosporina. TRATAMENTO CIRÚRGICO A cirurgia está indicada na AR intratável com deformidades que levam à impotência funcional. A artrodese corrige a subluxação atlanto-axial grave. Já a sinovectomia ou tenosinovectomia com ressecção das proeminências ósseas lesivas aos tendões é indicada para aliviar a dor intratável das articulações de punho, cotovelo e metacarpofalangianas. TRATAMENTO NA GRAVIDEZ: hidroxicloroquina e a sulfassalazina são as DMARDs mais seguras nesse período, mas deve-se ter atenção sobre o seu uso.
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