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LAURA BRAGA – MEDICINA – T9 ARTRITE REUMATOIDE A artrite reumatoide (AR) é uma doença autoimune inflamatória crônica caracterizada por sinovite (inflamação da articulação sinovial) periférica. Sem tratamento, evolui para erosões ósseas com deformidades irreversíveis. Prevalência de 1% na população brasileira adulta. Pico de incidência entre 30 a 50 anos. Acometendo três vezes mais mulheres do que homens. A AR é bastante variável quanto à apresentação clínica, à gravidade e ao prognóstico. Sua forma clínica mais comum é a poliartrite simétrica de pequenas e grandes articulações com caráter crônico e destrutivo, podendo levar a relevante limitação funcional, comprometendo a capacidade laboral e qualidade de vida. FISIOPATOLOGIA O antígeno leucocitário humano (human leukocyte antigen – HLA) é considerado o principal fator genético no desenvolvimento dessa doença. Diversos alelos de HLA-DRB1 vêm sendo associados a AR em populações variadas. Principais fatores de risco para o desenvolvimento de AR foram a presença dos alelos HLA-DRB1 SE (shared epitope – epitopo compartilhado) e a detecção de anticorpos contra peptídeos citrulinados cíclidos (anti-CCP). No entanto, variações fenotípicas e de incidência apontam para fatores ambientais que, além da predisposição genética, contribuem para o surgimento da doença, tais como tabagismo e infecções periodontais. NA APS Os primeiros doze meses do início da doença (AR inicial), especialmente as doze primeiras semanas (AR muito inicial), são consideradas uma janela de oportunidade terapêutica (evita sequelas), enfatizando a importância do diagnóstico e intervenção precoce. A identificação inicial do quadro e o início do tratamento na atenção primária podem resultar em melhor prognóstico. SINAIS E SINTOMAS Artrite (edema articular com dor a palpação/sinais de inflamação) com duração maior que seis semanas. Principais diagnósticos diferenciais com osteoartite, gota e artrite psoriásica. Evolução insidiosa Porém, raramente, alguns pacientes podem apresentar início rápido. Rigidez matinal costuma ter duração maior que 30 minutos. Podendo ser a manifestação inicial da doença. Outras manifestações sistêmicas inespecíficas: fadiga, astenia, febre, mialgia, perda de peso, podem proceder ou acompanhar o quadro articular. AR inicial – clínica mais comum Poliartrite aguda (70%) com sinovite persistente nas mãos (91%) LAURA BRAGA – MEDICINA – T9 Rigidez matinal prolongada (mais de 2 horas) e se < 30 minutos – osteoartrite Acometimento articular da AR costuma ser simétrico e preferencialmente das pequenas articulações das mãos. Metacarpofalangeanas (MCF) e interfalangeanas proximais (IFP); – distais (osteoartrite) Pés (metatarsofalangeanas (MTF) e punhos. Com a evolução da doença podem surgir deformidades articulares irreversíveis. Atrofia interóssea, desvio ulnar e dedos em pescoço de cisne. Mão em Z; Desvio ulnar dos dedos; Desvio radial dos punhos; Subluxação (não desalinha totalmente a articulação). Outras articulações: ombros, cotovelos, joelhos, quadris, tornozelos, temporomandibular e coluna cervical. ACOMETIMENTO DO JOELHO Sinal da Tecla de Piano: devido a sinovite (acúmulo de líquido) ao apertar a patela. LAURA BRAGA – MEDICINA – T9 SÍNDROME DO TUNEL DO CARPO Acompanha a AR devido a compressão do túnel do carpo, levando a inflamação. Sinovite dos punhos – compromete o nervo mediano. Se atentar a pacientes que apresentam a síndrome mas não possuem atividade laboral ou apresentam mas não em intensidade suficiente e além disso, sintomas associados. COLUNA CERVICAL (C1-C2) Subluxação atlantoaxial Mais comum, causa: Dor cervical crônica Risco de lesão medular, sequela neurológica Rastreamento por: raio X da coluna cervical lateral Afastamento >3mm (arco anterior do atlas – dente do axis) - Indicação de artrodese cirúrgicas - fixação Impacção atlantoaxial Segunda mais comum MANIFESTAÇÕES EXTRA-ARTICULARES Linfadenopatia, nódulos reumatoides, vasculite cutânea (vasos sanguíneos), doença intersticial pulmonar, serosite, espisclerite e escleromalácia perfurante. Ocorrem especialmente em pacientes com doença mais grave e de pior prognóstico. Cometimentos apenas articulares são mais comuns. NODULOS REUMATOIDES Presente em 25% dos pacientes com AR; Presente na face extensora dos cotovelos; Associação com FR (fator reumatoide) positivo; Nodulações indolores; Múltiplas e profundas na pele; Infiltrações linfociticas. VASCULITE Pequeno calibre: Infarto periungueal – microvasculatura. LAURA BRAGA – MEDICINA – T9 Médio calibre: Ulcerações crônicas, vasculite necrotizante. Associado a alta titulação de: FR + e anti-CCP. Paciente pode apresentar aterogênese acelerada, sem necessariamente vasculite. PERICARDITE Maioria dos pacientes assintomáticos; Derrame pericárdico – achado em ecocardiograma. DERRAME PLEURAL Raramente volumoso – toracocentese com glicose baixa e estéril. SÍNDROME DE SJOGREN Pode estar associada ou não a AR e ao lúpus. Acometimento oftalmológico mais comum da AR. Síndrome seca: Xerostomia (língua geográfica) e Xeroftalmia (córnea não lubrificada). Acarreta episclerite (mais localizada, área superficial da esclera); esclerite (área vascularizada, levando a dor). Complicação: Escleromalácia perfurante: afinamento da esclera – consegue observar diretamente os vasos da coroide. SINDROME DE FELTY AR + Neutropenia + Esplenomegalia Indica predisposição a infecções graves; AR de longa data, grave e com altos títulos de auto anticorpos. DIAGNOSTICOS DIFERENCIAIS As articulações que não costumam ser comprometidas na AR, e seu comportamento sugere diagnóstico alternativo (osteoartrite, por exemplo): Interfalangeanas distais (IFD); Primeira carpometacarpiana (CMTC) e Primeira metatarsofalangeana (MTF). LAURA BRAGA – MEDICINA – T9 EXAME FÍSICO O exame físico deve incluir a cuidadosa palpação de todas as articulações potencialmente acometidas na AR, em busca de dor, edema ou calor. O teste do aperto (Squeeze test) é um teste com elevada sensibilidade para avaliar a dor de maneira mais objetiva, sendo referida após o examinador comprimir as articulações metacarpofalangeanas ou metatarsofalangeanas. EXAMES COMPLEMENTARES Na suspeita de AR deve-se solicitar: FR – se negativo complementar investigação com anti-CCP, quando disponível); PCR; Velocidade de Hemossedimentação (VSG/VHS). Exames laboratoriais normais não excluem o diagnóstico em pacientes com sintomas sugestivos de AR. Para complementar a avaliação diagnóstica e prognóstica, deve-se solicitar raio-X. Maõs (incidências AP + Nogaard) Pés (incidências AP + Perfil) Punhos (incidência AP) O raio-X de coluna cervical também está recomendado, visto que esses pacientes tem maior risco de subluxação atlantoaxial. Os achados radiográficos incluem: Inicialmente: Aumento de partes moles e osteopenia justa- articular. Lesões mais características: Redução do espaço articular e erosões ósseas – em casos mais avançados. Visando o início do tratamento com metotrexato, solicitar hemograma, plaquetas, TGO, TGP, anti-HCV, HbsAg, anti-HIV, creatinina e raio-X de tórax. FATORES DE MAU PROGNÓSTICO Alguns aspectos clínicos e laboratoriais estão relacionados à progressão mais rápida da destruição articular. Sexo feminino; Tabagismo; Baixo nível socioeconômico; Início da doença em idade mais precoce; FR ou anti-CCP em títulos elevados; Provas inflamatórias (velocidade de eritrossedimentação ou proteína C reativa) persistentemente elevadas; Grande número de articulações edemaciadas; LAURA BRAGA – MEDICINA – T9 Manifestações extra-articulares; Presença precoce de erosõesna evolução da doença. DIAGNOSTICO O diagnóstico de AR deve ser feito considerando-se achados clínicos e exames complementares. O paciente deve ter pelo menos uma articulação com sinovite clínica (edema articular) que não seja melhor explicado por outra doença. Deve-se excluir dessa avaliação as articulações interfalangeanas distais (IFD), primeira carpometacarpiana (CMTC) e primeira metatarsofalangeana (MTF). Os critérios classificatórios de AR aumentam a sensibilidade do diagnóstico e permitem identificar os casos mais precocemente. Pacientes com pontuação ≥ 6 apresentam diagnóstico de AR. Lembrar que pacientes podem preencher esses critérios mesmo sem ter artrite reumatoide, portanto a avaliação de diagnósticos diferenciais é imprescindível. LAURA BRAGA – MEDICINA – T9 TRATAMENTO MEDICAMENTOSO O tratamento medicamentoso da AR deve ser iniciado o mais precocemente possível após o diagnóstico ser estabelecido, idealmente nas primeiras 12 semanas, uma vez que a instituição precoce de medicamentos modificadores do curso da doença (MMCDs) previne danos estruturais (erosões), melhorando a capacidade funcional. Em pacientes com critérios classificatórios de AR (≥ 6 pontos) nos quais foram excluídos os outros diagnósticos diferenciais, sugere-se que o médico da APS inicie o tratamento com metotrexato enquando o paciente aguarda atendimento na atenção especializada. Caso o paciente apresente contraindicação ao uso do metotrexato ou artrite indiferenciada (sem fechar os critérios diagnósticos para AR, porém com forte suspeita) sugere-se o início do tratamento com animaláricos (hidroxicloroquina ou cloroquina) na APS. Os antimaláricos são medicações menos potentes, e portanto, em situações que contraindicam MTX, o especialista provavelmente substituirá a medicação por outro MMCD (como leflunomida ou sulfassalazina). Drogas imunomoduladoras (bloqueiam a resposta imune/inflamatória do paciente). O calendário vacinal deve ser atualizado antes do início do tratamento com medicações imunossupressoras. A vacinação com imunobiológicos obtidos por bactérias ou vírus vivos atenuados (febre amarela, tríplice viral (sarampo/caxumba/rubéola), tetra viral (sarampo/caxumba/rubéola/varicela), poliomielite oral, BCG, varicela e rotavírus, são contraindicados em pacientes com uso de imunossupressores. Além disso, a principal causa de morte de pacientes com AR são as doenças cardiovasculares. A identificação e o controle de risco dos fatores cardiovasculares devem fazer parte da rotina assistencial dos pacientes com AR. O incentivo à cessação do tabagismo tem papel fundamental. Pacientes tabagistas têm pior prognóstico e resposta terapêutica inferior ao MMCDs quando comparados aos pacientes não tabagistas. TRATAMENTO SINTOMATICO Na evidência de dor e edema, sugere-se: Prednisona 10mg/dia e ou anti-inflamatório não esteroide (Ibuprofeno até de 8/8h, se necessário). Pode-se prescrever um analgésico simples (Paracetamol/Dipirona) para dor. Dividir a dose de prednisona em duas tomadas diárias (minimizar os sintomas de rigidez matinal). Se o paciente persistir sintomático, aumentar dose de prednisona até 15mg/dia. Deve-se buscar a menor dose pelo menor tempo possível para alívio sintomático. O corticoide e/ou anti-inflamatório geralmente é necessário por cerca de 1 a 2 meses (começo da ação do MMCDs). Se necessário manter corticoide por mais de 3 meses, sugere-se complementar cálcio (dose individualizada de acordo com ingesta do paciente a fim de completar ingesta de 1200 mg/dia) e vitamina D (800 UI/dia). LAURA BRAGA – MEDICINA – T9 A medida que ocorre remissão dos sintomas, o corticoide deve ser reduzido escalonadamente (por exemplo: 2,5mg a cada 2/3 semanas). Medicações Modificadoras do Curso da Doença. Algumas situações de maior risco para eventos adversos com o início do MTX podem ser identificadas na avaliação inicial. Portanto, não recomendamos iniciar na APS o uso de MTX em pessoas com: Citopenias isoladas (anemia, leucopenia ou trombocitopenias) ou bicitopenias; TGO/TGP acima do limite superior de normalidade; Doença Renal Crônica (TFG entre 30 e 60 ml/min/1,73m2); Hepatites B ou C crônica; Neoplasias. ORIENTAÇÕES PARA O USO DE METOTREXATO LAURA BRAGA – MEDICINA – T9 TRATAMENTO – ACOMPANHAMENTO Em caso de falha da monoterapia inicial (atividade da doença moderada a alta após 3 meses de tratamento otimizado em doses plenas) costuma-se substituir o MMCD sintético por outro MMCD sintético em monoterapia ou associar dois MMCDs sintéticos. Após 6 meses com pelo menos dois esquemas diferentes e atividade de doença moderada ou alta, inicia-se os MMCD biológicos. LAURA BRAGA – MEDICINA – T9 Anti-TNF alfa (certolizumabe pegol, golimumabe, infliximabe, etanercepte ou adalimumabe, abatacepte, tocilizumabe e rituximabe. ENCAMINHAMENTO PARA SERVIÇO ESPECIALIZADO Sugere-se encaminhamento para serviço especializado em reumatologia pacientes com: Diagnóstico de artrite reumatoide (estabelecido com pontuação ≥ 6 pelos critérios classificatórios); Alta suspeita de artrite reumatoide. Definida por presença de artrite (sinovite/edema identificado pelo médico) de 3 ou mais articulações associada a: Rigidez matinal por mais de 30 minutos; e/ou Teste do aperto (teste do squeeze) positivo.
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