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Abdome agudo vascular Introdução Dor abdominal intensa de origem vascular, sendo uma urgência não-traumática grave por redução súbita do fluxo sanguíneo intestinal. A dor é difusa e mal definida, apresentando desproporção entre a dor e o exame físico. Mais comum em idosos. Fisiopatologia As três principais síndromes de isquemia intestinal são: ● Isquemia colônica (70-75%); ● Isquemia mesentérica aguda (20-25%): - Oclusão da AMS por êmbolo (50%) ou trombo (oclusão arterial) (15-25%); - Trombose da VMS (oclusão venosa) (5%); - Isquemia mesentérica não-oclusiva (vasoespasmo arterial) (20-30%). ● Isquemia mesentérica crônica (5%). Essa lesão intestinal pode se dar por dois mecanismos: ● Hipoperfusão com hipoxia: o comprometimento da oferta de oxigênio se dá com uma redução do fluxo intestinal maior que 50%. O intestino consegue compensar até 75% de hipoperfusão por até 12h sem dano substancial, pelo aumento da extração de oxigênio e circulação colateral. Se houver manutenção, tem-se vasoconstrição e redução do fluxo colateral. ● Reperfusão: a lesão se dá por ação de espécies reativas de oxigênio. Principais fatores de risco: ● Doenças crônicas; ● Tabagismo; ● História recente de evento cardiovascular; ● História prévia de embolismo; ● Distúrbios de coagulação; ● Uso de anticoncepcional (estrogênio); ● Má formação arteriovenosa; ● Medicações vasoconstritoras. Isquemia colônica O cólon recebe menor suprimento sanguíneo em comparação ao resto do TGI e isso faz dele o segmento mais acometido. Existem três mecanismos principais: ● Isquemia colônica não oclusiva (95%); ● Oclusão arterial por êmbolos ou trombos; ● Trombose de veia mesentérica. A maioria das oclusões por êmbolos ou trombos cursa com isquemia do ID concomitante. É mais prevalente em mulheres e deve ser suspeitada em pacientes com dor em abdome inferior e diarreia ou hematoquezia. Isquemia mesentérica aguda A oclusão da AMS pode ocorrer por êmbolos ou trombos. A oclusão por êmbolos é mais comum e costuma ter melhor prognóstico, geralmente, poupando o delgado. Os êmbolos são provenientes de trombos do AE, VE, valvas cardíacas ou aorta proximal, tendo como fator de risco IAM, fibrilação atrial ou estenose mitral. A oclusão por trombos ocorre devido à doença intrínseca da camada íntima dos vasos, sendo a aterosclerose o principal fator. Pode estar associado a doenças do tecido conectivo, trauma abdominal, sepse ou dissecção de aorta. Pode ser não oclusiva, também conhecida como Vasoconstricção mesentérica. É decorrente de um grave e prolongado vasoespasmo associado ao uso de drogas ou doenças sistêmicas graves, como choque, ICC, sepse, hipóxia grave. A ICC é a etiologia isolada mais frequente. A trombose da VMS é a principal causa de isquemia de delgado em pacientes jovens com doenças cardiovasculares. A obstrução aguda do fluxo venoso causa sequestro do fluido intestinal, hipovolemia e hemoconcentração, gerando vasoconstricção arteriolar e redução da perfusão intestinal. Pode ser primária ou secundária se tiver associada a algum dos fatores da Tríade de Virchow (hipercoagulabilidade, estase venosa e lesão endotelial). Isquemia mesentérica crônica É caracterizada pela angina mesentérica ou intestinal nas primeiras horas após alimentar-se. Relacionada a aterosclerose. Há formação de vasos colaterais. Sintomático quando duas ou mais artérias comprometidas. Existem duas explicações para a relação entre a dor e as refeições: - Desequilíbrio entre demanda metabólica e fluxo sanguíneo esplâncnico; - Hipoperfusão intestinal: desvio do sangue para o estômago. Clínica As formas de apresentação e gravidade dependem de certos fatores: ● Leito acometido (arterial ou venoso); ● Grau de obstrução; ● Duração; ● Circulação colateral; ● Extensão das vísceras acometidas. Intensidade poder ser: ● Branda (isquemia mesentérica não oclusiva); ● Intensa (êmbolos ou trombos). Localização pode ser: ● Epigástrica ou mesogástrica: território da AMS; ● QI: território da AMI; ● Isquemia colônica: geralmente no lado esquerdo. Pode variar desde um quadro súbito (êmbolos ou trombos em território arterial) a quadros de angina abdominal crônica (trombose da VMS), além de apresentar sintomas variáveis como: ● Náuseas e vômitos; ● Diarreia e constipação. Dor abdominal referida é desproporcional ao exame físico. A tríade da isquemia mesentérica crônica consiste em: ● Dor abdominal pós-prandial; ● Aversão a comida; ● Perda de peso. No exame físico, inicialmente o abdome pode estar normal, com dor leve a moderada. Há peristalse normal ou aumentada como reação inicial à hipóxia. Com a progressão da isquemia, tem-se: ● Distensão abdominal; ● Timpanismo aumentado. Sinais de choque e peritonite generalizada são achados tardios e indicam prognóstico ruim. Fezes sanguinolentas ocorrem se tiver necrose. Diagnóstico Exames laboratoriais Pode haver: leucocitose em 75% dos casos, hemoconcentração, acidose metabólica, elevação do lactato, fosfato e amilase sérica (elevações menor que na pancreatite). Solicitar gasometria arterial. Se houver necrose, há elevação de LDH, CPK, Fosfatase Alcalina (fração intestinal). Exames de imagem Devem ser solicitados nos casos de pacientes estáveis. 1ª escolha: TC com contraste de abdome. Nos casos de trombose da VMS, pode-se ver: estenose ou oclusão de dois ou mais vasos mesentéricos; vasos colaterais dilatados; espessamento e realce da parede intestinal; ingurgitamento da VMS; trombo na VMS. A angiografia é o exame padrão ouro na isquemia mesentérica aguda e crônica, porém muitas vezes não é necessária devido ao diagnóstico pela TC. Sua vantagem é que pode ser usada de forma terapêutica. Também podem ser encontrados: oclusão abrupta da AMS por êmbolos (sinal do menisco); estreitamento na origem dos vasos mesentéricos; irregularidade nos ramos intestinais; espasmos das arcadas arteriais; oclusão e trombos. Qualquer paciente com dor abdominal aguda e acidose metabólica tem isquemia intestinal até que se prove o contrário! Outros exames disponíveis USG com Doppler: pode ser feito como exame inicial nos casos de isquemia mesentérica crônica. É menos utilizado que a TC devido as suas desvantagens: examinador-dependente, interposição gasosa. Colonoscopia: pode ser solicitada nos casos de isquemia colônica para confirmação diagnóstica. Deve ser feito com insuflação mínima para evitar distensão excessiva e somente nos casos estáveis, sem sinais de peritonite ou evidência de isquemia irreversível. Tratamento Clínico O manejo inicial inclui monitorização cardíaca e dos parâmetros ventilatórios, acesso venoso com reposição individualizada, correção de distúrbios hidroeletrolíticos, analgesia e antibiótico venoso (evitar translocação bacteriana) de amplo espectro. Os anticoagulantes são utilizados nos casos de oclusão arterial ou venosa e em alguns casos de isquemia mesentérica não oclusiva para evitar a formação de trombos e sua propagação, com exceção de casos de sangramento ativo. A papaverina é um vasodilatador e pode ser utilizada nos casos de vasoconstricção, colocado diretamente na AMS. Cirúrgico Pode ser necessário ressecção das alças isquemiadas. A exploração cirúrgica está indicada nos casos de: - Sinais de irritação peritoneal; - Sinais de infarto intestinal em imagem; - Sinais de perfuração; - Dúvida diagnóstica. Nos casos de oclusão arterial mesentérica: Na isquemia mesentérica crônica geralmente o tratamento é conservador visando a prevenção da progressão da aterosclerose com terapia antiplaquetária e anticoagulação nos casos de trombos. A revascularização é indicada nos sintomáticos com estenose importante com o objetivo deprevenir infarto intestinal. Revisando a anatomia Tronco celíaco: irriga o intestino primitivo anterior, até a 2ª porção do duodeno. AMS: intestino primitivo médio. 2ª porção do duodeno até metade do colón transverso. AMI: intestino primitivo posterior. Irriga o colón sigmoide e reto. Tronco celíaco, AMS, e AMI se formam através da aorta abdominal. Êmbolos Vias colaterais mais importantes do TGI: artéria marginal de Drummond + Arcada de Riolan (não está presente em todo mundo. Conecta AMS com AMI). Veia esplênica + VMS: formam a veia porta. Áreas críticas de isquemia: ângulo esplênico do cólon (zona de Griffins) + junção retossigmóide (zona de Sudeck).