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A Organização do trabalho escolar

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O68 A organização do trabalho escolar [recurso eletrônico] : uma
oportunidade para repensar a escola / Organizadores,
Monica Gather Th urler, Olivier Maulini ; tradução: Fátima
Murad ; revisão técnica: José Fernando B. Lomônaco. –
Dados eletrônicos. – Porto Alegre : Penso, 2012.
 Editado também como livro impresso em 2012.
ISBN 978-85-65848-07-7
 1. Educação. 2. Gestão educacional. 3. Organização das
 instituições educacionais. I. Th urler, Monica Gather. II. Maulini,
 Olivier.
CDU 37.091
Catalogação na publicação: Ana Paula M. Magnus – CRB 10/2052
P ara aprender é preciso trabalhar. E para trabalhar é preciso que o traba- lho seja organizado. Disciplinas, cur-
sos, ciclos, séries, programas, aulas, horá-
rios, lições: a escola recorta o espaço e o 
tempo; organiza o trabalho dos professo-
res1 que, por sua vez, organizam o dos alu-
nos. Ao final, é na interação que advêm as 
aprendizagens, mas no momento e nas 
condições produzidas pelo trabalho de fun-
do que pré-estrutura a relação.
Por que questionar a organização do 
trabalho escolar? Porque esse é um forte 
determinante do que a escola produz, por-
que subentende o trabalho que está sendo 
feito e geralmente fica de fora das reformas 
e dos debates sobre as melhores maneiras 
de ensinar. Sua opacidade é sua força: ela 
cria a ordem de coisas na qual se apoia 
posteriormente a parte visível das ativida-
des. O projeto deste livro é apresentar um 
panorama do estudo empírico do trabalho 
escolar para com preender e conceitualizar 
as relações entre a organização do ensino e 
as forças que podem orientar ou contrariar 
sua evolução.
A OrgAnizAçãO, COnCeiTO 
e PrOblemA
Conceitualmente, a organização é, an-
tes de tudo, uma forma herdada, ancorada 
na história, nos costumes, nas leis, nos mu-
ros e nos móveis dos estabelecimentos. É 
“uma estrutura hierarquizada, que dispõe 
de regras de trabalho precisas e que permi-
te padronizar, coordenar e planejar ativida-
des” (Alter, 2002, p. 131). Mas é também 
um processo, uma ação, um trabalho, aque-
le “que consiste em empregar racionalmen-
te meios para obter um resultado” (Alter, 
2002, p. 151). Em um coletivo, cada opera-
dor organiza seu trabalho, mas alguns têm 
introdução
a organização do trabalho escolar: 
pensá-la para fazê-la evoluir
Monica Gather Thurler
Université de Genève
Olivier Maulini
Université de Genève
12 Monica Gather Thurler e Olivier Maulini
ainda o poder de estruturar e de prescrever 
a tarefa dos outros. A organização do traba-
lho depende, ao mesmo tempo, da atividade 
cognitiva das pessoas e da racionalização da 
atividade comum mediante serviços ou uma 
hierarquia criados para esse fim.
A organização é, simultaneamente, a 
ordem e a mudança, o princípio ativo que 
mantém e transforma a dinâmica das inte-
rações: é a parte do trabalho que permite o 
trabalho2, que o “fecha em si mesmo” (Mo-
rin, 1977, p. 136), que o torna autônomo, 
mas também o limita em suas ambições. “A 
organização do trabalho é uma construção 
social, o resultado de um outro trabalho, 
chamado de trabalho de organização” (Du-
jarier, 2006, p. 49). Portanto, transformar a 
organização do trabalho é, stricto sensu, 
transformar as condições de produção do 
trabalho, ou ainda, produzir uma outra 
maneira de produzir a atividade humana 
de produção. Que o homem produza a si 
mesmo pelo trabalho de formação comple-
ta a reflexão e mostra que não se mexe im-
punemente nas maneiras como se organiza 
o trabalho nos estabelecimentos de ensino.
Mais precisamente, este livro nasceu de 
um problema, em outras palavras, de uma 
meta e de uma dificuldade, de uma intenção 
e de um obstáculo resistente à sua realiza-
ção. A meta, a intenção é a luta contra o fra-
casso escolar: os levantamentos internacio-
nais destes últimos anos (OCDE, 2001) 
mostraram que alunos saem da escola sem 
ter adquirido os saberes necessários para vi-
ver dignamente, conseguir um emprego, co-
nhecer seus deveres, exercer seus direitos; 
não é possível aceitar isso. E o obstáculo, a 
dificuldade está no fato de que os sistemas 
educacionais funcionam geralmente como 
se a exclusão não fosse o problema mas a 
solução (Hutmacher, 1993; Crahay, 1996; 
Draelants, 2006): o aluno que não “acom-
panha” deve refazer o programa, repetir o 
ano, mudar de curso, em suma, sair do gru-
po que não pode mais integrá-lo.
Tirar alguém da célula-classe é, literal-
mente, “desclassificá-lo”, colocá-lo à mar-
gem de seus colegas, mostrar-lhe sua dife-
rença, transformá-la em desigualdade, di-
minuir o grau de exigência que se espera 
dele, daquilo que se considera que é possí-
vel ensinar-lhe – sentimento de incapaci-
dade que ele próprio pode acabar incorpo-
rando. Ao mesmo tempo, essa maneira de 
controlar é difícil de ser modificada, mes-
mo pelos professores que a julgam injusta 
ou duvidam de sua eficácia.
Diante dessa realidade, não se pode di-
zer que a escola e os professores tenham fi-
cado de braços cruzados. Ao contrário, con-
tam-se numerosas iniciativas que encontram 
suas raízes mais ou menos longinquamente 
no passado. Citemos os seguintes, na desor-
dem, justamente sem pré-julgar a maneira 
como se organiza o conjunto:
– A consideração da atividade dos alu-
nos no processo de aprendizagem, 
modalidades de gestão de classe al-
ternando ou combinando lições e 
pesquisas, exercícios e projetos, tra-
balho pessoal e coletivo, regras im-
postas e conselho cooperativo.
– O reconhecimento da heterogenei-
dade social e cultural por uma peda-
gogia diferenciada, apoios direcio-
nados e moduláveis, adaptados às 
necessidades de pessoas e de grupos 
constituídos provisoriamente.
– O questionamento da formação por e 
para as disciplinas incitando a criar 
dispositivos mistos, pluri ou interdisci-
plinares: atividades-padrão, centros de 
interesse, pesquisas documentais, tra-
balhos pessoais padronizados, planos 
de trabalho, itinerários pedagógicos.
– O remanejamento de planos de estu-
dos, a ênfase dada a objetivos mais 
A organização do trabalho escolar 13
amplos, uma lógica de imersão e de 
progressão em espiral, algumas ve-
zes sobre currículos concebidos em 
termos de integração de saberes em 
práticas e competências duradouras.
– A revisão dos prazos, dos modos de 
controle das aprendizagens e de orien-
tação, o desenvolvimento da avaliação 
formativa, provas criteriosas, portfó-
lios, comunicação famílias-escola.
– O trabalho de equipe dos professo-
res, uma maior responsabilização 
coletiva em forma de gestão de ci-
clos, de acompanhamento colegiado, 
de conselhos de professores, de ava-
liação pactuada.
– A delegação de autonomia aos esta-
belecimentos escolares, a incitação a 
organizar o trabalho no nível local, 
em função das necessidades e dos 
recursos existentes, da capacidade e 
da vontade dos professores (e dos 
diretores) de inovar nesse nível, de 
levar mais em conta as necessidades 
dos alunos e de transformar suas 
práticas a fim de assegurar a pro-
gressão de todos.
– A tendência declinante de controlar 
o trabalho dos professores e dos alu-
nos em função dos resultados alcan-
çados na forma de injunção e de 
medidas externas (definição de pa-
drões, controle da qualidade, pres-
crições quanto à organização de 
programas e horários, submissão 
dos estabelecimentos à obrigação de 
prestar contas, etc.).
– A formação de professores para um 
ofício que pode se transformar con-
tra sua vontade ou sob seu impulso, 
de maneira coerente ou por tensões 
e contradições das quais só podem 
se livrar pensando a maneira como 
trabalha e se organiza a instituição.
Pois os níveis de mudanças não são 
todos equivalentes. Pode-se imaginar que a 
organização celular em classes, cursos e sé-
ries será a última a resistir, não somente 
porque é antiga e bem ancorada, mas, so-
bretudo, porque as outras mudanças são 
tanto melhor aceitas na medida em que o 
modo principal de regulação não é ele pró-
prio ameaçado.
A regulagem dos fluxos pela repetên-
cia e separação de turmas – o que foi com-
parado a um mecanismode “destilação 
fracionada” – não contribui somente para 
reagrupar e isolar os alunos em dificulda-
de. Ela condiciona o trabalho dos profes-
sores, seja porque o esforço consentido 
para ajudar os mais fracos a progredir 
pode ser aniquilado no final do ano, seja 
porque que esse prazo incita a “seguir o 
programa”, tornando cada aluno – e ape-
nas ele – responsável por aproveitar ao 
máximo o que lhe é ensinado. A questão 
que nos colocamos nesta obra coletiva 
pode, assim, parecer paradoxal, mas ela 
apenas expressa a complexidade de uma 
mudança de paradigma: se a forma como 
o trabalho escolar é organizado cria obs-
táculo à pedagogia diferenciada, será que 
a organização desse trabalho não é uma 
alavanca difícil de acionar, mas poderosa, 
importante de questionar?
TrAbAlhAr nA esCOlA: 
umA duPlA evOluçãO
Sabe-se que não basta falar de “colégio 
único” ou de “ciclos de aprendizagem”, nem 
de cooperação entre professores, de projeto 
de estabelecimento ou de controle da qua-
lidade para que a organização da escola 
seja ipso facto menos seccionada, mais fle-
xível, mais compatível com uma pedagogia 
diferenciada. Quando as boas intenções 
14 Monica Gather Thurler e Olivier Maulini
terminam em ficções, acaba-se por rejeitar 
a ficção e a intenção (Dubet e Duru-Bellat, 
2000). Para aquém e para além das metas, é 
preciso ter meios, recursos, ideias e compe-
tências que permitam conduzir melhor as 
aprendizagens, regulá-las de forma diferen-
te, de maneira mais fina, melhor direciona-
da, hierarquizando os objetivos e variando, 
se necessário, as progressões. Vemos antes 
e depois reformas de estruturas, ali onde 
elas existem ou onde têm dificuldade de se 
instaurar verdadeiramente.
entre gestão de classe e 
comando do sistema
Primeiro, o depois. Pode-se decretar 
um ciclo e não mudar nada naquilo que or-
ganiza fundamentalmente o trabalho dos 
alunos e dos professores. O novo espaço- 
-tempo nada mais é, então, que a soma das 
séries anteriores, a justaposição de classes 
homogêneas que cada titular conduz sozi-
nho durante um ano e de onde retira os 
elementos piores para enviar um grupo “de 
nível” ao colega da série seguinte. Essa ló-
gica linear prolonga a que pode prevalecer 
nas próprias classes, quando se julga que o 
curso da aprendizagem segue o do ensino, 
o encadeamento regular dos capítulos do 
programa, das páginas do livro, das lições, 
dos exercícios e das recitações.
Se “a indiferença às diferenças”, segun-
do a expressão feliz de Bourdieu (1966), é a 
norma no interior de um ano, se tudo deve 
ser aprendido no mesmo ritmo e na mes-
ma ordem, sem hierarquia de prioridades, 
o ciclo longo não tem nenhuma utilidade: 
ele fica sujeito inclusive ao processo de re-
tardar o prazo, de deixar que se acumulem 
lacunas proporcionais ao tempo passado 
sem regular. A inovação só se torna um re-
curso se os professores estão concentrados 
em uma única série, se eles encontram os 
meios de se acomodar a – ou mesmo tirar 
partido – de uma certa heterogeneidade. 
Comunidades de aprendizagem, pedagogia 
interativa, classe cooperativa, trabalho de 
grupos, atividades-padrão, projetos, conse-
lhos, situações-problema, sequências didáti-
cas, avaliação formativa, ensino mútuo, tu-
torado, fichários, contratos, certificados, pa-
dronizações, planos de trabalho, ateliês, etc.: 
foi na e pela renovação da “gestão de classe” 
(Dupriez e Dumay, 2006; Fijalkow e Nault, 
2002; Nault e Fijalkow, 1999) que o trabalho 
escolar evoluiu, em parte.
Reunir em vez de separar depende, sem 
dúvida, de grandes princípios e de pequenos 
gestos repetidos milhares de vezes, de uma 
sutil alquimia entre desejo de aprender e 
projeto de ensinar, relações sociais e encon-
tro de subjetividades, vontade implacável de 
elevar o nível e recusa da exclusão. É tam-
bém questão de organização: visto que o 
professor não pode se formar em lugar dos 
alunos, ele deve se empenhar em organizar 
situações, procedimentos, dispositivos, em 
suma, as condições coletivas de um trabalho 
fecundo. O paradoxo da lição é que o audi-
tório trabalha geralmente menos que o pro-
fessor: ele ouve em vez de ler, espera em vez 
de procurar, deixa ao orador o essencial da 
atividade. Repartir o trabalho de outra ma-
neira é envolver os alunos nas práticas inte-
lectuais, no processo de pesquisa, de reda-
ção, de comunicação, de seleção e de com-
paração das informações. É fazê-los entrar 
ativamente na razão gráfica (Goody, 1979) 
não “dando” uma aula a pegar ou a largar. 
Como levar em conta necessidade se, simul-
taneamente, visar os mesmos objetivos para 
todos? “É a partir dessa pergunta e somente 
dela que é legítimo organizar o trabalho es-
colar” (Meirieu, 2004, p. 115).
Pode-se transpor o raciocínio para 
aquém da classe e do ensino. Os sistemas 
educacionais são os herdeiros de uma lógi-
A organização do trabalho escolar 15
ca burocrática na qual o trabalho de baixo 
é regulado de cima por uma convergência 
de normas e de prescrições. O ofício de 
aluno (Perrenoud, 1994) é colocado sob o 
controle do professor, mas não se deve es-
quecer que ele próprio é submetido a um 
conjunto de exigências e de injunções que 
pré-estruturam sua ação. É bem possível 
que o poder dos professores sobre a ativi-
dade das classes oculte o fato de que seu 
próprio trabalho é sobredeterminado. Res-
ta-nos compreender melhor se, no fim das 
contas, ele é antes pouco dominado ou, ao 
contrário, falsamente liberado… É a ambi-
guidade das “anarquias organizadas”, difí-
ceis de entender, tanto em suas causas 
quanto em seus efeitos.
A experiência e a pesquisa mostraram 
que o poder real não é sempre e tão somen-
te descendente, que a base administrada 
tem sua margem de manobra e que pode – 
conscientemente ou não, com o conheci-
mento ou não da hierarquia – aproveitar 
sua margem de liberdade para fazer mais, 
menos ou diferente do que lhe é explicita-
mente solicitado (Crozier e Friedberg, 
1977; Barthassat, Capitanescu Benetti e 
Gather Thurler, 2007). Mas é justamente 
esse tipo de constatação que vem justificar, 
na escola como em outras organizações, 
modelos alternativos de gestão.
Se a competência qualifica o distancia-
mento entre a prescrição e o trabalho real, 
se as aprendizagens visadas dependem tan-
to (se não mais) de iniciativas locais quanto 
de diretrizes anônimas, se, enfim, é mais 
importante atingir os objetivos do que apli-
car rigorosamente um procedimento im-
posto, então é preciso comandar o sistema 
subordinando as modalidades às finalida-
des, regulando os meios pelos resultados 
efetivamente observados. Também aqui, a 
escola pode querer se reorganizar no inte-
resse dos alunos, mas igualmente dos pro-
fessores que padecem menos do trabalho 
em si do que da distância entre a atividade 
desejada e a atividade realmente realizada, 
da contradição entre os valores estabeleci-
dos pela instituição (igualdade, emancipa-
ção, direito à instrução) e um sentimento 
crescente de impotência diante dos alunos 
que não seguem o curso normal do ensi- 
no (Blanchard-Laville, 2001; Rayou e Van 
Zanten, 2004).
Embora, e sobretudo, ela não seja una-
nimidade, há uma relação entre o trabalho 
que o professor efetua e o da noosfera que 
pretende torná-lo mais justo, mais eficaz ou 
gratificante. Padrões nacionais ou internacio-
nais, planos de estudos-padrão, referenciais 
de objetivos, controle da qualidade, avalia-
ções externas, autonomia e conselhos de esta-
belecimentos, projetos de escolas, parcerias, 
trabalho de equipe, profissionalização dos 
professores e terceirização de sua formação: o 
trabalho escolar evolui igualmente fora da 
classe, em um segundo nível, em primeiro lu-
gar porque o ministério, a sala dos professo-
res ou o conselho de direção são também lu-
gares de transformação do mundo e, em se-
gundo lugar, porque as práticas pedagógicas 
que formam ao final os alunos são articula-
das à evolução das relações de poder no resto 
da instituição (Gather Thurler, 2000a; Barrè-
re, 2002; Marcel, 2004).
Nada indica,porém, que todas as mu-
danças vão na mesma direção. E os pró-
prios professores podem ter hesitações. 
Menos imposições para agir aqui e agora 
significa também mais contas a prestar em 
outro lugar e em um segundo momento. 
Como navegar entre a super e a sub regu-
lação, entre igualdade de fins e adequação 
dos meios? Também aqui por “uma orga-
nização do trabalho ao mesmo tempo 
mais transdisciplinar e melhor adaptada 
às necessidades dos alunos” (Lessard e 
Tardif, 2001).
16 Monica Gather Thurler e Olivier Maulini
O escalonamento do ciclo: 
um ponto de dificuldade
A organização do trabalho está, por-
tanto, no cruzamento de duas evoluções: a 
da gestão de classe, que procura acabar com 
as divisões e a do comando do sistema, que 
redistribui os papéis na instituição. A passa-
gem das séries aos ciclos seria apenas um 
problema entre outros ou um ponto de difi-
culdade? Uma simples formalidade ou o tes-
te de uma nova maneira de formar (Maulini 
e Perrenoud, 2005; Perrenoud, 2002)? Isso 
depende dos sistemas educacionais, de suas 
normas de excelência, de seus critérios de 
justiça, de escolhas políticas e de um contex-
to social que condicionem historicamente as 
práticas dos professores. Mas está ligado 
também a essas próprias práticas, às inten-
ções e ao sentimento de competência de que 
podem se valer os profissionais – individu-
almente ou coletivamente – para denunciar 
os efeitos de propaganda e reclamar mudan-
ças verdadeiras.
A inovação é um fenômeno complexo 
precisamente por essa razão: ela deve se 
antecipar às práticas das quais depende em 
parte, levar em conta o estado da arte e 
atribuir-lhe, ao mesmo tempo, a capacida-
de e o desejo de proceder de maneira dife-
rente (Alter, 2000, 2002; Hall e Hord, 2001). 
Isso deixa duas maneiras de preservar a or-
dem escolar existente: decretar os ciclos e 
garantir aos professores que eles já são 
competentes; não empreender nada en-
quanto não se conhecer cada uma das eta-
pas que conduzem às novas práticas. De 
fato, é entre esses dois polos – no cruza-
mento de imposições e recursos – que se 
negociam a amplitude e a distribuição das 
mudanças. O trabalho que os professores 
devem fazer e o que querem fazer são in-
terdependentes, e todo trabalhador pode 
ser ambivalente quanto a isso: a ordem her-
dada limita sua liberdade, mas também re-
duz a incerteza a assumir. É preciso ter for-
tes convicções para criar para si problemas 
que o status quo atribui ao sistema, isto é, a 
parte de trabalho pela qual ninguém é res-
ponsável nominalmente.
Nós nos colocamos, neste livro, do 
lado das práticas inovadoras, a fim de en-
tender como se reorganiza o trabalho dos 
alunos e o dos professores quando os ciclos 
de aprendizagem são considerados possí-
veis e ao mesmo tempo necessários para 
enfrentar melhor o fracasso escolar. O que 
se passa nas classes e nos estabelecimentos? 
O que advém das maneiras de aprender e 
de ensinar, dos objetivos, dos métodos, das 
situações de formação, dos critérios de ava-
liação? Qual a relação entre a atividade de 
“primeira linha” (as operações cotidianas, o 
encontro professor-alunos, as interações 
didáticas) e o trabalho de fundo (as fun-
ções de engenharia, direção, prescrição, con-
trole, apoio, etc.)? Em cada escalão, como se 
combinam o trabalho organizado e o tra-
balho de organização, a parte da atividade 
que depende da de outro e aquela da qual 
outros atores são, por sua vez, dependen-
tes? Procuraremos descrever, mas também 
conceitualizar as práticas de vanguarda, os 
problemas que elas resolvem e aquelas que 
levantam simultaneamente.
Os capítulos desta obra nos conduzi-
rão da história da organização escolar às 
competências emergentes, passando pelas 
teorias da aprendizagem, a reelaboração 
dos programas, os dispositivos de gestão 
de classe, o planejamento do ensino, os ci-
clos longos, os módulos transdisciplinares, 
o trabalho de equipe, os projetos de esta-
belecimento, os modos de prestação de 
contas e de prescrição. Nós os apresentare-
mos depois de situar esta pesquisa em um 
contexto social, pedagógico e político que 
explique porque a organização do trabalho 
A organização do trabalho escolar 17
se tornou um desafio de primeira linha 
para a escola.
TrAnsfOrmAr A OrgAnizAçãO? 
Origem e COnTexTO dA PesquisA
Nosso Laboratoire de Recherche Inno-
vation-Formation-Éducation [Laboratório 
Inovação-Formação-Educação] (LIFE, 2003) 
estuda a maneira como a escola evolui, o 
modo como emergem, se instalam, re-
fluem, se discutem, se negociam ou não as 
inovações. Ele reuniu, no âmbito de um se-
minário de pesquisa organizado em forma 
de encontros mensais, três dezenas de prá-
ticos e pesquisadores em educação de Ge-
nebra e de outras partes3 para tentar com-
preender melhor como o trabalho escolar é 
organizado, como procedem e pensam aque-
les que tentam transformá-lo. Esta obra apre-
senta o essencial desse procedimento cole-
tivo, a meio caminho entre a preocupação 
prática (Como se organizar?) e o interesse 
teórico (O que se organiza, como, a que 
efeito, para qual proveito?). Ela reúne 14 
contribuições de nossa equipe, às quais fa-
zem eco quatro artigos de pesquisadores 
em educação de Quebec. 
De onde veio o impulso? Toda pesqui-
sa, mesmo a mais desinteressada, tem um 
sentido, uma gênese, razões. A nossa ins-
creve-se em uma longa tradição: tratar in-
diferentemente crianças diferentes significa 
condenar-se a privar de instrução aquelas 
que se distinguem mais do que os professo-
res esperam. A escola não se torna equitati-
va dando a todos os alunos as mesmas 
chances de fracassar, mas fazendo “o me-
lhor” (Dubet, 2002; Duru-Bellat, 2006; Vellas, 
2002) para que todos tenham acesso aos 
saberes de base que têm a obrigação de es-
tudar. A democratização do ensino foi o 
grande progresso do século passado (Lelièvre, 
2004; Magnin, 2001). Mas, em um mundo 
cada vez mais complexo, em que a liberda-
de do sujeito supõe a capacidade de esco-
lher e de discutir (Habermas, 1991; Sen, 
1992/2000; Touraine, 1997), a generaliza-
ção das competências continua sendo um 
objetivo a atingir, um ideal a visar.
As desigualdades não vêm nem da es-
cola, nem da sociedade, mas da relação en-
tre o que se espera dos alunos e os recursos 
culturais de que cada um dispõe e sabe uti-
lizar ou não na situação. A pedagogia e a 
pesquisa em educação se aliaram há muito 
tempo para compreender o que pode im-
pedir ou, ao contrário, sustentar a intenção 
de aprender. A “fabricação da excelência 
escolar” (Perrenoud, 1984) não é simples-
mente um fato a constatar. É também uma 
prática a questionar e, portanto, de um pon-
to de vista científico, a confrontar com o 
projeto da instrução pública de conduzir o 
maior número de alunos a competências 
compartilhadas. Assim, nossa equipe passou 
da análise das normas de excelência à das 
práticas ordinárias de avaliação, e depois, 
passo a passo, à do currículo real, do sentido 
do trabalho escolar, do ofício do aluno, das 
pedagogias ativas e diferenciadas, das ma-
neiras prospectivas de organizar os saberes 
visados ao mesmo tempo que o sistema de 
ação supõe produzi-los e controlá-los (Bols-
terli e Maulini, 2007; Bronckart e Gather 
Thurler, 2004; Fabre e Vellas, 2007; Gather 
Thurler, 2000a, 2007; Maulini, 2005; Perre-
noud, 1984, 1994, 1997, 2002).
renunCiAr às séries: COndiçãO 
de umA renOvAçãO
No Cantão de Genebra, contexto de 
nossos trabalhos, a realidade resiste, como 
em outros lugares, à luta contra o fracasso 
escolar. As políticas de redução de efetivos 
18 Monica Gather Thurler e Olivier Maulini
de classe, de formação de professores para 
novas abordagens didáticas e de apoio in-
dividual aos alunos em dificuldade não fo-
ram suficientes para “tender a corrigir as 
desigualdades de oportunidade de êxito es-
colar” como é a intenção expressa pela lei 
sobre a instrução pública. Um estudo sobre 
a repetência, no início dos anos 1990, mos-
tra, inclusive, que sua frequência está em 
alta, que as desigualdades sociaisdiante do 
êxito tendem a se agravar e que o único 
exemplo em que os últimos da classe não 
precisam repetir uma série é aquele em que 
o professor segue seu grupo por mais um 
ano (Hutmacher, 1993). Esse estudo não 
indica o que os alunos repetentes sabem ou 
ignoram, mas põe em questão a maneira 
como a escola organiza a regulação e a esti-
mula a reorientar sua pedagogia mudando 
antes de tudo sua organização:
No plano da organização escolar, a repe-
tência está diretamente ligada ao quadro 
temporal em que a escola organiza a divi-
são do trabalho entre professores. Como 
medida de flexibilização do tempo, está 
em sincronia com o relógio anual que 
marca o ritmo de vida do sistema. Basta 
que os/as professores/as conservem os 
mesmos alunos por dois anos para que a 
repetência quase desapareça, não porque, 
evidentemente, os alunos têm mais êxito 
nesses casos, mas porque, em um horizon-
te temporal mais longo, os/as professores/as 
podem adaptar melhor os ritmos aos alu-
nos sem serem obrigados/as a prestar con-
tas sobre cada um já por ocasião da mu-
dança de ano. Essa observação não é nova. 
Há muito tempo, parte dos professores rei-
vindica acabar com as divisões de séries, lá 
onde, em uma lógica taylorista e burocrá-
tica, outros protagonistas, sob pretexto de 
homogeneização das classes, tendiam, ao 
contrário, a enrijecer as divisões entre sé-
ries e entre classes. Deve-se perguntar se, 
de fato, é por causa da heterogeneidade 
dos alunos ou por causa de freios institu-
cionais que o fim das divisões tem tanta 
dificuldade de se afirmar nas práticas. Não 
seria preciso […] examinar o lado dos 
adultos envolvidos? Sobretudo nas gran-
des escolas urbanas, o fim das divisões su-
põe uma cultura viva do pacto profissional 
e da cooperação entre professores que falta 
em muitos lugares. Implica também uma 
responsabilidade (coletiva e individual) 
dos professores sobre o conjunto do per-
curso escolar ou, pelo menos, sobre uma 
extensão mais longa desse percurso. Ora, 
estendida a quatro ou cinco anos, essa res-
ponsabilidade pode mudar de natureza. 
Mais do que quando se tem os alunos ape-
nas por um ano, tende-se a ir além do âm-
bito da instrução stricto sensu e a conside-
rar o futuro global dos alunos. […] Esse 
não é apenas um problema de pedagogia, 
mas também de organização. (Hutmacher, 
1993, p. 153-154 e 161)
Acabar com as divisões em etapas da 
escolaridade para assegurar – de maneira 
mais flexível e melhor ajustada – a forma-
ção global de cada aluno: esse raciocínio 
será retomado um ano mais tarde pela Di-
reção do Ensino Primário. Visto que a tria-
gem e a separação escolares dissuadem a 
“máquina-escola” (Meirieu e Le Bars, 2001) 
de procurar outros meios de funcionar, é 
preferível abdicar dessa solução para colo-
car de outro modo (verdadeiramente?) o 
problema da diferenciação. Assim, a escola 
genebrina se fixa em “três eixos de renova-
ção” (DEP, 1994), que são, de fato, três tem-
pos de um mesmo raciocínio.
– Eixo 1: Individualizar os percursos de 
formação. Visto que a repetência é 
uma forma sumária demais de regu-
lação, é preciso reorganizar a escola-
ridade em ciclos plurianuais, em vez 
de séries. “Essa nova estrutura não é 
um fim em si, mas um meio de dar 
mais tempo e espaço para diferen-
A organização do trabalho escolar 19
ciar, para permitir percursos mais in-
dividualizados. [Ela] só representará 
um progresso caso consiga organizar 
progressões flexíveis e individualiza-
das” (p. 8).
– Eixo 2: Aprender a trabalhar melhor 
junto. Dado que o espaço da classe 
impede essa flexibilização, pretende-
-se confiar cada ciclo a uma equipe 
de professores encarregados de pla-
nejar e de controlar juntos as apren-
dizagens das crianças. “A organização 
em ciclos de aprendizagem supõe um 
verdadeiro trabalho de equipe, visto 
que um grupo de professores será co-
letivamente responsável pela pro-
gressão do conjunto dos alunos que 
frequentam o mesmo ciclo na mes-
ma escola” (p. 11).
– Eixo 3: Colocar as crianças no centro 
da ação pedagógica. Na medida em 
que a progressão não decorre do ci-
clo, mas do fato de que ele permite e 
obriga a ensinar mais eficazmente, o 
trabalho dos professores deve, antes 
de tudo, sustentar o engajamento 
dos alunos em sua formação. Deve-
se “estabelecer situações de aprendi-
zagem, elas próprias integradas a 
dispositivos e sequências didáticas, 
que se apoiem, por sua vez, em mo-
dos de gestão de classe e opções pe-
dagógicas” (p. 13).
Gerir a classe, o ciclo, os dispositivos, 
as situações, as sequências, as progressões, 
o trabalho dos alunos e o dos professores: 
renunciar às séries é apresentado primeira-
mente não como um remédio provado, 
mas como um problema que a escola se 
impõe para encontrar pouco a pouco ou-
tras maneiras de se organizar, portanto, 
uma ordem escolar em parte revisada.
A principal vantagem das séries é sua 
simplicidade e sua familiaridade: todo mun-
do conhece e compreende o sistema: a pessoa 
vai bem ou vai mal no ano, portanto, é pro-
movida ou reprovada. A gestão também é 
simplificada: um professor, uma classe, o pro-
grama de uma série. Criar ciclos de aprendi-
zagem é abandonar esses funcionamentos 
conhecidos para substituí-los por uma orga-
nização mais flexível, e por isso mais comple-
xa. Isso perturba os hábitos de todos, obriga a 
reconstruir modos de agrupamento de alu-
nos, de avaliação, de gestão de classe, e impõe 
aprender junto a falar de outro modo dos 
alunos (DEP, 1994, p. 12-13).
“Perturbação”, “abandono”, “reconstru-
ção”; menos familiaridade, mais incerteza: se-
ria demorado resumir uma reforma dessa 
amplitude. O processo levou inicialmente 
quatro anos de exploração durante os quais 
15 escolas voluntárias, um grupo de acompa-
nhamento e um comitê de comando estraté-
gico da mudança buscaram juntos um cami-
nho que conduzisse dos ciclos anunciados 
aos ciclos realizados na prática. Após um ano 
de transição, o processo deveria se generali-
zar progressivamente às 200 escolas (35 mil 
alunos) do Cantão. Encontra-se o relato e a 
análise desse processo em outras publicações 
(Allal, 2006; Favre, Jaeggi e Osiek, 2005; 
Gather Thurler, 2000b, 2004, 2005; Lessard, 
1999a; Perrenoud, 2005).
Diversos imprevistos confirmaram que 
a organização do trabalho não se deixa mo-
dificar mecanicamente: os debates entre 
profissionais, nem todos convencidos da 
pertinência ou da factibilidade da mudan-
ça; os dilemas da instituição, entre diferen-
ciação e padronização, coerência do siste-
ma e autonomia dos estabelecimentos, ino-
vação e manutenção da ordem; as negocia-
ções entre grupos (professores, funcioná-
rios, diretores, especialistas, pais, sindicatos 
e associações), eles próprios permeados 
20 Monica Gather Thurler e Olivier Maulini
por diversas correntes; controvérsias públi-
cas sobre o desempenho do sistema escolar, 
as questões de método, de autoridade e de 
justiça na educação – tudo isso em um con-
texto de precarização das condições de vida 
nos bairros populares; e, para completar, o 
lançamento de uma iniciativa cantonal,* ma-
neira de politizar a contestação – em demo-
cracia direta. Inscrever na lei a divisão em 
séries e a seleção anual pelas médias numé-
ricas foi uma maneira, para os mais conser-
vadores, de rejeitar a reforma, mas também 
a escola tal como ela evoluiu e suas melho-
rias, retornando às práticas e às estruturas 
do passado (para uma intervenção nesse de-
bate, ver LIFE, 2003). A inscrição da repe-
tência e das médias trimestrais no novo re-
gulamento do ensino primário genebrino 
para o ano letivo de 2007 mostra, à sua ma-
neira, que a organização das escolas poderia 
ser o núcleo duro de concepções distintas 
do trabalho pedagógico e da igualdade em 
face da formação.
TudO se mOve, POis TudO 
esTá ligAdO: um sisTemA, 
nOve CAnTeirOs
Deixemos de lado as contingências da 
política local para voltar à questão que nos 
interessa no âmbito desta obra: em que me-
dida a transformação da organização do tra-
balho escolar – compreendidosseus mean-
dros, seus conflitos, suas objeções – coloca 
os profissionais diante de problemas didáti-
cos e pedagógicos que transcendem as con-
junturas, que são identificáveis, se não iden-
tificados, em toda parte, que se enraízam na 
história da escola e podem ocupá-la de for-
ma duradoura? No momento de expandir a 
reforma, o grupo de comando confirmou 
que a mudança de organização não era su-
perficial, visto que o plano-padrão não dei-
xaria espaço à imutabilidade e que todas as 
escolas seriam obrigadas progressivamente a 
se inspirar nele. No fim das contas, oposito-
res e partidários não estavam de acordo so-
bre nada, salvo sobre o fato de que tudo se 
move, pois tudo está ligado.
Para propor uma reforma de envergadura, 
é preciso abordar todos os aspectos que 
parecem pertinentes para compreender 
seus fundamentos e verificar sua factibili-
dade. A visão sistêmica dará a impressão, 
às vezes, de que o grupo de comando “se 
intromete em tudo”. É simplesmente por-
que uma reforma de tal amplitude tem in-
cidências sobre um grande número de 
componentes da escola. […] Assim, o gru-
po optou resolutamente por uma extensão 
progressiva. Examinou vários cenários e, 
por fim, decidiu-se pela ideia de propor 
aos estabelecimentos que aplicassem o 
conjunto do plano-padrão. […] Esse cená-
rio não fraciona a inovação e aposta na 
coerência sistêmica (GPR, 1999, p. 3 e 43).
Vejamos rapidamente como essa coe-
rência procurou se desdobrar em nove ei-
xos. As contribuições desta obra farão cons-
tantemente referência a esses dados empíri-
cos, seja para situar suas questões, seja para 
escrever o material que subentende suas 
conclusões.
1. Os ciclos de aprendizagem como or-
ganização pedagógica. A escola primária 
genebrina deveria ser organizada em dois 
ciclos de quatro anos: o ciclo elementar 
(níveis –2 a +2) e o ciclo médio (níveis +3 
a +6). Sem repetência no ciclo, percursos 
individualizados, um prolongamento excep-
* N. de R.T.: O termo “iniciativa cantonal” refere-se a iniciativas propostas por um certo número de cidadãos para de-
liberar sobre algum assunto considerado relevante e/ou controverso. No presente caso, parece dizer respeito à adoção 
de ciclos no sistema escolar suíço. Corresponde, de certa maneira, ao que entendemos por “plebiscito”.
A organização do trabalho escolar 21
cional em função de necessidades particu-
lares, bem identificadas. Jamais se refaz um 
ano: é preciso cuidar das dificuldades mais 
cedo, de maneira dirigida, ou mesmo indi-
vidualizada.
2. Os objetivos-núcleo, os programas e as 
situações de aprendizagem. Só é possível di-
versificar as progressões se os objetivos forem 
hierarquizados e se dispuser de meios de en-
sino que não sejam, eles próprios, separados 
em séries. Assim, o próprio plano de estudos 
é reorganizado sob a forma de objetivos em 
espiral e de expectativas de fim de ciclo. O 
plano de estudos romando (Plan d’études ro-
mand – PER)4 e, pouco tempo depois, o pro-
jeto federal HarmoS5 serão concebidos no 
mesmo espírito: integrar os saberes a serem 
aprendidos em campos disciplinares, concei-
tos ou competências-chave. O ensino torna-
se estratégico: não se segue o professor passo 
a passo; ele fixa uma direção e varia os cami-
nhos caso necessário.
3. A diferenciação do ensino. Os dispo-
sitivos de trabalho devem alternar as situa-
ções complexas, o ensino explícito de sabe-
res a mobilizar, a identificação de erros, de 
obstáculos e a construção daquilo que per-
mita superá-los. É o que propõem as se-
quências didáticas que completam os meios 
de ensino, ciclo por ciclo, objetivo por ob-
jetivo (“produzir uma carta para dar sua 
opinião”, “ler e escrever números inteiros”, 
“analisar uma paisagem”, etc.). Para não 
deixar os professores decidirem sozinhos a 
progressão, a Diretoria do Ensino Primário 
mandará também editar, por seus serviços, 
“sugestões de planejamento”, padronizan-
do, a título indicativo, o encadeamento das 
sequências em um, dois ou quatro anos.
4. A avaliação dos alunos nos ciclos de 
aprendizagem e a passagem ao primeiro se-
cundário. Se o problema já não é tanto san-
cionar o aluno em dificuldade, mas apre-
sentar o diagnóstico que o ajudará, onde 
quer que esteja, a progredir, as maneiras de 
avaliar devem ser aprimoradas, tornar-se 
mais qualitativas, menos esquemáticas que 
uma média numérica. Desde a fase de ex-
ploração, as escolas abriram mão de dar no-
tas aos trabalhos em proveito de uma obser-
vação formativa, de um julgamento criterio-
so, de balizas e de provas padronizadas, de 
registros e de portfólios comentados, de en-
trevistas tripartites professor-alunos-pais. 
Em francês e matemática, as apreciações 
(“atingiu, quase atingiu, não atingiu os obje-
tivos”) continuaram sendo traduzidas em 
notas globais no final do ciclo médio a fim 
de orientar os alunos para um dos cursos 
(ginasial ou não) do primeiro secundário. 
Foi na extensão dessas novas práticas que se 
cristalizou em seguida o debate político.
5. A gestão dos grupos, do tempo e dos 
espaços nos ciclos. Como conciliar as ideias 
de “evitar a segregação” e “colocar todos os 
alunos em situação de progredir”? Séries 
múltiplas, classes multi-idades, transdisci-
plinaridade, grupos de necessidades, de ní-
veis, de projetos, módulos de aprendizagem 
ou de avaliação: as escolas são estimuladas a 
examinar e rever permanentemente sua pró-
pria organização, para que o ciclo não seja 
nem a camuflagem de classes sempre justa-
postas, nem uma simples dilatação do espa-
ço-tempo. Objetivos comuns e diversidade 
de necessidades requerem uma diferencia-
ção constante no interior das lições, das se-
quências, das atividades, mas também entre 
elas, pois sem isso fecham-se as classes nelas 
mesmas e a organização do trabalho não é 
uma questão apreendida coletivamente. É a 
articulação entre grupos de base e outras 
reuniões, estáveis ou efêmeros, que deve evi-
tar a dupla armadilha do todo homogêneo – 
que evita diferenciar – e do todo heterogê-
neo – que impede circunscrever.
6. A questão das crianças migrantes e 
das estruturas de acolhimento. Mais de 40% 
22 Monica Gather Thurler e Olivier Maulini
dos alunos genebrinos têm uma língua ma-
terna diferente do francês. A proporção 
chega a mais de 80% em certos bairros da 
cidade ou de sua periferia. Por muito tem-
po integrados em uma classe de sua idade, 
os recém-chegados são agora parcialmente 
e provisoriamente agrupados em estruturas 
de acolhimento nas quais professores for-
mados são especialmente incumbidos de 
garantir a transição, não apenas entre as 
línguas, mas também, com muita frequên-
cia, entre as condições de vida locais e as 
de um país de origem de onde os emigra-
dos fogem da violência ou da pobreza. A 
abertura para as línguas é valorizada pela 
escola e por uma Genebra internacional 
orgulhosa de promover a pluriculturalida-
de, o humanismo e a paz. Isso não impede 
questionamentos da política de integração 
pelo fato de que as pesquisas PISA6 dão 
uma classificação pior aos alunos da cidade 
do que aos dos cantões rurais, mais homo-
gêneos socialmente.
7. O ensino especializado no ensino pri-
mário renovado. Até onde apostar na inte-
gração? A passagem aos ciclos pode dar a 
sensação de que uma estrutura flexível po-
derá se encarregar de tudo, incluindo o tra-
balho com os alunos mais especiais, psico-
logicamente frágeis ou em situação de defi-
ciência. Contudo, o sistema ainda é organi-
zado em forma de unidades particulares: 
em Genebra, 2,4% dos alunos são escolari-
zados em classes ou instituições de ensino 
especializado. É uma taxa baixa em compa-
ração com a maioria dos cantões suíços e 
outros países da comunidade europeia ou 
da OCDE.
8. A informação e a associação de pais 
no quadro dos ciclos. A mudança da escola 
não pode mais ser pensada sem o apoio – 
portanto a participação – dos pais. Eles têm 
previamente um julgamento sobre a ma-
neira como é organizado o trabalho dos 
professores e das crianças: se não se deseja 
que o exerçam por meiosindiretos (por es-
tratégias de esquiva, de pressão, de politi-
zação, etc.), é preciso organizar na escola 
espaços de diálogo e de acordo. Reuniões 
coletivas, entrevistas e dossiês de avaliação, 
cadernos para troca de correspondência, 
comissões paritárias, ajuda nos deveres, re-
des de tradução, vínculos com as associa-
ções e sua federação: uma parte do traba-
lho é organizada para e com as famílias, 
mas também graças a elas quando, por 
exemplo, os alunos produzem um jornal ou 
ateliês que mostrem o que estão aprenden-
do e de que maneira. No futuro, o Departa-
mento da Instrução Pública pretende dar 
um passo adiante em direção à parceria, 
instituindo em todos os lugares conselhos 
de estabelecimento.
9. A autonomia dos estabelecimentos, 
sua coordenação, a prestação de contas. A 
lógica taylorista coloca as classes sob o 
controle direto da via hierárquica. O pro-
cesso de reorganização solicitou primeira-
mente o espaço intermediário do estabele-
cimento. São equipes – não pessoas – que 
empreenderam a exploração. Projetos de 
escola, ciclos e subciclos, coordenadores e 
depois zeladores, redes e grupos de acom-
panhamento, supervisão colegiada dos alu-
nos, formações coletivas, balanços e planos 
quadrienais: o trabalho foi coletivizado em 
dois níveis – interno aos grupos das esco-
las; externo, por sua coordenação. Menos 
divisão na base implica mais prestação 
de contas nas camadas superiores, coman- 
do estratégico e delegação de responsabili- 
dades aos atores em todos os estágios do 
sistema.
Essa maneira de inserir os níveis de 
análise e de intervenção talvez seja própria 
A organização do trabalho escolar 23
de Genebra, mas remete a questões reco-
nhecíveis em outros sistemas escolares fran-
cófonos (Arsenault e Lenoir, 2005; Lafortu-
ne, 2004; Lessard, 1999b; Meirieu, 2005; 
Perraudeau, 1997; Quéva, 2003; Rey, Ivano-
va, Kahn e Robin, 2003) e ainda na organi-
zação da formação de base em todo o mun-
do (Bruner, 1996; Coombs, 1973; Delors, 
1996; OCDE, 2001; UNESCO, 1990). Ou se 
raciocina de maneira restritiva – e transfor-
mar o trabalho escolar se torna um proble-
ma entre outros, uma pedra do edifício, um 
item na longa lista de inovações ou se esten-
de o conceito – e a organização do trabalho 
se torna a estrutura de acolhimento das de-
mais mudanças, o que dá sentido a elas, que 
impulsiona ou, ao contrário, impede opera-
ções de nível mais baixo.
Passar da classe ao ciclo, no caso, não é 
uma variável isolada: em uma perspectiva 
sistêmica é uma “mudança de segundo 
grau” (Senge, 1991; Watzlawick, 1980) que 
redistribui, na escola, um bom número de 
tarefas e de responsabilidades. Compreende-
-se melhor a importância disso quando se
considera que a organização do trabalho é
questão de luta e de negociação em todas as
profissões: o ensino é, certamente, um “ofí-
cio do humano”, portador de valores e de
ideais, mas também requer um trabalho –
uma ação sobre o mundo (produção) expos-
ta ao julgamento de outro (relação) (Jobert,
1998, 2000) – do qual se pede ora a regula-
mentação, ora a flexibilização. Pensar a or-
ganização é também confrontar as condi-
ções de trabalho dos alunos e a dos profes-
sores, sem postular (ingenuamente?) que
seus interesses são convergentes, nem (cini-
camente?) que é um jogo soma zero e que
todo bônus para o usuário é pago com um
“malus” para o assalariado. Apontar os dile-
mas ajudará provavelmente a compreender
melhor as questões e sua complexidade.
dAs esTruTurAs herdAdAs 
às COmPeTênCiAs emergenTes: 
enTrAdAs PlurAis e 
COmPlemenTAres
Poderíamos “circunscrever” a proble-
mática da organização do trabalho escolar 
mobilizando, uma a uma, certas disciplinas 
das ciências humanas. A ergonomia distin-
guiria tarefa prescrita e trabalho real, pro-
cedimentos e cursos da ação, planejamento 
e realização das operações. A abordagem 
psicossociológica enfatizaria a relação dos 
trabalhadores com sua atividade e com 
aqueles aos quais ela é dirigida, com o po-
der, com a autonomia, com espaços-tem-
pos que estruturam o cotidiano, com a or-
ganização como para-angústia e suporte da 
identidade. O ponto de vista didático parti-
ria do saber em jogo, das ligações entre a 
epistemologia de referência e uma organi-
zação do trabalho que garanta a progressão 
racional do ensino. A abordagem sócio- 
-histórica tentaria compreender melhor a
maneira como se constituíram, ao longo do
tempo, os diferentes modos de organização
do trabalho, suas hipóteses fundadoras, as
respostas que eles deram aos problemas do
momento. A pedagogia se preocuparia
mais com a maneira como os professores
pensam, concebem, modulam, improvi-
sam, adaptam as situações e as ações a fim
de estimular os alunos a aprender. A ciên-
cia política, finalmente, questionaria a or-
ganização do trabalho quanto à sua eficá-
cia, sua equidade, sua pertinência, sua fac-
tibilidade, os recursos humanos e materiais
de que a escola deveria dispor. Preferimos
nos inspirar nas ciências contributivas em
função dos níveis de análise e dos proble-
mas estudados.
Nossa intenção não é fazer um inven-
tário, e sim tornar visível, mais pensável e, 
eventualmente, transformável a organiza-
Encerra aqui o trecho do livro disponibilizado para 
esta Unidade de Aprendizagem. Na Biblioteca Virtual 
da Instituição, você encontra a obra na íntegra.

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