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UNIVERSIDADE FEDERAL DE RONDONÓPOLIS INSTITUTO DE CIÊNCIAS EXATAS E NATURAIS CURSO DE MEDICINA ANA CLARA GUIMARÃES VENTURI VENTILAÇÃO MECÂNICA: Revisão de literatura técnico-teórica, prevenção de complicações e perspectivas sobre atualizações de protocolos RONDONÓPOLIS 2021 ANA CLARA GUIMARÃES VENTURI VENTILAÇÃO MECÂNICA: Revisão de literatura técnico-teórica, prevenção de complicações e perspectivas sobre atualizações de protocolos Dissertação sobre Ventilação Mecânica apresentada ao Prof. Maurício Raposo de Medeiros do departamento de Medicina, ICEN, como exigência do módulo de Emergências Clínicas do 8° semestre do curso. RONDONÓPOLIS 2021 RESUMO A via aérea é uma das prioridades do manejo do paciente em emergência e é necessário muito cuidado para a correta avaliação e escolha da abordagem a ser seguida em cada situação. Existem diversos tipos de técnicas e instrumentos de manutenção de uma via aérea adequada, sendo fundamental o conhecimento das técnicas, indicações e contraindicações de cada um deles para reconhecimento e manejo precoce do paciente em potencial risco de evoluir para insuficiência respiratória aguda, ou que já esteja neste estado. A Ventilação Mecânica (VM), ou Suporte Ventilatório, é uma das intervenções terapêuticas mais importantes na medicina moderna. Trata-se da segunda intervenção mais comum em Unidades de Tratamento Intensivo (UTI). Porém, a VM também está fortemente relacionada à morbimortalidade de pacientes submetidos a cirurgias, traumas e insuficiência respiratória, além de ser precursora de uma série de complicações e estar sujeita a diversas ocorrências iatrogênicas. O presente ensaio objetiva apresentar um breve apanhado técnico-teórico sobre vias aéreas, manejo da via aérea no serviço de emergência e VM. Dessa maneira, discute-se sobre a importância da abordagem de temas tangentes e transversais ao tema central, como a prevenção de complicação, iatrogênicas ou não, e a necessidade da criação, adesão e seguimento de protocolos pelos profissionais de saúde intensivistas, afinal são questões indispensáveis ao aprendizado sobre suporte ventilatório. PALAVRAS-CHAVE: respiração artificial, emergências, protocolos clínicos ABSTRACT The airway is one of the priorities of emergency patient management and great care is needed to correctly assess and choose the approach to be followed in each situation. There are several types of techniques and instruments for maintaining an adequate airway, and knowledge of the techniques, indications and contraindications of each of them is essential for early recognition and management of patients at potential risk of developing acute respiratory failure, or who are already in this state. Mechanical Ventilation (MV), or Ventilatory Support, is one of the most important therapeutic interventions in modern medicine. It is the second most common intervention in Intensive Care Units (ICU). However, MV is also strongly related to the morbidity and mortality of patients undergoing surgery, trauma and respiratory failure, in addition to being a precursor of a series of complications and being subject to several iatrogenic events. This essay aims to present a brief technical-theoretical overview of airways, airway management in the emergency department and MV. Thus, it is discussed the importance of addressing issues that are tangent and transversal to the central theme, such as the prevention of complications, iatrogenic or not, and the need for the creation, adherence and follow-up of protocols by intensive care professionals, after all, they are issues indispensable for learning about ventilatory support. KEYWORDS: artificial respiration, emergencies, clinical protocols SUMÁRIO 1. ANATOMIA E FISIOLOGIA DA VIA AÉREA................................................... 01 2. AVALIAÇÃO DA VIA AÉREA NA SALA DE EMERGÊNCIA........................ 09 3. EQUIPAMENTOS PARA ACESSO A VIA AÉREA NA SALA DE EMERGÊNCIA E ASSISTÊNCIA RESPIRATÓRIA......................................... 13 4. INDICAÇÕES E PREPARO ENDOTRAQUEAL............................................... 19 5. USO RACIONAL DE FÁRMACOS PARA O ACESSO DA VIA AÉREA NA EMERGÊNCIA........................................................................................................ 23 6. TÉCNICAS DE INTUBAÇÃO TRAQUEAL........................................................ 27 6.1. Sequência Rápida de Intubação.......................................................................... 28 6.2. Sequência Prolongada de Intubação.................................................................... 33 7. COMPLICAÇÕES GRAVES DA INTUBAÇÃO OROTRAQUEAL NA EMERGÊNCIA E ESTRATÉGIAS DE ABORDAGEM..................................... 33 8. VIA AÉREA CIRÚRGICA DE EMERGÊNCIA – CRICOTIREOIDOSTOMIA.................................................................................. 35 9. OUTROS DISPOSITIVOS DE ACESSO A VIA AÉREA.................................... 36 9.1. Máscara Laríngea Intubadora.............................................................................. 36 9.2. Combitube (Tubo Retroglótico).......................................................................... 37 10. VENTILAÇÃO MECÂNICA NA EMERGÊNCIA.............................................. 38 10.1. Ventilação mecânica não invasiva (VNI)........................................................... 39 10.2.Ventilação mecânica invasiva (VM)................................................................... 42 11. PRINCÍPIOS DA VENTILAÇÃO MECÂNICA EM SITUAÇÕES ESPECIAIS: DPOC, ASMA, OBESIDADE, DOENÇAS RESTRITIVAS................................ 45 12. VENTILAÇÃO MECÂNICA NA SÍNDROME DO DESCONFORTO RESPIRATÓRIO AGUDO E COVID-19.............................................................. 47 1 1. ANATOMIA E FISIOLOGIA DA VIA AÉREA O corpo humano precisa manter obtenção contínua de oxigênio (O2) do ambiente, bem como liberação do gás carbônico (CO2) produzido pelas células do organismo para o ar ambiente e, para isso, destaca-se a relevância do sistema respiratório (AMIB, 2017). O sistema respiratório pode ser dividido estruturalmente em partes superiores e inferiores, e funcionalmente em uma porção condutora e uma porção respiratória (GRAAF, 2003). Nesse sentido, os principais eventos funcionais da respiração incluem a ventilação pulmonar, que é o movimento do ar para dentro e para fora dos alvéolos; a difusão de oxigênio e dióxido de carbono entre o sangue e os alvéolos; o transporte de oxigênio e dióxido de carbono para os e dos tecidos periféricos; e a regulação da respiração (GUYTON, 2017). As principais vias aéreas e estruturas do sistema respiratório são cavidade nasal, faringe, laringe e traqueia, brônquios, bronquíolos e alvéolos pulmonares no interior dos pulmões. Nesse sentido, as estruturas do sistema respiratório superior incluem o nariz, a faringe e as estruturas associadas; o sistema respiratório inferior inclui a laringe, a traqueia, a árvore bronquial, os alvéolos pulmonares e os pulmões (GRAAF, 2003). Os alvéolos são unidades microscópicas, que são circundados por vasos capilares (GUYTON, 2017). Imagem 01: Anatomia básica do sistema respiratório Fonte: NETTER, 2018 2 O conhecimento da anatomia das vias aéreas superiores é fundamental para a realização de procedimentos para o acesso de vias aéreas definitivas, as quais serão melhor discutidas ao longo desta dissertação. Nesse sentido, destaca-se as principais estruturas anatômicas das vias aéreas superiores,que são: (GRAAF, 2003) • Boca: A cavidade oral é limitada na parte superior em sua porção anterior pelo palato duro e posteriormente pelo palato mole. Seus músculos inserem-se no osso hioide, no maxilar inferior e na apófise do ligamento estilo-hióideo. • Nariz: É composto de ossos, cartilagens, tecido fibrogorduroso e pele. É divido pelo septo nasal em narina direita e esquerda, através das quais se alcança a fossa nasal direita e esquerda. Em suas paredes laterais, identificam-se os cornetos superiores, médios e inferiores, onde se determina o ponto de maior estreitamento das fossas nasais. • Nasofaringe: localizada na região posterior onde as fossas nasais se unem. Compreende a região da coana nasal até o final do palato mole. • Orofaringe: região que vai do final do palato mole até a inserção da base da língua. Nas paredes laterais da orofaringe, encontram-se as amídalas palatinas, limitadas pelos pilares amidalianos anteriores e posteriores. • Laringofaringe: região que compreende da base da língua até a entrada da laringe, onde ocorre a separação das vias aérea e digestiva. Imagem 02: Laringofaringe Fonte: NETO, 2016 • Laringe: localiza-se anteriormente a quarta, quinta e sexta vértebras cervicais no adulto e nas crianças no nível das segunda e terceira vértebras cervicais. É composta 3 por nove cartilagens, três pares e três ímpares (pares: aritenoides, corniculadas e cuneiformes; ímpares: tireoide, cricoide e epiglote). (GRAAF, 2003) Imagem 03: Laringe Fonte: NETO, 2016 • Traqueia: possui cerca de 2,5 cm de diâmetro e 10 a 13 cm de comprimento, no adulto, estendendo-se da laringe até a carina. No adulto, a traqueia forma com o brônquio principal direito um ângulo entre 20 e 25° e, com o brônquio principal esquerdo, entre 40 e 45°. Devido ao ângulo da traqueia e ao diâmetro menor do brônquio principal esquerdo, é mais frequente a intubação seletiva do brônquio principal direito. (GRAAF, 2003). 4 Imagem 04: Traqueia Fonte: Disponível em <https://www.todamateria.com.br/bronquios/>. Acesso em maio de 2021. Em termos de sua função geral, o sistema respiratório é dividido frequentemente em uma parte condutora e uma parte respiratória. A parte condutora inclui todas as cavidades e estruturas que transportam gases para os alvéolos pulmonares. O ar é conduzido pelas cavidades oral e nasais para a faringe, e em seguida através da laringe para a traqueia e árvore bronquial. Essas estruturas conduzem o ar aquecido e umedecido para a parte respiratória no interior dos pulmões (GRAAF, 2003). A parte respiratória consiste nos alvéolos pulmonares que são as unidades funcionais do sistema respiratório onde ocorrem as trocas gasosas entre o ar e o sangue (GRAAF, 2003). À esta troca denominamos HEMATOSE, e a mesma ocorre ao nível do interstício alvéolocapilar e capilar-tecido. O O2 é usado pelas células como aceptor final de elétrons no processo de respiração, denominado devido a isso, de aeróbio. Nesse processo, a molécula de glicose (C6H12O6) é desmontada progressivamente, sendo a energia desse “desmonte” armazenada em moléculas de Adenosina Tri-Fosfato (ATP). Como produtos desse processo químico, sobram CO2 e água (H2O). Ambos passam à corrente sanguínea e serão aproveitados e/ou expelidos pelo organismo pelos rins e pulmões (AMIB, 2017). Outras funções do pulmão e do sistema respiratório são: 1. Permitir a excreção de substâncias voláteis que possam ser endógenas (exemplo: corpos cetônicos e amônia) 2. Excretar substâncias exógenas como gases anestésicos; 5 3. Participar da síntese de substâncias como angiotensina II (vasoconstrictor); 4. Exercer ação filtrante para grandes partículas provenientes do sistema venoso, impedindo as mesmas de atingir a circulação pulmonar; 5. Atuar como reservatório sanguíneo e participar dos sistema de tampão ácido-básico do organismo, de forma a manter o pH às custas de aumento da perda de CO2, com desvio da Equação de Handerson-Hasselbach e produção de CO2 e H20, retirando H+ circulante e alcalinizando o pH, ou vice-versa. A caixa torácica tem um tônus basal que mantém sua conformação e atua diretamente no processo ventilatório, tanto na inspiração (processo ativo, com gasto de energia) como no retorno, através das forças de recolhimento, para seu ponto de repouso. Quando a caixa torácica se eleva, as costelas projetam-se quase inteiramente para frente, de maneira que o esterno também se move para frente e para longe da coluna vertebral, aumentando o diâmetro anteroposterior do tórax. (GRAAF, 2003) Os músculos que elevam a caixa torácica são os músculos da inspiração (intercostais externos) e, em casos de dificuldade respiratória é demandada a ação dos músculos acessórios, que incluem os músculos esternocleidomastóideo, o serrátil anterior e o escaleno. O diafragma é um músculo de atuação inspiratória, que divide anatomicamente a caixa torácica da cavidade abdominal dos seres humanos. A respiração tranquila normal é realizada por esse músculo, que, durante a inspiração, contrai-se, aumentando o volume torácico e, consequentemente, provocando a expansão dos pulmões. Durante a expiração, o diafragma relaxa e a retração elástica dos pulmões, da parede torácica e das estruturas abdominais comprime os pulmões. (GRAAF, 2003) Já os músculos que deprimem a caixa torácica são os músculos da expiração, incluindo os intercostais internos, o reto do abdominal e outros músculos abdominais que comprimem o conteúdo abdominal para cima em direção ao diafragma (GUYTON, 2017). A expiração, dessa maneira, embora seja habitualmente derivada de um processo passivo, também pode ser feita de forma ativa, como nos reflexos de tosse e espirro, ou quando o indivíduo assim o desejar (AMIB, 2017). Os ductos alveolares, alvéolos pulmonares e sacos alveolares compõem a porção respiratória dos pulmões. As trocas de gases ocorrem através das paredes dos minúsculos alvéolos pulmonares e o grande número dessas estruturas propiciam uma área de superfície muito grande (60 a 80 metros quadrados) para a difusão dos gases (GUYTON, 2017). 6 Imagem 05: Esquema das vias aéreas intrapulmonares Fonte: NETTER, 2018 O tipo II de células alveolares permite a difusão e é mais espesso do que o tipo I de células alveolares, que secreta uma substância chamada surfactante, reduzindo, assim, a tendência dos alvéolos pulmonares se colapsarem (GRAAF, 2003). Processos de agressão ao pulmão que resultem em inflamação poderão causar edema, com espessamento do interstício alvéolo-capilar, e devido ao aumento da permeabilidade levar ao preenchimento da luz alveolar com líquido, proteínas, células e mediadores inflamatórios, causando a diluição da surfactante e levando ao colapsamento alveolar com perda de sua função (AMIB, 2017). Volume Corrente (VC) é definido como o ar que entra e sai das vias aéreas num ciclo ventilatório habitual. Em pacientes EXTUBADOS, fisiologicamente estima-se que o VC varie de 10-12 ml/kg de peso predito (Predicted Body Weight, PBW). No entanto, em pacientes sob ventilação invasiva esse volume deve ser menor, variando entre 6-8 ml/kg de PBW em pulmões normais (AMIB, 2017). 7 O Volume de Reserva Expiratório (VRE) é todo ar que se consegue expirar forçadamente após uma expiração normal. O ar que não se consegue expirar é denominado de Volume Residual (VR). A soma de VR+VRE é a Capacidade Residual Funcional e representa na prática clínica o ponto de repouso da caixa torácica. Quando se intuba um paciente, modifica-se o equilíbrio de pressões ao final da expiração, permitindo-se que uma parte do VRE seja expirado com maior facilidade, passivamente. Isso pode ocasionar queda na CRF e possibilita a formação de micro-atelectasias, por isso deve-se manter um volume extra ao final da expiração, visando a manutenção daCRF no valor mais próximo da normalidade (AMIB, 2017). Dessa maneira, é possível medir a pressão gerada pela presença desse volume - Pressão Positiva ao Final da Expiração (PEEP). Recomenda-se que no paciente sob VMI deve-se utilizar de uma mínima PEEP (“PEEP fisiológica”), que, na prática, varia de 3-5 cm H2O. O objetivo dessa PEEP “fisiológica” será ajudar a restabelecer a CRF e impedir a ocorrência de atelectasias laminares, por exemplo (AMIB, 2017). Destaca-se também os conceitos de strain e stress, fenômenos mecânicos próprios de microestruturas ou pequenas áreas do corpo humano. “Stress’’ é definido como a distribuição interna das forças contrárias à força exercida por unidade de área, sendo o balanço, a reação a uma carga externa e avaliado pela Pressão Transpulmonar (Paw – Ppleural. “Strain” é a deformação da estrutura que sofre “stress”, havendo modificação de seu tamanho e/ ou forma em relação ao seu status inicial, sendo avaliado pela mudança de volume causado peço Stress, ou seja, o Delta V entre o Volume inspirado e a Capacidade Residual Funcional (AMIB, 2017). Ventilar é deslocar o ar e, no caso do sistema respiratório, almeja-se deslocar o ar do ambiente para intimidade alveolar e de lá de volta ao ar ambiente, diferindo-se, dessa maneira, da hematose em si. Ventilação e hematose estão intimamente dependentes e ligadas, mas são processos diferentes, assim, o aparelho que muitos chamam de RESPIRADOR, na verdade é um VENTILADOR artificial, pois tem por meta manter a renovação do ar alveolar de maneira adequada (AMIB, 2017). Na beira do leito, essa renovação do ar alveolar é expressa pelo Volume-Minuto. A formula do Volume-Minuto é VC x frequência respiratória. a ventilação pulmonar pode ser medida também pela mecânica global do sistema respiratório e pela conseqüência que exerce no organismo, através da obtenção do nível da pressão parcial do gás carbônico dissolvido no sangue na forma de gás (PaCO2). Já uma diminuição na PaO2 pode ser usada como marcador de problemas de troca, desde que mantida ou aumentada a Fração 8 Inspirada de O2. Assim, na beira-do-leito podese avaliar a TROCA GASOSA de forma muito prática usando-se a relação PaO2/FiO2 (AMIB, 2017). Levando-se em consideração a pressão atmosférica ao nível do mar (760 mmHg), temos que, em ar ambiente, a pressão de oxigênio será em torno de 150 mmHg e vapor d’água e dióxido de carbono quase nulas. Já na intimidade alveolar, a Pressão Alveolar do Oxigênio (PAO2), é em torno de 90 mmHg, e assim, a PACO2, em torno de 40 mmHg e a PVH2O em torno de 47 mmHg. Em condições de repouso, o sangue capilar pulmonar entra em contato com o alvéolo por cerca de 0,75 segundo, atingindo completo equilíbrio com o oxigênio alveolar logo após cerca de um terço de seu caminho ao longo desse percurso (GUYTON, 2017). A Oxihemoglobina é a molécula que é responsável pela quase totalidade do transporte do O2 para as células, podendo estar ou não estar totalmente saturada de O2. A Oxihemoglobina terá maior ou menor afinidade pelo O2 de acordo com algumas situações, a saber: Hipertermia, corticoides, acidoses, fosfatos orgânicos, aumento de Hb; aumento de 2,3 DPG; Hipotermia, alcaloses, hipocapnia, dim. da Hb, dim. fosfatos, presença Hb anormais (GUYTON, 2017). O transporte de oxigênio (TO2) ou Oferta de Oxigênio (DO2) é função primordial do sistema cardiocirculatório. Sob condições normais, a oferta de oxigênio às células é controlada pela taxa metabólica celular, processo denominado “oferta direcionada pela demanda”. O tônus vascular da microcirculação atua de acordo com a necessidades celulares visando manter a PO2 intracelular acima de um nível mínimo (AMIB, 2017). Os pulmões são órgãos cônicos, cuja distribuição do ar e sangue se faz de forma heterogênea. Pesquisas recentes demonstraram que os alvéolos do ápice pulmonar são de maior tamanho, mas com menor capacidade de expansão que os alvéolos da base pulmonar. Também já foi demonstrado que há um maior direcionamento de volume total de sangue para as bases pulmonares do que para os ápices, devido à força da gravidade e à anatomia dos pulmões. Os pulmões são órgãos de interface ar-sangue e o organismo visa o acoplamento VENTILAÇÃO/PERFUSÃO (V/P) (AMIB, 2017). As áreas de tecido submetidas somente a ventilação - sem perfusão - são denominadas áreas de espaço morto. Logo, as áreas submetidas a predomínio de ventilação sobre perfusão estão sob Efeito Espaço Morto. Já áreas que apresentem somente perfusão, sem ventilação estão sob o denominado “Shunt” e aquelas áreas sob predomínio de perfusão sobre a ventilação estão sob Efeito “Shunt”. Assim sendo, a base pulmonar tem 9 predomínio de perfusão sobre ventilação (efeito shunt) e o ápice predomínio de ventilação sobre perfusão (efeito espaço morto) (AMIB, 2017). A interrupção desse processo de ventilação-perfusão pode se dar por inúmeras causas, e em diversos pontos da cadeia respiratória, podendo ocasionar uma Síndrome, denominada de Sd. de Insuficiência Respiratória Aguda (IRpA). A mesma tem início súbito e caso não venha a ser revertida ou corrigida em sua causa, levará o paciente ao óbito, vez que o corpo humano não consegue manter sua fisiologia sob respiração exclusiva anaeróbia (AMIB, 2017). Desta maneira, frente às mais variadas doenças e situações clínicas que podem ocasionar a IRpA, tornou-se necessário desenvolver, no decorrer da história, recursos cada vez mais elaborados que pudessem garantir o adequado suporte ao paciente até que o mesmo possa recuperar sua capacidade de respiração. A Ventilação artificial é um dos meios de suporte a esta situação. Nesse viés, compreender seu funcionamento, sua aplicação e seus riscos é essencial para poder oferecer o melhor tratamento, com possibilidade real de cura, àqueles que dela necessitarem. 2. AVALIAÇÃO DA VIA AÉREA NA SALA DE EMERGÊNCIA O manejo da via aérea nos serviços médicos de emergência deve concentrar-se na rápida avaliação e em intervenções simultâneas. Os objetivos são a otimização da oxigenação e da ventilação com a minimização de complicações como aspiração, enquanto facilita a liberação e o transporte, realizando quaisquer outros tratamentos fundamentais que possam estar indicados. Em geral, as intervenções menos invasivas e menos demoradas que alcancem esses objetivos são preferíveis (BROWN, CALVIN, 2019). Nesse sentido, é fundamental o reconhecimento precoce do paciente em potencial risco de evoluir para insuficiência respiratória aguda, ou que já esteja neste estado. Os principais sinais e sintomas de alarme são: Trauma Crânio Encefálico (TCE); Trauma de face; Cornagem; Utilização de musculatura acessória; Trauma de pescoço; Intoxicações; Cianose; Apneia; Pacientes potencialmente em risco de broncoaspiração; Lesão da via aérea por inalação; Convulsões sucessivas e reentrantes; Incapacidade de manter ventilação adequada sob máscara (BROWN, CALVIN, 2019). 10 A avaliação clínica detalhada encontra-se prejudicada em situações de emergência, dessa maneira é crucial habilidade e agilidade para avaliar prováveis causas de dificuldade ao acesso das vias aéreas. Entre essas, pode-se citar fratura ou rigidez de coluna cervical, micro ou macrognatismo, fratura de face ou mandíbula, boca pequena ou impedida de abrir, estenose traqueal. Se houver previsão de via aérea difícil, é de suma importância solicitar auxílio (BROWN, CALVIN, 2019). Em um cenário pré-hospitalar, destaca-se o trauma e suas consequências como a grande causa de emergência. Na esteira dessa lógica, sinais de obstrução devem ser prontamente identificados. Ressalta-se a importância de estimular uma resposta verbal do paciente, pois a fala constitui uma garantia, pelo menos temporária, de que a via aérea está permeável (sugere-se que o profissional de saúde que realiza o atendimento questione,por exemplo, “Qual o seu nome?” ou “Você sabe onde está?”). A incapacidade do paciente de falar adequadamente, de sentir, de deglutir as secreções, ou a presença de estridor, dispneia ou alteração do estado mental impedindo as respostas às questões exigem uma avaliação detalhada da suficiência da via aérea e da ventilação (BROWN, CALVIN, 2019). Após avaliar a resposta verbal às questões, é importante realizar um exame mais detalhado da boca e da orofaringe. Dessa maneira, é necessário investigar possíveis sangramentos, edema da língua ou da úvula, anormalidades da orofaringe (p. ex., abscesso peritonsilar) ou qualquer outra anormalidade que possa interferir na livre passagem de ar através da boca e da orofaringe (BROWN, CALVIN, 2019). Além disso, é relevante a avaliação da integridade da mandíbula, da porção central da face e da porção anterior do pescoço (inspeção e palpação). Durante a palpação, deve- se avaliar com cuidado a presença de enfisema subcutâneo (sensação de crepitação), uma vez que ela pode indicar ruptura de um conduto de passagem de ar, lesão pulmonar, ruptura esofágica ou, raras vezes, infecções formadoras de gás (BROWN, CALVIN, 2019). Após a inspeção e a palpação da via aérea superior, observar o padrão respiratório do paciente durante vários ciclos respiratórios, observando a simetria normal e o movimento concordante do tórax. A obstrução da via aérea inferior, que ocorre além do nível da glote, costuma produzir estridor expiratório, cujo volume e tom estão relacionados à velocidade e à turbulência do fluxo ventilatório (BROWN, CALVIN, 2019). 11 A ausculta do tórax para avaliar a eficiência das trocas gasosas pode revelar sons respiratórios reduzidos, indicando pneumotórax, hemotórax, derrame pleural, enfisema ou outra patologia pulmonar (BROWN, CALVIN, 2019). A saturação de oxigênio é monitorada continuamente por oximetria de pulso, e as gasometrias arteriais raras vezes estão indicadas para o propósito de determinar as tensões arteriais de oxigênio. A capnografia contínua pode ser usada para a avaliação das mudanças na capacidade de ventilação adequada do paciente, e a medida da tensão arterial de CO2 contribui com poucas informações úteis (BROWN, CALVIN, 2019). Uma gasometria venosa ou arterial pode fornecer uma boa ideia geral do estado acidobásico do paciente e de sua ventilação basal, mas a avaliação da ventilação global continua sendo uma tarefa clínica, necessitando da avaliação do estado geral do paciente e da trajetória percebida. Em pacientes com doença pulmonar obstrutiva, como asma ou doença pulmonar obstrutiva crônica (DPOC), a intubação pode ser necessária em tensões de CO2 devido à fadiga do paciente (BROWN, CALVIN, 2019). Dessa maneira, o manejo inicial do paciente na sala de emergência sempre deverá respeitar o protocolo ATLS quando se tratar de um trauma. Assim, o manejo tem como principais procedimentos de auxílio: (ATLS, 2018) • Sempre solicitar ajuda; • Monitorização contínua do paciente grave; • Aspiração de conteúdo em cavidade oral; • Ventilação com máscara + ambu em fonte de O2; • Sedação adequada do paciente, para permitir um procedimento rápido e não traumático As manobras de permeabilização - como elevação do mento e tração da mandíbula - devem ser realizadas com proteção da coluna cervical. A monitorização da oximetria de pulso e capnografia são essenciais. A prioridade, nesse momento, é assegurar oxigenação continuada, assim, a via aérea pode ser mantida com uma cânula orofaríngea (Guedel). Este procedimento é útil para a ventilação temporária no doente inconsciente, enquanto se tomam as medidas cabíveis para estabelecer uma via aérea definitiva se necessário (ATLS, 2018). A via aérea definitiva implica em um tubo endotraqueal, com o balão insuflado, devidamente fixado com fita adesiva, conectado a um sistema de ventilação assistida, 12 com mistura enriquecida de oxigênio. Os tipos de via aérea definitiva serão melhor discutidos ao longo desta monografia e os mais utilizados no manejo emergencial são: tubo orotraqueal, tubo nasotraqueal e via aérea cirúrgica (cricotireoidostomia cirúrgica ou por punção) (ATLS, 2018). A pré-oxigenação antes de estabelecer uma via aérea definitiva é recomendada, uma vez que fornece uma margem adicional de segurança. A melhor maneira de fornecer ar oxigenado é via dispositivo de balão e máscara com válvula unidirecional com reservatório a um fluxo de 11 litros por minuto (ATLS, 2018). Imagem 06: Algoritmo principal para o manejo da via aérea de emergência. Fonte: ATLS, 2018. 13 3. EQUIPAMENTOS PARA ACESSO A VIA AÉREA NA SALA DE EMERGÊNCIA E ASSISTÊNCIA RESPIRATÓRIA Seja no cenário pré-hospitalar ou hospitalar, deve-se ter em mente que o objetivo primordial é o controle imediato da via aérea e sua permeabilidade. Nesse sentido, é essencial que os equipamentos necessários para o manejo adequado das vias aéreas estejam em boas condições, com a integridade testada previamente e prontamente disponíveis (BATRA, 2005). Os principais equipamentos necessários para o manejo da via aérea na sala de emergência são: • Aparelho de sucção e cateter de Yankauer • Bolsa-válvula-máscara (AMBU) Imagem 07: AMBU Fonte: (UNASUS, 2021) Na ventilação com ambu, uma bolsa autoinflável (bolsa de reanimação) é conectada a uma válvula não respiratória e então a uma máscara facial que adapta-se aos tecidos moles da face. A extremidade oposta da bolsa é conectada a uma fonte de oxigênio (100% de oxigênio) e geralmente a um reservatório. A máscara é mantida manualmente firme contra a face, e o ato apertar a bolsa ventila o paciente pelo nariz e pela boca (SOLEIMANPOUR, 2016). A menos se contraindicado (por exemplo, ordem de não reanimar ou diretiva antecipada específica), usam-se das vias respiratórias adjuvantes, como cânulas nasofaríngeas e/ou orofaríngeas, durante a ventilação com ambu para ajudar a manter a via respiratória pérvia (SOLEIMANPOUR, 2016). https://www.msdmanuals.com/pt-br/profissional/t%C3%B3picos-especiais/quest%C3%B5es-m%C3%A9dico-legais/ordens-de-n%C3%A3o-reanima%C3%A7%C3%A3o-onr-e-ordens-m%C3%A9dicas-para-manuten%C3%A7%C3%A3o-do-tratamento-de-suporte-%C3%A0-vida-polst-do-ingl%C3%AAs-physician-orders-for-life-sustaining-treatment https://www.msdmanuals.com/pt-br/profissional/t%C3%B3picos-especiais/quest%C3%B5es-m%C3%A9dico-legais/diretivas-avan%C3%A7adas https://www.msdmanuals.com/pt-br/profissional/t%C3%B3picos-especiais/quest%C3%B5es-m%C3%A9dico-legais/diretivas-avan%C3%A7adas 14 Deve-se usar válvulas de pressão expiratória final positiva (PEEP) se for necessária assistência adicional para a oxigenação sem contraindicações ao seu uso. A correta ventilação com ambu requer competência técnica e depende de 4 elementos: via respiratória pérvia, vedação adequada da máscara, técnica de ventilação apropriada e válvula PEEP se necessário para melhorar a oxigenação (SOLEIMANPOUR, 2016). Se a ventilação com ambu for usada durante um período prolongado ou se for feita incorretamente, pode-se introduzir ar no estômago. Se isso ocorrer e houver distensão gástrica, inserir uma sonda nasogástrica para remover o ar acumulado no estômago (SOLEIMANPOUR, 2016). Na técnica com duas pessoas fazendo a ventilação, o mais experiente assume a máscara, porque manter a vedação adequada da máscara é a tarefa mais difícil. A segunda pessoa ambusa. Em seguida, o profissional que assumir a vedação da máscara deve, usando as duas mãos, deve segurar a máscara entre os polegares e os indicadores posicionados nos dois lados da haste do conector. A posição tradicional das mãos é a preensão "C-E", posicionando os dedos médios, anulares e mínimos (o "E") sob a mandíbula e puxando a mandíbula para cima, enquanto os polegares e os indicadores criam um "C" pressionando a máscara. O profissional deve semprecertificar-se de aplicar elevação apenas nas partes ósseas da mandíbula, porque a pressão nos tecidos moles do pescoço ou embaixo do queixo pode obstruir as vias respiratórias. Quando for obtida vedação adequada, pedir para a outra pessoa conectar o ambu à máscara e iniciar a ventilação (SOLEIMANPOUR, 2016). Caso apenas um profissional vá realizar a ventilação, usando uma das mãos, deverá segurar a máscara, com o polegar e o dedo indicador em volta da haste do conector da máscara. A maioria das pessoas usa a mão não dominante para segurar a máscara, mas as duas mãos podem ser usadas desde que seja possível obter uma boa vedação da máscara (SOLEIMANPOUR, 2016). Para cada inspiração, comprimir o ambu de maneira firme e suave a fim de prover um volume corrente de 6 a 7 mL/kg (ou cerca de 500 mL para um adulto de tamanho médio) por 1 segundo e então soltar a bolsa para permitir que ela infle novamente. Ao usar um ambu de 1.000 mL, comprimir apenas até a metade para obter o volume 15 corrente correto. Em caso de parada cardíaca, não exceder 8 a 10 inspirações por minuto (uma respiração completa a cada 6 a 7,5 segundos) (SOLEIMANPOUR, 2016). • Cânula respiratória orofaríngea de Guedel Imagem 08: Cânulas orofaríngeas de diferentes tamanhos Fonte: (UNASUS, 2021) As cânulas orofaríngeas são dispositivos intraorais rígidos que se adaptam à língua e a deslocam para longe da parede posterior da faringe, restaurando assim a patência da via respiratória (HABRAT, 2019). As cânulas faríngeas (tanto orofaríngeas como nasofaríngeas) são um componente preliminar das vias respiratórias superiores para pacientes com apneia ou insuficiência ventilatória grave, que também inclui o posicionamento adequado do paciente e as manobras manuais da mandíbula (HABRAT, 2019). Constituem-se contraindicações absolutas ao uso de cânulas orofaríngeas o nível de consciência adequado ou a presença de reflexo faríngeo, enquanto o trauma bucal e o trismo são considerados contraindicações relativas, indicando-se preferencialmente nesses casos, o uso de cânulas nasofaríngeas (HABRAT, 2019). O procedimento inicia-se com o posicionamento adequado do paciente na posição olfativa (se não houver lesão de coluna cervical). Conforme necessário, limpar secreções obstrutivas, vômitos ou corpo estranho na orofaringe. Determinar o tamanho apropriado da cânula orofaríngea. Segurar a cânula na lateral da face do paciente com a aba no canto da boca. A ponta de uma cânula de tamanho adequado só deve chegar até o ângulo do ramo da mandíbula. A seguir, começar a inserir as cânulas na boca com a ponta voltada para o palato (concavidade para cima). Girar a cânula 180 graus à medida que avança posteriormente para a orofaringe, essa técnica evita que as cânulas 16 empurrem a língua para trás durante a inserção obstruindo ainda mais a passagem do ar. Quando totalmente inserida, a aba do dispositivo deve ficar apoiada nos lábios do paciente (HABRAT, 2019). • Cânula respiratória nasofaríngea Imagem 09: Cânulas nasofaríngeas de diferentes tamanhos Fonte: (UNASUS, 2021) As cânulas nasofaríngeas são tubos flexíveis com uma extremidade alargada e a outra extremidade chanfrada, que são inseridas, a extremidade chanfrada primeiro, pelas narinas até a faringe (HABRAT, 2019). Constituem-se como contraindicações absolutas ao uso de cânula nasofaríngea a suspeita de fratura da placa cribriforme (base do crânio e como contraindicações relativas o trauma nasal significativo (HABRAT, 2019). O procedimento se inicia com o paciente em supinação ou ligeiramente inclinado na maca. Conforme necessário, limpar secreções obstrutivas, vômitos ou corpo estranho na orofaringe. Determinar o tamanho apropriado da via respiratória. Quando colocada na lateral da face, a cânula do tamanho certo vai da ponta do nariz até o trago da orelha. Medir o comprimento da via respiratória para assegurar que não cause obstrução. Em seguida, deve-se abrir as narinas para revelar a passagem nasal. Inspecionar as duas narinas para determinar qual lado é mais largo. Lubrificar as cânulas nasofaríngeas com lubrificante solúvel em água ou gel anestésico, como gel de lidocaína. Inserir a cânula nasal posteriormente (não em direção cefálica) paralelamente ao assoalho nasal, com o bisel da ponta voltado para o septo nasal (ou seja, a extremidade lateral pontiaguda e a extremidade aberta da cânula voltada para o septo). Usar pressão suave, porém firme, para passar cânulas pelas narinas sob o corneto inferior. Se houver resistência, tentar girar ligeiramente as cânulas e voltar a avançar. Se mesmo assim a cânula não passar, 17 tentar inserir na outra narina. Avançar as cânulas na direção da nasofaringe posterior até que a aba esteja na abertura da narina (HABRAT, 2019). • Máscara Laríngea Imagem 10: Máscara laríngea Fonte: Disponível em: <https://www.stramedicalshop.com.br/masc ara-laringea-descartavel-n-1-rn-a-lactentes- ate-5kg-novamasc> Acesso em maio de 2021. A máscara laríngea é uma alternativa à ventilação pela cânula orotraqueal, salvas as considerações de que não protege completamente o paciente de aspiração ou laringoespasmo (BRIMACOMBE, 1997). Existem vários tipos de máscaras laríngeas, algumas descartáveis e outras reutilizáveis, sendo que a essência do dispositivo se configura em um tubo para ventilação de vias aéreas com um manguito semelhante a uma máscara na sua extremidade. Alguns modelos apresentam “barras” de abertura (uma “grade” sobre a entrada da laringe) que podem evitar a interferência da epiglote na ventilação, enquanto outras que possuem “protetores” (ou “blocos”) de mordida que protegem a máscara laríngea de um possível reflexo do paciente após a passagem (BRIMACOMBE, 1997). A passagem da máscara laríngea exige um componente de sedação (opioides, hipnóticos, agentes inalatórios, etc) para evitar o reflexo de tosse, engasgo, laringoespasmo ou esforço respiratório (BRIMACOMBE, 1997). O procedimento inicia-se assim que o manguito da máscara laríngea estiver lubrificado. Primeiramente, o profissional de saúde deve segurar o dispositivo com o dedo indicador da sua mão dominante, de forma que ele fique na junção entre o manguito e o tubo da máscara. Em seguida, o manguito precisa ficar posicionado pressionando o palato 18 duro (utilizando o dedo indicador do passo anterior para te ajudar), e logo após, deslizar a máscara laríngea ao longo do palato para trás e para baixo, até encontrar resistência. O dedo vai saindo a medida da introdução, e nessa transição, a mesma mão dominante “empurra” o dispositivo evitando que ele se desloque. Após essa etapa, deve-se insuflar através de uma seringa até atingir a pressão necessária para uma vedação adequada (BRIMACOMBE, 1997). • Capnógrafo • Catateres intravenosos • Catateres para aspiração • Conjunto de Intubação Retrógrada • Coxins • Estetoscópio • Fibrobroncoscópio • Fio Guia • Fita tape • Fonte de oxigênio (100% de oxigênio, 15 L/minuto) • Laringoscópio com lâmpada íntegra Lâminas curvas (Macintosh) e retas (Miller) • Luvas, máscara, capote e proteção para os olhos (precauções universais) • Máscaras de ventilação de diversos tamanhos • Máscaras, óculos, luvas • Material para Cricotireoidostomia • Oxímetro de pulso • Pinça de Magill • Pomada/gel lubrificante • Seringas • Sonda nasogástrica • Tubos Endotraqueais de diferentes calibres • Válvula de PEEP 19 4. INDICAÇÕES E PREPARO ENDOTRAQUEAL Via aérea definitiva implica em um tubo endotraqueal, com o balão insuflado abaixo das cordas vocais, devidamente fixado com fita ou cadarço, conectado a um sistema de ventilação assistida, com mistura enriquecida em oxigênio (ATLS, 2018). A determinação do médico em relação à necessidade de intubação se baseia no cenário clínico, na fisiopatologia,na avaliação da via aérea à beira do leito e na probabilidade de deterioração (BROWN, 2019). A decisão de intubar deve se basear em três (03) avaliações clínicas fundamentais: (VELASCO, 2020) 1. Há incapacidade de manter ou proteger a via aérea? Pacientes sem reflexos de proteção da via aérea têm maior risco de aspiração, e há maior dificuldade na manutenção de ventilação adequada. Nesse sentido, a fonação clara e desimpedida é boa evidência do controle adequado da musculatura da via aérea. A habilidade de deglutição espontânea é bom indicador da proteção da via aérea, enquanto a observação de secreções acumuladas na orofaringe indica o oposto (VELASCO, 2020). Dessa maneira, a apresentação de lesões por inalação, fraturas faciais ou hematomas retro faríngeos são indicações de IOT devido ao comprometimento iminente ou potencial da via aérea. O reflexo de vômito é contraindicado para essa avaliação, uma vez que além de não ser comprovadamente útil na avaliação de proteção, pode induzir ao vômito e à aspiração no paciente que não tem controle da musculatura de via aérea superior (VELASCO, 2020). 2. Há incapacidade de ventilar ou oxigenar? A hematose é necessária para a função dos órgãos vitais, nesse viés, mesmo breves períodos de hipoxia devem ser evitados. Se o paciente é incapaz de ventilar de maneira suficiente, ou se não consegue atingir uma oxigenação ideal apesar do uso de oxigênio suplementar, então está indicada a intubação (BROWN, 2019). Esse é o caso de pacientes com doenças obstrutivas de vias aéreas (como angioedema), doenças neuromusculares (como miastenia gravis) ou doenças que afetem a troca gasosa no parênquima pulmonar (doença pulmonar obstrutiva crônica [DPOC], asma ou doenças intersticiais pulmonares) (VELASCO, 2020). 20 Os principais indicadores de falha ventilatória são taquipneia, estridor e respiração superficial. Em pacientes que apresentaram taquipneia, o desenvolvimento de eupneia ou bradipneia, no contexto de piora da doença, indica que houve atraso da intubação (VELASCO, 2020). Não se deve aguardar a alteração de exames laboratoriais como acidose respiratória ou hipoxemia no contexto de doença aguda, já que tais alterações também são indicativas de atraso na intubação (VELASCO, 2020). 3. Qual a evolução clínica ou o desfecho esperados? A avaliação de possível agravamento das condições de via aérea do paciente, mesmo que não imediatamente evidente, deve ser levada em conta na decisão de intubação. Naqueles com lesão expansiva cervical ou de sistema nervoso central, as deteriorações da anatomia e da proteção da via aérea, respectivamente, indicam a intubação precoce com o objetivo de evitar situações potencialmente perigosas ao paciente e estressantes ao médico. Nos casos de pacientes em anafilaxia ou com queimaduras de face, a intubação precoce também é indicada em razão da rápida alteração da anatomia glótica (VELASCO, 2020). Dessa maneira, a única contraindicação absoluta de intubação orotraqueal é a transecção da traqueia e as principais indicações de IOT baseiam-se em: (VELASCO, 2020) • Procedimentos e cirurgias; • Impossibilidade de manter via aérea pérvia (algumas indicações de obstrução de via aérea superior são voz abafada, incapacidade de deglutir as secreções devido a dor ou obstrução, estridor e dispneia); • Insuficiência respiratória aguda grave e refratária; • Hipoxia e/ou hipercapnia; • Escala de Coma de Glasgow (GCS) ≤ 8; • Instabilidade hemodinâmica grave ou parada cardiorrespiratória; • Antecipação de piora em pacientes queimados ou em pacientes com visível desconforto respiratório que poderão entrar em fadiga da musculatura respiratória. 21 Outrora, a avaliação de todos os preditores de dificuldade dos pacientes que terão a via aérea manipulada é crucial para o prosseguimento e preparo de qualquer procedimento de maneira segura. Os principais fatores que podem indicar a dificuldade na execução de manobras para abordagem da via aérea são lesões da co1una cervical, artrite avançada da coluna cervical, trauma mandibular ou maxilofacial significativo, limitação na abertura da boca e obesidade (ATLS, 2018). A avaliação de uma laringoscopia difícil pode ser realizada por meio de análise do mnemônico “LEMON”, que consiste em: (VELASCO, 2020) L: Look externally: avaliação subjetiva de potenciais dificuldades a serem encontradas durante a laringoscopia, como alterações anatômicas, sangramento, obesidade, entre outras. E: Evaluate: avaliação 3-3-2. Abertura oral correspondente a 3 dedos, distância mento- hióideo de três dedos, hio-tireóideo de dois dedos sempre levando em conta o dedo do paciente e não o do examinador. Imagem 11: Avaliação 3-3-2 Fonte: VELASCO, 2020 M: Mallampati: diz respeito à relação entre abertura oral, tamanho da língua do paciente e tamanho da orofaringe. Imagem 12: Classificação de Mallampati 22 Fonte: VELASCO, 2020 O: Obstruction: são quatro os indicadores de obstrução da via aérea: voz abafada, estridor, dispneia, salivação excessiva. N: Neck mobility: diz respeito à possibilidade de mobilização cervical. Pacientes com restrição extrínseca (colar cervical) ou intrínseca (doenças reumáticas) apresentam maior dificuldade à laringoscopia direta, principalmente as restrições intrínsecas. Em 2018, diversas sociedades e associações britânicas ligadas à anestesia e terapia intensiva publicaram um documento conjunto com as melhores práticas para intubação orotraqueal e o mesmo recomenda o uso da classificação de “MACHOCHA” para avaliação de uma via aérea difícil, uma vez que atualmente é a única ferramenta validada para este fim (HIGGS, 2018). Tabela 01: Escore de MACOCHA Fonte: HIGGS, 2018 http://bjanaesthesia.org/article/S0007-0912(17)54060-X/fulltext 23 O escore varia de 0 (fácil) a 12 (muito difícil). Um MACOCHA > 3 indica via aérea difícil. Neste cenário, um segundo médico deve ser chamado para ajudar a realizar o procedimento (HIGGS, 2018). Uma recomendação interessante é que, em um paciente com via aérea difícil, seja marcado o sítio da cricotireoidostomia antes da 1ª tentativa de intubação, seja pelo palpação ou com uso do US, permitindo que o médico responsável ganhe tempo caso falhe na IOT (recomenda-se um máximo de 3 tentativas) (HIGGS, 2018). 5. USO RACIONAL DE FÁRMACOS PARA O ACESSO DA VIA AÉREA NA EMERGÊNCIA Os agentes farmacológicos devem estar disponíveis para facilitar os procedimentos de manejo ou estabelecimento de via aérea definitiva. Visto que nas circunstâncias de emergência é comum a situação de “full stomach” e propensão a aspiração, recomenda- se a sequência rápida de intubação – quando há certeza razoável de que esta não será difícil (WONGYINGSINN, 2009). Para tanto, sugere-se que os seguintes fármacos estejam disponíveis: Propofol, Tiopental, Etomidato, Midazolam, Fentanil, Succicinilcolina, Atropina, Lidocaína. Além destes agentes, destaca-se a Hidrocortisona, utilizada para reduzir edema de manipulação (BATRA, 2005). São necessários agentes para induzir analgesia, sedação e relaxamento muscular, destacando-se como principais exemplos: Pré-tratamento: Os opioides devem ser administrados de forma lenta e sempre observando o padrão respiratório do paciente, pois, em determinadas situações pode haver depressão respiratória e apneia (HIGGS, 2018). A utilização de pré-medicação com fentanil deve ser criteriosa e seu uso de rotina para todos os pacientes não é indicado devido ao seu potente efeito hipotensor. O fentanil é um opioide de ação curta, analgésico e simpatolítico, que diminui os efeitos cardiovasculares da laringoscopia por estimulação do sistema nervoso simpático em pacientes para os quais não é desejável um rápido aumento da pressão arterial. Está indicada sobretudo em pacientes com sangramento intracraniano ativo, hipertensãointracraniana ou com dissecção aórtica e que se apresentem em crise hipertensiva previamente à intubação (VELASCO, 2020). 24 Dessa maneira, as principais medicações de uso recomendado nessa etapa são: (DIEGO, 2020) • Anfetanil (0,5mg/mL): 10-30mcg/kg EV em bólus • Fentanil (50mcg/ mL): 3mcg/kg EV em bólus lento • Remifentanil (1mg/frasco): 0,5-1 mcg/kg/min EV em bomba de infusão • Lidocaína (20mg/ mL): 1,5 mg/kg EV em bólus. Sedação • Cetamina (50mg/mL): 1,5-2 mg/kg EV em bólus. Fármaco indicado para pacientes com asma (efeito broncodilatador da medicação) ou choque anafilático que tenham sistema nervoso autonômica intacto, pois causa aumento do tônus simpático. Recomenda-se que seja evitada em pacientes com dissecção aórtica suspeita ou conhecida, com aneurisma da aorta abdominal, com infarto agudo do miocárdio (IAM) ou com hipertensão intracraniana (DIEGO, 2020). • Etomidato (2mg/mL): 0,3 mg/kg EV em bólus Medicação de efeito rápido e tempo de ação curto, cerebroprotetivo e não associado à queda significativa na pressão arterial. Esse fármaco é considerado vantajoso pois não causa vasodilatação ou depressão miocárdica, sendo hemodinamicamente neutro em comparação com outros agentes. (DIEGO, 2020) Não há clara evidências sobre a supressão adrenal após dose única. • Midazolam (5mg/ mL): 0,1-0,5 mg/kg EV em bólus Fármaco de início lento (2-3 minutos sem pré-tratamento com opioides) e duração (até várias horas) maior do que a do etomidato. No entanto, pode acompanhar hipotensão. Não é recomendada como agente de indução por causa do atraso no tempo de indução, predileção de hipotensão e duração prolongada da ação. Pode ser revertido com flumazenil. (DIEGO, 2020) • Propofol (10mg/ mL): 0,5-2 mg/kg EV em bólus Medicação mais comum utilizada para sequência rápida de intubação, pois tem início rápido, curta duração e é cerebroprotetivo. Considerado vantajoso pois tem início rápido (em 30-45 segundos), suprime reflexos de via aérea, induz apnéia e tem duração de 5 a 10 minutos, sendo a medicação de escolha para grávidas. 25 No entanto, o propofol também está associado à hipotensão por vasodilatação venosa e arterial, sendo um depressor do miocárdio e da resistência vascular periférica. (DIEGO, 2020) Bloqueio neuromuscular • Succinilcolina (100mg/frasco): O pó do frasco é diluído em 10mL de solução fisiológica para atingir a diluição de 10mg/Ml. Dose usual: 1-1,5 mg/kg EV em bólus lento. Fármaco despolariazante, de início rápido (em 45 a 60 segundos) e menor duração da ação (8-10 minutos). É necessário precaução em pacientes com hipercalemia ou com doença neuromuscular crônica pois pode ocasionar hipertermia maligna. A maioria dos pacientes têm fasciculações e também pode causar aumento da pressão intragástrica. Após a sua administração e realização da intubação, deve-se administrar outro relaxante de longa duração para possibilitar o acoplamento do paciente no respirador. (DIEGO, 2020) • Rocurônio (10mg/mL): 0,6-1mg/kg EV em bólus Início de ação mais lento (60 a 75 segundos) do que com succionilcolina e maior duração da ação (30-60 minutos). Doses maiores entre 1-1,2mg/kg promovem um relaxamento em 30 segundos, por isso em pacientes com via aérea difícil doses maiores são recomendadas. Não resulta problemas para pacientes hipercalêmicos ou com potencial para hipercalemia. Pode ser revertido com Sugadamadex. • Cisatracúrio (2mg/mL): 0,1 mg/kg EV • Vecurônio (4mg/frasco): 0,1 mg/kg EV em bólus. Diluir dois frascos em 8 mL de solução fisiológica. • Atracúrio (10mg/mL): 0,5 mg/kg EV. – Contraindicado para pacientes asmáticos ou alérgicos. Cisatracúrio, Vecurônio e Atracúrio são relaxantes musculares que apresentam latência mais demorada e são de longa duração. Utilizados apenas em pacientes em que é possível realizar ventilação sob máscara sem riscos antes da IOT. (DIEGO, 2020) As medicações devem ser escolhidas conforme a situação clínica, no qual destaca-se as principais condições: (DIEGO, 2020) • TCE/AVC: Etomidato + Quetamina 26 • Convulsão: Midazolam, propofol e etomidato • Broncoespasmo: Quetamina, proprofol ou etomidato • Doença cardiovascular: Etomidato • Choque: Etomidato ou quetamina A pandemia pela Covid-19 resultou em um rápido consumo de insumos e, eventualmente, equipes necessitam lidar com cenários de escassez de recursos ou até mesmo ausência completa de alguns. Por questões variadas, como hipoxemia prolongada, assincronias, necessidade de posição prona, o consumo de bloqueadores neuromusculares e sedativos sofreu aumento considerável nos pacientes internados com Covid-19 grave nas UTIs. Associa-se a esse fato o maior tempo de ventilação mecânica dos pacientes, impondo maior consumo desses itens (AMIB, ABRAMED, AMB, 2020). Dessa maneira, diante da escassez de sedativos e de bloqueadores neuromusculares, prioriza-se a Intubação em Sequência Atrasada (ISA) com a utilização de Ketodex (Cetamina+dexmedetomidina). A dose inicial necessária para sedação é de 1mcg/kg EV de Dexmedotomidina EV e 1-2mg/kg EV de Cetamina, se necessário realizar doses adicionais de 0,5mg ou 0,5mcg/kg EV até obter dissociação necessária (AMIB, ABRAMED, AMB, 2020). A intubação em sequência atrasada também engloba o uso de bloqueio neuromuscular, no entanto, a ISA permite que ocorra sedação dissociativa prévia, permitindo adequada pré-oxigenação com aumento da reserva respiratória. Além de manter ventilação espontânea e preservar reflexos de via aérea, reduzindo a chance de colapso cardiopulmonar durante o procedimento (“crash intubatório”) (AMIB, ABRAMED, AMB, 2020). Outras alternativas podem ser utilizadas na escassez de medicamentos nessa situação pandêmica, como o uso de doses mais elevadas da combinação de Fentanila (5mcg/kg) com Propofol (2,5mg/kg), sendo necessária atenção ao estado hemodinâmico do paciente antes da utilização desse esquema (AMIB, ABRAMED, AMB, 2020). A utilização da intubação acordada pode ser levantada nesse cenário de escassez. As recomendações para um procedimento de sucesso incluem: reconhecimento de fatores de dificuldade de IOT, cheklist antes e durante o procedimento, O2 suplementar, anestesia tópica e mínima sedação, sendo realizada por um profissional treinado e qualificado. 27 Os sedativos e bloqueadores neuromusculares são exemplos de medicações que eventualmente tornam-se escassas nesse momento (AMIB, ABRAMED, AMB, 2020). 6. TÉCNICAS DE INTUBAÇÃO OROTRAQUEAL As principais técnicas de intubação traqueal utilizadas são: laringoscopia direta, videolaringoscopia, uso de dispositivos ópticos e guiados por luz, intubação com endoscópio flexível, uso de estiletes de intubação com fibra óptica e vídeo, intubação às cegas e manejo cirúrgico da via aérea (BROWN, 2019). A intubação nasotraqueal às cegas exige que o doente apresente ventilação espontânea e é contraindicada em doentes em apneia. Fraturas faciais, do seio frontal, da base do crânio e da placa cribiforme são contraindicações relativas para a intubação nasotraqueal. Evidência de fratura de nariz e fratura de base de crânio (olhos de guaxinim, equimose retroauricular extravasamento de líquido cefalorraquidiano [rinorreia ou otorreia]) são sinais dessas lesões. (ATLS, 2018) Embora a videolaringoscopia (VL) tenha se tornado o dispositivo de escolha para muitos médicos na emergência, a laringoscopia direta (LD) ainda é uma técnica comum para a intubação traqueal em situações de emergência (BROWN, 2019). O conceito da LD é simples – criar uma linha reta de visão desde a boca até a laringe para visualizar as pregas vocais. A língua é o maior obstáculo para a laringoscopia. O laringoscópio é usado para controlar a língua e deslocá-la para fora da linha de visão. Um laringoscópio consiste em um cabo, uma lâmina e uma fonte de luz. Ele é usado como instrumento para a mãoesquerda independentemente da preferência do operador. Em geral, as lâminas de LD são curvas (Macintosh) ou retas (Miller) (BROWN, 2019). A diretriz para o manejo da intubação traqueal em adultos gravemente enfermos aponta a importância do treinamento e divisão de funções na equipe, independentemente da técnica de intubação a ser praticada (HIGGS, 2018). A primeira orientação da diretriz é a presença de uma equipe treinada, na qual cada integrante saiba suas funções. O ideal é um mínimo de quatro (04) pessoas: • Líder: orientará as ações e irá monitorar a execução das tarefas por cada membro. Precisa estar com as mãos livres para tomar as melhores decisões, em especial a mudança na técnica entre as tentativas de intubação e a decisão de fazer a crico. Um líder que seja o intubador pode cair no “cognitive overload” e prejudicar sua capacidade de tomada de decisão. 28 • “Runner”: como um circulante de centro cirúrgico, é um técnico de enfermagem que traz medicações e devices necessários. • Médico: encarregado da intubação. • Enfermeiro: encarregado do manuseio dos equipamentos, carrinho de parada/intubação e medicações. O ideal é que conheça a técnica e ajude nas manobras, como “chin lift” e “BURP” – back, up and right position, bem como saiba preparar e auxiliar no uso da cricotireoidostomia (“crico”), se necessário. Imagem 13: Composição e posicionamento da equipe para intubação traqueal Fonte: HIGGS, 2018 6.1.Sequência rápida de intubação A sequência rápida de intubação (SRI) é o método de escolha para a maior parte das intubações no departamento de emergência. Tal método consiste em utilizar concomitantemente medicação hipnótica e bloqueador neuromuscular no paciente devidamente pré-oxigenado. (BROWN, 2019) Essa técnica depende de sete passos fundamentais para o seu sucesso, também conhecidos como os “7 Ps’ da Intubação Orotaqueal”, que são: Preparação; Pré- 29 oxigenação; Pré-tratamento; Paralisia com indução; Posicionamento do paciente; Posicionamento do tubo com confirmação; Pós-intubação. • Preparação O primeiro passo deve assegurar que a intubação ocorra sem erros de equipamentos, além de prever se a intubação será difícil. Esse passo deve durar menos que 5 min e é sistematizado em: avaliação, check-list de material, monitorização, preparo de drogas e acesso venoso (VELASCO, 2020). As medicações escolhidas para o procedimento devem ser aspiradas e identificadas. Recomenda-se que as medicações escolhidas para sedação pós-procedimento também estejam preparadas previamente ao início do procedimento (VELASCO, 2020). O paciente deverá estar conectado a um monitor com cardioscopia, oximetria, pressão arterial e capnografia em forma de onda. Acesso venoso fixado e funcionante também é necessário, preferencialmente dois, para o caso de falha inadvertida de um dos acessos (VELASCO, 2020). Verificar a presença e funcionamento dos equipamentos, como o laringoscópio (deve estar disponível à beira do leito, testado quanto ao seu funcionamento e de tamanho ideal), tubos endotraqueais (tamanho desejado e 0,5 mm menor também devem estar à mão e com balonetes testados) (VELASCO, 2020). Caso opte-se por utilizar fio-guia para o tubo endotraqueal, ele deverá ficar proximal ao olho de Murphy (abertura lateral do tubo) e ser reto em todo o seu trajeto com uma curvatura anterior menor que 35° proximal ao balonete; tal conformação evita que o tubo obstrua o campo de visão durante a passagem. Equipamentos para via aérea de resgate também devem estar facilmente à disposição (VELASCO, 2020). • Pré-oxigenação No departamento de emergência, recomenda-se que não se ventile o paciente, a não ser que a oximetria de pulso esteja abaixo de 93% no momento da indução da hipnose. Deve-se fornecer oxigênio com a maior concentração disponível ao paciente por no mínimo 3 minutos antes da indução hipnótica, com o objetivo de saturar o máximo possível os pulmões e demais tecidos corporais com oxigênio, possibilitando maior tempo de apneia após a indução (VELASCO, 2020). 30 Além disso, os pacientes devem ser pré-oxigenados, sempre que possível, com inclinação de 30-45°. A colocação de cânula nasal com o maior fluxo tolerável pelo paciente durante o período de pré-oxigenação e com fluxo de 5 a 15 L por minuto após a indução aumenta o tempo de apneia sem hipoxemia (VELASCO, 2020). Existem duas formas preconizadas de pré-oxigenação: • Bolsa-válvula-máscara: Com reservatório, ligada a fluxômetro de oxigênio a 15 litros por minuto: A bolsa não deve ser pressionada, o movimento inspiratório deve vir do paciente. • Máscara não reinalante: Com reservatório, ligada a fluxômetro de oxigênio completamente aberto (aproximadamente 40 L) Caso não seja possível obter saturação adequada com esses métodos, pode-se lançar mão de ventilação não invasiva, com fornecimento de oxigênio a 100%, como tentativa de otimizar o paciente previamente à tentativa de intubação (VELASCO, 2020). • Pré-tratamento O pré-tratamento, gradativamente, cai em desuso, uma vez que transmite a ideia de que a administração de drogas como fentanil e lidocaína é indispensável. Hoje, a indicação para o fentanil é para pacientes com emergências hipertensivas, como na dissecção aguda de aorta, e na hipertensão intracraniana (DIEGO, 2020). Nessa etapa, indica-se o uso de sedativos como o fentanil (1-3 mcg/kg) e a lidocaína (1,5 mg/kg). Elas devem ser administradas três minutos antes da passagem do tubo, se houver indicação (VELASCO, 2020). • Paralisia e indução A infusão das doses previamente calculadas e preparadas de hipnótico e de bloqueador neuromuscular deve ser feita rapidamente, em bolus, a iniciar pela medicação hipnótica (descritas no capítulo anterior) (VELASCO, 2020). Dos hipnóticos disponíveis, a ketamina ganha espaço, pelo seu poder de sedação sem instabilidade hemodinâmica, podendo ser associada a uma dose baixa de fentanil. A principal contraindicação é o paciente coronariopata, pois pode aumentar o duplo produto. Outras opções são etomidato, midazolam e propofol (HIGGS, 2018). 31 Os objetivos da infusão em bolus são a perda de consciência e o bloqueio neuromuscular da maneira mais rápida possível, possibilitando a intubação precoce. Após a infusão das medicações o paciente cessará os movimentos respiratórios espontâneos (VELASCO, 2020). • Posicionamento do paciente Nessa etapa, o objetivo é alinhar os eixos oral, laríngeo e faríngeo do paciente. A altura da cama deve corresponder à altura do processo xifoide do intubador. O paciente deve ser levado o mais próximo da cabeceira da cama quanto possível. Deve-se elevar a cabeça do paciente de forma que o meato auditivo externo fique na mesma altura do manúbrio do esterno. O coxim deve ser posicionado no occipício do paciente (VELASCO, 2020). Imagem 14: Posicionamento na IOT Fonte: BROWN, 2019 • Passagem e posicionamento do tubo Este é o momento da inserção do tubo. Após o início da flacidez da musculatura facial, deve-se proceder com a laringoscopia. Na introdução do laringoscópio, inicialmente é realizada a epigloscopia: abertura da boca, com inserção cuidadosa do laringoscópio pelo 32 lado direito, rebatendo a língua para a esquerda até a visualização da epiglote. A epiglote é a referência que sinaliza a abertura laríngea e as cordas vocais. Em seguida, ao usar uma lâmina curva, deslocar a epiglote indiretamente pressionando o ligamento hipoepiglótico na base da valécula. O laringoscópio deve ser tracionado anteriormente e para cima (não realizar alavanca). Identificar as cartilagens posteriores e sulco interaritenóideo. Essas estruturas formam a borda posterior da glote e separam a via de entrada traqueal do esôfago. Depois disso, se for possível, visualizar as pregas vocais e passar o tubo através das pregas vocais até a traqueia. O tubodeve ser introduzido até que as pregas vocais fiquem na altura da marca preta proximal ao balonete (tubos com uma marca) ou entre as marcas pretas proximais ao balonete (tubos com duas marcas). Em seguida, retirar fio guia, insuflar cuff com seringa de 6 a 10 ml de ar (20mmHg), acoplar ambu e insuflar, auscultando epigástrio, pulmão esquerdo e pulmão direito, respectivamente. A confirmação do posicionamento com a medida de CO2 expirado é obrigatória. Pode- se utilizar dispositivo colorimétrico como método confirmatório, porém o uso de capnografia com forma de onda é o padrão-ouro. A ultrassonografia transtraqueal tem despontado como uma ferramenta de confirmação de intubação com acurácia próxima a 100% (VELASCO, 2020). Pacientes em que a condição de base permita e que tenham sido devidamente pré- oxigenados podem receber mais do que uma tentativa de intubação (aconselhamos o máximo de duas tentativas). Caso a oximetria de pulso fique abaixo de 93%, deve-se interromper o procedimento para ventilar o paciente e evitar maior hipoxemia (VELASCO, 2020). • Pós intubação Após o posicionamento do tubo e a confirmação da posição, ele deve ser fixado para evitar extubação ou intubação seletiva acidental. O paciente deve ser conectado ao ventilador mecânico com ajustes personalizados ao seu tamanho e patologia (VELASCO, 2020). Recomenda-se a permanência do médico ao lado do paciente nos momentos que seguem o procedimento devido à possibilidade de instabilidade hemodinâmica. Além disso, deve-se obter uma radiografia de tórax para confirmar o posicionamento do tubo 33 (2-4 cm acima da carina) e avaliar o parênquima pulmonar. A realização de analgesia contínua após a intubação é indicada, em razão da manipulação recente da via aérea (VELASCO, 2020). 6.2. Sequência prolongada de intubação A sequência prolongada de intubação (SPI) consiste no uso de um sedativo previamente à pré-oxigenação com o intuito de otimizar esse passo antes do ato da laringoscopia. É indicada para pacientes com indicação de IOT que se apresentam com drive respiratório mantido, agitação ou ansiedade que dificultem a oferta adequada de oxigênio durante o período de pré-oxigenação (VELASCO, 2020). Essa técnica evita a distensão gástrica secundária à pressão positiva aplicada com dispositivo bolsa-válvula-máscara em pacientes apneicos. O medicamento de escolha é a quetamina nas dosagens descritas anteriormente (capítulo anterior) e a partir da pré- oxigenação seguem-se os mesmos passos da SRI (VELASCO, 2020). 7. COMPLICAÇÕES GRAVES DA INTUBAÇÃO OROTRAQUEAL NA EMERGÊNCIA E ESTRATÉGIAS DE ABORDAGEM A presença de tubos oro ou nasotraqueais em contato direto com as estruturas das vias aéreas pode provocar lesões de mucosa, decorrentes, principalmente, de intubações traumáticas e prolongadas, da utilização de tubos de grande calibre e da elevada pressão no balonete das sondas. Observa-se também prejuízo ao condicionamento do ar, uma vez que as fossas nasais, não entrando em contato com o ar inalado, por causa da presença do tubo, ficam impedidas de realizar o importante papel de filtração, umidificação e aquecimento dos gases inalados (BROWN, 2019). As complicações das vias aéreas secundárias à intubação endotraqueal são freqüentes, muitas delas com sintomas leves e de curta duração. Entretanto, em muitos casos as lesões são graves e permanentes, envolvendo as estruturas da laringe e da traquéia, e exigem correção cirúrgica, como ocorre na estenose glótica e traqueal. (MARTINS, 2004) As principais complicações advindas da IOT são: Broncoaspiração (vômitos); Intubação esofágica; Intubação seletiva, atelectasias, colapso pulmonar e pneumotórax; Laceração de partes moles das vias aéreas; Lesão da coluna cervical por movimentação da cabeça durante o procedimento; Luxação da mandíbula; Fratura ou arrancamento de 34 dentes; Ruptura ou vazamento do balonete do tubo; Trauma de via aérea, hemorragia e aspiração (BROWN, 2019). As tentativas de redução da morbidade associada à IOT puderam ser evidenciadas, nas últimas décadas, pelo desenvolvimento de novos tipos de balonetes dos tubos endotraqueais (mais extensos e mais complacentes), pela disponibilidade dos novos protótipos de sondas e pelo acoplamento de umidificadores aquecidos aos sistemas de ventilação mecânica. No mesmo sentido, têm sido enfatizadas as orientações a residentes, médicos e enfermeiros quanto aos cuidados necessários durante a introdução da sonda traqueal, à escolha do calibre ideal do tubo e às técnicas adequadas de aspiração das secreções pulmonares (MARTINS, 2004). A pressão no interior do balonete da sonda pode aumentar durante a anestesia, pela difusão de gases anestésicos para o seu interior, como ocorre com o óxido nitroso, logo nas primeiras horas após o início da anestesia. Para evitar a expansão do balonete foi desenvolvida uma sonda de intubação provida de válvula de escape de ar (válvula de Lanz). No entanto, embora existam comprovações da eficácia dos tubos com a válvula de Lanz, o custo dessa sonda é ainda muito elevado, o que inviabiliza sua utilização na rotina hospitalar. (MARTINS, 2004) Outra tentativa de minimizar o índice de morbidade associada à intubação endotraqueal é a utilização da máscara laríngea, a qual passou a ser utilizada, inicialmente, em situações de emergência, em virtude de sua fácil introdução, mesmo nas mãos de profissionais inexperientes. A principal vantagem da máscara é que, após sua introdução, ela se acomoda na hipofaringe e não faz contato com a região da glote, o que reduz a ocorrência dos sintomas de rouquidão e disfagia no pós-operatório. Por este motivo, a máscara laríngea passou a ser a primeira escolha em anestesia de profissionais da voz. (MARTINS, 2004) As pesquisas clínicas e experimentais permitem a adoção de recomendações para com o paciente intubado, tais como: cautela e habilidade na introdução da sonda, escolha do calibre ideal, opção pelos novos protótipos de sondas com balonetes mais complacentes e mais maleáveis, imobilização adequada dos pacientes, cuidados na aspiração traqueal, monitorização permanente da pressão no interior do balonete, adaptação de umidificadores aquecidos ou de permutadores de calor e de umidade. (MARTINS, 2004) 35 8. VIA AÉREA CIRÚRGICA DE EMERGÊNCIA – CRICOTIREOIDOSTOMIA A via aérea cirúrgica é indicada diante da impossibilidade de intubação da traqueia, obstrução por edema de glote, fratura de laringe ou hemorragia orofaríngea grave ou quando o tubo endotraqueal não puder ser posicionado entre as cordas vocais (ATLS, 2020). Na impossibilidade da realização da IOT, opta-se pela cricotireoidostomia, apesar da possibilidade de complicações no atendimento emergencial. Esse procedimento não é aconselhável em crianças menores de 12 anos (risco de lesão irreversível). É um acesso temporário, que pode ser por técnica cirúrgica ou por punção (VELASCO, 2020). As principais complicações da cricotireoidostomia são hemorragias, falso trajeto, enfisema subcutâneo, pneumotórax, lesão da corda vocal, estenose traqueal, infecções, traqueomalácia (VELASCO, 2020). No Brasil, o kit de cricotireoidostomia é composto por: agulha, fio-guia, dilatadores e cânula. Além desses materiais, utiliza-se lâmina de bisturi, pinça cirúrgica, oxigênio suplementar, equipamentos de proteção individual, equipamentos de monitorização e anestésico local (VELASCO, 2020). Após correta preparação para o procedimento, com posicionamento do paciente em decúbito dorsal a 0º, monitorização, paramentação, assepsia e antissepsia local é realizada com uma incisão latero-lateral na pele que se estende pela membrana cricotireoidea. Uma pinça hemostática curva pode ser utilizada para dilatar a abertura, e um tubo endotraqueal ou um tubo de traqueostomia de pequeno calibre (de preferência de 5 a 7 mm de diâmetro) podeser inserido. (ATLS, 2020) É importante ressatar que em todos os procedimentos de cricotireoidostomia cirúrgica deve-se ter o controle da traqueia durante todo o procedimento, sempre com algum instrumento segurando-a em posição com relação à incisão (VELASCO, 2020). Imagem 15: Determinação anatômica da membrana cricotireóidea 36 Fonte: VELASCO, 2020 9. OUTROS DISPOSITIVOS DE ACESSO A VIA AÉREA 9.1.Máscara laríngea intubadora A máscara laríngea trata-se de uma alternativa para garantir a via aérea pérvia quando a ventilação sob máscara não obtiver sucesso, quando não houver a possibilidade ou sucesso da IOT após duas (02) tentativas. É um tubo semicurvo que inicia-se em um conector e termina em uma pequena máscara inflável. O uso desse dispositivo não garante uma via aérea definitiva, por isso é preciso substituí-la em até oito (08) horas (MATSUMOTO, 2007). Imagem 16: Máscara laríngea intubadora Fonte: Disponível em < https://www.stramedicalshop.com.br/blog/como- utilizar-uma-mascara-laringea/>. Acesso em junho de 2021. Já a máscara laríngea intubadora garante uma via aérea definitiva, pois permite a passagem de tubo endotraqueal pelo seu interior para intubação sem visualização direta, apesar do seu uso ser equivalente ao da máscara laríngea convencional. Ao optar por 37 intubar o paciente utilizando a máscara laríngea deve-se segurar o apoio de metal da máscara e fazer o movimento de elevação equivalente ao movimento da laringoscopia; a seguir esvazia-se o balonete da máscara e se passa o tubo endotraqueal. (VELASCO, 2020) 9.2. Combitube (Tubo retroglótico) Imagem 17: Diretrizes para introdução do Combitube. Fonte: MICHAEL, 2015. O tubo retroglótico, também conhecido como Combitube, é utilizado para intubação às cegas por profissionais não treinados em laringoscopia, possui dois balonetes e, habitualmente, duas vias de ventilação (distal e entre os balonetes). O primeiro balão insuflado obstrui a orofaringe proximal, enquanto o balão distal obstrui a entrada do esôfago, permitindo o posicionamento perfeito do dispositivo. (VELASCO, 2020) A técnica de inserção é simples, assumindo-se que o paciente esteja na posição supina, o profissional de saúde deve iniciar o procedimento elevando a língua e mandíbula do paciente com a mão não dominante. Em seguida, pode-se introduzir o Combitube na linha média do paciente até que os dentes incisivos superiores (ou a crista alveolar) fiquem entre as faixas circulares impressas no dispositivo. Por fim, infla-se o balão orofaríngeo (azul) e em seguida o balão distal, que em 90% das inserções estará alocado no esôfago (branco). Entre os dois balonetes existem fenestrações, que é por onde ventila-se o doente de forma indireta. Caso o dispositivo seja inserido na traqueia, a ventilação ocorrerá por mecanismo direto, não mais pelas fenestrações (MICHAEL, 2015). O combitube é disponível em dois tamanhos (37F; 41F) e não é recomendado o seu uso em população pediátrica abaixo de 1,20 m (MICHAEL, 2015). 38 10. VENTILAÇÃO MECÂNICA NA EMERGÊNCIA A Ventilação Mecânica (VM) é um método de suporte para indivíduos com insuficiência respiratória aguda ou crônica agudizada, que possibilita a manutenção de oxigenação e/ou ventilação (eliminação de dióxido de carbono) destes pacientes de maneira artificial, até que eles sejam capazes a reassumir um trabalho respiratório efetivo sem auxílio. (MORATO, 2015) A principal indicação de ventilação mecânica (VM) é a insuficiência respiratória aguda (IRespA), que pode decorrer da falência em ventilar ou em oxigenar. Essa condição pode ser classificada, fisiopatologicamente, da seguinte maneira: (VELASCO, 2020) • Hipoxêmica (PaO2 < 60 mmHg): associada a esforço respiratório sem melhora após aporte adequado de O2 (cateter nasal, máscara de Venturi, máscara não reinalante e ventilação não invasiva quando indicada). Caracteriza-se por baixa relação PaO2/FiO2 (P:F) e necessidade de pressão positiva para otimizá-la. O tratamento de suporte envolve aumentar a fração inspirada de O2 (FiO2), as pressões de vias aéreas e o recrutamento de segmentos pulmonares com a aplicação de pressão expiratória positiva (PEEP). • Hipercápnica (PaCO2 > 55 mmHg em pacientes não retentores crônicos): Relacionada a falência ventilatória e/ou carbonarcose. A retenção de CO2 é decorrente da hipoventilação alveolar e/ou do aumento do trabalho respiratório até o limite da fadiga muscular. corrente pela frequência respiratória. A VM se faz através da utilização de aparelhos que, intermitentemente, insuflam as vias respiratórias com o volume corrente (VT). Isso acontece devido à geração de um gradiente de pressão entre as vias aéreas superiores e o alvéolo, podendo ser conseguido por um equipamento que diminua a pressão alveolar (ventilação por pressão negativa) ou que aumente a pressão da via aérea proximal (ventilação por pressão positiva), as quais serão melhor abordadas nos tópicos seguintes. (MORATO, 2015) O profissional intensivista deve ser capaz de tomar a decisão entre a ventilação invasiva e a não-invasiva. Para isso, há critérios para auxiliá-lo na decisão. Se o paciente apresentar FR >25/min, trabalho respiratório, estar em acidose ou alcalose ou SatO2 < 90% ele é candidato à VMI. (MORATO, 2015) São critérios de contraindicação à VM não-invasiva a agitação, Glasgow < 12, tosse ineficaz, obstrução de via aérea, distensão abdominal, vômito, sangramento digestivo alto, 39 instabilidade hemodinâmica, arritmias complexas, trauma de face, cirurgia de esôfago e barotrauma não drenado. Caso ele não apresente esses critérios e esteja sob ventilação não- invasiva, deve ser reavaliado no mínimo a cada 2 horas e se houver piora, deve ser considerada a intubação e, caso se decida por ela, o paciente deve ser sedado. (MORATO, 2015) 10.1. Ventilação Mecânica Não Invasiva A ventilação com pressão positiva não invasiva (VPPNI) é uma técnica de ventilação em que não é empregado qualquer tipo de prótese traqueal, sendo a interface ventilador- paciente feita através de uma máscara (BROWN, 2019). Consiste no uso de pressão expiratória final contínua (CPAP) ou dois níveis de pressão (BiPAP) nas vias aéreas por meio de uma interface não invasiva. Seu uso pode diminuir taxas de intubação e tempo de internação no pronto-socorro e na unidade de terapia intensiva (UTI), porém, quando utilizada de maneira incorreta, pode acarretar prejuízos ao paciente, incluindo aumento de mortalidade (VELASCO, 2020). As vantagens da VPPNI sobre a ventilação mecânica incluem: a preservação da fala, da deglutição e dos mecanismos de defesa fisiológicos da via aérea; risco reduzido de lesão da via aérea; risco reduzido de infecção nosocomial; aumento do conforto do paciente; e diminuição da permanência na unidade de terapia intensiva (UTI) e no hospital (BROWN, 2019). O dispositivo que faz o contato físico entre o paciente e o ventilador é chamado de interface. As interfaces para a VPPNI têm vários formatos e tamanhos projetados para cobrir as narinas individualmente, apenas o nariz, o nariz e a boca, toda a face, ou ajustada como um elmo. Nesse sentido, as mais comumente utilizadas são: (BROWN, 2019) • Máscara nasal: Podem ser usadas em IRpA leve, em pacientes com claustrofobia ou má adaptação à máscara facial; • Máscara facial (oronasais): Permite administração de maiores volumes correntes, sendo preferida nos casos de insuficiência respiratória aguda, relacionada a melhora rápida dos parâmetros fisiológicos; • Máscara facial total: Utilizar nas situações de insuficiência respiratória hipoxêmica mais graves por permitir uma pressurização maior das vias aéreas. Reduz escapes 40 aéreos e permite a administração de maiores pressões inspiratórias. Além disso, é mais confortável que as interfaces nasal e facial comum; • Capacete:
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