Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
2011 História do imperialismo Prof. Fabiano Dauwe Prof. César Augusto Jungblut Copyright © UNIASSELVI 2011 Elaboração: Prof. Fabiano Dauwe Prof. César Augusto Jungblut Revisão, Diagramação e Produção: Centro Universitário Leonardo da Vinci – UNIASSELVI Ficha catalográfica elaborada na fonte pela Biblioteca Dante Alighieri UNIASSELVI – Indaial. Impresso por: 930 D235h Dauwe, Fabiano. História do imperialismo / Fabiano Dauwe [e] César Augusto Jungblut. Indaial : Uniasselvi, 2011. 183 p. il. Inclui bibliografia. ISBN 978-85-7830-500-0 1. História Imperial. I. Centro Universitário Leonardo da Vinci II. Núcleo de Ensino a Distância III. Título III apresentação Prezado(a) acadêmico(a)! Iniciamos agora nossa disciplina de História do Imperialismo. Você perceberá que esta é uma disciplina um pouco diferente, pois não se concentra em um único tema, mas em dois. Nossa disciplina tratará, inicialmente, da consolidação da ideologia liberal após a Revolução Francesa, que deu origem ao nacionalismo romântico e ao imperialismo neocolonialista do século XIX. Neste sentido, a disciplina funciona como uma continuação de História Moderna. A Unidade 1 trata dos eventos políticos mais importantes ocorridos no século XIX, desde a ascensão de Napoleão Bonaparte. Um destaque especial foi dado para os efeitos políticos do nacionalismo, que deu origem às revoluções de 1848 e aos movimentos de unificação da Itália e da Alemanha, mas o surgimento do socialismo, nessa mesma época, demonstrou a força da classe operária em um período de forte crescimento industrial. A Unidade 2 trata da História da Ásia, região pouco estudada, mas de suma importância para entender o Imperialismo no século XIX. Além disso, você conhecerá um pouco da História da China, do Japão e da Índia. Nessa unidade será dada uma atenção à importância de se estudar esse assunto e levá-lo à sala de aula. A Unidade 3 trata do imperialismo propriamente dito, especialmente do período anterior à Primeira Guerra Mundial. Você perceberá de que forma essa exploração desenfreada dos recursos do mundo colocou em choque os países europeus, cada vez mais poderosos, à custa do restante do mundo. Então, seja bem-vindo(a) e bons estudos! Prof. Fabiano Dauwe Prof. César Augusto Jungblut IV Você já me conhece das outras disciplinas? Não? É calouro? Enfim, tanto para você que está chegando agora à UNIASSELVI quanto para você que já é veterano, há novidades em nosso material. Na Educação a Distância, o livro impresso, entregue a todos os acadêmicos desde 2005, é o material base da disciplina. A partir de 2017, nossos livros estão de visual novo, com um formato mais prático, que cabe na bolsa e facilita a leitura. O conteúdo continua na íntegra, mas a estrutura interna foi aperfeiçoada com nova diagramação no texto, aproveitando ao máximo o espaço da página, o que também contribui para diminuir a extração de árvores para produção de folhas de papel, por exemplo. Assim, a UNIASSELVI, preocupando-se com o impacto de nossas ações sobre o ambiente, apresenta também este livro no formato digital. Assim, você, acadêmico, tem a possibilidade de estudá-lo com versatilidade nas telas do celular, tablet ou computador. Eu mesmo, UNI, ganhei um novo layout, você me verá frequentemente e surgirei para apresentar dicas de vídeos e outras fontes de conhecimento que complementam o assunto em questão. Todos esses ajustes foram pensados a partir de relatos que recebemos nas pesquisas institucionais sobre os materiais impressos, para que você, nossa maior prioridade, possa continuar seus estudos com um material de qualidade. Aproveito o momento para convidá-lo para um bate-papo sobre o Exame Nacional de Desempenho de Estudantes – ENADE. Bons estudos! NOTA V VI VII UNIDADE 1 - A EUROPA E OS ESTADOS UNIDOS NO SÉCULO XIX ..................................1 TÓPICO 1 - O PERÍODO NAPOLEÔNICO E O CONGRESSO DE VIENA ............................3 1 INTRODUÇÃO ...................................................................................................................................3 2 O CONSULADO .................................................................................................................................4 2.1 O 18 BRUMÁRIO ...........................................................................................................................4 2.2 A ESTRUTURA DA FRANÇA SOB O CONSULADO .............................................................5 2.2.1 A Concepção de Estado .......................................................................................................5 2.2.2 A educação e a Igreja ............................................................................................................6 2.2.3 O Código Civil ......................................................................................................................6 2.2.4 A burguesia e o império .......................................................................................................7 3 O PERÍODO IMPERIAL ....................................................................................................................7 3.1 OS IDEAIS REVOLUCIONÁRIOS ..............................................................................................10 3.2 A TERCEIRA COALIZÃO – 1805 ................................................................................................10 3.3 O BLOQUEIO CONTINENTAL ..................................................................................................10 3.4 A CAMPANHA DA RÚSSIA .......................................................................................................11 3.5 A DERROCADA DE NAPOLEÃO ..............................................................................................11 3.6 O GOVERNO DOS CEM DIAS E O EXÍLIO ..............................................................................12 4 O CONGRESSO DE VIENA .............................................................................................................12 4.1 O “CONCERTO DA EUROPA” ...................................................................................................13 4.2 A SANTA ALIANÇA ....................................................................................................................14 RESUMO DO TÓPICO 1......................................................................................................................15 AUTOATIVIDADE ...............................................................................................................................16 TÓPICO 2 - AS REVOLUÇÕES LIBERAIS E O NACIONALISMO ROMÂNTICO ...............17 1 INTRODUÇÃO ...................................................................................................................................17 2 AS REVOLUÇÕES LIBERAIS ..........................................................................................................18 2.1 AS REVOLTAS DA DÉCADA DE 1820 ......................................................................................18 2.1.1 A “Questão Oriental” e a liberação da Grécia ..................................................................19 2.2 AS REVOLUÇÕES DE 1830 ..........................................................................................................19 2.2.1 A Revolução Liberal na França ...........................................................................................20 2.2.2 A Revolução Liberal em outros países...............................................................................20 2.3 AS REVOLUÇÕES LIBERAIS DE 1848 .......................................................................................20 2.3.1 A Primavera dos Povos ........................................................................................................21 2.4 O 18 BRUMÁRIO DE NAPOLEÃO III .......................................................................................222.5 A ERA DO CAPITAL.....................................................................................................................23 3 O NACIONALISMO ROMÂNTICO ..............................................................................................24 3.1 O ROMANTISMO .........................................................................................................................24 3.2 O NACIONALISMO .....................................................................................................................27 RESUMO DO TÓPICO 2......................................................................................................................29 AUTOATIVIDADE ...............................................................................................................................30 TÓPICO 3 - AS ORIGENS DO SOCIALISMO ................................................................................31 1 INTRODUÇÃO ...................................................................................................................................31 2 O SURGIMENTO DO SOCIALISMO ...........................................................................................32 sumário VIII 2.1 O LUDISMO ...................................................................................................................................33 2.2 CARTISMO ....................................................................................................................................35 2.3 A UTOPIA SOCIALISTA ..............................................................................................................37 2.3.1 Socialismo utópico ................................................................................................................37 2.4 O SOCIALISMO CIENTÍFICO ....................................................................................................38 RESUMO DO TÓPICO 3......................................................................................................................42 AUTOATIVIDADE ...............................................................................................................................43 TÓPICO 4 - OS ESTADOS UNIDOS NO SÉCULO XIX ...............................................................45 1 INTRODUÇÃO ...................................................................................................................................45 2 POLÍTICA EXTERNA DOS EUA NO SÉCULO XIX ..................................................................45 3 FATORES QUE EXPLICAM A EXPANSÃO .................................................................................47 4 A GUERRA DA SECESSÃO .............................................................................................................49 LEITURA COMPLEMENTAR .............................................................................................................51 RESUMO DO TÓPICO 4......................................................................................................................55 AUTOATIVIDADE ...............................................................................................................................56 UNIDADE 2 - HISTÓRIA DA ÁSIA..................................................................................................57 TÓPICO 1 - INTRODUÇÃO AOS ESTUDOS DA HISTÓRIA DA ÁSIA .................................59 1 INTRODUÇÃO ...................................................................................................................................59 2 A HISTÓRIA DA ÁSIA CONTEMPORÂNEA .............................................................................59 3 A HISTÓRIA EUROCÊNTRICA .....................................................................................................61 LEITURA COMPLEMENTAR .............................................................................................................65 RESUMO DO TÓPICO 1......................................................................................................................70 AUTOATIVIDADE ...............................................................................................................................71 TÓPICO 2 - OS CONFLITOS NA CHINA .......................................................................................73 1 INTRODUÇÃO ...................................................................................................................................73 2 UM BREVE PANORAMA DA CHINA ..........................................................................................73 3 A CHINA NO SÉCULO XIX .............................................................................................................76 4 AS GUERRAS DO ÓPIO (1839-1842/1856-1858) ...........................................................................78 5 OS TRATADOS “INÍQUOS” ...........................................................................................................81 6 A REVOLTA DOS TAIPING (1851-1864) .......................................................................................82 7 A GUERRA SINO-JAPONESA (1894-1895) ...................................................................................83 8 A REVOLTA DOS BOXERS (1900-1901) .........................................................................................84 LEITURA COMPLEMENTAR .............................................................................................................85 RESUMO DO TÓPICO 2......................................................................................................................88 AUTOATIVIDADE ...............................................................................................................................89 TÓPICO 3 - O JAPÃO MODERNIZADO .........................................................................................91 1 INTRODUÇÃO ...................................................................................................................................91 2 A ERA TOKUGAWA ..........................................................................................................................92 3 A RESTAURAÇÃO DE MEIJI ..........................................................................................................95 4 A INDUSTRIALIZAÇÃO..................................................................................................................97 LEITURA COMPLEMENTAR 1 ..........................................................................................................99 LEITURA COMPLEMENTAR 1 ..........................................................................................................101 RESUMO DO TÓPICO 3......................................................................................................................104 AUTOATIVIDADE ...............................................................................................................................105 TÓPICO 4 - ÍNDIA: HISTÓRIA E IMPERIALISMO .....................................................................107 1 INTRODUÇÃO ...................................................................................................................................107 IX 2 O DOMÍNIO INGLÊS SOBRE A ÍNDIA .......................................................................................107 3 GUERRA DOS CIPAIOS (1857-1859) ..............................................................................................110 LEITURA COMPLEMENTAR .............................................................................................................111 RESUMO DO TÓPICO 4......................................................................................................................116 AUTOATIVIDADE ...............................................................................................................................117UNIDADE 3 - O IMPERIALISMO E O NEOCOLONIALISMO .................................................119 TÓPICO 1 - O CONCEITO DE IMPERIALISMO E SUAS VARIANTES ..................................121 1 INTRODUÇÃO ...................................................................................................................................121 2 O SENTIDO DO TERMO IMPERIALISMO ...............................................................................121 3 ENTENDENDO O CONCEITO DE IMPERIALISMO ...............................................................122 4 POR QUE OCORREU O IMPERIALISMO? .................................................................................124 LEITURA COMPLEMENTAR .............................................................................................................126 RESUMO DO TÓPICO 1......................................................................................................................128 AUTOATIVIDADE ...............................................................................................................................129 TÓPICO 2 - A REVOLUÇÃO INDUSTRIAL E O NEOCOLONIALISMO ...............................131 1 INTRODUÇÃO ...................................................................................................................................131 2 A REVOLUÇÃO INDUSTRIAL .......................................................................................................131 3 NEOCOLONIALISMO ......................................................................................................................132 LEITURA COMPLEMENTAR .............................................................................................................135 RESUMO DO TÓPICO 2......................................................................................................................138 AUTOATIVIDADE ...............................................................................................................................139 TÓPICO 3 - O IMPERIALISMO NA ÁFRICA .................................................................................141 1 INTRODUÇÃO ...................................................................................................................................141 2 O IMPERIALISMO NA ÁFRICA ...................................................................................................142 LEITURA COMPLEMENTAR .............................................................................................................147 RESUMO DO TÓPICO 3......................................................................................................................151 AUTOATIVIDADE ...............................................................................................................................152 TÓPICO 4 - A UNIFICAÇÃO DA ALEMANHA E DA ITÁLIA ..................................................153 1 INTRODUÇÃO ...................................................................................................................................153 2 PROCESSO DA UNIFICAÇÃO ITALIANA ................................................................................153 3 A ALEMANHA ....................................................................................................................................157 LEITURA COMPLEMENTAR .............................................................................................................160 RESUMO DO TÓPICO 4......................................................................................................................162 AUTOATIVIDADE ...............................................................................................................................163 TÓPICO 5 - METODOLOGIA DO ENSINO DE HISTÓRIA DO IMPERIALISMO ..............165 1 INTRODUÇÃO ...................................................................................................................................165 2 AS TECNOLOGIAS E O ENSINO DE HISTÓRIA......................................................................166 3 FILMES NA SALA DE AULA ...........................................................................................................169 LEITURA COMPLEMENTAR 1 ..........................................................................................................171 LEITURA COMPLEMENTAR 2 ..........................................................................................................173 RESUMO DO TÓPICO 5......................................................................................................................177 AUTOATIVIDADE ...............................................................................................................................178 REFERÊNCIAS .......................................................................................................................................179 X 1 UNIDADE 1 A EUROPA E OS ESTADOS UNIDOS NO SÉCULO XIX OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM PLANO DE ESTUDOS A partir desta unidade você será capaz de: • avaliar o impacto causado por Napoleão Bonaparte na França e na Euro- pa, e sua importância para a difusão da ideologia liberal pelo continente; • conceituar romantismo e nacionalismo e perceber como essas ideologias se uniram para dar origem às revoluções e aos movimentos de unificação da Alemanha e da Itália; • compreender o socialismo e sua importância para as lutas políticas do sé- culo XIX; • conhecer a história dos Estados Unidos no século XIX. Esta unidade está dividida em quatro tópicos. No final de cada um deles, você encontrará atividades que o(a) ajudarão a refletir e a fixar os conhecimentos abordados. TÓPICO 1 – O PERÍODO NAPOLEÔNICO E O CONGRESSO DE VIENA TÓPICO 2 – AS REVOLUÇÕES LIBERAIS E O NACIONALISMO ROMÂNTICO TÓPICO 3 – AS ORIGENS DO SOCIALISMO TÓPICO 4 – OS ESTADOS UNIDOS NO SÉCULO XIX 2 3 TÓPICO 1 UNIDADE 1 O PERÍODO NAPOLEÔNICO E O CONGRESSO DE VIENA 1 INTRODUÇÃO A Revolução Francesa foi um dos eventos mais marcantes da História europeia, tanto pela ideologia que a originou quanto pelos efeitos políticos e sociais que esse movimento haveria de causar a médio e longo prazo, em todo o mundo. As origens do movimento estavam no pensamento iluminista que se desenvolveu na Europa no século XVIII e pregava os ideais de liberdade individual, de igualdade jurídica entre todos os cidadãos e de fraternidade. Seu questionamento das autoridades estabelecidas pelas tradições e legitimadas pela religião trouxe como consequências o estabelecimento de governos eleitos pelo povo (sejam eles republicanos ou monárquicos) e a separação entre Igreja e Estado, entendida como um dos pilares dos Estados modernos. Nada disso, é claro, aconteceu facilmente, nem foi uma decorrência pura e simples dos ideais iluministas. Estamos tão acostumados, no início do século XXI, a testemunhar os efeitos do Iluminismo que não nos damos conta de que esses efeitos só chegaram até nós à custa de muito sangue e de ferozes ações e reações. Afinal, ideias como essas, tão radicalmente opostas ao que se entendia como “o correto” há vários séculos, não foram aceitas pacificamente e sem resistências dos grupos ameaçados. Dessa forma, várias décadas decorreram entre a eclosão da Revolução Francesa e a aceitação mais ou menos generalizada dos ideais revolucionários em toda a Europa. Prezado(a) Acadêmico(a)! Iniciamos os estudos desta disciplina justamente no ponto em que deixamos a disciplina de História Moderna. Portanto, nossas discussões, neste momento, pressupõem que você domina os conteúdos daquela disciplina. Se você tiver alguma dúvida, não hesite em retomar o Caderno de História Moderna ou a bibliografia proposta. UNI UNIDADE 1 | A EUROPA E OS ESTADOS UNIDOS NO SÉCULO XIX 4 A figura de Napoleão Bonaparte cumpriu um papel essencial na consolidação desse pensamento. Seu domínio sobre a França por quase vinte anos foi um períodode consolidação dos ideais iluministas, de aplicação desses ideais à administração pública e de sua difusão pela Europa a partir das campanhas militares que seu exército empreendeu. Ainda que não possamos atribuir essas transformações exclusivamente à sua atuação pessoal – naquela ideia ultrapassada de que “a história se resume à biografia de alguns grandes homens” – é inegável que sua liderança causou um efeito dramático na França e em todo o mundo. 2.1 O 18 BRUMÁRIO 2 O CONSULADO Os primeiros anos após a queda da Bastilha haviam sido politicamente conturbados. Após a Assembleia Constituinte de 1791, o rei Luís XVI precisou governar com poderes limitados, em um regime de monarquia constitucional (o preferido de filósofos como Voltaire). A conspiração do rei contra a revolução levou-o à guilhotina, em 1793, e a partir desse momento a França experimentou algumas formas republicanas de governo: a Convenção – que degenerou no Terror jacobino – e o Diretório, que estabelecia um poder central fraco que gerou descontentamento popular. Ao mesmo tempo, a França estava em guerra contra os países vizinhos, que temiam que as ideias revolucionárias se espalhassem entre suas populações. A guerra aumentava ainda mais a crise econômica e política do país. Não é de se estranhar que um general – Napoleão Bonaparte – ganhasse prestígio entre a população e fosse alçado ao poder. A insatisfação com o governo do Diretório levava diversos grupos a tramarem um golpe contra o regime. Escolheram Napoleão para comandante, por seu enorme apoio popular, acreditando que poderiam controlá-lo. No dia 9 de novembro de 1799 (18 Brumário do ano VIII, pelo Calendário Revolucionário), o Diretório foi substituído por um Consulado, a cargo de três nomes: Napoleão, Roger Ducos e Seyès. O governante efetivo, no entanto, era o primeiro-cônsul, Prezado(a) acadêmico(a)! Para informações mais detalhadas sobre esse tema, releia o Caderno de História Moderna, em especial o último tópico da Unidade 3. NOTA TÓPICO 1 | O PERÍODO NAPOLEÔNICO E O CONGRESSO DE VIENA 5 2.2.1 A Concepção de Estado 2.2 A ESTRUTURA DA FRANÇA SOB O CONSULADO O período do Consulado foi politicamente contraditório. A Constituição promulgada em 1799 tinha uma aparência democrática e previa o funcionamento de um Senado, um Conselho de Estado e diversas outras instituições que, em princípio, retiravam poder dos governantes. No entanto, como mencionamos, criava uma situação cada vez mais autoritária que levaria, logo em seguida, à concentração total dos poderes políticos nas mãos de Napoleão. Mesmo assim, foi um período de fundamental importância, pois viu consolidar-se uma estrutura política e administrativa que seria amplamente imitada no restante do mundo a partir de então. Passemos agora a analisar com detalhes algumas das reformas implantadas nesse período. O Estado napoleônico era originado da concepção iluminista de poder, que entendia que a legitimidade do governante provinha não de Deus ou de algum atributo especial que ele, pessoalmente, possuísse, mas exclusivamente da vontade dos seus governados. Essa ideia, originada dos pensamentos de John Locke e Jean-Jacques Rousseau, foi também inspiradora do movimento de independência dos Estados Unidos. Como consequências diretas dessa ideia, os franceses entendiam que a administração pública, não apenas nos níveis de governo, mas em todos os órgãos do Estado, deve ser ocupada de acordo com os melhores interesses do país. Isso levou a um processo de centralização administrativa do Estado e à criação de uma burocracia – ou seja, uma estrutura administrativa – que selecionasse os melhores elementos disponíveis para exercer cada cargo. Em vez de favorecimentos reais ou privilégios de nobreza, instituíram-se os concursos públicos para a seleção dos mais qualificados a cada cargo. Foi a vitória da chamada meritocracia. Napoleão, que foi aos poucos ganhando as condições para estabelecer, nos anos seguintes, uma ditadura militar. O período em que Napoleão Bonaparte esteve à frente do comando da França (1799-1815) trouxe consequências dramáticas para toda a Europa. As conquistas militares do Exército francês espalharam os ideais revolucionários por toda a parte e populações inteiras tomaram conhecimento de noções como igualdade, liberdade econômica e participação política. UNIDADE 1 | A EUROPA E OS ESTADOS UNIDOS NO SÉCULO XIX 6 2.2.2 A educação e a Igreja 2.2.3 O Código Civil O governo do Consulado promoveu também uma reorganização completa do sistema educacional francês, de modo a estender a educação pública a todos os cidadãos. Por educação pública entendia-se um ensino gratuito, amplamente acessível a todos, ministrado em língua francesa padrão e laico, isto é, desvinculado de qualquer relação com a religião. É importante observar que a educação já era bastante difundida na França no período anterior à Revolução. As escolas religiosas e as igrejas, entendendo a escola como um elemento de controle social, já forneciam uma educação básica a praticamente todos os franceses, desde o século XVI. A ideologia revolucionária apenas apropriou-se desse papel controlador e universalizou a educação. A educação laica tocava em um dos pontos centrais da estrutura de Estado que estava sendo criada. A Igreja era entendida, pelos revolucionários, como uma força de controle social por demais poderosa e que precisava ser contida para não rivalizar com a autoridade do próprio Estado. Por esse motivo, promoveu-se uma completa separação entre os assuntos da Igreja e os do Estado, ainda que o governo reconhecesse o papel importante e o predomínio religioso da Igreja Católica na França. Em 1801 foi celebrado um acordo com a Igreja Católica, pelo qual o Estado francês reconhecia o catolicismo como religião da maioria dos franceses (mas não a religião oficial do Estado, como desejava o papa). O clero passaria a ser amparado pelo Estado, em troca do confisco das terras da Igreja em território francês. A partir desse momento, o Estado francês reconhecia o direito à existência e à legitimidade de todas as religiões. Uma das medidas mais importantes adotadas pelo governo do Consulado foi a elaboração do Código Civil Francês, inspirado nas legislações romana, bizantina e no pensamento iluminista. O Código, concluído em 1804, estabelecia por escrito os princípios fundamentais do Estado francês e como este estaria organizado dali para diante. O Código aboliu definitivamente os privilégios feudais e instituiu uma lei única para todo o país. Dentre as determinações do Código, proibiu-se a lei de retroagir (aplicar-se a eventos que ocorreram antes de sua promulgação), estabeleceu o divórcio consensual e deliberou sobre diversas questões fundamentais para os Estados modernos. Por estes motivos, e por toda a concepção de Estado que trazia consigo, o Código Napoleônico serviria, dali em diante, como modelo para praticamente todas as legislações nacionais – inclusive a atual legislação brasileira. TÓPICO 1 | O PERÍODO NAPOLEÔNICO E O CONGRESSO DE VIENA 7 2.2.4 A burguesia e o império O Consulado foi um período de grande prosperidade para a burguesia, que encontrou no imperador um aliado no fortalecimento econômico do país. Napoleão favoreceu os empreendimentos industriais na França, estabelecendo tarifas protecionistas e controlando a inflação, o que ajudou a fortalecer o consumo e promoveu uma acentuada recuperação econômica. O sucesso da administração de Napoleão entusiasmou as elites francesas. Ele foi proclamado cônsul vitalício em 1802 e ganhou o direito de nomear seu sucessor. Na prática, a medida antecipava o estabelecimento de um regime imperial na França, o que de fato aconteceu dois anos depois: por meio de um plebiscito, Napoleão tornou-se Imperador. Durante a coroação de Napoleão, tornou-se célebre o momento em que ele retirou a coroa imperial das mãos do papa Pio VII e coroou a si mesmo. Simbolicamente, Napoleão demonstrava,com isso, que não aceitaria submeter-se a qualquer autoridade, muito menos à da Igreja Católica. Você consegue perceber os traços de pensamento Iluminista nesse gesto? UNI 3 O PERÍODO IMPERIAL Após a coroação, Napoleão passou a defrontar-se com sérias dificuldades com os vizinhos, onde persistia o temor de que as ideias revolucionárias se espalhassem. A resposta francesa foi o avanço militar: o alistamento e o serviço militar obrigatórios haviam dotado a França do maior exército do continente, com cerca de 600 mil homens bem treinados. O exército avançou pelas regiões germânicas, anexando grande parte delas: apenas a Áustria, a Prússia, a região de Holstein (próxima à Dinamarca) e a Pomerânia (litoral do mar Báltico) escaparam ao domínio francês. Mas, mesmo as regiões que não foram ocupadas se viram forçadas a declarar seu apoio nominal a Napoleão. Da mesma forma, regiões ao sul, como o reino da Itália (que correspondia a uma parte do norte da Itália atual e tinha capital em Milão) e o reino de Nápoles (correspondente ao sul da Itália atual), foram conquistadas. O exército napoleônico parecia invencível. UNIDADE 1 | A EUROPA E OS ESTADOS UNIDOS NO SÉCULO XIX 8 Prezado(a) Acadêmico(a)! Lembre-se de que na época do Império Napoleônico (1804–1814), os países da Alemanha e da Itália, como os conhecemos hoje, não existiam. Eles só surgiram por volta de 1870, e os avanços do exército francês influíram em grande medida na sua consolidação. Os processos de unificação desses países serão vistos com mais detalhes no próximo tópico. ESTUDOS FU TUROS TÓPICO 1 | O PERÍODO NAPOLEÔNICO E O CONGRESSO DE VIENA 9 FONTE: Disponível em: <http://www.ecunico.com/eisohomem/daniel/imperio_napoleonico. jpg>. Acesso em: 15 mar. 2008. FIGURA 1 – O AVANÇO DO EXÉRCITO FRANCÊS ATÉ 1812, EM SEU MOMENTO DE MÁXIMA EXPANSÃO UNIDADE 1 | A EUROPA E OS ESTADOS UNIDOS NO SÉCULO XIX 10 3.1 OS IDEAIS REVOLUCIONÁRIOS 3.2 A TERCEIRA COALIZÃO – 1805 3.3 O BLOQUEIO CONTINENTAL Por onde passava, o exército francês promovia intensas transformações políticas e sociais: as novas regiões, entendidas como estados-satélites da França, passavam a seguir os mesmos ideais revolucionários que vicejavam no país de origem. Por toda a parte, privilégios feudais eram abolidos, a autoridade senhorial (inclusive o direito a aplicar as leis em seus domínios) dava lugar ao código civil e as divisões políticas eram reordenadas. Nas regiões germânicas, vários territórios, até então politicamente fragmentados, foram agrupados por Napoleão para formar a Confederação do Reno, e o imperador Francisco II foi forçado a abdicar. Com isso, foi extinto, em 1806, o Sacro Império Romano- Germânico (que existia desde 962). O país mais temeroso do avanço militar francês era a Grã-Bretanha. Preocupada com a possibilidade de prejuízos econômicos e políticos, a diplomacia britânica articulou a criação de uma coligação de nações contrárias ao expansionismo napoleônico. Em 1805, a chamada Terceira Coalizão – pois sucedia a duas outras surgidas logo após a Revolução Francesa, em 1792 e 1798 –, formada por Inglaterra, Áustria, Rússia e Prússia, enfrentou diretamente o exército napoleônico. Embora obtivesse uma vitória importante na famosa batalha naval de Trafalgar (o que impediu a França de invadir a Inglaterra), foi derrotada em Austerlitz. A derrota pôs fim à Coalizão, mas não aos enfrentamentos entre França e Grã-Bretanha. Mais quatro coalizões seriam formadas até a derrota definitiva de Napoleão, em 1815. Impossibilitado de invadir a Inglaterra, Napoleão decidiu anular seu adversário a partir da economia: decretou, em 1806, um embargo comercial à Inglaterra, que valeria para todos os países sob seu domínio. O chamado Bloqueio Continental teve o efeito contrário ao que se esperava: a ampla capacidade industrial e o controle do comércio marítimo garantiram à Inglaterra a manutenção de seu poderio, ao passo que a restrição comercial com a grande potência da época trouxe sérias dificuldades econômicas para a própria França e seus aliados. Em parte por esse motivo, algumas regiões sob o controle francês começaram a romper o bloqueio, o que obrigou Napoleão a intervir militarmente sobre elas. TÓPICO 1 | O PERÍODO NAPOLEÔNICO E O CONGRESSO DE VIENA 11 3.4 A CAMPANHA DA RÚSSIA 3.5 A DERROCADA DE NAPOLEÃO De todas as intervenções, a mais importante para o destino do Império Napoleônico foi a campanha da Rússia. A Rússia, país agrário e muito dependente das importações inglesas, rompeu o Bloqueio Continental em 1810, o que levou Napoleão a invadir o país em 1812. Em vez de enfrentar diretamente os invasores, os russos preferiram evitar os combates, praticando a estratégia da terra arrasada: por onde passassem, as tropas napoleônicas encontravam os campos destruídos e as cidades vazias (e muitas vezes igualmente destruídas), e eram forçadas a avançar ainda mais. Aos poucos, as tropas se enfraqueceram física e moralmente, e o rigoroso inverno russo terminou de selar o destino da desastrosa campanha. Estima-se que, dos 600 mil homens que partiram, apenas cerca de 40 mil regressaram com vida. Sentindo o enfraquecimento de Napoleão, a Inglaterra reuniu a Sexta Coalizão para tentar derrotá-lo definitivamente. Napoleão anunciou que reuniria um exército ainda maior do que o que fora enviado à desastrosa campanha da Rússia – e, de fato, conseguiu reunir 650 mil soldados, embora nem todos sob seu comando direto. O exército francês recuou após a Batalha de Leipzig (também conhecida como “Batalha das Nações”), em outubro de 1813. Em 30 de março do ano seguinte, a coalizão entrou em Paris e, uma semana mais tarde, Napoleão abdicou do trono francês e, preso, foi levado para o exílio na ilha de Elba, no mar Mediterrâneo. O grande clássico do russo Lev Tolstói, Guerra e Paz, trata da sociedade russa durante o período Napoleônico. É considerado uma das maiores obras-primas da literatura mundial. DICAS UNIDADE 1 | A EUROPA E OS ESTADOS UNIDOS NO SÉCULO XIX 12 3.6 O GOVERNO DOS CEM DIAS E O EXÍLIO 4 O CONGRESSO DE VIENA Com a deposição de Napoleão, Luís XVIII foi coroado e a monarquia Bourbon restaurada. A dificuldade do novo rei em conciliar os diversos interesses conflitantes no país causava-lhe uma enorme impopularidade. Napoleão soube se aproveitar da situação: fugiu de Elba no início de 1815, retornou a Paris, onde foi novamente aclamado imperador. Imediatamente, a Sétima Coalizão reuniu-se para derrotá-lo, o que ocorreu pouco mais de três meses depois. Por esse motivo, o período ficou conhecido como o Governo dos Cem Dias. A derrota final de Napoleão ocorreu na famosa Batalha de Waterloo (18 de junho de 1815), quando o imperador foi preso e novamente enviado ao exílio – desta vez na inacessível ilha de Santa Helena, localizada no meio do Atlântico Sul, a mais de 2000 quilômetros da região mais próxima. Incomunicável, e supostamente vítima de envenenamento, Napoleão morreu na ilha em 1821. Após a derrota de Napoleão na Batalha das Nações, embaixadores das maiores potências da Europa se reuniram em Viena, capital da Áustria, para reordenar o mapa político da Europa. A intenção era apagar o legado deixado por Napoleão e os acontecimentos dos vinte e cinco anos anteriores e barrar o avanço das perigosas ideias liberais. O espírito que movia os negociadores do Congresso de Viena era, portanto, essencialmente reacionário. As forças conservadoras restauraram os monarcas que haviam sido depostos e restabeleceram os antigos privilégios de nobreza em todos os países, inclusive na França. Pelos termos do acordo, a França voltaria a ser governada por Luís XVIII e, nos demais países europeus, igualmente retornariam ao trono os antigos governantes ou seus herdeiros. Para evitar o retorno das ideias democráticas geradas pela Revolução Francesa, os participantes do Congresso de Viena comprometeram-se a elaborar uma aliança política de solidariedade mútua. TÓPICO 1 | O PERÍODO NAPOLEÔNICOE O CONGRESSO DE VIENA 13 FONTE: Disponível em: <http://www.ecunico.com/eisohomem/daniel/europa_1815.jpg>. Acesso em: 20 mar. 2008. 4.1 O “CONCERTO DA EUROPA” O sistema internacional europeu após o Congresso de Viena buscava o equilíbrio entre cinco “potências” (termo surgido na época) continentais, cada uma com seus interesses específicos. A Grã-Bretanha era a grande senhora dos mares e a única potência industrial. Não tinha ambições territoriais na Europa, mas não hesitava em atuar de modo a favorecer seus interesses – como na entrada do Báltico, retirando a Noruega do jugo dinamarquês, e na foz do Reno, criando a União da Holanda e da Bélgica. Seus principais interesses eram coloniais, mas, com exceção da Índia, o país preferia manter um controle apenas econômico sobre as várias regiões. Defendia a liberdade econômica, justamente por seus produtos serem os mais competitivos do mundo. A Rússia era um país enorme e poderoso, que buscava interferir a distância nos assuntos que lhe interessavam e desejava conquistar acesso mais fácil ao Mar Mediterrâneo. O czar Alexandre I propôs a Santa Aliança, com o objetivo de garantir a segurança do continente e que deveria reunir Rússia, Áustria, Prússia e Grã-Bretanha. A recusa da Grã-Bretanha a participar acirrou a rivalidade com a Rússia, que já estava acesa pela chamada “Questão Oriental” – o Império Otomano, que se esfacelava e despertava a cobiça das duas potências. FIGURA 2 – DIVISÃO POLÍTICA DA EUROPA APÓS O CONGRESSO DE VIENA (1815) UNIDADE 1 | A EUROPA E OS ESTADOS UNIDOS NO SÉCULO XIX 14 A França lutava para reconquistar seu lugar entre as potências e para manter sua influência sobre as regiões vizinhas: a segurança de Espanha, Bélgica e Itália ficava a seu cargo. A Áustria era um país que se sentia prestes a ruir a qualquer momento, em face das pressões locais: como era um Estado multinacional, composto por católicos, ortodoxos e protestantes, de fala alemã, eslava, húngara e italiana, temia os movimentos nacionalistas e emancipacionistas. Portanto, era o país mais preocupado em conter qualquer movimento revoltoso, onde quer que ele acontecesse. Já a Prússia, indevidamente considerada uma potência pouco relevante em 1815, conseguiu, na realidade, a maior vantagem nos acordos diplomáticos: as vastas regiões mineradoras da Renânia, parte da rica e industrializada Saxônia e boa parte do território polonês. Essa vantagem, que não foi reconhecida como tal na época, seria muito importante mais tarde, no processo de unificação da Alemanha. 4.2 A SANTA ALIANÇA A fim de pôr em prática os princípios de solidariedade entre os países, o czar russo Alexandre I propôs a criação da Santa Aliança, uma organização supranacional que, vinculando os interesses políticos aos da religião, deveria conter os ânimos revolucionários baseados no liberalismo e os movimentos nacionalistas, bem como as lutas de independência das colônias americanas. Originalmente, a Aliança deveria ser encabeçada pelos maiores países de cada religião – Inglaterra anglicana, Áustria católica, Prússia luterana e Rússia ortodoxa –, mas a Inglaterra se recusou a participar por apoiar a independência das colônias americanas e defender o liberalismo econômico. A postura intransigente da Santa Aliança e o surgimento de movimentos nacionalistas em diversas partes da Europa terminaram por enfraquecê-la e, com a morte do czar Alexandre I, considera-se que a Santa Aliança tenha perdido seu poder de influência. 15 RESUMO DO TÓPICO 1 Neste tópico você viu que: • O Consulado, na França, foi instalado em 1799, um momento de grave crise política, e ficou a cargo de um general carismático: Napoleão Bonaparte. • Como cônsul, Napoleão promoveu profundas mudanças na administração e na sociedade francesas: criou um Código Civil, nacionalizou e laicizou a educação, consolidou a separação da Igreja e do Estado e conteve a grave crise econômica que a França atravessava. • O sucesso da administração de Napoleão permitiu-lhe tornar-se imperador em 1804. Ele próprio coroou-se – em vez de ser coroado pelo papa, como mandava a tradição –, demonstrando não aceitar a interferência de nenhuma autoridade em seu poder. • Durante o período imperial, Napoleão enfrentou diversas coalizões de países que desejavam conter as ideias revolucionárias. Vencendo, na maioria das vezes, espalhou essas ideias por toda a Europa. • Incapaz de derrotar a Inglaterra, Napoleão decretou o Bloqueio Continental. Após a Rússia romper o bloqueio, o exército francês invadiu o país e conheceu sua maior derrota diante da estratégia russa de terra arrasada e do rigoroso inverno. • Após a derrota em 1814, Napoleão foi exilado, mas, retornando, governou por mais cem dias até ser definitivamente derrotado em 1815. • Com a derrota de Napoleão, seus adversários organizaram o Congresso de Viena, com o objetivo de conter os ânimos revolucionários e trazer a Europa à situação anterior à Revolução Francesa. • Cada uma das cinco potências – Grã-Bretanha, Rússia, França, Áustria e Prússia – tinha seus interesses particulares no Congresso de Viena, mas essas diferenças eram conciliáveis. Assim, iniciou-se um longo período de paz no continente. • O czar Alexandre I propôs a criação de uma organização supranacional, para defender os interesses conservadores na Europa – a Santa Aliança. A Grã- Bretanha não aderiu ao movimento, que se enfraqueceu na década de 1820. 16 AUTOATIVIDADE 1 O que representou, para a burguesia francesa, o período napoleônico? 2 A reação conservadora do Congresso de Viena e da Santa Aliança foi sustentada por quais interesses? 17 TÓPICO 2 AS REVOLUÇÕES LIBERAIS E O NACIONALISMO ROMÂNTICO UNIDADE 1 1 INTRODUÇÃO A derrota de Napoleão parecia ter selado o destino das ideias liberais na Europa. Os ideais franceses de liberdade, igualdade e fraternidade, espalhados com tanto fervor durante vinte e cinco anos pelo continente, pareciam ter sucumbido diante da pressão das grandes potências conservadoras que se reuniram no Congresso de Viena. O conceito iluminista de poder, que considerava que os governantes retiravam sua autoridade da vontade popular, parecia sepultado diante da restauração das antigas monarquias absolutistas em todas as coroas europeias. Até mesmo na França, onde o rei havia sido executado, a dinastia Bourbon reviveu com Luís XVIII. A intenção dos ultraconservadores parecia realizada: teria a Revolução Francesa passado em branco? No entanto, por mais que os embaixadores das monarquias absolutistas tentassem impedir, os ideais revolucionários de liberdade e de direitos civis haviam calado fundo na população da Europa. As noções de igualdade civil, com um tratamento igualitário a nobres e plebeus, considerados todos igualmente humanos, apareciam como uma novidade empolgante para as populações do resto do continente, que tomaram contato com ela através das conquistas napoleônicas. Essas ideias eram atraentes especialmente para as burguesias nacionais, que percebiam a oportunidade de impor os seus valores morais e políticos à sociedade e, com isso, retirarem os benefícios econômicos que desejavam. As décadas que se seguiram a 1815, apesar da resistência empedernida dos ultraconservadores, assistiriam à vitória da burguesia como classe econômica e social, bem como ao triunfo de sua ideologia filosófica: o Romantismo. Veremos agora como isso aconteceu. UNIDADE 1 | A EUROPA E OS ESTADOS UNIDOS NO SÉCULO XIX 18 2 AS REVOLUÇÕES LIBERAIS 2.1 AS REVOLTAS DA DÉCADA DE 1820 No período compreendido entre 1815 e 1850, três grandes ondas revolucionárias varreram não apenas o continente, mas também outras partes do mundo. A primeira delas, na década de 1820, afetou especialmente os países mediterrâneos – Portugal, Espanha, Grécia e reino de Nápoles. A década seguinte testemunhou revoltas ainda mais contundentes, e o modelo político reacionário estabelecido em Viena ruiu definitivamente em 1830. Mais tarde, em 1848,ocorreu a maior das ondas revolucionárias do século XIX – uma série de revoltas em praticamente todos os lugares da Europa, motivadas pelo liberalismo político e pelo nacionalismo romântico. Embora tivessem fracassado do ponto de vista prático, essas revoltas terminaram por sepultar definitivamente o poder aristocrático na Europa. O primeiro grande movimento de reação ao absolutismo restaurado ocorreu nos países do sul da Europa, entre 1820 e 1829. No entanto, o elo que os une não é muito mais sólido do que isso. Os conflitos em Portugal, Espanha, Grécia e reino de Nápoles tiveram motivações diferentes uns dos outros e todos, com exceção do movimento pela independência da Grécia, foram duramente contidos. No caso dos dois primeiros, teve relação direta com os processos de libertação das colônias na América. Na Espanha, a revolta surgiu a partir do esfacelamento colonial e, em Portugal, a chamada Revolução Constitucional do Porto teve influência direta na Independência do Brasil. Em Nápoles, bem como nos países ibéricos, a revolta foi contida, o que não ocorreu, contudo, na Grécia. Vamos analisar essa última com mais detalhes a seguir. Prezado(a) acadêmico(a)! Este tópico cobre os acontecimentos da Europa no período entre as décadas de 1848 e 1870, ou seja, até as vésperas das unificações da Itália e da Alemanha. É um período muito extenso e repleto de acontecimentos e certamente não é possível fazer em poucas páginas uma exposição aprofundada do assunto. Para maiores informações sobre esse tema, sugerimos dois ótimos livros de Eric Hobsbawm: A Era das Revoluções: 1789 – 1848 e A Era do Capital: 1848-1875. Estas duas obras, juntamente com A Era dos Impérios: 1875 – 1914 (que vai ser referência básica para a Unidade 3), constituem uma espécie de “trilogia do século XIX”, de leitura obrigatória para os estudiosos do período. NOTA TÓPICO 2 | AS REVOLUÇÕES LIBERAIS E O NACIONALISMO ROMÂNTICO 19 2.1.1 A “Questão Oriental” e a liberação da Grécia 2.2 AS REVOLUÇÕES DE 1830 Como mencionamos há pouco, o acerto diplomático entre as potências permitiu que o continente europeu atravessasse um período de relativa tranquilidade política após 1815. A única questão pendente na paz europeia era o Império Otomano, que estava em perceptível processo de esfacelamento. Constituído a partir da invasão turca sobre o Império Bizantino, no final da Idade Média, o império tinha dificuldade de conciliar uma enorme quantidade de povos tão diversos entre si e cada vez mais hostis aos turcos. A questão era menos nacionalista do que religiosa: o domínio muçulmano não era bem-vindo pelos povos cristãos – católicos ou ortodoxos – da região. Os gregos, especialmente, lutavam contra o domínio turco, e isso acendia o imaginário europeu, pela carga simbólica que essa luta carregava: que a Grécia, berço da civilização clássica, pudesse estar em busca de sua autonomia política – e sobre dominadores muçulmanos – era fato que emocionava os espíritos sensíveis no final da década de 1820. Mas, a luta contra os turcos atiçava, em um plano mais pragmático, os interesses estratégicos dos britânicos e dos russos. Estes últimos, porque desejavam exercer a influência política sobre a Grécia invocando as tradições da religião ortodoxa e, assim, conseguirem vantagens econômicas. A Grã-Bretanha, por sua vez, desejava impedir o avanço russo pelos Bálcãs, mas, ao mesmo tempo, enfraquecer o Império Otomano. Dessa forma, ambas as potências apoiaram a criação de uma monarquia na Grécia em 1829. A revolta na Grécia iniciou-se como parte dos movimentos de protesto do início da década de 1820, e, como vimos, foi de todos esses o único que obteve sucesso em seu objetivo, principalmente por causa dos interesses britânicos e russos mencionados acima. Mas, o efeito simbólico que esse movimento ganhou na Europa fugiu completamente ao controle dos arquitetos da Restauração Conservadora do Congresso de Viena. A libertação da Grécia, em 1829, serviu de inspiração para movimentos nacionalistas e liberais em diversas outras partes do continente e acabou dando início a uma nova onda de revoltas, muito mais significativa do que a anterior, no início da década de 1830. UNIDADE 1 | A EUROPA E OS ESTADOS UNIDOS NO SÉCULO XIX 20 2.2.1 A Revolução Liberal na França 2.2.2 A Revolução Liberal em outros países 2.3 AS REVOLUÇÕES LIBERAIS DE 1848 Após a queda de Napoleão, os acordos do Congresso de Viena haviam restaurado o absolutismo na França, sob o rei Luís XVIII. O período foi caracterizado por uma ferrenha perseguição política aos liberais, em uma tentativa ultraconservadora de desfazer todas as conquistas da Revolução Francesa. Esse esforço, no entanto, mostrou-se inútil; não havia mais como se retornar ao status quo anterior a 1789, por mais que Luís XVIII e seu irmão Carlos X – coroado em 1824 – se esforçassem para isso. O governo ainda mais ferrenhamente conservador de Carlos X, aliado a uma séria crise econômica no final da década, levou a população a organizar uma revolta contra o absolutismo real. A burguesia, desejando restabelecer seus interesses, ofereceu o trono ao duque de Orléans, Luís Filipe. O novo rei favoreceu amplamente os interesses econômicos da burguesia. Em seu reinado, a França se industrializou, organizou uma estrutura econômica que concentrou a riqueza nas mãos da burguesia e deu início à sua expansão colonial pela África. Por medo do radicalismo, o governo decidiu rejeitar as reivindicações do proletariado, que desejava reformas profundas na estrutura do país. Mas, embora os movimentos operários viessem crescendo consideravelmente, especialmente na Grã-Bretanha, não havia lideranças entre os proletários franceses capazes de promover uma revolta de amplas proporções. Em outras partes da Europa, os movimentos libertários de 1830 tiveram repercussão. Em Portugal e na Espanha ocorreram verdadeiras guerras civis entre liberais e absolutistas (em Portugal, os liberais foram liderados por D. Pedro IV, que havia sido D. Pedro I do Brasil); revoltas ocorreram também na Grã-Bretanha, na Bélgica (que conseguiu sua independência) e parcialmente na Suíça. A leste do Reno, no entanto, os movimentos revolucionários foram contidos pela atuação da Santa Aliança, especialmente da Áustria – que, como vimos, temia muito qualquer tipo de revolução e de movimento revoltoso que pudesse destruir sua frágil unidade. Mas o nacionalismo começava a fazer eco entre a população e levaria, mais tarde, aos processos de unificação. As revoluções de 1830 tiveram um alcance relativamente limitado do ponto de vista social. Encontraram alcance maior entre a burguesia, que desejava consolidar sua posição política, do que entre os trabalhadores. A bem da verdade, os burgueses temiam os movimentos operários, pois sabiam do risco que isso TÓPICO 2 | AS REVOLUÇÕES LIBERAIS E O NACIONALISMO ROMÂNTICO 21 2.3.1 A Primavera dos Povos A onda de revoluções ocorrida em 1848 ficou conhecida como a Primavera dos Povos. A sensação que se tinha era de que o liberalismo e o nacionalismo estavam finalmente triunfando sobre o absolutismo e expulsando-o definitivamente para os livros de História. Por todo o continente – com raras exceções –, movimentos revoltosos surgiam, mas, em sua grande maioria, não conseguiram atingir os objetivos desejados. No Império Austríaco. Em meados do século XIX, a Áustria era um dos últimos grandes baluartes do absolutismo em solo europeu. O esforço gigantesco para impedir a fragmentação política do país não apenas levava os imperadores austríacos a intervirem no exterior quando preciso, como a desencorajar tentativas de revolta internas. Mas, em 1848, uma revolta popular obrigou o rei Fernando I a aceitar uma monarquia parlamentar. A repercussão foi grande na Hungria e na Boêmia, regiões do Império com língua e cultura muito diferentes da Áustria, e esboçaram-se tentativas de maior autonomia regional. No entanto, no final de 1848, o rei conseguiuretomar o controle absoluto do governo. Na Península Itálica. A península Itálica estava dividida, em 1848, em uma série de pequenos Estados, que incluíam reinos (duas Sicílias e Sardenha- Piemonte), ducados (Toscana, Módena, Lombardia e outros) – muitos dos quais sob o domínio austríaco – e outros tipos de domínios, incluindo extensos territórios pertencentes à Igreja. Em 1848, o rei de Sardenha-Piemonte, Carlos Alberto, tentou dar início a um movimento de unificação da península com base no nacionalismo italiano e, para isso, declarou guerra à Áustria. O movimento ganhou a adesão de diversos Estados da península, mas foi sufocado pelo poder do exército austríaco. Apesar da derrota, o ideal de unificação não seria abandonado e viria a ter sucesso mais tarde. representaria para seus interesses. No entanto, a crescente industrialização de diversas partes do continente europeu gerava um aumento de influência da classe operária nas decisões políticas, por mais que a burguesia desejasse mantê- la afastada da política. A França continuava sendo, ainda na metade do século XIX, o grande epicentro político e ideológico do continente. Assim como em 1830, quando os acontecimentos vindos de Paris tiveram influência direta em revoltas ocorridas em outros países, novamente a crise francesa teve repercussões no exterior em 1848. O resultado foi um novo período de revoluções em todo o continente. As Revoluções de 1848, embora não tenham obtido sucesso imediato em suas reivindicações, contribuiriam para a destruição final do Absolutismo e para o estabelecimento de uma nova ideologia na organização política: o nacionalismo romântico. UNIDADE 1 | A EUROPA E OS ESTADOS UNIDOS NO SÉCULO XIX 22 Nos Estados Germânicos. A região da atual Alemanha consistia, em 1848, numa frouxa confederação de 38 Estados relativamente autônomos. A crise econômica, as condições de vida precárias da população e o desejo por uma organização política mais democrática, que previsse liberdade de imprensa e a organização de um parlamento unificado, levaram diversas regiões à revolta. O objetivo final era, como nas regiões italianas, conseguir a unificação do país, com base nos ideais nacionalistas. Mas, a intervenção enérgica da Áustria e a dificuldade de se estabelecer uma organização satisfatória levaram o movimento ao fracasso. 2.4 O 18 BRUMÁRIO DE NAPOLEÃO III Na França, o governo de Luís Filipe não conseguiu conciliar satisfatoriamente os interesses da nobreza e da burguesia. Aos poucos, tornou-se mais conservador e começou a desagradar setores consideráveis da burguesia. Ao mesmo tempo, a rápida industrialização da França gerou um grande aumento no número de operários e garantiu-lhes maior poder de barganha. Mas, o sistema de voto censitário, que ainda vigia no país, impedia a sua manifestação política. Prezado(a) Acadêmico(a)! Analise novamente os movimentos de 1848 e perceba o que eles tiveram em comum. Foram movimentos de caráter nacionalista, que buscavam maior autonomia e liberdade individual, e que fracassaram sob o peso de governos ultraconservadores. No entanto, mesmo derrotadas em um primeiro momento, as lutas de 1848 tiveram reflexos profundos nas décadas seguintes e contribuíram para a consolidação do poder político da burguesia no século XIX. Você consegue perceber a relação entre o aumento da industrialização e os movimentos de reivindicação proletária, comandados por grupos como os socialistas e os anarquistas? Tente refletir a respeito disso e relacionar esses fenômenos à crescente tendência à democratização política durante o século XIX. Anote suas conclusões. UNI UNI TÓPICO 2 | AS REVOLUÇÕES LIBERAIS E O NACIONALISMO ROMÂNTICO 23 Em 1848, um protesto popular em Paris foi contido com extrema dureza pelo exército. O incidente levou ao descrédito do imperador Luís Filipe, que se viu forçado a abdicar. O novo Governo Provisório estabeleceu uma República no país e, no ano seguinte, foi eleito presidente Luís Napoleão, sobrinho de Napoleão Bonaparte. A referência a seu tio permitiu que Luís Napoleão conciliasse interesses da burguesia e dos camponeses e que, três anos depois, ele conseguisse proclamar-se imperador após um plebiscito. Com esse golpe – chamado por Karl Marx de 18 Brumário de Luís Bonaparte – ele ganhou o direito de governar a França, como Napoleão III, até 1870. 2.5 A ERA DO CAPITAL O Segundo Império francês foi um período de grande desenvolvimento econômico e de pouca efervescência política. A burguesia ganhou definitivamente o acesso às decisões do governo, e o país cresceu de forma até então nunca vista: novas indústrias surgiram, ferrovias foram construídas em todo o país e o grande desenvolvimento posterior estava em gestação. Ao mesmo tempo, o governo exercia uma forte censura aos meios de comunicação, por medo da propagação das ideias socialistas e anarquistas. O desenvolvimento francês estava em pleno acordo com o que vinha acontecendo em grande parte da Europa e também nos Estados Unidos. A industrialização avançava a passos largos, gerando uma enorme prosperidade para as burguesias nacionais, mas ao mesmo tempo acentuando com muita clareza o enorme contraste com a miséria do proletariado. Esse contraste teria como consequências, nas décadas seguintes, tanto o crescimento dos movimentos operários comandados por socialistas, anarquistas e anarcossindicalistas, como o desenvolvimento de políticas imperialistas entre as maiores potências europeias. Quando Karl Marx intitulou o golpe de 1851 de O 18 Brumário de Luís Bonaparte, usou de toda sua ironia. Acusou o sobrinho de querer parecer igual ao tio, quando não passava de um impostor, um Napoleão menor. Na obra que escreveu com esse título, Marx cunhou a célebre expressão, tantas vezes citada, que diz que a história se repete duas vezes: a primeira como história, a segunda como farsa. NOTA UNIDADE 1 | A EUROPA E OS ESTADOS UNIDOS NO SÉCULO XIX 24 3 O NACIONALISMO ROMÂNTICO 3.1 O ROMANTISMO Os movimentos revolucionários de 1848 e, posteriormente, as unificações da Itália e da Alemanha foram impulsionados por uma poderosa ideologia, que arrastava corações e mentes em toda a Europa: o nacionalismo. Essa ideologia, de origem tipicamente burguesa, ganhou terreno na Europa a partir da década de 1820 e, por se revestir de um caráter fortemente influenciado pelo Romantismo, também ficou conhecida como nacionalismo romântico. Prezado(a) Acadêmico(a)! Você provavelmente se lembra de seus estudos de Literatura, no Ensino Médio: Barroco, Arcadismo, Romantismo, Realismo etc. Você deve ter estudado as características principais do movimento e seus principais representantes literários, especialmente em Portugal e no Brasil. O que talvez não tenha ficado tão claro, dependendo de como o assunto foi tratado, é que o Romantismo se constituiu em muito mais do que um simples movimento literário ou mesmo artístico; foi uma verdadeira revolução filosófica, uma forma particular de se compreender o mundo que surgiu na Europa a partir do último quartel do século XVIII e desenvolveu-se com grande força na primeira metade do século XIX. Regiões como a Bélgica, o vale do Reno, na Prússia, o reino de Sardenha- Piemonte na Península Itálica e o norte dos Estados Unidos se tornaram grandes centros industriais na segunda metade do século XIX, o que não apenas gerou uma dramática transformação na economia mundial, como provocou uma ruptura no equilíbrio entre os países formados em 1815. A partir de 1870, aproximadamente, o surgimento de novas potências industriais perturbou a Pax Britannica e desencadeou uma série de acontecimentos que levariam, mais tarde, à deflagração da Primeira Guerra Mundial (1914-1918). Estudaremos, com mais detalhes, o Socialismo no próximo tópico. Já o Imperialismo será visto detalhadamente na Unidade 3. ESTUDOS FU TUROS TÓPICO 2 | AS REVOLUÇÕES LIBERAIS E O NACIONALISMO ROMÂNTICO 25 O homem romântico, dessa forma, sentia-se perdido diantedo mundo, embora o encarasse com ardor e paixão intensos. O espírito romântico talvez encontre sua tradução mais eloquente no quadro O viajante sobre o mar de brumas, do pintor alemão Caspar David Friedrich (1774-1840), que retrata um homem em completa solidão sobre uma paisagem desoladora e enevoada, expressão da angústia da alma romântica (ver a reprodução a seguir). Se você desejar relembrar essa discussão, releia, no Caderno de História Moderna, o trecho referente à Reforma Religiosa, ou o livro A Ética Protestante e o Espírito do Capitalismo, de Max Weber. NOTA Diversas são as definições para o Romantismo. Seu desenvolvimento coincidiu com a ascensão política da burguesia, que trouxe consigo valores muito diferentes dos partilhados pela sociedade de nobreza que dominava anteriormente. Os românticos buscavam explicações para a origem de sua autoridade e de seus países, e as encontraram na Idade Média. A religiosidade cristã servia bem aos interesses burgueses – especialmente no norte da Europa – que se identificavam com os ideais de simplicidade e de devoção que viam aí. Um medievalismo idealizado passou a ser uma característica marcante do movimento – perceptível, por exemplo, em obras como Ivanhoé, de Walter Scott, na construção de palácios inspirados em castelos e nas reinterpretações de lendas e contos de fada de origem medieval. Um dos pontos mais importantes do movimento é a intensa subjetividade – o que implica o recurso à individualidade, ao escapismo e ao sentimentalismo – em oposição ao pensamento iluminista do século XVIII, entendido pelos românticos como excessivamente racional e, portanto, desumanizado. Esta também é uma característica do movimento que pode ser identificada com a ideologia burguesa – especialmente no norte da Europa – e sua noção de individualidade e de desamparo do ser humano no caminho da salvação. UNIDADE 1 | A EUROPA E OS ESTADOS UNIDOS NO SÉCULO XIX 26 FONTE: Disponível em: <http://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/5/5b/Caspar_David_ Friedrich_ 032.jpg>. Acesso em: 22 mar. 2008. As atitudes dos românticos variavam, então, de um hedonismo desenfreado (como nas obras de Stendhal e Lord Byron) a um estado de mórbida desesperança (como o jovem Werther, personagem-título do clássico de Goethe, que se suicidou por um amor impossível), passando por uma fuga do mundo por meio da idealização do amor e da vida (o tema romântico por excelência). FIGURA 3 – O VIAJANTE SOBRE O MAR DE BRUMAS, DE CASPAR D. FRIEDRICH (1774-1840) O Romantismo deu origem a dezenas de grandes obras-primas da literatura mundial. Em sua maioria, essas obras são hoje bastante acessíveis, sendo fácil encontrá- las em livros de ampla circulação e mesmo na Internet. Alguns dos grandes escritores da época incluem Lord Byron, as irmãs Brontë, Edgar Allan Poe (EUA), George Sand e Walter Scott (britânicos), Vitor Hugo, Alexandre Dumas pai, Stendhal, Musset, Chateaubriand, Lamartine e Balzac (franceses), os irmãos Grimm, Goethe, Schiller e Novalis (alemães), Ibsen (norueguês) e dezenas de outros. Na música, o Romantismo também produziu nomes extraordinários, como Beethoven, Haydn, Liszt, Chopin, Schummann, Verdi, Wagner, NOTA TÓPICO 2 | AS REVOLUÇÕES LIBERAIS E O NACIONALISMO ROMÂNTICO 27 3.2 O NACIONALISMO O questionamento da autoridade das monarquias absolutistas tradicionais, a partir da Revolução Francesa, gerou a necessidade de se estabelecerem em outros termos as noções de legitimidade política. A partir desse momento, era o povo, não mais a vontade divina, quem garantia o poder real. Isso gerava a ideia de nação, um conjunto de pessoas com uma origem comum, reunidas em um mesmo território e compartilhando, a despeito das diferenças de classes sociais, da mesma história, da mesma língua, dos mesmos símbolos e dos mesmos objetivos. O Romantismo do início do século XIX servia como um poderoso catalisador dos ânimos nacionalistas, ao vincular emocionalmente os indivíduos à sua região de origem. A partir desse momento, a antiga submissão ao monarca, característica do Antigo Regime, perdeu o sentido. O indivíduo passava a se ligar voluntariamente (não mais como súdito) à região onde nascera e aos seus semelhantes, com quem compartilhava a língua, as tradições e o amor pela terra natal. Em alguns lugares, como na França e na Inglaterra, a nação era identificada com o país já existente, consolidado a partir das tradições daquele povo e sendo governado em seu benefício. Em outros lugares, entretanto, o que se entendia por nação não coincidia com um território autônomo. Algumas nações estavam sob o domínio de povos pertencentes a outras culturas – como o caso dos tchecos, húngaros e croatas, submetidos ao Império Austríaco –, outras estavam fragmentadas em diversos territórios, como no caso da Alemanha e da Itália. Nessas regiões, a ideia de autonomia ou de unificação começou a ganhar cada vez mais adeptos, ao longo do século. Nas revoluções de 1848, esses movimentos estouraram pela primeira vez, mas foram sufocados pelas forças ultraconservadoras; no entanto, algumas décadas mais tarde eles seriam bem-sucedidos. Schubert, Berlioz, Brahms e muitos mais. É claro que essa lista deveria ser muitas vezes maior, mas preferimos não nos estender demais. Fica então a sugestão: leia ou ouça essas obras e todas mais que puder e desejar. Pesquise, conheça com a maior profundidade que puder esse movimento. Além da satisfação de conhecer obras extraordinárias, isso lhe dará uma percepção muito mais aguçada dos significados do Romantismo e do século XIX. UNIDADE 1 | A EUROPA E OS ESTADOS UNIDOS NO SÉCULO XIX 28 As unificações da Itália e da Alemanha serão estudadas na Unidade 3. ESTUDOS FU TUROS 29 RESUMO DO TÓPICO 2 Neste tópico, você viu que: • As revoluções de 1848, que ficaram conhecidas como A Primavera dos Povos, originaram-se na França e alastraram-se por toda a Europa. Mas não obtiveram sucesso: após um breve período, todas as revoltas foram contidas e os governos depostos foram restabelecidos. • Na França, Luís Napoleão, sobrinho de Napoleão Bonaparte, foi eleito presidente e depois tornou-se imperador com o nome de Napoleão III. • O período entre 1850 e 1870 foi de grande desenvolvimento econômico na Europa, o que levava também a um fortalecimento dos movimentos operários. • O nacionalismo romântico foi a ideologia que motivou inúmeras revoltas pela Europa, no século XIX, e deu o tom das unificações nacionais na Alemanha e na Itália. • A unificação italiana foi comandada pelo reino de Sardenha-Piemonte, o mais industrializado da península e o único comandado por uma dinastia local. Após uma guerra contra a Áustria e o apoio das forças republicanas de Giuseppe Garibaldi, o conde Cavour, articulador da unificação, reuniu toda a península em um único reino. • A unificação alemã foi comandada pela Prússia, governada pelo chanceler Otto von Bismarck. Para conseguir a unificação, ele travou guerras, sucessivamente, com a Dinamarca, a Áustria e a França, até que em 1871, o rei Guilherme I da Prússia foi coroado Kaiser (rei) da Alemanha. • As unificações da Alemanha e da Itália alteraram o equilíbrio do poder no continente europeu, além de acirrar tensões que levariam, mais tarde, à deflagração da Primeira Guerra Mundial (1914-1918). • A humilhação sentida pelos franceses com a derrota na Guerra Franco- Prussiana em 1871 levou a população a insurgir-se e criar um governo popular: a Comuna de Paris. 30 AUTOATIVIDADE 1 Após a “Primavera dos Povos”, o continente europeu atravessou um período de grande desenvolvimento econômico. Há alguma relação entre os dois eventos? Explique. 2 O que caracteriza, em linhas gerais, o Romantismo? 3 Comentando a proclamação de Luís Napoleão como imperador Napoleão III, Marx cunhou sua célebre frase que diz que a história se repete como farsa. De que forma o “18 Brumário de Luís Bonaparte” era a repetição como farsa da história? 31 TÓPICO 3 AS ORIGENSDO SOCIALISMO UNIDADE 1 1 INTRODUÇÃO Caro(a) acadêmico(a)! Você já estudou em outras disciplinas acerca de algumas ideias sobre o socialismo. No entanto, nesse tópico irá entender como e por que o Socialismo se desenvolveu no Século XIX a partir de uma leitura histórica. Como já foi estudado na Disciplina de História Moderna, o século XVlll, conhecido como o “Século das Luzes”, foi cenário também de movimentos liberais, contestadores e revolucionários. Muitos estavam convencidos de que as luzes da razão iriam amenizar os preconceitos, a ignorância e as desigualdades entre as pessoas, o que acabou não acontecendo. Ainda tivemos o fato de que os resultados das revoluções mostraram que o liberalismo correspondeu aos interesses da burguesia. O que ocorreu de certa forma, por exemplo, com a Revolução Francesa. A insatisfação com a situação política e social também esteve presente no século XVlll. A França se viu diante de uma das primeiras manifestações socialistas. Apesar de fracassado, o movimento conhecido como “Conspiração dos Iguais” lançou as bases para a discussão das ideias socialistas no país. Entre suas exigências, defendiam a socialização da terra, a obrigatoriedade do trabalho para todo o cidadão e a intervenção do Estado na economia. A Conspiração dos Iguais, de 1796, foi um movimento que pretendia a abolição de toda propriedade privada e a fundação de um governo popular de tendência socialista liderada pelo Jacobino Graco Babeuf. Seus seguidores foram presos, executados ou deportados. NOTA 32 UNIDADE 1 | A EUROPA E OS ESTADOS UNIDOS NO SÉCULO XIX Temos uma questão importante para responder: o que é mesmo Socialismo? De uma maneira geral, podemos afirmar que o socialismo é um acontecimento típico da história con temporânea. É lógico que, anteriormente ao surgimento das ideias socialistas, houve outras formas de protestos contra as desigualdades sociais existentes, contra a concentração de riquezas, contra os abusos da burguesia. No entanto, foi somente no século XIX que essas ideias tomaram uma profundidade de análise mais científica e os próprios movimentos contestatórios cresceram. É isso que veremos nesse tópico! 2 O SURGIMENTO DO SOCIALISMO O Socialismo tem suas origens nas lutas contra as injustiças sociais da época. No entanto, foi além disso. Inseriu nessa luta um novo elemento: a ideia de transformar as condições de produção e a apropriação da riqueza privada para a maioria da sociedade. Os defensores das ideias socialistas passaram a propor limites e restrições aos direitos dos proprietários privados, elaborando uma série de questões que deveriam acabar com as gritantes diferenças sociais do período. Primeiramente, no início do século XIX, o movimento socialista desdobrou- se mais em uma forma de resistência do que em construção de ideias propriamente ditas. Sua primeira expressão de protesto da nascente classe operária se traduziu no ludismo. De forma particular, o ludismo foi um movimento que se insurgiu contra as profundas alterações e explorações trazidas pela chamada “Revolução Industrial” na Inglaterra. TÓPICO 3 | AS ORIGENS DO SOCIALISMO 33 FONTE: Disponível em: <http://images.google.com.br>. Acesso em: 24 abril 2008. 2.1 O LUDISMO Reclamar contra as máquinas na indústria e a sua substituição em relação à mão de obra humana já fazia parte do cotidiano dos trabalhadores no final do século XVIII e início do XIX. No entanto, foi em 1811, na Inglaterra, que o movimento explodiu, recebendo um outro sentido. Derivado do nome de Ned Ludd, um dos líderes do movimento, os Ludistas ficaram conhecidos pelos seus atos violentos contra as máquinas. Destruindo máquinas e invadindo fábricas, pois, segundo os mesmos, essas eram mais eficientes que os homens, tiravam seus trabalhos, requerendo, assim, duras jornadas de trabalho. Ficaram lembrados como “os quebradores de máquinas”. Vejamos o que nos diz Voltaire Schilling sobre o Ludismo! FIGURA 4 – TRABALHADORES NA INGLATERRA, PAÍS ONDE OCORREU O LUDISMO O Movimento Ludista Atacar e destruir máquinas é uma atividade bem mais antiga do que se supõe. Bem antes do desencadeamento do Movimento Ludista 34 UNIDADE 1 | A EUROPA E OS ESTADOS UNIDOS NO SÉCULO XIX registraram-se, no princípio do século XVIII, ações depredadoras na periferia de Londres contra uma serra movida a água, como também contra uma tosquiadeira automática, inventada por um tal de Everet em 1758. O próprio Marx assinala (no cap. XIII, 5, d’O Capital) as rebeliões ocorridas em certas partes da Europa provocadas pela introdução de moinho de fazer fitas e galões. O que levava aquela gente humilde, geralmente cordata, a cometer tais atos desesperados? Medo e insegurança. Assustavam-se com a possibilidade das máquinas estreitarem ou suprimirem com o trabalho deles, além do receio sobrenatural ao novo, tão comum entre as gentes. Os Ludistas, porém, foram mais além dos quebra-quebras. Se bem que no seu princípio houve incursões antimáquinas espontâneas, tal como se deu em março de 1811, em Arnold, um lugarejo de Nottingham, onde um bando devastou 60 teares sob o aplauso de uma multidão de desempregados, em Yorkshire, Leicestershire e em Derbyshire, regiões vizinhas, não se tratava mais de explosões irracionais, esparsas e desordenadas. Nos momentos seguintes, nunca tendo um líder só, foram pequenos grupos organizados e disciplinados, atuando segundo um plano, quem entraram em atividade. Estima-se que o seu número oscilou de três a oito mil integrantes, dependendo do distrito. Liderados pelos assim apontados “homens de maus desígnios”, usando máscaras ou escurecendo o rosto, os esquadrões ludistas, armados com martelos, achas, lanças e pistolas, aproveitando-se para deslocarem-se à noite, vagavam de um distrito ao outro demolindo tudo o que encontravam, apavorando os donos das fábricas. O comandante da operação chamava-se de “General Ludd”, com poder de vida e morte sobre os companheiros. Em Nottingham revelou-se um tipo enorme, Enoch Taylor, um ferreiro que levava ao ombro uma poderosa maça de ferro batizada com o seu nome mesmo: Enoch. Bastava uma martelada daquelas para que a porta do estabelecimento viesse abaixo, enquanto que mais uma outra aplicada num engenho qualquer reduzia-o a um monte de ferro inútil. A literatura marxista a respeito do ludismo (E.P.Taylor, E.Hobsbawn, e o próprio Marx) procurou retirar a pecha de analfabetos ignorantes que o restante da população inglesa havia lançado sobre os inimigos das máquinas (tornando desde então o termo ludista algo pejorativo). Entenderam-no, o movimento, como um protossindicalismo, uma reação desculpável e natural contra algo que provocava o desemprego e o rebaixamento salarial. Além, claro, de ser uma contestação ao capitalismo, ainda que no quadro da grande transformação operada na transição do trabalho manual para o trabalho automatizado. Mesmo TÓPICO 3 | AS ORIGENS DO SOCIALISMO 35 assim, não conseguiram evitar as óbvias associações do ludismo com o obscurantismo medieval, tão comuns a certos setores das classes populares. Marx, socorrendo-se de um tal de Andrew Ure (The Philosophy of the Manufactures, 1835), um teórico, defendeu a tese de que graças às ameaças dos trabalhadores é que os capitalistas, para reduzirem as pressões e as rebeldias, aceleravam as implementações tecnológicas, concluindo que a máquina era estruturalmente uma “potência hostil ao trabalhador” (O Capital, vol. I, cap. XIII, 5). FONTE: Disponível em: <http://educaterra.terra.com.br/voltaire/artigos/ludismo.htm>. Acesso em: 28 abril 2008. 2.2 CARTISMO Objetivando a reivindicação de melhores condições de vida, os operários ingleses se organizaram, no final da década de 1830, num movimento que ficou conhecido como Cartismo. Mais político que o anterior, o Cartismo teve como finalidade representar politicamente o operariado enquanto movimento organizado. Considerado um dos primeiros movimentos independentes da classe
Compartilhar