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01. Anomalias anorretais Introdução As anomalias anorretais representam um dos maiores desafios que o cirurgião pediatra enfrenta na correção dos defeitos congênitos. A principal sequela que as crianças portadoras dessa malformação enfrentam é a incontinência fecal, que as segrega da sociedade. Além disso, muitas delas tem incontinência urinária e, frequentemente, distúrbios da atividade sexual. Etiopatogenia Múltiplos fatores podem interferir no desenvolvimento das estruturas. Entre elas estão os relacionados ao ambiente como a ingestão de substancias químicas (talidomida, contraceptivos orais e inibidores do ácido fólico) e fatores mecânicos como a flexão excessiva da cauda primitiva, além disso, temos possíveis fatores genéticos como a delação do gene 22q11.2 que está associado a anomalias anorretais e geniturinárias. Incidência As AAR ocorrem entre 1:2500 a 1:5000 recém‐nascidos, sendo mais frequentes no sexo masculino que no feminino. No sexo masculino o tipo mais comum é aquele com fístula retouretral, enquanto no sexo feminino é aquele com fístula retovestibular. O risco de um casal ter um segundo filho com AAR é de aproximadamente 1%. Sem fistula 5% dos casos. A persistência da cloaca e a extrofia da cloaca são muito raras. Classificação Masculino: 1‐ Fístula retouretral‐ bulbar e prostática O reto comunica‐se com a face posterior da uretra, na sua porção superior (prostática) ou na sua porção inferior (bulbar), apresentando mecônio na urina. Logo acima da fístula, o reto e a uretra têm uma parede comum, cuja extensão é mais longa na fistula reto bulbar. Crianças com fístula reto bulbar tem bom mecanismo esfincteriano e sacro bem formado, logo apresentando bom prognostico de continência fecal. Ao contrário, crianças com fístula reto prostática tem mecanismo esfincteriano pobre e alterações sacrais associadas que apresenta pior prognostico de continência fecal. 2‐ Fístula retoperineal Definida como AAR baixa, apresentar esfíncter externo bem desenvolvido e posicionado, permitindo correção primária com baixo risco de lesão. Observação de mecônio no períneo ou em trajeto na rafa mediana do escroto. Musculatura e sulco interglúteo bem desenvolvidos, prognóstico de continência fecal bom. 3‐ Fístula retovesical O reto se comunica perpendicularmente com o colo da bexiga, abrindo no trato urinário acima do mecanismo esfincteriano. O sacro geralmente é hipoplásico ou, mesmo, ausente. O mecanismo esfincteriano é hipotrófico e o períneo é caracteristicamente achatado, quase não se identificando o sulco interglúteo. Abordagem cirúrgica abdominoperineal, eventualmente com auxílio de laparoscopia. 4‐ Anus imperfurado sem fistula É pouco comum e tem as mesmas características em ambos os sexos. O reto termina em fundo cego aproximadamente 1 a 2 cm acima do períneo. O mecanismo esfincteriano está preservado, o sacro é habitualmente normal. Metade desses casos são portadores de síndrome de Down. Feminino: 1‐ Fístula retovestibular O reto se abre no vestíbulo da genitália feminina, logo à frente do introito vaginal. A porção inferior do reto e a vagina compartilham uma longa parede comum. A maioria das crianças tem sacro normal e mecanismo esfincteriano adequado. O sulco interglúteo é bem delineado e a impressão anal é bem marcada. A identificação da fístula exige um exame detalhado da genitália. Bom prognóstico de continência fecal. Comentado [A1]: Imagem mostrando a fistula retovestibular, a seta aponta para a fístula 2‐ Fístula retoperineal O reto abre‐se anteriormente ao centro do esfíncter externo, posteriormente ao vestíbulo da vagina. Não há parede comum entre o reto e a vagina, fato que tem importante implicação cirúrgica. 3‐ Cloaca É uma malformação na qual o reto, a vagina e o trato urinário unem‐se e terminam num único canal comum. O reto, a vagina e o trato urinário têm parede comum muito longa, o que representa o principal desafio técnico na correção cirúrgica desses defeitos. Provavelmente irá necessitar de reconstrução da vagina, pois é praticamente impossível a mobilização de vagina muito alta e de pequenas dimensões para o períneo. A vagina e o útero mostram diferentes graus de septações que variam desde finos septos incompletos ate uma completa separação em duas hemivaginas e dois hemiúteros. Observam‐se diferentes associações de hidrocolpos e hemivaginas, em diferentes combinações e graus de complexidade. Há dois tipos de cloacas: baixa, representando canal menor que 3cm e possuindo bom prognostico; e alta, representando canal maior que 3 cm representando prognostico ruim No sexo feminino, o ânus imperfurado sem fistula tem, do ponto de vista anatômico, terapêutico e prognóstico, as mesmas implicações que no sexo masculino. Malformações associadas São as conhecidas como síndrome de VATER ou VACTERL, que abrange problemas vertebrais, esôfago e traqueais, cardíacos, renais e de extremidades. Observa‐se malformações geniturinárias em cerca de 50% dos pacientes, musculoesqueléticas em aproximadamente 30%, cardiovascular em 2% (30%‐10%), gastrintestinal em 20%, respiratória em 13% e SNC em 12%. Tais malformações são responsáveis pela morbidade e mortalidade. Há também associação com atresia do esôfago (8%) e atresia duodenal (5%), anomalia sacral (30%). Deve solicitar os seguintes exames para verificar tais anomalias: ecocardiograma; Rx Torax e abdome; Rx PA e perfil da bacia (índice sacro); US Renal; US da coluna lombossacra (25% de medula presa); US da pelve. Diagnóstico Comentado [A2]: Comentado [A3]: Frequentemente há referencia de eliminação anômala de mecônio, pelo trato urinário nos meninos e pelo introito vulvovaginal nas meninas. Pode ser, ainda, eliminado pelo períneo, bem como não haver eliminação de mecônio. Distensão abdominal e vômitos tardios podem fazer parte do quadro clinico nos casos em que a fístula é insuficiente ou não existir fístula. Constipação crônica, com esforço a defecação e fezes em fita pode sugerir estenose anal. (na suspeita de estenose faz uma manometria anorretal) No exame físico pode evidenciar distensão abdominal, a ausência do ânus e o achatamento da região glútea, bolsa escrotal fedida. O exame físico deve incluir a pesquisa de contração do canal esfíncter externo e o toque retal, se houver canal anal. Realização de invertograma, geralmente 12 horas após o nascimento, objetivando determinar a altura do fundo de saco retal. Sumario da urina, com investigação de presença de mecônio. A ultrassonografia abdominal pode investigar anomalias no trato urinário. A radiografia de tórax e abdome pode evidenciar anomalias de vertebras e costelas, e defeitos cardíacos. A sonda nasogástrica pode ser passada para verificar problemas no esôfago. Uretrocistografia miccional para verificar as fistulas reto uretral ou reto vesical. Algoritmo masculino Não se deve esperar a visualização da saída de mecônio antes de 16 a 24 horas. Isto também significa que não devemos tomar qualquer decisão importante com relação a realização de colostomia descompressiva antes de decorridas 24 horas de vida. Comentado [A4]: ARPSP – Anorretoplastia sagital posterior Comentado [A5]: Tanto na menina como no menino, o melhor local é no colón descendente, deve limpar a porção distal, e lembrando que a boca distal deve apresentar uma fistula mucose pequena para evitar prolapso. Algoritmo feminino Nas meninas portadoras de cloaca, deve‐se solicitar especificamente o ultrassom pélvico para excluir a presença de hidrocolpos,que ocorre em cerca de 50% desses casos. Quando o cirurgião não consegue localizar fistula perineal e não há saída de mecônio por algum orifício do períneo, nas primeiras 16 a 24 horas, a menina deve ser submetida a colostomia e deve‐se concluir que provavelmente trata‐se de caso de anus imperfurado sem fistula. Conduta A definição do tipo da malformação anorretal e a qualidade da musculatura retal e glútea é prioritária. Nos casos com evidencia clínica, laboratorial e de imagem de anomalia baixa deve‐se fazer anoplastia perineal por via sagital posterior, sem colostomia protetora. Nos casos de anomalias altas deve‐se fazer colostomia e posterior (3 e 6 meses) abaixamento reto cutâneo por via sagital posterior. Nos casos de cloaca deve‐se fazer colostomia, derivação urinaria, vaginostomia se necessário e posteriormente, em torno de 6 meses, fazer a anoretoplastia sagital posterior e reconstrução da vagina nas meninas. A colostografia (colograma de alta pressão) pela colostomia protetora (2 semanas após) pode trazer informações quando a altura do fundo do saco retal, quantidade de intestino. Resultados Continência fecal e evacuação de fezes sem dificuldades são os objetivos do tratamento cirúrgico dessas anomalias. Nos casos de lesões baixas, sem anomalias vertebrais, geralmente os resultados são bons. A maioria dos pacientes com AAR alta permanecem com algum grau de desordem funcional na evacuação de fezes após o tratamento cirúrgico. Estudos mostram que os nervos lombo‐sacrais que controlam a função do esfíncter anal externo estão congenitamente alterados. Sendo as sequelas usuais: obstipação intestinal, em que deve ser tratada desde o início; incontinência fecal, lavagem diária para a vida toda, mudanças na dieta e uso de drogas que diminuem a motilidade; incontinência urinária, uso de drogas ou cateterismo. A manométria anorretal tem sido utilizada para definir a presença ou ausência do reflexo anorretal Após a anoretoplastia a dilatação do neoformado canal retal com velas de Hegar deve ser iniciada após duas semanas do procedimento cirúrgico e se continua até que o diâmetro esteja satisfatório. Comentado [A6]: ARVUPSP‐ Anorretovaginouretroplastia sagital posterior Deve reoperar quando há incontinência fecal refrataria, bexiga neurogênica, infecção urinaria recorrente. Adoção do procedimento de malone para tratar a incontinência fecal, onde exterioriza o apêndice para realizar os enemas anterógrados. Referências Brandt, C. T. Introdução a Cirurgia Geral da Criança. Pernambuco, Editora UFPE. 2003; SJT‐ preparatório para residência médica. Clínica Cirúrgica‐ Pediatria, volume 3, 12º edição. São Paulo, SJT editora, 2012; Maksoud, J. G. Cirurgia Pediátrica, volume I, 2ª edição. São Paulo, Revinter, 2003; IMIP Fernando Figueira. Pediatria, 4ª edição. Rio de Janeiro, Medbook, 2011;
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