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Incontinência Urinária Caso clínico Uma mulher de 65 anos vai ao consultório para receber cuidados médicos. Há cerca de 6 meses, ela começou a ter incontinência urinaria quando tossia ou espirrava. Por causa do vazamento de urina durante a prática de exercícios, a paciente até parou de ir à ginástica. Ela mora com o marido e consegue caminhar cerca de 4km com regularidade. O marido dela não relata qualquer problema de memória ou cognição. A história médica inclui rinite alergia e doença do refluxo gastroesofágico. A única cirurgia à qual essa paciente se submeteu foi uma colecistectomia aos 50 anos. Ela está tomando os fármacos ácido acetilsalicílico, loratadina e omeprazol diariamente, além de beber uma xícara de chá pela manhã. Ela não fuma nem consome bebidas alcoólicas. A paciente nega disúria, hematúria, dor abdominal, febre ou calafrios. O exame físico revela ausência de firmeza palpável no abdome, cistocele, impactação fecal e edema podal. O vazamento de urina é observado durante o teste sob estresse com tosse. O escore no MEEM é de 30/30. Questões 1) Qual o diagnóstico sindrômico da paciente em questão? a) Incontinência urinária de urgência b) Incontinência urinária de estresse/esforço c) Incontinência urinária por transbordamento d) Incontinência urinária funcional 2) São causas reversíveis de incontinência urinária, exceto: a) Infecção do trato urinário, medicamentos b) Diabetes mellitus descompensado, fecaloma c) Hipoestrogenismo do assoalho pélvico, hemiplegia pós-AVEi d) Delirium, depressão 3) Durante a avaliação, deve-se realizar: I) Anamnese correta II) Exame físico geral III) Avaliação ginecológica IV) Avaliação retal V) Avaliação cognitiva/mental Estão corretas: a) Todas b) I, II, III c) I, II, V d) I, II, IV 4) Para esta paciente em questão, qual seria a melhor proposta inicial de tratamento? a) Uso de antimuscarínicos como oxibutinina b) Cirurgia para correção de cistocele (slings) c) Estrogênios tópicos e modificações ambientais d) Mudanças comportamentais com exercícios para musculatura pélvica Conceito e perfil epidemiológico Qualquer perda involuntária de urina em quantidade suficiente para causar qualquer constrangimento social Síndrome geriátrica não faz parte da senescência Nem todos os idosos com fatores predisponentes possuem IU Abordagem ativa por parte do médico Prevalência: 30% na comunidade, até 50-60% em idosos institucionalizados, 2x mais mulheres que homens Importância Uma das grandes síndromes geriátricas Compromete a qualidade de vidas dos indivíduos afetados, familiares e cuidadores Leva ao aumento dos custos em saúde e resulta institucionalização precoce Sem impacto direto na mortalidade Aumento da morbidade: Risco de quedas e fraturas Infecções da trato urinário recorrentes Úlceras de pressão Disfunções sexuais Distúrbios do sono Isolamento social e depressão Estresse do cuidador Institucionalização precoce Sugestões de abordagem “Você tem problemas com a sua bexiga?” “Você usa um absorvente para se proteger no caso de perder urina?” “Você perde urina sem querer?” Fisiologia da micção A micção envolve: integração de nervos periféricos, medula, centros encefálico em córtex cerebral, ponte, bulbo e mesencéfalo Os centros superiores dirigem aos órgãos do trato urinário inferior devido terminações excitatórias e inibitórias, fazendo com que as aferências sensitivas cheguem até os órgãos do trato urinário Controle voluntário da micção: centros controladores em áreas corticais (giros frontal e cingulado) e subcorticais inibem a micção em nível pontinho; mas também fazem a excitação do esfíncter uretral externo, permitindo o controle voluntário Centro pontinho da micção (CPM): na fase de esvaziamento, envia estímulos excitatórios para a medula sacral e inibitórios para a coluna toracolombar. Já na fase de enchimento, o processo é ao contrário (inibitório para a medula sacral e excitatório para coluna toracolombar) Inervação simpática do TUI Emerge da medula em nível de T11 e L2 Faz sinapse nos plexos hipogástrico e mesentérico inferior, antes de prosseguir pelo nervo hipogástrico até os receptores beta-adrenérgicos (corpo vesical) e alfa-adrenérgicos (colo vesical e uretra proximal) Fibras nervosas simpáticas dirigem-se a gânglios parassimpáticos toracolombares, liberando norepinefrina no TUI, que leva ao relaxamento do músculo detrusor e contração do esfíncter uretral interno Inervação parassimpática do TUI Origem: neurônios localizados na coluna intermediolateral dos segmentos S2-S4 da medula A condução é por fibras pré-ganglionares pelo nervo pélvico até os gânglios do plexo pélvico (esse plexo dá origem às fibras pós-ganglionares que se dirigem à bexiga) Acetilcolina e óxido nítrico resultam em contração detrusora e relaxamento da uretra proximal Inervação somática do esfíncter uretral externo emerge do núcleo do corno anterior (núcleo de Onuf) de um ou mais segmentos da medula espinal sacral (S2-S4), seguindo para o nervo pudendo até o esfíncter estriado Fase de enchimento: “distensão da bexiga ativa neurônios sensitivos na parede vesical, que levam impulsos aferentes a centros controladores supraespinais, inibindo o centro pontinho da micção e ativação dos neurônios motores no núcleo de Onuf com consequente contração da musculatura estriada do esfíncter uretral externo via nervo pudendo. Simultaneamente ocorre ativação reflexa simpática (T11-L2) e, através do nervo hipogástrico, contração da musculatura lisa da uretra. O parassimpático é inibido e o detrusor relaxa, armazenando urina” Fase de esvaziamento: “impulsos eferentes provocam inibição das fibras somáticas do núcleo de Onuf e relaxamento voluntário da musculatura estriada do esfíncter externo. Estes impulsos promovem inibição simpática pré-ganglionar e estimulação parassimpática, resultando em contração do detrusor por meio dos receptores muscarínicos” Impacto do envelhecimento Aumento de fibras de colágeno na bexiga diminuem sua elasticidade Alteração de receptores de pressão, resultando no surgimento de contrações intempesitivas durante a fase de enchimento vesical Uretra mais fibrosa, menos flexível, com perda de densidade muscular (pode resultar em falha esfincteriana) Mulheres HIpogonadismo na mulher: menor irrigação dos tecidos, mucosa uretral atrofia e resseca (fica mais sensível a infecções) Vagina: carências hormonais, diminuição ou ausência de atividade sexual, sequelas de parte e intervenções ginecológicas interferem na qualidade dos tecidos vaginais, pH e flora favorecimento de infecções Períneo fragilizado por diversas razões: envelhecimento muscular, carência hormonal, partos, gravidez, sequelas de intervenções uroginecológicas ou radioterapira pélvica Homens Hipertrofia benigna de próstata ou adenoma de próstata: principal fator relacionado com alterações no fluxo urinário Obstáculo urinário: manifesta-se por jato fraco, gotejamento terminal, aumento na frequência e noctúria Envelhecimento renal: diminuição do número de néfrons, redução da capacidade de concentrar urina. Junto com AHD, isso contribui para aumento de frequência urinária Tipos de incontinência urinária Incontinência urinária transitória “Perda de urina por insulto psicológico, medicamentoso ou orgânico, que cessa ou melhora após o controle do fator desencadeante” Causas: mneumônico DIURAMID Delirium Infecções do trato urinário Uretrite e vaginites atróficas Restrição de mobilidade Aumento do débito urinário Medicamentos Impactação fecal Distúrbios psíquicos Incontinência urinária estabelecida Urgência Sinônimos: bexiga hiperativacom incontinência Tipo mais comum na população idosa e principalmente em homens Perda de urina precedida ou acompanhada de um desejo importuno de urinar (urgência) Quantidade urinária variável, geralmente maiores, e pode decorrer de hiperatividade do detrusor durante fase de enchimento vesical Causas: transtornos neurológicos, anormalidade vesicais e idiopática A perda de urina é variável e depende da função do esfíncter uretral e da capacidade do paciente em suprimir a urgência Esforço/estresse Perda involuntária de urina que ocorre com o aumento da pressão intra-abdominal (tosse, espirro, exercícios) na ausência de contrações vesicais Tipo mais comum em mulheres jovens Causas (mulheres): hipermobilidade do colo vesical e deficiência esfincteriana intrínseca Fatores de risco: obesidade, partos vaginais, hipoestrogenismo e/ou cirurgias Nos homens é incomum Causas: deficiência esfincteriana intrínsecasecundaria a cirurgias prostáticas Transbordamento/hiperfluxo Decore da inabilidade de esvaziamento vesical pela hipocontratilidade do músculo detrusor, por obstruções uretrais ou por ambos (resíduo pós-miccional) Mais comum em homens do que em mulheres Causa mais frequente em homem idoso: obstrução secundaria à hiperplasia prostática benigna (HPB) Causa mais frequente em mulher: obstrução da via de saída após cirurgia anti- incontinência ou prolapso genital grave Funcional Atribuído a fatores externos ao trato urinário, com integridade deste Causas: comprometimento cognitivo, alterações psiquiátricas, barreiras ambientais e limitações físicas Mista Coexistência de mais de um tipo de incontinência no mesmo paciente Condição frequente entre idosos, principalmente em mulheres que apresentam hiperatividade do detrusor e deficiência esfincteriana associadas Avaliação diagnóstica Anamnese Medicamentos Ginecológico: cistocele, manobra de Valsalva, força muscular Exame físico geral e especial Cognitivo-mental: delirium, demências, depressão Locomotor/ambiental: barreiras ambientais, limitações físicas Exames complementares Todos os pacientes: exame de urina para investigação de sinais de infecção, hematúria, glicosúria Pacientes selecionados: dosagem de eletrólitos (cálcio inclusive), glicemia, ureia, creatinina de acordo com suspeita clínica Medida de resíduo pós-miccional: suspeita de transbordamento ou de retenção urinária (sondagem de alívio ou USG) Não rotineiros: urodinâmico e cistoscopia Tratamento Não farmacológico Perda ponderal Não ingerir líquidos de forma abundante Evitar cafeína Álcool e tabaco Eliminar as barreiras físicas de acesso ao banheiro Tratar fatores reversíveis Terapias comportamentais Exercício para os músculos pélvicos (Kegel) Treinamento vesical Diário miccional Biofeedback Eletroestimulação Incontinência de urgência Treinamento vesical (horários fixos + inibição da micção) Antidepressivos tricíclicos e antimuscarínicos (bexiga hiperativa – oxibutinina, tolterodina) – ambas a serem evitas em idosos Incontinência de estresse Estrogênios tópicos (incerto seu benefício a longo prazo) Duloxetina (dual) Cirurgia para pacientes com IUE grave ou que não responderam ao tratamento clínico (slings) Incontinência de transbordamento (independente da causa) Dependente da causa: alfa 1-bloqueador (HPB – doxasozina, tansulosina); sondagem vesical intermitente ou de demora ou remoção cirúrgica Incontinência funcional: Intervenções comportamentais Modificações ambientais Fraldas geriátricas ou absorventes para IU Evitar anticolinérgicos em idosos, sobretudo os dementados Respostas quizz 1) B 2) C 3) A 4) D
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