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MUSCULAÇÃO E GINÁSTICA DE ACADEMIA Roberto Pacheco da Silva Treinamento intervalado de alta intensidade (HIIT) Objetivos de aprendizagem Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados: � Descrever as características do HIIT. � Discutir as variáveis de controle do HIIT. � Elaborar uma sessão de HIIT. Introdução A capacidade aeróbica, normalmente apresentada como consumo máximo de oxigênio (VO2 máximo), é frequentemente utilizada como indicador de aptidão cardiorrespiratória e ponto fundamental da saúde. Além disso, a capacidade aeróbica alta está associada a um melhor de- sempenho físico e a um menor risco de doenças cardiovasculares e mortalidade em atletas e não atletas. O treinamento intervalado de alta intensidade (HIIT, high intensity interval training) foi classificado como a modalidade de treinamento mais popular na pesquisa anual das tendências mundiais de condicionamento físico de 2018, ficando em terceiro lugar na pesquisa de 2019 e estando entre as cinco melhor classificadas desde o ano de 2014 (THOMPSON, 2018). Ele tem sido amplamente utilizado como uma alternativa ao trei- namento tradicional de resistência, visto que resulta em níveis mais altos de desempenho de resistência, redução do tempo dedicado ao exercício por sessão de treinamento e aumento da adesão ao exercício. Apesar do recente aumento no interesse por esse treinamento, o HIIT é uma modalidade que vem sendo aplicada no treinamento de atletas há algumas décadas. Uma das grandes vantagens desse tipo de treinamento, e que vem atraindo a atenção da população, é o alto gasto calórico. Devido à alta intensidade dos exercícios, o organismo demora várias horas para recuperar-se do estresse e, durante esse tempo, o metabolismo continua acelerado, gerando gasto energético em níveis acima do repouso durante um longo período após os exercícios. Além disso, estudos demonstram que o HIIT é um método eficiente e eficaz para o desenvolvimento do sistema cardiorrespiratório, sendo aplicado com sucesso, inclusive, em indivíduos não treinados. Neste capítulo, você conhecerá as principais características do HIIT, bem como as variáveis de controle e os métodos de prescrição dessa modalidade de treinamento. 1 Características do HIIT O treinamento intervalado de alta intensidade (HIIT) é, hoje, um dos meios mais eficazes para melhorar a função cardiorrespiratória e metabólica e, consequentemente, o desempenho físico dos praticantes. A principal carac- terística do HIIT consiste em repetidas séries, curtas ou longas, de exercícios de alta intensidade, intercaladas com períodos de recuperação (BUCHHEIT; LAURSEN, 2013). Na última década, vários estudos científicos nessa área foram apresenta- dos. Contudo, a utilização do HIIT por atletas já marca quase um século de existência. Em 1920, Paavo Nurmi, um dos melhores corredores de média e longa distância do mundo na época, já utilizava alguma variação de HIIT. Em 1950, Emil Zatopek contribuiu para a popularização desse formato de treinamento (BILLAT, 2001). As rotinas de HIIT incluem treinamento de corridas curtas (sprints) repetidas, com duração entre 3 e 7 segundos, intercaladas com períodos de recuperação com duração geralmente inferior a 60 segundos. O tempo de esforço e de recuperação pode variar, bem como podem ser aplicados sprints de 30 segundos ou mais, intercalados com tempos maiores para recuperação (2–4 minutos). As sessões de treinamento com HIIT podem variar entre treinos curtos, de 4 a 7 minutos, ou mais longos, que podem chegar a 40 a 45 minutos de duração. Após experimentos pioneiros de Hill, na década de 1920, Åstrand et al. (1960), na década de 1960, e Balsom et al. (1992), na década de 1990, criou-se a base científica para a sustentação do HIIT como método eficaz de treinamento. Foi demonstrado que os protocolos de HIIT provocam aumento da captação máxima de oxigênio (VO2 máx.), do limiar de lactato e da potência aeróbica. Treinamento intervalado de alta intensidade (HIIT)2 Os protocolos de HIIT permitem que, durante as sessões de exercícios, os indivíduos mantenham a captação de oxigênio em níveis máximos ou sub- máximos durante longos períodos de tempo, uma vez que estímulos potentes provocam adaptações nos sistemas central e periférico, envolvendo captação, transporte e utilização de oxigênio, culminando, assim, na melhoria do VO2 máximo (BUCHHEIT; LAURSEN, 2013; LAURSEN et al., 2002;) Uma das grandes vantagens do treinamento intervalado em relação a métodos de treinamento que envolvem esforços contínuos e moderados é o tempo dedicado à realização dos exercícios, uma vez que o HIIT fornece uma maneira de realizar grandes quantidades de exercício de alta intensidade em curtos períodos, além da possibilidade de manipular a forma de gerar sobrecarga de acordo com a necessidade de cada atleta. Por exemplo, a modulação da sobrecarga pode ser feita por meio do aumento do número total de séries de exercícios, da intensidade de cada série, do tempo sob esforço em cada série ou até mesmo pela diminuição do intervalo entre as séries. Atualmente, o HIIT pode ser subdividido em diferentes protocolos. Por exemplo, de acordo com diferentes combinações de intensidade de trabalho e duração da série, o HIIT usa diferentes protocolos de intervalo de trabalho, incluindo intervalo longo (2–4 minutos de trabalho/série com intensidade submáxima), intervalo curto (< 45 segundos de trabalho/série em intensidade submáxima), intervalo de sprint (> 20–30 segundos de trabalho/série em intensidade quase máxima) e exercícios de sprints repetidos (≤ 10 segundos de trabalho/série em intensidade máxima). Ou seja, o número de repetições de séries por sessão de treinamento é pensado de acordo com o tempo total da duração da sessão. Assim, os protocolos HIIT podem ser implementa- dos como alto (16 minutos de trabalho) ou baixo (4 minutos de trabalho) volume. Em termos de periodização, a duração da intervenção HIIT pode ser classificada como duração de longo prazo (≥ 12 semanas) ou de curto prazo (< 12 semanas) (BATACAN et al., 2017). Apesar de inicialmente ter sido desenvolvido para aprimorar o treinamento de corredores, o HIIT pode ser adaptado para qualquer modalidade esportiva e tipo de exercício. Além da corrida, em esteira ou pista, e do ciclismo em bicicleta ergométrica, o HIIT pode ser feito com variações de exercícios calistênicos, como saltos, polichinelos e agachamentos, e, ainda, utilizar técnicas de artes marciais ou gestos esportivos específicos. 3Treinamento intervalado de alta intensidade (HIIT) Em virtude dessa característica de versatilidade, um estudo revisou as evidências existentes do efeito do HIIT, se comparado com o treinamento contínuo de intensidade moderada, sobre a melhora da condição cardiorrespi- ratória em crianças e adolescentes saudáveis (CAO; QUAN; ZHUANG, 2019). Um total de 563 sujeitos, de ambos os sexos, foram incluídos em 17 estudos. As intervenções contaram com exercícios de corrida e ciclismo, com duração de 3 a 24 semanas e sessões de exercícios de 2 a 3 vezes semanais. Os autores concluíram que o HIIT apresentou um efeito significativamente melhor que o treinamento moderado contínuo na condição cardiorrespiratória das crianças e dos adolescentes. Dessa forma, o HIIT se mostrou como a melhor metodologia de treinamento, em termos de efetividade e eficiência, para obter melhora da condição cardiorrespiratória para essa população-alvo. Além de atletas, não atletas, crianças e adolescentes saudáveis, o HIIT vem sendo testado com resultados satisfatórios na saúde de populações especiais. No controle glicêmico e na aptidão cardiorrespiratória de pacientes com diabetes tipo 2, o HIIT, quando comparado com o treinamento contínuo de moderada intensidade, demonstrou efeito igual ou superior para reduzir índice de massa corporal, peso corporal, gordura total, bem como melhorou o controle glicêmico e o VO2 máximo (LIU et al., 2019).Em relação à pressão arterial, o HIIT apresentou resultados significativamente positivos para redução da pressão arterial em repouso em sujeitos com pré-hipertensão ou hipertensão estabelecida (COSTA et al., 2018). O efeito do HIIT também foi comparado com treinamento contínuo de intensidade moderada em sujeitos com insufi- ciência cardíaca com fração de ejeção reduzida (GOMES NETO et al., 2018). Em termos comparativos, o resultado da metanálise de 13 estudos com 411 pacientes mostrou que o HIIT foi superior ao treinamento contínuo em termos de ganhos no consumo máximo de oxigênio em protocolos de treinamento entre 3 e 24 meses. Em termos de qualidade de vida, ambas as modalidades de treinamento apresentam melhoras significativas, sem diferença entre elas, o que leva à conclusão de que os programas de exercícios para reabilitação cardíaca devem considerar a necessidade e a preferência dos pacientes. Com base nesses resultados, adotar estratégias de tratamento com base na ade- são do paciente ao programa de exercício é fundamental para a melhoria e a manutenção da qualidade de vida desses pacientes. Por fim, em pacientes com doença arterial coronariana, foram apresentados resultados semelhantes, visto que o HIIT se mostrou superior ao treinamento contínuo de intensidade moderada para elevar o consumo máximo de oxigênio, sem diferenças significativas na melhora da qualidade de vida quando ambas as modalidades foram comparadas (GOMES NETO et al., 2017). Treinamento intervalado de alta intensidade (HIIT)4 Um fator determinante para o resultado em qualquer programa de exer- cícios é a fase de recuperação. Embora o sono e o exercício atuem de formas diametralmente opostas do ponto de vista fisiológico, os benefícios desses dois estados estão relacionados e são recíprocos. Assim, para haver a supercom- pensação do organismo e a adaptação geral ao estímulo, bem como a melhora do desempenho propriamente dito, é necessário o descanso adequado. Essa fase de recuperação ocorre principalmente, e necessariamente, durante o sono. O sono é um dos melhores aliados da recuperação física, uma vez que o exercício causa depleção de energia, microlesões musculares, elevação da temperatura corporal e alterações nos níveis de melatonina, todos restaurados durante o sono quando ocorre liberação de hormônios essenciais para a res- sintetização do glicogênio muscular e a síntese proteica. Durante o período de repouso, o organismo tem um pico de produção do hormônio do crescimento, que estimula o crescimento e a recuperação muscular. Entretanto, o contrário também é facilmente observado, uma vez que treinar após noites maldormidas resulta em frequência cardíaca elevada, cansaço, falta de atenção e queda no desempenho. Promover ou melhorar o sono por meio do exercício físico é saudável, seguro e simples. Exercícios aeróbicos e de força melhoram a qualidade de vida em pacientes com insônia crônica. O exercício, a qualquer hora do dia, melhora o sono. No entanto, a recomendação geral para o melhor benefício para o sono é de que o exercício seja praticado de 4 a 8 horas antes da hora de dormir. Pessoas que ingressam em programas de treinamento físico geralmente relatam menos cansaço e necessidade de dormir, além de melhor qualidade de sono e sono mais restaurador. A American Sleep Disorders Association reconhece o exercício físico como uma intervenção não farmacológica para melhorar o padrão de sono, uma vez que diminui a latência ao sono e aumenta o tempo total de sono e a duração do sono de ondas lentas. O exercício físico também está associado à diminuição do risco e à me- lhora da apneia do sono. A apneia obstrutiva do sono é considerada o mais grave distúrbio do sono, a qual está associada a problemas cardiovasculares (p. ex., hipertensão, doença coronariana e insuficiência cardíaca) e metabólicos (p. ex., diabetes e dislipidemia) e ao aumento de mortalidade cardiovascular. Um estudo que avaliou mais de 5 mil indivíduos que realizaram polissonografia demonstrou que a prática regular de exercício físico foi associada à menor risco para apneia do sono moderada e grave (DA SILVA et al., 2017). Uma análise de subgrupo desse mesmo estudo, investigando somente os pacientes com apneia do sono grave, demonstrou que mesmo esses pacientes são beneficiados com exercícios, uma vez que a prática de exercícios foi associada a menores 5Treinamento intervalado de alta intensidade (HIIT) sintomas de baixa qualidade do sono, como cansaço, sonolência, humor ao acordar e sono não reparador (SILVA et al., 2019). A utilização específica do HIIT para o tratamento da apneia obstrutiva do sono também foi testada (KARLSEN et al., 2017). Trinta sujeitos obesos com apneia obstrutiva do sono grave foram acompanhados e comparados com o grupo-controle, com um modelo de treinamento de 4 séries de 4 minutos de caminhada ou corrida em intensidade de 90 a 95% da frequência cardíaca máxima, com recuperação de 3 minutos em 70% da frequência cardíaca máxima, duas vezes por semana, durante 12 semanas. Como resultado, foi observada uma diminuição significativa no índice de apneias do sono (principal marcador de gravidade da doença), sonolência excessiva diurna e aumento do VO2 máximo. Esse efeito não dependeu de mudança no peso corporal, uma vez que não houve alteração nesse parâmetro. Como supracitado, o HIIT foi testado em diversas populações, como atletas, praticantes recreativos de exercícios físicos, crianças e adolescente, sujeitos com obesidade e pacientes em tratamento para doenças cardiovasculares e metabólicas, entre outras. Em virtude dos resultados consistentes nessa gama de estudos, é possível afirmar que o HIIT é eficiente e eficaz para a aplicação em treinamentos da população em geral interessada em melhorar o rendimento esportivo, o condicionamento físico e a estética. É importante ressaltar que, comparativamente com protocolos de treinamentos longos e contínuos, de intensidade leve e moderada, os resultados das pesquisas mostraram que o HIIT obteve ganhos comparáveis ou, em muitos casos, superiores. Aliado a isso, outro destaque e ponto de vantagem para essa metodologia é o tempo dedicado ao exercício, visto que, mesmo em estudos que ajustaram o treinamento para equiparar o gasto calórico e a carga de trabalho total de grupos pesquisados com HIIT e outros métodos de treino e obtiveram resultados semelhantes em termos de melhora do desempenho, os autores relatam a vantagem do HIIT quanto à economia de tempo despendido para a realização do exercício. Na sociedade atual, a prática consistente de exercícios físicos regulares ainda faz parte de um número pequeno da população, sendo os principais motivos relatados para a não prática de exercícios aqueles relativos à rotina diária, como, por exemplo, falta de tempo e de motivação, carga no trabalho excessiva, entre outros. Assim, qualquer implementação de rotina que eco- nomize tempo, seja desafiadora e motivante e demonstre resultados rápidos e seguros é um fator determinante na escolha, na incorporação e na adesão do exercício na rotina do indivíduo. Treinamento intervalado de alta intensidade (HIIT)6 Nesse sentido, o HIIT foi testado em ambientes de academias de ginástica e musculação (ROY et al., 2018). Aos participantes do estudo, foram oferecidas atividades tradicionais (≥ 30 minutos de exercício moderado na maioria dos, senão em todos, dias da semana) ou HIIT (3 tiros ≤ 30 segundos com percepção de esforço ≥ 8, na escala 0–10 ou 80–90% da frequência cardíaca máxima), resultando em 41% de preferência pelo HIIT, o que pode ser interpretado como resistência inicial do participante a se submeter a treinamentos intensos. Ao fim de 12 meses de protocolo de pesquisa, a adesão ao HIIT foi de 70% e de 67% para ao método tradicional; no entanto, o prazer de realizar a prática foi maior no grupo que optou pelo método HIIT. Ao analisar os dados objetivos do estudo, observou-se maior perdade peso e de gordura abdominal e melhora no metabolismo de glicose naqueles que treinaram com o método HIIT. Uma pesquisa publicada em 2019 com a entrevista de 33 mulheres entre 21 e 59 anos, ativas e sedentárias, que frequentavam a academia entre 1 mês e 4 anos demonstrou que o segundo motivo principal pela escolha do HIIT como forma de treinamento foi por ser um “treino motivador diferenciado”, ficando atrás apenas do motivo “emagrecimento” (THUMS; ANTUNES, 2019). Nos resultados, foi observada melhor motivação e disposição durante o dia, o que resultou em maior qualidade de vida, de acordo com as respostas de mudanças percebidas pelas alunas, como “disposição, resistência, melhora do sono, força, alegria, autoestima, bem-estar e menos dor”. De acordo com Thums e Antunes (2019, documento on-line): Considerando os aspectos que permearam os dados coletados deste estudo, através da percepção dos benefícios da saúde física geral e principalmente na avaliação da compreensão das alunas sob o ponto de vista motivacional, houve a superação do método HIIT e sua influência na prática regular e frequência no programa de exercícios. […] da motivação da prática desta modalidade, deu-se por ser um treino desafiador, de alta intensidade, e diferenciado, que possibilitou o estímulo e a adesão das alunas […]. Concluímos que, por tratar-se uma modalidade de curto período, diferenciada a cada aula, […] superamos a falta de tempo e falta de motivação 2 Variáveis de controle no HIIT A prescrição para o HIT consiste na manipulação de diversas variáveis, que incluem a intensidade do esforço, a intensidade e a duração do intervalo de trabalho, a intensidade durante o intervalo de recuperação, a duração da re- cuperação, a modalidade de exercício, o número de repetições em cada série, 7Treinamento intervalado de alta intensidade (HIIT) o número de séries, bem como o tempo para a recuperação entre as séries (Figura 1). A manipulação de qualquer uma dessas variáveis pode afetar as respostas fisiológicas agudas ao HIIT. Figura 1. Definição de nove variáveis de uma sessão de HIIT. Fonte: Viana-Gomes et al. (2016, p. 67). As principais variáveis a serem consideradas no planejamento de uma sessão ou programa de HIIT são descritas a seguir. Modalidade A modalidade de exercício diz respeito a qual atividade será realizada em uma sessão de treinamento. Ela deve ser programada de acordo com o nível de aptidão, as preferências, a experiência, as limitações, as potencialidades e a especificidade da modalidade esportiva e a individualidade biológica de cada aluno/atleta. Em geral, são estabelecidos exercícios mais comuns e de fácil realização, como caminhadas/corridas (tanto em esteira como ao ar livre) e ciclismo, para indivíduos iniciantes ou que apresentam quadro de sobrepeso ou obesidade. No entanto, exercícios de diferentes modalidades podem ser conjugados para aplicação em uma sessão de HIIT, e a forma de combinação deles influenciará diretamente no grau de esforço e dificuldade de cada sessão de treinamento. Treinamento intervalado de alta intensidade (HIIT)8 Intensidade do esforço Variável que estabelece a principal característica do HIIT, a intensidade do esforço deve ser controlada para atingir níveis de intensidade adequados para causar adaptações desejadas ao exercício e, ao mesmo tempo, estar dentro da capacidade do indivíduo de completar a sessão de treinamento com mínimo risco de lesão devido ao esforço. Existem diversas maneiras simples que podem ser utilizadas para o con- trole de intensidade. A frequência cardíaca é uma delas, a qual deve, em cada momento de exercício, atingir um nível superior a 80% da frequência cardíaca máxima do indivíduo. A velocidade de corrida (quando em esteira) e de pedalada (quando em cicloergômetro), o PACE (quando em atividades de corrida ao ar livre) e até mesmo a escala de percepção subjetiva de esforço de BORG são métodos indiretos válidos para controlar a intensidade do exercício durante o HIIT. Duração do tempo de esforço A duração do esforço se refere ao tempo em esforço durante cada momento de exercício. Vários protocolos estão estabelecidos na literatura científica com resultados consistentes do HIIT para ganho de condicionamento, performance e saúde. Em linhas gerais, no treinamento para aumentar a potência aeróbica e o VO2 máximo, geralmente o tempo de trabalho deve ser superior a 60 segundos em cada estímulo em uma série ou sessão de treinamento. Intensidade do esforço durante a recuperação O repouso pode ser modulado de acordo com o objetivo de cada sessão de treinamento, podendo ser realizado de maneira passiva (repouso total) ou ativa (atividade leve, como caminhada). Ao utilizar o exemplo da frequência cardíaca como meio de controle de intensidade, pode-se estabelecer uma faixa de batimentos cardíacos a que o sujeito pode chegar, ou manter, durante o intervalo, a fim de não haver recuperação total. Dessa maneira, é esperado que, a cada nova repetição do exercício dentro de uma série, a intensidade e o grau de esforço sejam maiores. 9Treinamento intervalado de alta intensidade (HIIT) Duração do intervalo de repouso A duração do intervalo é o tempo para repouso entre um estímulo e outro. De modo geral, a proporção de trabalho e repouso recomendada para o HIIT é de 1:1, ou seja, o tempo de repouso oferecido será igual ao tempo em esforço. Para sujeitos iniciantes ou não adaptados a treinamentos de alta intensidade, a proporção entre tempo de esforço e repouso pode variar, sendo comum a aplicação de esforço/repouso em proporção de 1:2 e 1:3. Ainda utilizando o exemplo da frequência cardíaca como meio de controle, o tempo de repouso padrão é o necessário até que a frequência cardíaca atinja aproximadamente 120 a 130 batimentos por minuto. Número de séries O número de séries reflete o número de repetições de esforços realizados em uma sessão de treinamento. Durante uma atividade, esse número varia de acordo com o objetivo e o nível do condicionamento do atleta envolvido. Por exemplo, uma série pode ter vários estímulos curtos, separados por um intervalo maior para recuperação que o intervalo entre cada estímulo. O número de séries afetará o nível de fadiga e carga de trabalho total aplicado ao final da sessão de treinamento. Duração das séries A duração das séries, juntamente a todas as outras variáveis que envolvam tempo, deve ser programada, a fim de estabelecer o tempo total da sessão de treinamento. O HIIT é, por característica, uma modalidade de treinamento curta, levando, em geral, poucos minutos para a sua realização. Deve-se programar o número de séries para contemplar o desgaste ideal, mesmo que, durante o treinamento do dia, seja necessário retirar ou incluir séries extras, a fim de otimizar a sessão. Tempo entre as séries Assim como a duração do intervalo para repouso entre um exercício e outro, a duração entre as séries visa a restabelecer o organismo para um novo estímulo. Em geral, o tempo entre as séries é maior que o tempo entre os exercícios. Por exemplo, para uma sessão de treinamento de 3 séries de 6 sprints máximos, Treinamento intervalado de alta intensidade (HIIT)10 durante 15 segundos, com 15 segundos de recuperação passiva entre cada sprint, entre cada série, será realizado 1,5 minuto de intervalo com caminhada lenta. Intensidade de recuperação entre as séries Semelhante à intensidade do esforço durante a recuperação entre cada exercício, porém entre cada série. Otimizar a intensidade do exercício e a duração dos intervalos de trabalho nos protocolos de HIIT é fundamental para melhorar as adaptações ao treinamento. Um protocolo HIIT ideal só pode ser alcançado com um intervalo de recuperação adequado separando os momentos de esforço. Nesse sentido, um estudo publicado em 2019 revisou e discutiu a literatura existente sobre o assunto, a fim de compreender o papel moderador da dura- ção da recuperação nos protocolos HIIT nasrespostas agudas e no impacto a longo prazo na adaptação a esse tipo de treinamento (SCHOENMAKERS; HETTINGA; REED, 2019). Após a revisão e análise de 23 estudos com pro- tocolos de treinamento em corrida, ciclismo e natação, categorizados em: repeated sprint training (RST) (8 estudos), sprint interval training (SIT) (6 estudos) e aerobic interval training (AIT) (9 estudos), os autores concluíram que, no RST e no SIT, intervalos de recuperação mais longos (≥ 80 segundos) facilitam cargas de trabalho mais altas em intervalos de trabalho subsequentes (em comparação com intervalos de recuperação curtos), porém reduzem potencialmente o estímulo aeróbico da sessão de treinamento. Na modalidade AIT, a tensão fisiológica total suportada pelo protocolo de treinamento parece não ser modulada pelos intervalos de recuperação, a menos que a duração da recuperação seja muito curta. Além disso, foi destacada a necessidade de mais evidências científicas sobre a variedade de protocolos de HIIT, sobretudo em modalidades de exercícios diferentes de ciclismo e corrida 3 Métodos de prescrição do HIIT A prescrição do exercício HIIT é obviamente complexa, uma vez que envolve diversas variáveis que podem ser manipuladas de acordo com a necessidade e a especificidade de cada atleta. Para fins de padronização e simplificação, as nomenclaturas mais comumente adotadas são as descritas por Weston, Wisløff e Coombes (WESTON; WISLØFF; COOMBES, 2014) para dife- renciar dois tipos básicos de treinamento intervalado. Tomando como base a intensidade do exercício, os tipos básicos de treinamento intervalado são: 11Treinamento intervalado de alta intensidade (HIIT) 1. Treinamento intervalado de alta intensidade (HIIT): definido como esforços “submáximos” geralmente realizados em intensidades acima de 80% da frequência cardíaca máxima. 2. Treinamento intervalado de sprints (SIT): caracterizado por realização de esforços em intensidades iguais ou superiores ao ritmo de corrida associado ao VO2 máximo; também chamados de esforços “supramá- ximos” (MACINNIS; GIBALA, 2017). Como discutido anteriormente, não existem protocolos fixos ou obrigató- rios, com tempos de esforço, descanso ou exercícios específicos para o treina- mento HIIT. O objetivo principal é atingir a alta intensidade e a necessidade de descanso após cada série de exercício. Os protocolos mais utilizados atualmente, tanto para atletas como para praticantes recreativos, são descritos a seguir: � Protocolo Tabata (TABATA et al., 1996): criado pelo japonês Izumi Tabata, esse protocolo consiste na realização de 8 ciclos de esforço em intensidade máxima, durante 20 segundos, divididos por 10 segundos de intervalo para recuperação. � Protocolo Gibala (LITTLE et al., 2010): desenvolvido pelo canadense Martin Gibala, esse protocolo consiste em 8 a 12 ciclos de esforço má- ximo, durante 60 segundos, separados por 75 segundos de recuperação. � Protocolo Wisløff (WISLØFF et al., 2007): consiste em realizar 4 séries com 4 minutos de estímulo, em intensidade de 90 a 95% da frequência cardíaca máxima, e 3 minutos de intervalo para recuperação. � Protocolo Wingate: o teste anaeróbico de Wingate foi desenvolvido du- rante a década de 1970 no Instituto Wingate, em Israel (BAR-OR, 1987). A elaboração desse teste surgiu da necessidade de obter-se informações sobre o desempenho anaeróbico, em especial da potência anaeróbica. Desde sua criação, o teste de Wingate é utilizado em pesquisas cien- tíficas nos mais diferentes tipos de sujeitos, apresentando resultados consistentes e reprodutíveis. Esse teste, realizado exclusivamente em cicloergômetro, tem duração de 30 segundos, e, nesse curto período, o sujeito que está sendo avaliado tenta pedalar o mais rápido possível contra uma resistência fixa. Treinamento intervalado de alta intensidade (HIIT)12 No protocolo de HIIT, os estudos utilizam a metodologia do teste de Win- gate repetidamente, como, por exemplo, por meio da realização de 4 a 6 testes máximos de Wingate (30 segundos de velocidade máxima de pedalada), com intervalo de 4,5 minutos de recuperação (RAKOBOWCHUK et al., 2008). Nesse sentido, vale a pena conhecer o método descrito por Daniels (2013) em seu livro Fórmula de corrida de Daniels para utilização do treinamento intervalado no desenvolvimento da corrida. O autor estabelece que, para cada estímulo de corrida no treinamento intervalado, leva-se um determinado tempo até chegar à intensidade ideal esperada para o estímulo surtir efeito de adaptação. Por exemplo, suponha que a ideia da sessão de treinamento seja trabalhar em intensidade entre 95 e 100% do VO2 máximo. Assim: Ao correr em uma cadência I apropriada, o organismo leva cerca de dois mi- nutos para alcançar o ponto no qual opera no consumo máximo de oxigênio (o objetivo da sessão de treinamento). Se você correr quatro corridas de cinco minutos nessa cadência e levar dois minutos para alcançar o máximo em cada uma delas, então dos seus 20 minutos de corrida “difícil” você acumulou 12 minutos de corrida em VO2 máximo ou cadência I. (DANIELS, 2013, p. 155.) Isso ocorreria de forma igual em qualquer tempo de corrida destinado. Portanto, os tempos em intensidade-alvo para correr 7 corridas de 3 minutos ou correr 20 corridas de 1 minuto seriam de 7 e 0 minutos, respectivamente, pois o tempo para atingir o consumo máximo de oxigênio será igualmente de 2 minutos em qualquer condição desse exercício. Uma maneira que o autor sugere para tornar mais efetivo esse sistema é diminuir o tempo de intervalo entre as corridas: Leva-se dois minutos para alcançar o máximo, então, caso esteja correndo assim (não atingindo a intensidade adequada pelo fato da corrida ser muito curta), você deve reduzir seu tempo de recuperação de modo que a sua recu- peração ainda não tenha sido completada antes do início da próxima corrida (DANIELS, 2013, p. 155). Desse modo, é importante fazer tempos curtos para recuperação e partir para o próximo estímulo com desgaste para que o organismo atinja a inten- sidade esperada mais precocemente; assim, no caso do exemplo do autor, em vez de levar 2 minutos, levaria apenas 30 para atingir o VO2 máximo. Em contrapartida, dessa maneira estaria realizando-se o trabalho extra à custa do metabolismo anaeróbio, de modo que o acúmulo de lactato começará a limitá-lo ao longo do exercício. 13Treinamento intervalado de alta intensidade (HIIT) Outro ponto importante apontado pelo autor é entender a diferença entre velocidade de corrida e intensidade. Intensidade é a palavra-chave para o estresse de qualquer sistema fisiológico, porém nem sempre a velocidade para atingir a intensidade esperada será a mesma. Por exemplo, em variações de terrenos, a velocidade de corrida no plano e em um trecho de subida será diferente para a mesma intensidade de trabalho. Para efeitos de comparação de protocolos, um estudo de revisão sistemá- tica com metanálise comparou o efeito de diferentes protocolos de HIIT com protocolos de treinamento contínuos com intensidade moderada na melho- ria do VO2 máximo, em adultos saudáveis, com sobrepeso e/ou obesidade e atletas (WEN et al., 2019). O estudo contou com 53 trabalhos, totalizando a participação de 1.514 indivíduos, com idades entre 19 e 47 anos. Por meio desse estudo, constatou-se que, independentemente do protocolo, o HIIT é eficaz para melhorar o VO2 máximo nas populações estudadas. Ao investigar os diferentes protocolos de HIIT, o curto intervalo de trabalho HIIT (≤ 30 segundos na intensidade submáxima e máxima), o HIIT de baixo volume (≤ 5 minutos por sessão de treinamento) e o HIIT de curto prazo (≤ 4 sema- nas de intervenção) são estratégias viáveis e eficientes em termos de tempo de treinamento, além de apresentarem alta efetividade para melhorias no VO2 máximo, principalmente para a população em geral. Para garantir ou potencializar o benefício do treinamento no VO2 máximo, são recomendados intervalos de HIIT longos (≥2 minutos em intensidade submáxima), com alto volume (≥ 15 minutos por sessão de treinamento) e médio a longo prazos (≥ 4–12 semanas de intervenção). Elaboração de uma sessão de HIIT Após todo o embasamento teórico conceitual estudado nas sessões anteriores, agora será apresentada uma exemplificação prática de como prescrever uma sessão de HIIT com base em um estudo de caso. Imagine o seguinte cenário: � João. � Homem. � 35 anos. � IMC = 27 kg/m2. � Praticante regular de musculação. � Realiza treinamentos de força 4 vezes por semana. Treinamento intervalado de alta intensidade (HIIT)14 � Sem histórico médico de lesões ou impedimentos ao exercício. � Postura adequada, bom nível de força muscular e consciência corporal. � Procura orientação de como inserir o HIIT em sua rotina de exercícios, a fim de melhorar seu condicionamento aeróbio, uma vez que está realizando exclusivamente treino de força, e diminuir sua gordura corporal, para aumentar a definição muscular. Com base nos dados preliminares, uma estratégia seria incluir na rotina de treinamento de João o HIIT em dois dias da semana, como no exemplo a seguir: Segunda Terça Quarta Quinta Sexta Sábado Domingo Muscu- lação Muscu- lação HIIT 1 Descanso Muscu- lação Muscu- lação HIIT 2 Descanso Observe que o treinamento de musculação permaneceu inalterado, man- tendo a periodização característica do treinamento de força/hipertrofia fracio- nado ao longo dos dias da semana, porém foram acrescentados dois modelos distintos de HIIT (1 e 2). Como o HIIT 1 será realizado no mesmo dia e após o treinamento de musculação, é interessante adotar um protocolo rápido e que utilize o próprio material da academia, como esteira ou bicicleta. HIIT 1 — Protocolo Tabata em esteira após o treinamento de musculação: � Aquecimento: 2 minutos de caminhada. � Parte principal: 1 série de 8 ciclos de corrida em intensidade máxima, durante 20 segundos, com 10 segundos de intervalo passivo para recuperação. � Volta à calma: 2 minutos de caminhada em velocidade lenta. � Tempo total do treinamento: em torno de 8 minutos. O HIIT 2 foi incluído no sábado, podendo ser realizado em casa, parque ou na própria academia que João frequenta. Como nesse dia João realizará apenas o HIIT, pode ser prescrito um treinamento mais longo, aproveitando sua experiência e condicionamento, a fim de utilizar variações de movimento que o ajudem no trabalho de musculação: 15Treinamento intervalado de alta intensidade (HIIT) � Aquecimento: 1 minuto de corrida no lugar. � Parte principal: 3 séries de 6 exercícios, durante 45 segundos, com 15 segundos de intervalo entre eles, com 1,45 minuto de intervalo a cada série. � Exercícios: ■ corrida com elevação de joelhos; ■ agachamento com salto; ■ corrida tocando o calcanhar na mão; ■ finca-pé; ■ polichinelo; ■ corrida em prancha. � Tempo total de treinamento: 22 minutos. Uma questão fundamental para qualquer programa de treinamento é qual método apresenta menor risco de lesão para o praticante. A literatura científica demonstra que, apesar de não haver uma resposta específica para essa questão, um grande percentual das lesões é decorrente do supertreinamento, ou, em inglês, overtraining. Uma orientação para evitar lesões decorrentes desse tipo de situação é evitar de maneira brusca aumentos no volume e/ou na intensidade do exercício, assim como programas de treinamento neuromuscular e pré-fortalecimento antes do trabalho em altas intensidades propriamente dito. Como visto, o HIIT é um método de treinamento que tem se demonstrado altamente eficaz na promoção da saúde, bem como no aumento do desempe- nho. Além da sua efetividade, o HIIT também se destaca pela sua eficiência, tendo em vista que pequenos períodos de treinamento já são suficientes para promover adaptações, algo extremamente importante, uma vez que a falta de tempo é uma das principais justificativas para o abandono de programas de treinamento. Por esses aspectos, o profissional de educação física possui no HIIT uma excelente forma de treinamento que, se bem prescrito, certamente impactará de modo positivo nos resultados de seus alunos. Treinamento intervalado de alta intensidade (HIIT)16 ÅSTRAND, I. et al. 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No entanto, a rede é extremamente dinâmica; suas páginas estão constantemente mudando de local e conteúdo. Assim, os editores declaram não ter qualquer responsabilidade sobre qualidade, precisão ou integralidade das informações referidas em tais links. WEN, D. et al. Effects of different protocols of high intensity interval training for VO2max improvements in adults: a meta-analysis of randomised controlled trials. Journal of science and medicine in sport, [s. l.], v. 22, n. 8, p. 941–947, 2019. WESTON, K. S.; WISLØFF, U.; COOMBES, J. S. High-intensity interval training in patients with lifestyle-induced cardiometabolic disease: a systematic review and meta-analysis. British Journal of Sports Medicine, London, v. 48, n. 16, p. 1227–1234, 2014. WISLØFF, U. et al. Superior cardiovascular effect of aerobic interval training versus moderate continuous training in heart failure patients: a randomized study. Circulation, Hagerstown, v. 115, n. 24, p. 3086–3094, 2007. 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