Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
Farmacocinética APRESENTAÇÃO Nesta Unidade de Aprendizagem, vamos aprender os mecanismos de transporte através das membranas celulares envolvidos na absorção, distribuição, e excreção dos fármacos e como as alterações na biodisponibilidade de um fármaco no organismo interfere no resultado terapêutico do paciente. Para compreender e manejar a ação terapêutica dos fármacos no organismo humano, é preciso conhecer quanto da dose administrada do medicamento consegue chegar e por quanto tempo permanece no seu local de ação. A compreensão e a utilização dos princípios farmacocinéticos podem ampliar a probabilidade de sucesso terapêutico e reduzir a ocorrência de efeitos adversos dos fármacos. Bons estudos. Ao final desta Unidade de Aprendizagem, você deve apresentar os seguintes aprendizados: Identificar os princípios básicos da farmacocinética e fatores que interferem na biodisponibilidade dos fármacos. • Diferenciar os mecanismos de transporte das moléculas dos fármacos através das membranas, no processo de absorção, distribuição e excreção de fármacos. • Reconhecer como interações medicamentosas podem interferir em processos farmacocinéticos e na farmacoterapia. • DESAFIO A prescrição de vários medicamentos em um mesmo regime terapêutico a um determinado paciente é uma prática comumente com o objetivo de melhorar a eficácia dos medicamentos, reduzir a toxicidade, ou tratar doenças coexistentes, prática denominada de polifarmácia. Porém, é extremamente importante considerar a possibilidade de interações medicamentosas que possam resultar em ineficácia terapêutica ou toxicidade ao paciente. Interações medicamentosas podem ser classificadas em (a) incompatibilidades farmacêuticas; (b) interações farmacocinéticas e (c) interações farmacodinâmicas. Considerando que ao longo da sua vida profissional na área da saúde você irá se defrontar com inúmeras situações de pacientes com prescrições de vários medicamentos, ou que o paciente esteja utilizando simultaneamente medicações prescritas por diferentes médicos, é importante que você saiba identificar quais tipos de pacientes e classes de medicamentos apresentam maior probabilidade de interações medicamentosas. Nesse contexto, descreva: a) Explique as características dos pacientes com maior predisposição a interações medicamentosas. b) Quais as características dos medicamentos com maior predisposição a interações? c) Descreva as implicações resultantes de interações em nível farmacocinético, exemplificando mecanismos de interações em nível de absorção, distribuição, metabolização e excreção. INFOGRÁFICO Quando um fármaco é administrado a um paciente, imediatamente inicia-se o processo de disponibilização do mesmo ao organismo do paciente através do processo de transferência de moléculas do fármaco do local onde foi administrado até a corrente sanguínea. Esse processo é denominado de Farmacocinética e envolve a Absorção, Distribuição, Biotransformação (ou Metabolização) e Excreção. Veja na Figura o percurso do fármaco no organismo desde a administração até a eliminação, bem como os mecanismos de transporte que as moléculas dos fármacos utilizam para permear as membranas celulares, seja no processo de absorção, distribuição quanto de eliminação. CONTEÚDO DO LIVRO Farmacocinética descreve o percurso do fármaco no organismo e está diretamente relacionada à intensidade e duração de ação do fármaco. Acompanhe um trecho da obra "Farmacologia para fisioterapeutas" os princípios básicos da farmacocinética, mecanismos de transporte das moléculas dos fármacos, bem como fatores que interferem na absorção e biodisponibilidade do fármaco no organismo do paciente. Boa leiura. SUZANNE L. TINSLEY SUSAN B. MASTERS ANTHONY J. TREVOR PETER C. PANUS BERTRAM KATZUNG ERIN E. JOBST FISIOTERAPEUTAS FARMACOLOGIA P A R A F233 Farmacologia para fisioterapeutas [recurso eletrônico] / Peter C. Panus ... [et al.]; tradução: Beatriz Araújo do Rosário, Patrícia Lydie Voeux. – Dados eletrônicos. – Porto Alegre : AMGH, 2012. Editado também como livro impresso em 2011. ISBN 978-85-8055-067-2 1. Fisioterapia – Reabilitação. I. Panus, Peter C. CDU 615.8 Catalogação na publicação: Ana Paula M. Magnus – CRB 10/2052 Tradução: Beatriz Araújo do Rosário (iniciais, Caps. 1-3, 7-36, índice) Patrícia Lydie Voeux (Caps. 4-6) Consultoria, supervisão e revisão técnica desta edição: Almir Lourenço da Fonseca Diretor Científico do Dicionário de Especialidades Farmacêuticas (DEF) 3 Farmacocinética O termo farmacocinética significa os efeitos dos sistemas biológicos sobre os ligantes endógenos e os fármacos. Quase todos os fármacos, exceto os administrados direta- mente no tecido-alvo, onde os receptores sugeridos estão localizados, são absorvidos a partir do local de adminis- tração, transportados pela circulação a vários tecidos no corpo e, em seguida, alcançam o tecido-alvo. Ao mesmo tempo, o corpo tenta converter estes fármacos em for- mas que lhes permitam serem facilmente removidos. Esta sequência representa a absorção, distribuição, bio- transformação, eliminação e excreção dos fármacos. NATUREZAS FÍSICA E QUÍMICA DOS FÁRMACOS Os fármacos atualmente disponíveis consistem em íons inorgânicos, moléculas orgânicas não peptídicas, peque- nos peptídios e proteínas, ácidos nucleicos, lipídios e carboidratos. Os fármacos podem variar em tamanho e peso molecular (PM), com PM 7 para o lítio e PM acima de 50.000 para as enzimas trombolíticas. Entretanto, a maioria dos fármacos possui pesos moleculares entre 100 e 1.000. São encontrados com fre quên cia em plantas ou animais, mas muitos são parcial ou comple- tamente sintetizados. Acredita-se que os fármacos de origem natural, especialmente as ervas, sejam algumas vezes mais seguros que os fármacos sintetizados, o que é uma concepção popular errônea. A segurança de um fár- maco baseia-se em suas propriedades farmacodinâmicas (Cap. 2) e farmacocinéticas, e não na sua fonte. Hidrossolubilidade e lipossolubilidade Uma das propriedades importantes de um fármaco é a sua solubilidade em vários componentes do corpo, como, por exemplo, os ambientes aquosos extracelulares e intracelulares, bem como as membranas lipídicas das células. A hidrossolubilidade de um fármaco é uma fun- ção do grau de ionização ou polaridade da molécula. As moléculas de água se comportam como dipolos, sendo atraídas pelas moléculas com cargas, formando uma cáp- sula aquosa ao redor destas. Por outro lado, a lipossolu- bilidade de uma molécula é inversamente proporcional à sua carga. Muitos fármacos são bases fracas ou ácidos fracos. Para tais moléculas, o pH do meio determina a fração das moléculas ionizadas versus moléculas não ioni- zadas. Se o pKa do fármaco e o pH do meio são conhe- cidos, a fração de moléculas no estado ionizado pode ser prevista a partir da equação de Henderson-Hasselbalch (equação 1): Log (forma protonada/forma não protonada) = pKa – pH (1) Na equação 1, “protonada” significa associada a um próton, ou seja, um íon de hidrogênio. Esta equação é utilizada para ácidos e bases. As bases fracas são ioniza- das e, por consequência, mais polares e hidrossolúveis quando protonadas. Por outro lado, os ácidos fracos são não ionizados quando protonados, por isto são menos hidrossolúveis. As seguintes equações resumem estes pontos para as bases fracas (equação 2) e os ácidos fracos (equação 3): Base fraca RNH3+ ⇔ RNH2 + H+ (2) (Protonada) (Não protonada) Ácido fraco RCOOH ⇔ RCOO– + H+ (3) (Protonada) (Não protonada) 18 | PRINCÍPIOS BÁSICOS A relação de Henderson-Hasselbalch é clinica- mente importante na absorção de nutrientes e fárma- cos a partir do lúmen gastrintestinal (GI) bem como na excreção dos metabólitos pelos rins. No trato GI, os ácidos fracos podem ser absorvidos de forma passiva pelo estômago onde o pHestá na faixa 1 a 3 e estes ácidos são não ionizados (Fig. 3.1a), porém as bases fracas não têm boa absorção neste ambiente porque são ionizadas neste pH. Por outro lado, as bases fracas são absorvidas normalmente de forma passiva no intes- tino delgado, onde o pH está na faixa 5 a 7 (Fig. 3.1b). Um mecanismo similar pode ser aplicado no rim para reter as bases e os ácidos na urina ao acidificá-la ou alcalinizá-la, ionizando as moléculas e reduzindo sua reabsorção. VIAS DE ADMINISTRAÇÃO E ABSORÇÃO Quando os fármacos penetram no corpo em locais distantes do tecido ou órgão-alvo, devem ser trans- portados pela circulação para o local de ação indicado. Para entrar na corrente sanguínea, um fármaco deve ser absorvido do seu local de administração. Assim, a absorção descreve a entrada do fármaco no organismo. Mas, nem todas as vias de administração resultam em quantidades similares de fármaco que alcançam a cir- culação sistêmica e o tecido-alvo. De fato, para alguns fármacos e certas vias de administração, a quantidade absorvida pode acabar sendo apenas uma pequena fra- ção da quantidade administrada. Assim, a taxa e a efi- ciência da absorção do fármaco diferem conforme a via de administração do fármaco. As duas principais vias de administração dos fármacos são a enteral e a parenteral. As vias enterais envolvem o sistema GI para a adminis- tração do fármaco. As vias de administração parenteral são todas as rotas de absorção que não estão associadas ao sistema GI e que usam os sistemas vascular, mus- culoesquelético, pulmonar e cutâneo para os locais de administração. As vias comuns de administração estão listadas no Quadro 3.1. Administração enteral As vias de administração enteral consistem nas vias oral, sublingual ou bucal e retal. A administração oral é defi- nida pela deglutição do fármaco e sua absorção a partir do lúmen do sistema GI. A maioria dos fármacos pres- critos atualmente é indicada para liberação oral. Tal via oferece grande comodidade, sendo usada quando é necessário o tratamento crônico; contudo a absorção por esta via pode ser mais lenta e menos completa do que por algumas vias parenterais. Além disso, quando o fármaco é administrado por via oral e absorvido no estômago e intestino, ele deve passar pelo fígado antes de entrar na circulação sistêmica. Como descrito adiante, o fígado pode transformar o fármaco em uma forma inativa antes de entrar na circulação sistêmica. Este efeito do fígado sobre a administração oral de um fármaco é conhecido como efeito de primeira passagem. Todas as vias parente- rais evitam o efeito de primeira passagem. As vias de liberação bucal (administração no espaço entre a gengiva e a bochecha) e sublingual (adminis- tração sob a língua) são incomuns, pois permitem a absorção direta do fármaco na circulação sistêmica sem o efeito de primeira passagem, processo que pode ser Figura 3.1 O efeito do pH e da ionização sobre a absorção dos ácidos e bases fracos no sistema gastrintestinal. (a) O pH no estômago permite a absorção passiva dos ácidos fracos, mas não das bases fracas. (b) Por outro lado, o pH maior no intestino delgado permite a absorção passiva das bases fracas, mas não dos ácidos fracos. a Tecido com pH de 7.4 Lúmen do estômago com pH de 1 a 3 R-COOH ácido R-COOH ácido R-NH3 + base b Lúmen do duodeno com pH de 5 a 7 Tecido com pH de 7,4 R-NH2 base R-COO− ácido R-NH2 base Farmacocinética | 19 rápido ou lento conforme a formulação física do pro- duto. A via sublingual oferece os mesmos recursos que a bucal. As vias de administração sublingual e bucal são utilizadas na clínica para nitroglicerina e vários outros agentes terapêuticos. Nos usuários de nicotina, o tabaco sem fumaça* é colocado no espaço bucal. A via retal também permite uma fuga parcial do efeito de primeira passagem, embora não de forma tão completa quanto as vias sublingual ou bucal. As formulações para a via retal são geralmente prescri- tas como supositórios inseridos na porção inferior do reto, mas que tendem a migrar para a porção superior. A absorção a partir desta localização superior faz com que o fármaco sofra as mesmas limitações de biodis- ponibilidade que os fármacos administrados por via oral. Grandes quantidades de fármacos e aqueles com sabor desagradável são melhor administrados pela via retal do que pelas vias bucal ou sublingual. Alguns fármacos administrados por via retal podem provocar irritação. Administração parenteral A administração vascular consiste nas vias intravenosa e intra-arterial. A via intravenosa permite a absorção instantânea e completa, sendo potencialmente perigosa porque, se a administração for muito rápida, serão alcan- çados níveis sanguíneos elevados do fármaco. As vias intra-arteriais, pouco usadas, são indicadas para admi- nistrar um fármaco em um órgão ou tecido. Outra via parenteral é o sistema musculoesquelé- tico, embora sempre através da injeção intramuscular. Em geral, a absorção do local da injeção intramuscular é mais rápida e com maior biodisponibilidade do que a administração oral. Grandes volumes, como 5 m� em cada nádega, poderão ser administrados se o fármaco não for muito irritante. Alguns fármacos não podem ser administrados por esta via por causa dos efeitos adversos no local da injeção. Os anticoagulantes de uso paren- teral, como a heparina, podem provocar hematoma quando o fármaco é administrado na musculatura. Por outro lado, a administração intra-articular é utilizada para obter alta concentração do fármaco no espaço arti- cular em quadros como artrite ou infecção da articula- ção. Em geral, a absorção do fármaco das articulações para o sangue é lenta. A administração no sistema pulmonar consiste nas vias intranasal e de inalação. Esta administração pode ser indicada para efeitos locais ou sistêmicos. A admi- nistração intranasal de descongestionantes nasais é usada para provocar efeito local em pacientes com resfriado ou rinoconjuntivite. Similarmente, a inalação de fármacos *N.R.T.: sob a denominação “tabaco sem fumaça”, estão todas as formas de tabagismo – exceto o uso de cigarros, charutos e congê- neres, bem como cachimbos – que, evidentemente sem fumaça, são absorvidas (a nicotina) por via bucal: fumo de mascar, tabaco dip- ping (molho ou pasta de tabaco com nicotina), water tobacco (solu- ção aquosa de tabaco), pó de tabaco, creamy snuff, tabaco dissolvível, goma de mascar etc. Este grupo pode incluir até o cigarro eletrônico (que vaporiza a nicotina) e o safé (snuff ), em que a absorção se dá pela mucosa nasal. Existe também o tabaco herbal sem fumaça, em que uma variedade de produtos (à base de ervas) imita o tabaco. O “tabaco sem fumaça” é uma forma de tabagismo e não uma técnica para combatê-lo. Quadro 3.1 Vias de administração, características gerais e biodisponibilidade Via Características Biodisponibilidade (%) Enterais VO Mais conveniente; o efeito de primeira passagem pode ser signifi cativo 5 a < 100 Sublingual/bucal Evita o efeito de primeira passagem 75 a < 100 Retal Menos efeito de primeira passagem que a via oral 30 a < 100 Parenterais IV Início muito rápido 100 (por defi nição) IM É possível usar grandes volumes; pode ser dolorosa 75 a ≤ 100 SC Volumes menores que a IV; pode ser dolorosa 75 a ≤ 100 Inalação Frequentemente o início é muito rápido 5 a < 100 Transdérmica Geralmente a absorção é muito lenta; usada por causa da falta de efeito de primeira passagem; duração de ação prolongada 80 a ≤ 100 VO, via oral; IV, intravenosa; IM, intramuscular; SC, subcutâ nea. 20 | PRINCÍPIOS BÁSICOS broncodilatadores e anti-inflamatórios esteroidais é indi- cada para efeitos locais nas vias respiratórias em pacien- tes com asma ou doen ça pulmonar obstrutiva crônica. A liberação sistêmica também pode ser obtida a partir destes locais de administração. A calcitonina e a cocaína podem entrar na circulação sistêmica quando adminis- tradas por via intranasal. De modosimilar, a liberação sistêmica de nicotina ocorre rapidamente após a inalação da fumaça de tabaco. A pele também pode ser usada para administrar os fármacos. Se o tecido-alvo estiver localizado sob a pele, a administração será cutâ nea. Se o tecido-alvo for mais profundo que a pele, ou se o fármaco for aplicado sob a pele para ter efeitos sistêmicos, então a administração será transdérmica. Os fisioterapeutas utilizam vias trans- dérmicas (em teoria) para liberar fármacos anti-inflama- tórios e analgésicos no local sob os tecidos subcutâneos. Para potencializar a liberação percutâ nea destes fármacos, podem ser utilizadas a energia mecânica ( fonoforese) ou a corrente elétrica direta (iontoforese). Algumas pesqui- sas clínicas controladas relatam resultados positivos com estas vias de administração. Entretanto, os parâmetros farmacocinéticos envolvidos na fonoforese e iontoforese, como a profundidade direta da penetração no tecido pelo fármaco no local de aplicação, ainda estão sendo investigados. Na administração subcutâ nea, o fármaco é injetado sob a pele, sendo indicado para a liberação sistê- mica. A insulina é o fármaco mais comum liberado atra- vés da injeção subcutâ nea. A absorção ocorre lentamente para todas as vias de administração que utilizam a pele. Outras vias de administração consistem na liberação localizada para as superfícies dos olhos e da vagina, bem como injeções em compartimentos específicos, como o espaço intratecal ao redor da medula espinhal. Vários fatores influenciam a absorção a partir do local de liberação e o efeito clínico do fármaco. O primeiro é o fluxo sanguíneo no local. Um fluxo sanguíneo ele- vado distribui rapidamente o fármaco a partir do local de administração e mantém um depósito elevado do fármaco para o gradiente de concentração sanguínea. A concentração do fármaco no local de administra- ção também é importante para determinar o gradiente entre o depósito e o sangue (ver o Boxe 3.1: Lei de difusão de Fick). DISTRIBUIÇÃO A maioria dos fármacos deve ir do local de administra- ção para o tecido-alvo. Este movimento do fármaco pelo corpo é chamado de distribuição. Para que um fármaco seja distribuído, deve se deslocar por barreiras, como as paredes dos capilares e das membranas celulares. Este movimento para dentro dos e entre os compartimentos biológicos é chamado de permeação. Permeação A permeação pode envolver vários processos diferentes, como a difusão, transportadores específicos e endocitose junto com exocitose. A permeação dos fármacos por difusão ocorre nos meios aquosos e lipídicos. Outros fár- macos exigem transportadores ou endocitose e exocitose para alcançar os tecidos ou órgãos-alvos. No último caso, estes fármacos podem ser grandes demais ou pouco lipos- solúveis para alcançarem os tecidos ou órgãos-alvos. Difusão A difusão envolve o movimento passivo das moléculas de uma área de maior concentração para outra de menor concentração. A magnitude deste processo de difusão é Boxe 3.1 Lei da difusão de Fick A difusão é o principal determinante da velocidade de ab- sorção através de uma barreira como a membrana celular, a epiderme ou a parede vascular. A lei de Fick dispõe que a velocidade de movimento das moléculas (velocidade de difu- são) por uma barreira é diretamente proporcional ao gradien- te de concentração (C1 – C2), o coeficiente de permeabilidade para a molécula e a área de difusão, sendo inversamente proporcional à espessura da barreira (equação 4). Esta relação quantifica a observação de que a absorção do fármaco é mais rápida a partir de órgãos com grandes áreas superficiais, como o intestino delgado, comparados com órgãos com menores áreas superficiais, como o estô- mago. Além disso, a absorção de fármacos é mais rápida a partir de órgãos com barreiras mais finas, como os pul- mões, comparados com os que possuem barreiras espes- sas, como a pele. Velocidade de difusão = (C1 – C2) × (coeficiente de permeabilidade/espessura) × área (4) Farmacocinética | 21 prevista pela lei de Fick (ver o Boxe 3.1: Lei de difusão de Fick). A difusão pode ocorrer no ambiente aquoso ou no ambiente lipídico ou hidrofóbico. A difusão aquosa ocorre através dos espaços aquosos extracelular e intracelular. Por exemplo, as membranas da maioria dos capilares possuem pequenos espaços preenchidos com água que permite a difusão aquosa de moléculas até o tamanho de pequenas proteínas entre o sangue e o espaço extravascular. A difusão lipídica envolve o movi- mento das moléculas pelas membranas e outras estrutu- ras lipídicas. Transporte por carreadores Vários fármacos são transportados pelas barreiras através de moléculas transportadoras que deslocam substâncias endógenas similares. Em geral, estes transportadores são proteínas, podendo ser específicos ou transportar uma grande variedade de compostos. São exemplos de transportadores específicos os transportadores de ami- noácidos na barreira hematencefálica. Exemplos destes últimos transportadores consistem nos transportadores ácidos e básicos não específicos no túbulo renal. Muitas células neoplásicas são capazes de transportar fármacos quimioterápicos para fora destas células através de tais transportadores, apresentando considerável resistência ao tratamento. Diferente das difusões aquosa e lipídica, o transporte por carreador não é regulado pela lei de Fick, sendo sua capacidade limitada. Estes carreadores podem usar vários tipos diferentes de mecanismo de transporte. O primeiro é o transporte ativo, que exige a desfosforila- ção da adenosina trifosfato em adenosina difosfato. Esse tipo de carreador pode mover uma molécula no sentido contrário do seu gradiente de difusão (de uma área de menor concentração para outra de maior concentração), mecanismo usado para transportar o sódio do interior de uma célula para o exterior (a bomba de sódio). Por outro lado, a difusão facilitada transporta as moléculas no sentido do gradiente de difusão. Este mecanismo permite a permeação das moléculas polares pelas barreiras lipídi- cas, como as membranas celulares, que, de outra forma, seria feita em uma velocidade muito baixa. O transporte de aminoácidos do lúmen do trato GI para as células epiteliais que revestem o lúmen utiliza essa técnica. Endocitose e exocitose A endocitose, algumas vezes chamada de pinocitose, ocorre através da ligação de moléculas permanentes a receptores especializados nas membranas celulares. Após a ligação, a membrana celular internaliza a molé- cula ao envolvê-la naquela área da membrana. O conte- údo da vesícula intracelular é liberado para o citoplasma da célula. A endocitose permite que moléculas muito grandes ou pouco lipossolúveis entrem nas células. Por exemplo, moléculas grandes, como os peptídios, podem entrar nas células através deste mecanismo. Substâncias pequenas, mas altamente polares, como a vitamina B12 e o ferro, ligam-se a proteínas especiais, o fator intrínseco com a vitamina B12 e a transferrina com o ferro, e estes complexos entram nas células. A exocitose é o processo inverso; ou seja, a expulsão de material encapsulado pela membrana das células para o espaço extracelular. Volume de distribuição (VD) Quando se faz necessário determinar a distribuição dos fármacos, o corpo é representado como sendo um ou mais volumes físicos nos quais os fármacos são sequestrados, separados por barreiras. Variáveis espe- cíficas podem ser usadas para prever estes volumes de distribuição. Na maioria das vezes, a distribuição do fármaco não é homogênea em todo o corpo, podendo o fármaco se concentrar em um ou mais tecidos (p. ex., sangue, gor- dura, ossos). Estes tecidos são descritos como “compar- timentos físicos” e seus volumes podem ser definidos (Quadro 3.2). Entretanto, como observado, muitos fár- macos não se distribuem da mesma forma em todos os compartimentos. Por isso, dizemos que os fármacos têm um volume de distribuição aparente (não é equivalenteQuadro 3.2 Volumes físicos, em litros (�), de alguns compartimentos corporais em que os fármacos podem ser distribuídos Compartimento e volume físico Água Água total do corpo (42 �)1 Água extracelular (14 �) Sangue (5,6 �) Plasma (2,8 �) Gordura (14,0 a 24,5 �) Osso (4,9 �) 1 Representação média para uma pessoa de 70 kg. A água total do corpo, em um homem jovem e magro pesando 70 kg, pode totalizar 49 �; em uma mulher obesa de 70 kg, 35 �. 22 | PRINCÍPIOS BÁSICOS ao tamanho físico) (Vd), o qual relaciona a quantidade de fármaco no corpo com a concentração plasmática (equação 5): Vd = quantidade no corpo/concentração plasmática (5) A equação 5 é graficamente descrita na Fig. 3.2, sendo apresentados, no Quadro 3.3, exemplos de fármacos e seu Vd aparente. O parâmetro calculado para o Vd aparente não tem equivalente físico direto. Se um fármaco se liga de forma intensa nos tecidos periféricos, sua concentração plasmática pode cair para valores muito baixos mesmo que a quantidade total no corpo seja elevada. Como resultado, o volume de dis- tribuição calculado pode exceder em muito o volume total do corpo. Determinantes do Vd A distribuição dos fármacos nos tecidos varia e depende de muitos fatores como massa do órgão, fluxo sanguí- neo, solubilidade do fármaco, ligações intravascular e extravascular, além de comorbidades. O tamanho do órgão determina o gradiente de concentração entre o Figura 3.2 Efeito da ligação do fármaco sobre o volume de distribuição aparente. O fármaco A não se liga a macromoléculas (linhas onduladas grossas) nos compartimentos vascular ou extravascular do organismo hipotético no diagrama. O fármaco A se difunde livremente entre os dois compartimentos. Com 20 unidades do fármaco no organismo, a distribuição do estado de equilíbrio deixa uma concentração sanguínea de 20 unidades. O fármaco B, diferente do A, liga-se fortemente a proteínas no sangue. A difusão do fármaco B é muito mais limitada. No equilíbrio, apenas duas unidades do total se difundiram para o volu- me extravascular, deixando 18 unidades no sangue. Em ambos os casos, a quantidade total do fármaco no corpo é a mesma (20 unidades), mas o volume de distribuição aparente é muito diferente. O fármaco C se liga fortemente a moléculas nos tecidos periféricos, de modo que é necessária uma dose total maior (200 unidades) para alcançar concentrações plasmáticas mensurá- veis. Em equilíbrio, são encontradas 198 unidades nos tecidos periféricos e apenas 2 no plasma; assim, o volume de distribuição calculado é maior que o volume físico do sistema. A A A A A A A A A A AAA A A A A A A A B BBB BB B BBB BB B B B BB B BB Compartimento vascular Compartimentos extravasculares do corpo Vd = = 102 20 Vd = Concentração no sangue Quantidade de fármaco no corpo Vd = = 1,118 20 2 unidades18 unidades 18 unidades 2 unidades C C C C C C C C Vd = = 1002 200 198 unidades2 unidades C C C C C CC C C C C C C C C C C C C C C C C C C CC C C C C C C C C C C C C C C C C C C CC C C C C C C C C C C C C C C C C C C CC C C C C C C C C C C C C C C C C C CC C C C C C C C C C C C C C C C C C C CC C C C C C C C C C C C C C C C C C CCC C C C C C C C C C C C C C C C C CC C C C C C C C C C C C C C C C C C C CC C C C C C C C C C C C C C C C C C CCC C C C C C C C C 26 | PRINCÍPIOS BÁSICOS Boxe 3.2 Modelos farmacocinéticos A eliminação de fármacos do corpo pode ser estimada com base em um modelo de compartimento. Um modelo pode ser utilizado considerando uma distribuição equilibrada do fármaco em todos os tecidos, agindo o corpo como um compartimento único. Por outro lado, o fármaco pode ser planejado para ficar armazenado em dois ou mais tecidos, agindo o corpo como um modelo de vários compartimen- tos. Poucos fármacos se comportam como se estivessem distribuídos em apenas um compartimento, especialmente se estiverem restritos ao compartimento do sistema vas- cular. Outros fármacos têm distribuições mais complexas que exigem mais de dois compartimentos para a constru- ção de modelos matemáticos precisos. Após a absorção, muitos fármacos sofrem uma fase inicial de distribuição seguida por uma fase de eliminação mais lenta. Matemati- camente, este comportamento pode ser planejado através do “modelo de dois compartimentos” (Fig. 3.6). Cada fase está associada a uma meia-vida característica: t½α a para a fase de distribuição e t½β para fase de eliminação. Quando a concentração é indicada em um eixo logarítmico, a fase de eliminação para um fármaco de primeira ordem é uma linha reta. Figura 3.6 Curva de concentração sérica-tempo após a administração de clordiazepóxido em bolo intravenoso. Os dados experimentais são inseridos em uma escala semilogarítmica como círculos cheios. Este fármaco segue a cinética de primeira ordem, ocupando dois compartimentos. A porção curvilínea inicial dos dados representa a fase de distribuição t(1/2α) com o fár- maco equilibrado entre o compartimento do sangue e o do tecido. A porção linear da curva representa a eliminação do fármaco. A meia-vida de eliminação t(1/2β) pode ser calculada utilizando um gráfico como demonstrado ao medir o tempo entre dois pontos de concentração plasmática na fase de eliminação em que um é o dobro do outro. (Reproduzida e modificada, com autorização, de Greenblatt DJ, Koch-Weser J: Drug therapy: Clinical pharmacokinetics. N Engl J Med 1975;293:702.) Fase de distribuição Fase de eliminação 4,0 3,0 2,0 1,0 0,5 0,25 0,12 0,0625 0 4 8 12 24 36 48 C on ce nt ra çã o sé ric a (C ) (µ g/ m �) ( es ca la lo ga rí tm ic a) Dose Sangue Tecidos Distribuição t1/2α Eliminação t1/2β t1/2β Tempo (h) (escala linear) BIOTRANSFORMAÇÃO Todos os organismos são expostos a substâncias quí- micas estranhas presentes no ar, na água e nos alimen- tos. Muitos tecidos agem como portas de entrada para moléculas externas no corpo. Para garantir a elimina- ção de substâncias químicas que apresentam atividade farmacológica, assim como neutralizar a ação de várias substâncias endógenas, existem vias metabólicas visando alterar sua atividade e aumentar sua suscetibilidade Farmacocinética | 27 para a excreção. A biotransformação é um mecanismo metabólico usado para reduzir a atividade de compostos químicos exógenos e endógenos. Os produtos da bio- transformação são chamados de metabólitos. Muitos fár- macos são relativamente lipossolúveis, uma característica favorável à absorção pelas membranas. Esta mesma propriedade resulta em remoção muito lenta do corpo porque a molécula também é facilmente reabsorvida da urina no túbulo renal. O corpo acelera a excreção ao transformar muitos fármacos em formas menos lipossolúveis e facilmente eliminadas. Locais de biotransformação dos fármacos O órgão mais importante envolvido na biotransformação é o fígado. Os rins também têm um papel importante no metabolismo de alguns fármacos. Poucos fármacos, como os ésteres, são metabolizados em vários tecidos por causa da ampla distribuição das esterases responsáveis pelo metabolismo destas moléculas. Tipos de reações de biotransformação A biotransformação pode ser dividida em reações da fase I e fase II. As reações da fase I consistem na oxidação, redução, deaminação e hidrólise (Quadro 3.4). A oxida- ção é mediada em parte pelo grupo das enzimas do cito- cromo P450, também chamadas de oxidases de função mista. As reações da fase II envolvem a conjugação dos subgrupos hidrofílicos com estruturas químicas especí- ficas (Quadro 3.5). Estas adições ocorrem nas funções hidroxila (–OH), amina (–NH2) e sulfidrila (–SH) na molécula-substrato. Os subgrupos adicionados consistem no glicuronato, acetato, glutationa, glicina, sulfato e gru- pos metila. A maioria destes subgrupos é relativamente polar, aumentando a hidrossolubilidade do metabólito em comparação com a molécula original do fármaco.Determinantes da velocidade de biotransformação A velocidade de biotransformação de um fármaco pode variar muito entre as pessoas. Esta variação ocorre, na maioria das vezes, por causa de comorbidades, diferen- ças genéticas ou interações medicamentosas. Para alguns fármacos, as diferenças de idade e doen ças presentes são importantes no metabolismo do fármaco. Muitas vezes, o metabolismo hepático diminui com a idade ou na pre- sença de doen ça hepática. O sexo é importante apenas para algumas substâncias, como o etanol. (O metabo- lismo de primeira passagem do álcool é menor nas mulheres do que nos homens.) Como a velocidade de biotransformação é frequentemente o principal deter- minante da depuração, as variações no metabolismo do fármaco devem ser consideradas com cuidado quando um paciente é avaliado e estabelecido seu tratamento de reabilitação. Alguns exemplos de efeitos relacionados com a genética e as interações medicamentosas sobre a biotransformação são discutidos a seguir. Quadro 3.4 Exemplos de reações da fase I para o metabolismo dos fármacos Tipo de reação Substratos típicos Oxidações, dependentes do P450 Hidroxilação Barbituratos, anfetaminas, fenilbutazona, fenitoína N-dealquilação Morfi na, cafeína, teofi lina O-dealquilação Codeína N-oxidação Paracetamol, nicotina, metaqualona S-oxidação Tioridazina, cimetidina, clorpromazina Deaminação Anfetamina, diazepam Oxidações, independentes do P450 Oxidação de aminas Epinefrina Desidrogenação Etanol, hidrato de cloral Reduções Cloranfenicol, clonazepam, dantroleno, naloxona Hidrólises Ésteres Procaína, succinilcolina, ácido acetilsalicílico, clofi brato Amidas Procainamida, lidocaína, indometacina 28 | PRINCÍPIOS BÁSICOS Genética Vários sistemas que metabolizam fármacos são diferentes entre famílias ou populações por causa de fatores gené- ticos. Consistem na hidrólise de ésteres, acetilação de aminas e algumas reações de oxidação. A succinilcolina é um éster metabolizado pela coli- nesterase plasmática (pseudocolinesterase ou butirilcoli- nesterase). Na maioria das pessoas, este processo ocorre rapidamente, e uma dose única deste fármaco bloquea- dor neuromuscular tem uma duração de ação de 5 min. Aproximadamente 1 em 2.500 pessoas possui uma forma anormal desta enzima que metaboliza a succinilcolina e os ésteres similares muito mais lentamente. Em tais pessoas, a paralisia neuromuscular produzida por uma dose única de succinilcolina pode durar várias horas e reduzir a capa- cidade funcional (p. ex., respiração) durante este perío do. A dose de certos fármacos à base de aminas, como a iso- niazida (usada para a tuberculose) e a procainamida (usada para arritmias), é frequentemente maior para os nativos americanos e asiáticos por causa de sua maior velocidade de acetilação. Similarmente, a velocidade de oxidação do metoprolol e alguns antidepressivos tricíclicos por certas isoenzimas P450 também é determinada geneticamente. Interações medicamentosas A coadministração de determinados agentes pode alterar a distribuição de vários fármacos. Por exemplo, o fumo é uma causa comum da indução enzimática no fígado e pulmões, podendo aumentar o metabolismo de alguns fármacos. Em geral, a indução enzimática resulta do aumento da síntese das enzimas dependentes do cito- cromo P450 que oxidam fármacos no fígado. Existem muitas isoenzimas da família P450, e os indutores aumentam seletivamente subgrupos destas enzimas. O Quadro 3.6 lista os indutores comuns de algumas destas Quadro 3.5 Exemplos de reações da fase II que metabolizam fármacos Tipo de reação Fármacos substratos típicos Glicuronidação Paracetamol, morfi na, diazepam, sulfatiazol, digoxina, digitoxina Acetilação Sulfonamidas, isoniazida, clonazepam, mescalina, dapsona Conjugação com glutationa Ácido etacrínico, metabólito reativo da fase I do paracetamol Conjugação com glicina Ácido salicílico, ácido nicotínico (niacina), ácido desoxicólico Conjugação com sulfato Paracetamol, metildopa, estrona Metilação Epinefrina, norepinefrina, dopamina, histamina Quadro 3.6 Lista parcial de fármacos que induzem, de forma significativa, ao metabolismo dos fármacos mediado pelo P450 em seres humanos Família CYP induzida Indutores importantes Fármacos cujo metabolismo é induzido 1A2 Benzopireno (a partir da fumaça do tabaco), carbamazepina, fenobarbital, rifampicina, omeprazol Paracetamol, clozapina, haloperidol, teofi lina, antidepressivos tricíclicos, (R)-varfarina 2C9 Barbituratos,1 especialmente fenobarbital, fenitoína, primidona, rifampicina Barbituratos,1 cloranfenicol, doxorrubicina, ibuprofeno, fenitoína, clorpromazina, esteroides, tolbutamida, (S)-varfarina 2C19 Carbamazepina, fenobarbital, fenitoína Antidepressivos tricíclicos, fenitoína, topiramato, (R)-varfarina 2E1 Etanol,1 isoniazida Paracetamol, etanol (pouco), halotano 3A4 Barbituratos, carbamazepina, corticosteroides, efavirenzo, fenitoína, rifampicina, troglitazona Antiarrítmicos, antidepressivos, antifúngicos azólicos, benzodiazepínicos, bloqueadores dos canais de cálcio, ciclosporina, delavirdina, doxorrubicina, efavirenzo, eritromicina, estrogênios, inibidores da protease do HIV, nefazodona, paclitaxel, inibidores da bomba de prótons, inibidores da HMG-CoA redutase, rifabutina, rifampicina, sildenafi la, ISRS, tamoxifeno, trazodona, alcaloides da vinca anticâncer CYP, citocromo P450; ISRS, inibidores seletivos da recaptação da serotonina; HMG-CoA, 3-hidroximetilglutaril coenzima A. 1Substratos que também agem como indutores Farmacocinética | 29 isoenzimas e os fármacos que apresentam maior metabo- lismo. São necessários vários dias para alcançar a indução máxima. Faz-se preciso o mesmo perío do para que estas enzimas retornem aos níveis normais após a retirada do indutor. Os indutores mais comuns do metabolismo dos fármacos envolvidos em graves interações medicamen- tosas são a carbamazepina, o fenobarbital, a fenitoína e a rifampicina. Em pacientes que recebem concomitan- temente estes e outros indutores, a meia-vida de muitos fármacos pode ser reduzida. Por outro lado, alguns fármacos inibem seu pró- prio metabolismo e o de outros agentes também. O Quadro 3.7 lista os inibidores comuns e os fárma- cos que têm seu metabolismo reduzido. Os inibidores do metabolismo dos fármacos mais comuns envolvidos em graves interações medicamentosas são a amiodarona, cimetidina, furanocumarinas [presentes no suco de pomelo (grapefruit)], cetoconazol e agentes antifúngicos a ele relacionados e o inibidor da protease do vírus da imunodeficiên cia humana (HIV), o ritonavir. Os inibidores suicidas são fármacos metabolizados em produtos que inibem irreversivelmente a enzima respon- sável pelo seu metabolismo. Tais agentes são o etiniles- tradiol, a espironolactona, o secobarbital, o alopurinol, o fluroxeno e a propiltiouracila. O metabolismo também pode ser reduzido por fatores farmacodinâmicos, como a redução no fluxo sanguíneo para o órgão metabolizador. Por exemplo, o propranolol reduz o fluxo sanguíneo para o fígado. Transportadores intestinais P-glicoproteínas As P-glicoproteínas são uma família de transportadores dependentes da adenosina fosfato (ATP) que transportam moléculas-alvo do citoplasma para o espaço extracelular; foram identificadas no epitélio do trato gastrintestinal, na barreira hematencefálica e nas células cancerígenas. Estas proteínas transportadoras são especialmente importantes na redução da absorção de fármacos do trato GI ao transportar os fármacos de volta para o lúmen do GI. Por outro lado, os inibidores da P-glicoproteína intestinal podem aumentar a absorção e reduzir a excreção pelas fezes para vários fárma- cos, bem como simular os que inibem a biotransformação hepática. O verapamil e a furanocumarina são inibidores de tais transportadores no trato GI. Os fármacos importantes normalmente expulsos por estes transportadores GI são a digoxina, a ciclosporina e o saquinavir. Assim, osinibidores da P-glicoproteína podem levar a concentrações plasmáti- cas tóxicas dos referidos fármacos quando administrados em doses não tóxicas. Metabólitos da biotransformação Em geral, o metabolismo gera um metabólito inativo. Por exemplo, alguns fármacos, quando administrados por via oral, são metabolizados antes de entrar na cir- culação sistêmica. As ações de vários fármacos, como os simpatomiméticos e as fenotiazinas, encerram-se antes que eles sejam excretados por serem metabolizados em derivados biologicamente inativos. Quadro 3.7 Lista parcial de fármacos que inibem, de forma significativa, o metabolismo dos fármacos mediados pelo P450 em seres humanos Família CYP induzida Inibidor Fármacos cujo metabolismo é inibido 1A2 Cimetidina, fl uoroquinolonas, suco de pomelo (grapefruit), macrolídios, isoniazida, zileutona Paracetamol, clozapina, haloperidol, teofi lina, antidepressivos tricíclicos, (R)-varfarina 2C9 Amiodarona, cloranfenicol1, cimetidina, isoniazida, metronidazol, ISRS, zafi rlucaste Barbituratos, cloranfenicol, doxorrubicina, ibuprofeno, fenitoína, clorpromazina, esteroides, tolbutamida, (S)-varfarina 2C19 Omeprazol, ISRS Fenitoína, topiramato, (R)-varfarina 2D6 Amiodarona, cimetidina, quinidina, ISRS Antidepressivos, fl ecainida, lidocaína, mexiletina, opioides 3A4 Amiodarona, antifúngicos azólicos, cimetidina, claritromicina, ciclosporina1, eritromicina1, fl uoroquinolonas, suco de pomelo (grapefruit), inibidores da protease do HIV1 (p. ex., ritonavir), metronidazol, quinina, ISRS, tacrolimo Antiarrítmicos, antidepressivos, antifúngicos azólicos, benzodiazepínicos, bloqueadores dos canais de cálcio, ciclosporina, delavirdina, doxorrubina, efavirenza, eritromicina, estrógenios, inibidores da protease do HIV, nefazodona, paclitaxel, inibidores da bomba de prótons, inibidores da HMG-CoA redutase, rifabutina, rifampicina, sildenafi la, ISRS, tamoxifeno, trazodona, da vinca alcaloides da vinca anticâncer CYP, citocromo P450; ISRS, inibidores seletivos da recaptação de serotonina; HMG-CoA, 3-hidroximetilglutaril coenzima A. 1 Substratos que também agem como inibidores. Encerra aqui o trecho do livro disponibilizado para esta Unidade de Aprendizagem. Na Biblioteca Virtual da Instituição, você encontra a obra na íntegra. DICA DO PROFESSOR A Farmacocinética descreve o percurso do medicamento no organismo e o conhecimento do perfil de absorção, distribuição e eliminação dos fármacos do nosso organismo são importantes para determinar a dose administrada, a via de administração, o intervalo entre as doses, o tempo necessário para o início de ação farmacológica. Assista no vídeo o processo de absorção, distribuição, metabolização e excreção bem como fatores que interferem na biodisponibilidade e resposta terapêutica e funcional de um fármaco administrado ao paciente. Conteúdo interativo disponível na plataforma de ensino! NA PRÁTICA A Farmacocinética descreve o percurso do fármaco no organismo e está diretamente relacionada à intensidade e duração de ação do fármaco. Portanto, fatores que interferem nos parâmetros farmacocinéticos podem alterar a resposta terapêutica do medicamento e em alguns casos causar efeitos adversos. SAIBA + Para ampliar o seu conhecimento a respeito desse assunto, veja abaixo as sugestões do professor: Características fisico-químicas dos fármacos que estão relacionadas à absorção dos fármacos. Conteúdo interativo disponível na plataforma de ensino! Biotransformação de Fármacos. Conteúdo interativo disponível na plataforma de ensino! O processo de latenciação no planejamento de fármacos. Conteúdo interativo disponível na plataforma de ensino! Eliminação de Fármacos. Conteúdo interativo disponível na plataforma de ensino! Varfarina: perfil farmacológico e interações medicamentosas com antidepressivos. Conteúdo interativo disponível na plataforma de ensino!
Compartilhar