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Indaial – 2021 Psicologia Escolar E Educacional Prof. Dulcimar Lopes Carvalho Profa. Luciana Muniz 1a Edição Copyright © UNIASSELVI 2021 Elaboração: Prof. Dulcimar Lopes Carvalho Profa. Luciana Muniz Revisão, Diagramação e Produção: Centro Universitário Leonardo da Vinci – UNIASSELVI Ficha catalográfica elaborada na fonte pela Biblioteca Dante Alighieri UNIASSELVI – Indaial. Impresso por: C331p Carvalho, Dulcimar Lopes Psicologia escolar e educacional. / Dulcimar Lopes Carvalho; Luciana Muniz – Indaial: UNIASSELVI, 202 164 p.; il. ISBN 978-65-5663-968-0 ISBN Digital 978-65-5663-964-2 1. Processo de ensino-aprendizagem. - Brasil. II. Centro Universitário Leonardo da Vinci CDD 370 aPrEsEntação Olá, acadêmico! Seja bem-vindo ao Livro Didático da Psicologia Escolar e Educacional. Este é o ramo da psicologia que estuda o processo de ensino-aprendizagem em suas mais diversas vertentes da psicologia, por exemplo, a do desenvolvimento que estuda os mecanismos de aprendizagem das crianças e adultos e também da social que estuda o funcionamento da própria instituição, enquanto organização social, entre outras. A psicologia escolar e educacional como um todo aborda, ainda, as estratégias educacionais mais adequadas que podem facilitar esse processo de ensino-aprendizagem e todos os demais fatores que interferem nesse processo. Nesse sentido, o trabalho do psicólogo escolar-educacional é de fundamental importância que, com os educadores, em um trabalho coletivo e colaborativo, visam tornar o processo de aprendizagem mais efetivo e significativo para os educandos, principalmente no que diz respeito à motivação para aprender que é considerado um fator relevante na aprendizagem e também atuam nas dificuldades de aprendizagem que porventura possam ocorrer, segundo as necessidades e individualidades de cada criança ou cada pessoa. A psicologia escolar e educacional tem como precursores os teóricos Jean Piaget, Lev Vigotsky, Frederic Skynner, entre muitos outros que serão abordados parcialmente nesta disciplina, no que diz respeito aos processos de ensino-aprendizagem. Na Unidade 1, estudaremos o processo de escolarização das crianças e adultos, com seus dispositivos de controle, processos metodológicos, formação docente e sua relação com a construção da subjetividade no contexto escolar. Na Unidade 2, compreenderemos as intervenções do psicólogo no contexto educacional, com os educandos, suas famílias e seu importante papel no acompanhamento do trabalho docente na construção de práticas eficazes de aprendizagem. Veremos ainda as teorias psicológicas que fazem intercessão com elas, como o Behaviorismo de Frederic Skynner, a Psicanálise de Sigmund Freud, o Interacionismo de Lev Vygotsky e a Psicologia genética de Jean Piaget. Na Unidade 3, abordaremos a relação escola/família, sua importância no processo de ensino-aprendizagem e na construção de uma escola inclusiva. Além disso, as metodologias de ensino-aprendizagem no contexto escolar: a metodologia tradicional, a construtivista, as ativas de aprendizagem, as inovadoras como o ensino híbrido e a educação chamada 4.0. Por fim, compreenderemos as metodologias e práticas de orientação profissional de adolescentes de suma importância na busca de seus projetos futuros. Você já me conhece das outras disciplinas? Não? É calouro? Enfim, tanto para você que está chegando agora à UNIASSELVI quanto para você que já é veterano, há novidades em nosso material. Na Educação a Distância, o livro impresso, entregue a todos os acadêmicos desde 2005, é o material base da disciplina. A partir de 2017, nossos livros estão de visual novo, com um formato mais prático, que cabe na bolsa e facilita a leitura. O conteúdo continua na íntegra, mas a estrutura interna foi aperfeiçoada com nova diagramação no texto, aproveitando ao máximo o espaço da página, o que também contribui para diminuir a extração de árvores para produção de folhas de papel, por exemplo. Assim, a UNIASSELVI, preocupando-se com o impacto de nossas ações sobre o ambiente, apresenta também este livro no formato digital. Assim, você, acadêmico, tem a possibilidade de estudá-lo com versatilidade nas telas do celular, tablet ou computador. Eu mesmo, UNI, ganhei um novo layout, você me verá frequentemente e surgirei para apresentar dicas de vídeos e outras fontes de conhecimento que complementam o assunto em questão. Todos esses ajustes foram pensados a partir de relatos que recebemos nas pesquisas institucionais sobre os materiais impressos, para que você, nossa maior prioridade, possa continuar seus estudos com um material de qualidade. Aproveito o momento para convidá-lo para um bate-papo sobre o Exame Nacional de Desempenho de Estudantes – ENADE. Bons estudos! NOTA Portanto, esperamos que nossos estudos contribuam para que você, acadêmico, sinta-se motivado a buscar novos estudos que possibilitem uma aprendizagem cada vez mais significativa para você e para sua vida profissional e que as teorias aqui abordadas sirvam de caminho para a compreensão da importância da disciplina Psicologia escolar e educacional nos processos de ensino-aprendizagem dos estudantes e, principalmente, no favorecimento das interações entre professor-aluno, psicólogo-professor, aluno-família e escola-família. Boa leitura e bons estudos! Prof. Dulcimar Lopes Carvalho Profa. Luciana Muniz Olá, acadêmico! Iniciamos agora mais uma disciplina e com ela um novo conhecimento. Com o objetivo de enriquecer seu conhecimento, construímos, além do livro que está em suas mãos, uma rica trilha de aprendizagem, por meio dela você terá contato com o vídeo da disciplina, o objeto de aprendizagem, materiais complementares, entre outros, todos pensados e construídos na intenção de auxiliar seu crescimento. Acesse o QR Code, que levará ao AVA, e veja as novidades que preparamos para seu estudo. Conte conosco, estaremos juntos nesta caminhada! LEMBRETE sumário UNIDADE 1 — O PROCESSO DE ESCOLARIZAÇÃO E A SUBJETIVIDADE ....................... 1 TÓPICO 1 — O PROCESSO DE ESCOLARIZAÇÃO ..................................................................... 3 1 INTRODUÇÃO .................................................................................................................................... 3 2 COMPREENSÃO DE SALA DE AULA ........................................................................................... 3 3 PROCESSOS METODOLÓGICOS E DA FORMAÇÃO DOCENTE ....................................... 6 4 ESCOLARIZAÇÃO E DISPOSITIVOS DE CONTROLE ............................................................ 8 RESUMO DO TÓPICO 1..................................................................................................................... 13 AUTOATIVIDADE .............................................................................................................................. 14 TÓPICO 2 — PROCESSO DE CONSTRUÇÃO DA SUBJETIVIDADE E O SUJEITO NA PSICANÁLISE .................................................................................... 17 1 INTRODUÇÃO .................................................................................................................................. 17 2 SUBJETIVIDADE OU SUBJETIVIDADES NO CONTEXTO ESCOLAR .............................. 17 3 DINÂMICAS DE CONSTRUÇÃO E FORMAÇÃO DAS SUBJETIVIDADES ..................... 21 4 DINÂMICAS E PROCESSOS SUBJETIVOS NA APRENDIZAGEM ................................... 23 RESUMO DO TÓPICO 2..................................................................................................................... 29 AUTOATIVIDADE .............................................................................................................................. 30 TÓPICO 3 — SUBJETIVIDADE ESCOLARIZADA ...................................................................... 33 1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................33 2 SUBJETIVIDADE ESCOLARIZADA CIDADÃ E OS PROCESSOS DE LEGITIMAÇÃO .......................................................................................................................... 33 3 CIDADANIA E OS EFEITOS DE MODULAÇÃO DA SUBJETIVIDADE ............................ 36 4 A ESCOLA CONTEMPORÂNEA E A PEDAGOGIA DO CONTROLE ................................ 39 LEITURA COMPLEMENTAR ............................................................................................................ 43 RESUMO DO TÓPICO 3..................................................................................................................... 45 AUTOATIVIDADE .............................................................................................................................. 46 REFERÊNCIAS ...................................................................................................................................... 48 UNIDADE 2 — INTERVENÇÕES DO PSICÓLOGO NO CONTEXTO EDUCACIONAL ...................................................................................................... 51 TÓPICO 1 — AS TEORIAS PSICOLÓGICAS: O BEHAVIORISMO, A PSICANÁLISE, O INTERACIONISMO DE VIGOTSKY E A PSICOLOGIA GENÉTICA DE JEAN PIAGET ........................................................................................................ 53 1 INTRODUÇÃO .................................................................................................................................. 53 2 CONCEITOS PIAGETIANOS E ETAPAS DO DESENVOLVIMENTO ................................. 53 3 INFLUÊNCIAS SOCIOCULTURAIS E INTERNALIZAÇÃO DAS REFERÊNCIAS .......... 58 3.1 AS CONTRIBUIÇÕES DA PSICANÁLISE PARA A EDUCAÇÃO ......................................... 58 3.2 O INTERACIONISMO DE VIGOTSKY E AS CONTRIBUIÇÕES PARA A EDUCAÇÃO ....... 63 4 A PSICOLOGIA DO DESENVOLVIMENTO E EDUCAÇÃO NA CONCEPÇÃO BEHAVIORISTA ................................................................................................................................ 68 RESUMO DO TÓPICO 1..................................................................................................................... 76 AUTOATIVIDADE .............................................................................................................................. 78 TÓPICO 2 — INTERVENÇÕES DO PSICÓLOGO COM ALUNOS E FAMÍLIA ................... 79 1 INTRODUÇÃO .................................................................................................................................. 79 2 HISTÓRIA E ATUALIDADE DA FORMAÇÃO E PRÁTICA DO PSICÓLOGO ESCOLAR. ........................................................................................................................................... 79 3 O DIAGNÓSTICO INSTITUCIONAL E O PSICODIAGNÓSTICO NA ESCOLA .............. 83 4 PRINCIPAIS QUEIXAS ESCOLARES (APRENDIZAGEM E COMPORTAMENTO) ........... 85 RESUMO DO TÓPICO 2..................................................................................................................... 88 AUTOATIVIDADE .............................................................................................................................. 89 TÓPICO 3 — INTERVENÇÕES DO PSICÓLOGO COM A EQUIPE DOCENTE .................. 91 1 INTRODUÇÃO .................................................................................................................................. 91 2 INTERVENÇÕES PARA O DESENVOLVIMENTO DE BOAS PRÁTICAS DE APRENDIZAGEM ...................................................................................................................... 91 3 ACOMPANHAMENTO DO FAZER DOCENTE NA PRÁTICA COTIDIANA ................... 93 4 O MAL-ESTAR DOCENTE E A PERCEPÇÃO DA QUALIDADE DE VIDA NO TRABALHO ................................................................................................................................ 95 LEITURA COMPLEMENTAR ............................................................................................................ 97 RESUMO DO TÓPICO 3..................................................................................................................... 98 AUTOATIVIDADE .............................................................................................................................. 99 REFERÊNCIAS .................................................................................................................................... 101 UNIDADE 3 — A RELAÇÃO ESCOLA E FAMÍLIA, ORIENTAÇÃO PROFISSIONAL, METODOLOGIAS DE ENSINO-APRENDIZAGEM NO CONTEXTO ESCOLAR E O TRABALHO DOCENTE .......................................................... 103 TÓPICO 1 — A IMPORTÂNCIA DA INTEGRAÇÃO FAMÍLIA ESCOLA NO PROCESSO DE ENSINO-APRENDIZAGEM ..................................................... 105 1 INTRODUÇÃO ................................................................................................................................ 105 2 A PARTICIPAÇÃO DA FAMÍLIA NA PRÁTICA DA EDUCAÇÃO INFANTIL ............... 107 3 PARADIGMAS ENTRE PAIS E ESCOLA NO PROCESSO DE INCLUSÃO ..................... 111 4 RELAÇÃO FAMÍLIA E ESCOLA NO PROCESSO DE CONSTRUÇÃO DE UMA ESCOLA INCLUSIVA SOB O OLHAR PSICANALÍTICO ..................................................... 119 RESUMO DO TÓPICO 1................................................................................................................... 122 AUTOATIVIDADE ............................................................................................................................ 123 TÓPICO 2 — METODOLOGIAS DE ENSINO-APRENDIZAGEM NA ESCOLA ............... 125 1 INTRODUÇÃO ................................................................................................................................ 125 2 ESTILOS E TIPOS DE METODOLOGIA: DO TRADICIONAL AO CONSTRUTIVISTA ....................................................................................................................... 127 3 METODOLOGIAS ATIVAS DE APRENDIZAGEM ................................................................ 131 4 METODOLOGIAS INOVADORAS, ENSINO HÍBRIDO E A EDUCAÇÃO 4.0................ 134 RESUMO DO TÓPICO 2................................................................................................................... 139 AUTOATIVIDADE ............................................................................................................................ 140 TÓPICO 3 — METODOLOGIAS E A PRÁTICA DE ORIENTAÇÃO PROFISSIONAL ........................................................................................................ 143 1 INTRODUÇÃO ................................................................................................................................ 143 2 A ORIENTAÇÃO NO CONTEXTO ESCOLAR ......................................................................... 146 3 ATIVIDADES TEÓRICO-PRÁTICAS PARA ESCOLHA PROFISSIONAL DE ADOLESCENTES ............................................................................................................................ 150 4 TENDÊNCIAS E LABORAÇÃO DE PROJETOS FUTUROS COM ADOLESCENTES ......... 153 LEITURA COMPLEMENTAR .......................................................................................................... 156 RESUMO DO TÓPICO 3................................................................................................................... 160 AUTOATIVIDADE ............................................................................................................................ 161 REFERÊNCIAS .................................................................................................................................... 163 1 UNIDADE 1 — O PROCESSO DE ESCOLARIZAÇÃO E A SUBJETIVIDADE OBJETIVOS DE APRENDIZAGEMPLANO DE ESTUDOS A partir do estudo desta unidade, você deverá ser capaz de: • elaborar linhas de pensamento sobre a importância da escolarização no processo de construção das subjetividades; • descrever as dinâmicas de construção da subjetividade no contexto escolar; • problematizar a subjetividade escolarizada perpassando pela pesquisa conceitual e recortes discursivos. Esta unidade está dividida em três tópicos. No decorrer da unidade, você encontrará autoatividades com o objetivo de reforçar o conteúdo apresentado. TÓPICO 1 – O PROCESSO DE ESCOLARIZAÇÃO TÓPICO 2 – PROCESSOS DE CONSTRUÇÃO DA SUBJETIVIDADE E O SUJEITO DA PSICANÁLISE TÓPICO 3 – SUBJETIVIDADE ESCOLARALIZADA Preparado para ampliar seus conhecimentos? Respire e vamos em frente! Procure um ambiente que facilite a concentração, assim absorverá melhor as informações. CHAMADA 2 3 TÓPICO 1 — UNIDADE 1 O PROCESSO DE ESCOLARIZAÇÃO 1 INTRODUÇÃO Ao longo desta unidade, aprenderemos o conceito de escolarização que é diferente de educação. Esse processo de escolarização é específico do trabalho desenvolvido na escola e que exerce influências significativas no processo de ensino-aprendizagem dos educandos, como também na construção de sua subjetividade. Existem também outros fatores importantes que exercem essa influência, por exemplo, os processos metodológicos, a formação docente, assim como a forma em que a escola e o professor trabalham e se relacionam com os educandos, interferindo, assim, na formação de suas subjetividades. Você irá perceber que a escolarização precisa favorecer essa formação, considerando que a ação da escola vai muito além do repasse dos conhecimentos acumulados pela sociedade ao longo dos tempos, como comumente se entende. 2 COMPREENSÃO DE SALA DE AULA De acordo com o Dicionário Aurélio (2010), escolarização é o ato ou efeito de escolarizar o conjunto de conhecimentos adquiridos no estabelecimento de ensino ao longo do processo de escolarização dos alunos. Portanto, é preciso lembrar que, segundo Carvalho (2017), a aprendizagem não acontece apenas no espaço escolar, pois ela pode acontecer em diferentes ambientes e contextos. Sendo assim, a escolarização é diferente de educação. A educação tem um sentido muito mais amplo e envolve muitas relações além daquelas que se encontram no ambiente escolar. Segundo Coll, Marchesi e Palacios (2004), a sala de aula é um sistema constituído por um conjunto de elementos: alunos, professores, conteúdos, atividades de ensino, materiais, práticas e instrumentos de avaliação, que se relacionam e interagem entre si, originando complexas trocas e interações responsáveis pela aprendizagem. UNIDADE 1 — O PROCESSO DE ESCOLARIZAÇÃO E A SUBJETIVIDADE 4 Busca-se, segundo os referidos autores, a possibilidade de compreender o que, como e em que condições os alunos aprendem quando seus professores ensinam. Nesse sentido, a forma como se configura uma sala de aula diz muito sobre os processos de aprendizagem que nela ocorre. Ela é vista, portanto, como um contexto de aprendizagem e não simplesmente um espaço. Os autores ressaltam ainda que, boa parte de sua dinâmica é modulada por fatores, decisões ou processos que se originam em outros sistemas como o educacional, administrativo, sociopolítico, curricular, econômico e cultural, na própria escola da qual a sala de aula é um subsistema. Entende-se, portanto, que este espaço é um sistema com vida própria, embora não autônomo, pois está inserida dentro de vários outros sistemas que a configuram. Assim, o que ocorre na sala de aula é, também, reflexo desses sistemas e influem tanto na maneira como se ensina como nas formas de se aprender. A sala de aula apresenta contextos que se misturam e se confundem em dois contextos: • contexto físico: com características espaciais da sala de aula, materiais e equipamentos presentes; • contexto mental: com um conjunto de expectativas, afetos, emoções, interesses e motivações, construídas pelos participantes e compartilhadas em maior ou menor grau por todos eles. Assim, os dois contextos estão interconectados, mas as suas relações estão longe de ser diretas e lineares (COLL; MARCHESI; PALACIOS, 2004). FIGURA 1 – PROCESSO DE APRENDIZAGEM QUE ACONTECE NO INTERIOR DA SALA DE AULA FONTE: Adaptada de <https://shutr.bz/39IxugA>. Acesso em: 16 set. 2021. As atividades que professores e alunos desenvolvem na sala de aula, assim como as interações que estabelecem dentro dela, são o resultado de um processo de construção e reconstrução de conhecimentos reelaborados entre os participantes. TÓPICO 1 — O PROCESSO DE ESCOLARIZAÇÃO 5 É preciso compreender que a sala de aula não é simplesmente um espaço onde acontece a aprendizagem dos alunos por meio dos mecanismos de assimilação dos conhecimentos, oferecidos pela escola. Ela é, antes de tudo, um espaço de interações que permeiam todo o processo educacional e envolve fatores determinantes muito mais complexos do que o repasse de conhecimentos pelo educador e a assimilação pelos estudantes. Aliás, cabe ressaltar que esse não é o papel da escola, conforme as abordagens atuais da educação. À escola e ao professor, cabem o papel de mediar e facilitar a aprendizagem, tornando-a mais significativa e acessível, de forma prazerosa e agradável. E é nesse espaço, entre outros, que essa mediação acontece e, dependendo de como ocorre, pode facilitar e ou dificultar a aprendizagem e, muito mais que isso, trazer consequências futuras e devastadoras para o aprendizado e para o desenvolvimento integral dos educandos. FIGURA 2 – DINÂMICA DE INTERAÇÃO ENTRE PROFESSOR E ALUNO FONTE: <https://shutr.bz/2ZDFXA0>. Acesso em: 16 set. 2021. Quem nunca vivenciou ou ouviu falar de experiências marcantes entre professores e educandos e, por conta disso, passaram ou ainda encontram dificuldades com novos aprendizados? Não se trata de culpabilizar educadores por esta situação, que infelizmente é bem comum, mas apenas para lembrar o quanto essas interações são importantes. Docentes também passam por muitas situações devastadoras de desrespeito e desvalorização que dificultam o seu trabalho e, como ser humano que é, não está isento de erros e dificuldades. Na verdade, na sua rotina, muitos não percebem a ocorrência dessas situações ou não param para pensar o quanto elas interferem tanto na aprendizagem quanto no desenvolvimento integral de seus alunos. A sala de aula é, portanto, um espaço importante onde acontece as principais interações de aprendizagem mediadas pelo professor e elas precisam acontecer de forma produtiva, prazerosa e saudável. Esse convívio está permeado pelas emoções, sentimentos e não apenas de técnicas e metodologias. O ato de aprender envolve, sobretudo, as relações interpessoais entre educador e estudante, UNIDADE 1 — O PROCESSO DE ESCOLARIZAÇÃO E A SUBJETIVIDADE 6 que precisam ser cuidadas e aprimoradas para que cumpram o seu verdadeiro papel que é fazer deste espaço um espaço acolhedor, produtivo, prazeroso e de aprendizagens significativas para os educandos. 3 PROCESSOS METODOLÓGICOS E DA FORMAÇÃO DOCENTE No contexto das políticas para a educação no Brasil, segundo Carvalho (2017), as questões relacionadas à formação de professores, a partir da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB, 1996) que “disciplina a educação escolar, que se desenvolve, predominantemente, por meio do ensino, em instituições próprias”, têm recebido a merecida ênfase. A formação de professores está entre os principais eixos temáticos de diversas instâncias gerenciadoras dos recursos públicos do país, de acordo com Barreto et al. (2013 apud CARVALHO, 2017). Contudo, o que se observa na prática é que apesar dos investimentos, supostamente dedicados a essa formação, ainda há muito o que fazer nesse sentido. Os processos metodológicos precisam ser aprimorados a todo o tempo e a formação deve ser contínua e contextualizada, pois nenhuma metodologia é totalmenteeficaz e adequada para todos os casos e muito menos atende às necessidades de todos os educandos. Além disso, professores são únicos e individuais, com singularidades e especificidades que não se enquadram a toda e qualquer metodologia, por mais moderna que esta possa ser ou apresentar. Necessário lembrar ainda que nenhuma formação, por melhor que seja, irá contemplar e atender a todas as necessidades de todos os docentes. O professor se forma e se constrói a cada dia, por meio da reflexão de suas práticas e não apenas por meio de cursos e especializações. Nesse sentido, Nóvoa (1995, p. 25 apud CARVALHO, 2017, p. 61) ressalta que: A formação não se constrói por acumulação de cursos, conhecimentos e técnicas, mas sim, através de um trabalho de reflexibilidade crítica sobre as práticas. Práticas de formação que tomem como referência as dimensões coletivas e que contribuem para a consolidação de uma profissão que é autônoma na produção dos seus saberes e dos seus valores. Um filme que comtempla bem a temática aqui tratada é o Um tira no jardim de infância (1990). Ele conta a história de um policial que, para proteger uma criança, disfarça- se de professor e acaba se envolvendo emocionalmente com as crianças. DICAS TÓPICO 1 — O PROCESSO DE ESCOLARIZAÇÃO 7 Orrú (2017 apud CARVALHO, 2017), pontua que é preciso mais que repensar a prática, mas estar consciente que é preciso mudá-la. Profundas reflexões, segundo a autora, precisam ser feitas em todos os espaços escolares e na universidade para que os professores e as demais pessoas envolvidas no processo educativo tenham condições, oportunidades e momentos exclusivos para essas reflexões. Se esses momentos e espaços não existem na escola, precisam reivindicar pelo seu direito a informação e conhecimento, como parte extremamente importante para seu trabalho e não apenas o tempo de lecionar e se ocupar de todas as tarefas rotineiras que lhe são conferidas. Existem também muitos entraves para se adequar uma teoria única em um contexto tão diferenciado como a escola. Cabe aqui a reflexão, segundo Jesus e Effgen (2012 apud CARVALHO, 2017), de que a formação docente qualificada pode muito, mas não pode tudo. Há de se pensar em outros aspectos macro que configuram os sistemas de ensino, bem como as condições de trabalho docente em que estes operam. FIGURA 3 – IMPORTÂNCIA DA QUALIFICAÇÃO DOCENTE FONTE: <https://shutr.bz/3if5plU>. Acesso em: 16 set. 2021. Com relação às metodologias, elas se direcionam no mesmo sentido. São muitas, diversas e estão sempre mudando, aperfeiçoando-se e são pensadas para atuar em casos específicos, pontuais e não gerais e padronizados. São importantes no processo de aquisição do conhecimento, objetivando a facilitação desse processo de aprendizagem pelo educando e, por esse motivo, os docentes precisam conhecê-las e adaptá-las a cada contexto e a cada estudante. Tarefa difícil, mas necessária. Nesta unidade, conheceremos e estudaremos algumas delas, para que você possa utilizar em sua prática profissional, mas lembre-se de que elas, por si só, não podem garantir o sucesso do processo ensino-aprendizagem. Elas operam com você, com o professor e com todos os profissionais da educação que atuam na escola, no sentido de tornar a aprendizagem mais fácil e prazerosa. O caminho do conhecimento não precisa ser árduo e difícil, como se pensa. UNIDADE 1 — O PROCESSO DE ESCOLARIZAÇÃO E A SUBJETIVIDADE 8 4 ESCOLARIZAÇÃO E DISPOSITIVOS DE CONTROLE A escola, com todo o seu aparato para promover a escolarização, possui mecanismos e dispositivos de controle que perduram até os dias atuais. Isso porque o estabelecimento de ensino enquanto instituição precisa manter o status quo no qual ela foi criada. Até a primeira metade do século XX, os discursos e práticas escolares pautavam-se quase exclusivamente na disciplina, na obediência e na repetição. O regime disciplinar rígido pretendia silenciar o aluno, tornando-o obediente, dócil, para atender à lógica da sujeição. A escolarização era, e ainda é marcada por um tempo de disciplina, sujeição, obrigações e saberes selecionados (FAVERE, 2016, p. 3). Ao cumprir deveres e usufruir de direitos, a escola: Ajusta e conecta cada criança e jovem às necessidades tecnológicas, políticas e filosóficas específicas. Fascista, socialista ou democrática, ela educa para a obediência, para formar um cidadão cumpridor de deveres tanto quanto uma rês no rebanho segue o pastor e seus cães; ela atua, segundo os momentos históricos, em função da manutenção de sua estrutura fundada na relação poder-saber (PASSETTI; AUGUSTO, 2008 apud FAVERE, 2016, p. 12). Isso se observa fortemente nas práticas impostas pela escola, por exemplo, as carteiras dispostas em fileiras, a exigência do silêncio excessivo em sala de aula, a autoridade na figura do professor, que muitas vezes se configura como autoritarismo e não apenas respeito, assim como as avaliações voltadas à memorização e não à crítica, às normas disciplinares rígidas e incontestáveis, entre muitos outros dispositivos de controle. Os indivíduos, são, portanto, agenciados por estratégias de poder reatualizadas nos dispositivos de controle (FAVERE, 2016). Vamos juntos conhecer as novas e atuais metodologias. Você verá que pode ser muito prazeroso. ESTUDOS FU TUROS TÓPICO 1 — O PROCESSO DE ESCOLARIZAÇÃO 9 FIGURA 4 – DISPOSITIVOS DE CONTROLE FONTE: <https://shutr.bz/3AO7z38. Acesso em: 16 set. 2021. Isso se observa, por exemplo, nos documentos oficiais que norteiam toda as ações da escola como o Projeto Político-Pedagógico (PPP), que, em tese, é construído e formulado com a participação de todos (alunos, professores, pais, comunidade e gestão escolar) o que, na prática, não acontece. Raras são as vezes em que os pais e alunos são convidados a essa participação. As reuniões escolares são, em sua maioria, usadas para apontar os estudantes-problemas ou repassar a infinidade de normas e regras disciplinares, motivos esses que são bem poucos eficientes e com baixíssima presença dos pais. Os alunos, assunto principal de quase todas elas, não fazem parte delas. Esse documento, o PPP, tão importante para o direcionamento das principais ações da escola é própria de cada uma, podendo ser modelado e construído segundo os interesses de quem o faz, no caso, sendo no máximo uma equipe pedagógica e ou administrativa. Ainda assim, uma boa parte desse registro precisa seguir as linhas gerais de outro, o Programa Curricular Nacional (PCN), que tem como objetivo padronizar, selecionar e escolher os principais conteúdos curriculares que devem ser trabalhados em todo o país. Essa ação, inicialmente é positiva e louvável, pois se justifica na necessidade de diminuir as desigualdades entre as escolas públicas e particulares, porém, a questão é quem determina e escolhe esses conteúdos e com qual objetivo é feita essa seleção. Infelizmente, não são os docentes que são os que mais conhecem a realidade de seus alunos, tanto das instituições públicas ou particulares. E ainda temos muitas outras questões envolvidas nesse tema, pois escolas públicas e particulares operam em situações e realidades bem diferentes, com isso, torna-se quase impossível essa suposta busca igualitária, mas esse é um assunto bem mais complexo que precisa ser abordado em outro momento. O termo sociedade de controle utilizado por Deleuze (2008 apud FAVERE, 2016) traz em seu teor a ideia de comando, de vigilância e punição. Os controles são intensificados e as estratégias modificadas, atuando em diferentes momentos da vida: no trabalho, nos relacionamentos, nas redes sociais, na rua, em casa e, consequentemente, também, na escola. UNIDADE 1 — O PROCESSO DE ESCOLARIZAÇÃO E A SUBJETIVIDADE 10 “Na escola, a combinação de corpos obedientes, alinhados em séries cronológicas, produziu por muito tempo, segundo a autora, uma força coletiva disciplinada que fazia a máquina da escola ser eficiente, na qual se aumentavamas forças produtoras e diminuíam as forças políticas coletivas” (BELTRÂO, 2000 apud FAVERE, 2016, p. 4). A educação foi usada por muitos anos para doutrinar as pessoas e incutir nelas o pensamento de que são inferiores e que precisam obedecer aos que sabem, além de produzir mais. Não é à toa que a educação profissional é considerada até hoje como a preparação para o trabalho, como força operacional necessária à manutenção do capitalismo. Não que não seja necessária essa preparação, mas quem mantém essa força produtiva são as pessoas e como tal não deveriam ser vistas e tratadas apenas como sustentação do poder e acumulação de capital pelas empresas, o que infelizmente acontece. Pode-se perceber que as práticas de sujeição e disciplina ainda permanecem na contemporaneidade manifestadas pelas regras disciplinares, modelo de um aluno ideal, avaliações padronizadas, turmas seriadas e cronológicas, currículos profissionais voltados para a acumulação do capital, documentos normativos feitos sem a participação coletiva dos agentes da educação, entre outros. Uma das características do século XXI é estar e ser escolarizado, na medida em que se amplia a passagem pela escola, a cada dia, por períodos e tempos cada vez maiores. A exigência da escolarização como estratégia de sujeição, se aperfeiçoa e transita em leis, propagandas e mesmo no desejo das pessoas. A escolarização é incentivada e disseminada como um investimento necessário e vantajoso (FAVERE, 2016, p. 9). Você já deve ter ouvido falar por diversas vezes, pelos seus pais, que quem não estuda não consegue nada na vida. Essa afirmação até tem um fundo de verdade, pois o mundo competitivo e capitalista exige cada vez mais indivíduos bem formados e capacitados e essa formação é sempre delegada à escola. Não se trata de desmerecer o trabalho formativo do educandário e muito menos negando o seu valor. O que se coloca aqui é o quanto esse sujeito bem formado e capacitado precisa se submeter aos aparatos da escola, para que seja conferido esse mérito. A partir de quais parâmetros esse indivíduo é avaliado e a quais preceitos e normas precisa seguir rigidamente para que obtenha sucesso na vida? Qual garantia ele terá de sucesso na vida se for escolarizado? TÓPICO 1 — O PROCESSO DE ESCOLARIZAÇÃO 11 FIGURA 5 – O RUMO DA EDUCAÇÃO? FONTE: <https://shutr.bz/3oc4yWM>. Acesso em: 16 set. 2021. A cada dia pode-se perceber que essas exigências e tempos se ampliam cada vez mais. Há algum tempo, quem cursava um curso superior era considerado detentor de um conhecimento privilegiado e quase inalcançável por muitos. Atualmente, não é nada mais do que um primeiro passo para se atingir um mesmo objetivo, ou seja, o início de uma longa jornada de buscas, lutas e percursos cheios de obstáculos e muitos entraves na suposta carreira de sucesso. É preciso ressaltar ainda que a escola dissemina conhecimentos, porém valoriza e avalia também as competências comportamentais, que são muito importantes, mas que na maioria das vezes não são trabalhadas pela escola, como: responsabilidade, ética, honestidade, entre outras. Analisemos, quem é o aluno ideal preconizado pela escola? Aquele que detém os conhecimentos e ainda é responsável, dedicado, respeitador e correto, não é mesmo? FIGURA 6 – AVALIAÇÃO DO BOM ALUNO PELA ESCOLA FONTE: <https://bit.ly/3ieMKGR>. Acesso em: 16 set. 2021. UNIDADE 1 — O PROCESSO DE ESCOLARIZAÇÃO E A SUBJETIVIDADE 12 A figura a seguir também ilustra a avaliação que a escola faz dos alunos em termos de quem é o bom estudante. FIGURA 7 – AVALIAÇÃO DO BOM ALUNO PELA ESCOLA FONTE: <https://www.shutterstock.com/pt/image-illustration/mark-excellent-90824672>. Acesso em: 16 set. 2021. Por fim, por que os saberes veiculados pela escola ou conhecimentos não podem ser questionados? Por que o educandário apresenta tanta dificuldade em promover e se abrir para a participação dos envolvidos no seu processo de ensino- aprendizagem? Por que seleciona, padroniza e exclui os que não se encaixam em suas regras e normas rígidas e incontestáveis? Importante refletir sobre questões consideráveis levantadas no decorrer do texto, tão importantes enquanto agentes da educação responsáveis pela formação integral dos educandos e o pleno desenvolvimento de sua criticidade. CHAMADA 13 Neste tópico, você aprendeu que: • Escolarizar é diferente de educar, a escolarização acontece dentro dos domínios do espaço escolar e a educação é muito mais abrangente e pode acontecer em diferentes espaços. • O ambiente da sala de aula vai além de um espaço físico onde acontece a aprendizagem dos alunos, é, antes de tudo, um espaço de múltiplas interações. • Os processos metodológicos e a formação docente precisam ser continuamente atualizados, visto que são pensados para pessoas que são únicas, com necessidades singulares, diversas e que nenhuma formação, por melhor que seja, irá contemplar todas elas. • A escola utiliza de muitos dispositivos de controle que interferem na formação da subjetividade de seus educandos, padronizando comportamentos e atitudes que julgam atender as suas normas e padrões rígidos e incontestáveis com sérias consequências para o desenvolvimento da criticidade, que teoricamente é um dos principais objetivos da escola. RESUMO DO TÓPICO 1 14 1 Escolarização é o conjunto de conhecimentos adquiridos na escola ao longo do processo de aprendizado dos educandos, ou seja, na sua passagem pela escola. A respeito do processo de escolarização e a formação da subjetividade, assinale a alternativa CORRETA: a) ( ) Escolarização é o mesmo que educação. b) ( ) O processo de escolarização interfere e atua na formação da subjetividade. c) ( ) O espaço da sala de aula é apenas um espaço físico onde acontece a aprendizagem dos alunos. d) ( ) O processo de escolarização acontece naturalmente no processo de aprender e está restrito à aquisição de novos conhecimentos pelos alunos. 2 A formação de professores está entre os principais eixos temáticos de diversas instâncias gerenciadoras de recursos públicos em nosso país. Sobre a relação teoria e prática da formação dos docentes, assinale a alternativa INCORRETA: a) ( ) A formação de professores precisa ser contínua e aprimorada constantemente. b) ( ) Os professores precisam de mais cursos e mais conhecimentos para garantir a melhoria do seu trabalho e de sua prática. c) ( ) Apesar desses recursos, a formação de professores ainda precisa ser melhorada, pois muitos cursos não atendem às expectativas dos professores. d) ( ) Não são os cursos que garantem a boa formação dos professores. 3 A escola, com todo o seu aparato para promover a escolarização, possui mecanismos e dispositivos de controle. Analise as sentenças a seguir, que descreve alguns mecanismos de controle: I- Até a primeira metade do século XX, as práticas escolares eram pautadas exclusivamente na disciplina, na obediência e na repetição. II- O regime disciplinar pretendia atender à lógica da sujeição. III- A escolarização ainda hoje é marcada por mecanismos de sujeição e disciplina. IV- Os mecanismos e dispositivos de controle são necessários para manter a disciplina na escola. Assinale a alternativa CORRETA: a) ( ) As sentenças II, III e IV estão corretas. b) ( ) As sentenças I, II e IV estão corretas. c) ( ) As sentenças I, II, III estão corretas. d) ( ) As sentenças I e II estão corretas. AUTOATIVIDADE 15 4 O processo de escolarização influencia no modo como as pessoas aprendem e pensam. A escola, dependendo da forma como conduz esse processo, pode torná-lo mais prazeroso ou mais penoso para seus alunos. O papel da escola vai muito além da mera transmissão dos conhecimentos produzidos e acumulados pela sociedade. Diante dessas duas afirmativas, explique qual seria o papel da escola atual no sentido de promover uma escolarização que atenda a esse propósito e o que poderia ser melhorado e ou modificado?5 Os processos metodológicos e a formação docente são importantes para a construção de aprendizagens cada vez mais significativas para os alunos, visto que é o professor quem conduz esse processo no seu papel de mediador e facilitador dessas aprendizagens. Contudo, Effegen (2012 apud CARVALHO, 2017, p. 62) afirma que “a formação docente qualificada pode muito, mas não pode tudo”. Tendo em vista essa afirmação, explique o que ela pretende dizer e justifique sua resposta. 16 17 TÓPICO 2 — UNIDADE 1 PROCESSO DE CONSTRUÇÃO DA SUBJETIVIDADE E O SUJEITO NA PSICANÁLISE 1 INTRODUÇÃO Neste tópico, abordaremos como acontece a construção da subjetividade a partir da psicanálise e como essa abordagem trata a questão do sujeito. Vamos aprofundar os conceitos básicos para compreender bem como o sujeito, que é único e individual, recebe e exerce influências no seu mundo social transformando e sendo transformado por ele. No contexto escolar, as subjetividades se entrelaçam e por este motivo não se pode falar nela de forma totalmente individual e compartimentada, descolada das influências de um contexto social que é amplo e pluridimensional. Desse modo, estudaremos como os autores dessa abordagem tratam a questão da subjetividade coletiva. Por fim, vamos entender a dinâmica dos processos subjetivos na aprendizagem que é diverso e importante. Você irá perceber que existem muitos aspectos que influenciam na aprendizagem de cada pessoa. Iremos nos atentar para todos esses mecanismos que funcionam de modo bem específico em cada situação de aprendizagem. Os recursos utilizados também são diferenciados e precisam ser conhecidos. 2 SUBJETIVIDADE OU SUBJETIVIDADES NO CONTEXTO ESCOLAR Segundo Guattari (1992 apud SOARES; MIRANDA, 2009), a subjetividade é tudo aquilo que concorre para a produção de si mesmo, um modo de existir, um estilo de existência, mas também um modo de relacionar com o mundo, fruto de uma engenharia de altas interações, de componentes heterogêneos e que é socialmente produzida. Bock (2004, p. 23) traz uma definição mais detalhada do que seja a subjetividade: A subjetividade é a síntese singular e individual que cada um de nós vai constituindo conforme vamos nos desenvolvendo e vivenciando as experiências da vida social e cultural; é uma síntese que nos identifica, de um lado, por ser única, e nos iguala, de outro lado, na medida em que os elementos que a constituem são experienciados no campo comum da 18 UNIDADE 1 — O PROCESSO DE ESCOLARIZAÇÃO E A SUBJETIVIDADE objetividade social. Esta síntese – a subjetividade – é o mundo de ideias, significados e emoções construído internamente pelo sujeito a partir de suas relações sociais, de suas vivências e de sua constituição biológica; é, também, fonte de suas manifestações afetivas e comportamentais. FIGURA 8 – O QUE É SUBJETIVIDADE? FONTE: <https://shutr.bz/2Y4BQfU>. Acesso em: 16 set. 2021. Na psicanálise, o que define a pessoa na sua individualidade e subjetividade é chamada de self, isso é, a sua essência. O termo self, em português, pode ser traduzido por si ou por eu, mas na psicologia é pouco utilizado (SANTOS, 2016). Para a psicanálise, “a noção de sujeito e de subjetividade é dividida em duas ordens de funcionamento, relativas ao consciente e ao inconsciente. O inconsciente é, de hábito, compreendido como a própria subjetividade” (GARCIA-ROSA, 2001 apud TOREZAN; AGUIAR, 2011, p. 6). Entretanto, segundo esses autores, “não há como segmentar completamente uma região da outra quando se fala em aparelho psíquico” (GARCIA-ROSA, 2001 apud TOREZAN; AGUIAR, 2011, p. 6). “Tais aspectos caracterizam uma subjetividade unificada e governada pela consciência, e o inconsciente seria um estado de caráter temporário e adjetivado, uma espécie de adendo desconhecido da consciência” (GARCIA-ROSA, 2001 apud TOREZAN; AGUIAR, 2011, p. 6). FIGURA 9 – O ASPECTO DESCONHECIDO DA CONSCIÊNCIA FONTE: <https://shutr.bz/3CUnRYD>. Acesso em: 16 set. 2021. TÓPICO 2 — PROCESSO DE CONSTRUÇÃO DA SUBJETIVIDADE E O SUJEITO NA PSICANÁLISE 19 Freud, portanto, criou uma concepção sobre o inconsciente, quando este, passa da condição de apêndice da consciência à estrutura particular e determinante da subjetividade. O inconsciente é formulado, então, enquanto um sistema psíquico regido por leis próprias, instaurando um afastamento e um descentramento do outro sistema: a consciência. O inconsciente, para Freud, é o que genuinamente constitui a subjetividade e não apenas um desejável detalhe dela (TOREZAN; AGUIAR, 2011, p. 5). Segundo Freud, a mente humana pode ser comparada a um iceberg, em que a pequena parte visível é o consciente e a parte maior, submersa, representa o inconsciente. É na parte inconsciente que residem os impulsos, os sentimentos reprimidos e as forças vitais que controlam os pensamentos e as atitudes das pessoas e que, por isso, são a chave para conhecê-las (SANTOS, 2016). FIGURA 10 – PRIMEIRA FORMATAÇÃO DOS APARELHOS PSIQUICOS SEGUNDO FREUD FONTE: <https://shutr.bz/3CVLFvx>. Acesso em: 16 set. 2021. Contudo, é preciso lembrar que a produção da subjetividade é um processo complexo e se situa em uma configuração sócio-histórica, ou seja, está inserido em um processo social que nunca acaba, está continuamente em formação. Sendo assim, o indivíduo pode sempre transformar a sua identidade. Nesse sentido, a suposição, segundo Prata (2005, p. 1), “é que a subjetividade hoje se produz diferentemente do que se produziu, por exemplo, no início do século XX”. Com isso, entende-se que não existe uma subjetividade com valores universais, para qualquer tempo e lugar, pois ela é sempre produzida em determinado tempo. O educandário, enquanto instituição social, fez e faz 20 UNIDADE 1 — O PROCESSO DE ESCOLARIZAÇÃO E A SUBJETIVIDADE parte dessa produção, uma vez que é um lugar fundamental na constituição da subjetividade, como engrenagem atravessada e marcada pela configuração social e pelas relações de poder entre docentes e estudantes e pela forma que concebe a aprendizagem e transmite o saber. Como aprendemos que a subjetividade é sempre produzida, pode-se concluir que mudam também as formas de subjetivação, uma vez que se alteram essas relações entre professores e alunos, assim como se mudam as regras transmitidas pela escola. Não é possível falar em uma subjetividade individual e sim em subjetividades coletivas, de sujeitos que se constituem na experiência social, em suas relações singulares na família, na escola, na rua (TOREZAN; AGUIAR, 2011). A subjetividade se constrói continuamente na relação consigo mesmo e com as outras coisas e pessoas, nos modos de ser e existir de cada um. FIGURA 11 – FORMAÇÃO DE SUBJETIVIDADES COLETIVAS FONTE: <https://shutr.bz/3lYD0Bw>. Acesso em: 16 set. 2021. Assim, segundo Soares e Miranda (2009, p. 8): Ao considerarmos a subjetividade como um fluxo contínuo de sensações, modos de existir, amar e comunicar, de imagens, sons, afetos, valores e formas de consumo literalmente fabricadas no entrecruzamento de instâncias sociais, técnicas, institucionais e individuais, estamos radicalizando as possibilidades dos engendramentos de subjetividades. No limite, é possível talvez considerar que todos os sujeitos e coletivos humanos, institucionalizados ou não, com maior ou menor grau de instrução e de conhecimento tecnológico, são produtores de subjetividade. Pode-se concluir, então, que ao mesmo tempo que construímos a nossa própria subjetividade, também produzimos outras por meio das nossas relações. A escola, como instância institucionalizada que é, participa na produção e construção das subjetividades de seus alunos, professores e demais atores educacionais. TÓPICO 2 — PROCESSO DE CONSTRUÇÃO DA SUBJETIVIDADE E O SUJEITO NA PSICANÁLISE 21 3 DINÂMICAS DE CONSTRUÇÃO E FORMAÇÃO DAS SUBJETIVIDADES Questionamentos são necessários. As concepções de subjetividade anulam as noções de sujeito? Como se constroem e se formam as subjetividades?Para Freud, “temos uma concepção de sujeito que se estrutura ao longo do percurso histórico singularizado no cotidiano e, por outro lado, outra concepção que ressalta a dimensão da produção da subjetividade como um acontecimento atrelado a um determinado momento histórico e social” (SILVA; GARCIA, 2011, p. 2). O questionamento a ser feito é: existe uma exclusão entre as duas noções? A teoria psicanalítica, como visto no subtópico anterior, descentra o humano de uma noção centrada no consciente e, ao mesmo tempo, incluiu no âmbito do inconsciente como instâncias internas e externas ao indivíduo. Para Freud, o ser humano está implicado nas suas ações, mesmo naquelas que produzem estranhezas, sobressaltos, desconfortos e constrangimentos. “Desde muito cedo, Freud abandona a dicotomia racional versus irracional, razão versus instinto, social versus individual” (SILVA; GARCIA, 2011, p. 2). “Temos, então, a estruturação de um sujeito que se constituiu a partir de um outro, que é sempre social, mas que também é um ser único e com modos de subjetividade e efeitos inconscientes” (SILVA; GARCIA, 2011, p. 2). Segundo Gonzáles-Rey (2003 apud SILVA; GARCIA, 2011, p. 2): A noção de subjetividade é um sistema complexo e plurideterminado, afetado pelo próprio curso da sociedade e das pessoas que a constituem, dentro do contínuo movimento das redes de relação que caracterizam o desenvolvimento social. Neste movimento, produzem-se saberes acerca dos processos psíquicos, sistêmicos, dialógicos e dialéticos que reconhecem o ser humano como um indivíduo que, para o autor, tem uma capacidade de superar o imediato, dirigindo-se a realização de seus próprios projetos. Ressaltamos, nesta definição de subjetividade, a presença de uma noção de subjetividade que supõe a capacidade de mediatizar e de projetar-se num futuro através de um ideal, ou seja, um ser criativo, senhor do seu destino e com a possibilidade de se inventar. No entanto, essa noção pode ser expandida com a noção de sujeito proposta pela Psicanálise. Existe, então, um sujeito que se reinventa a partir do outro, ou seja, carrega consigo as marcas estruturantes do mundo social e, a partir delas, reinventa-se e se constrói (se subjetiva), ao mesmo tempo que encobre essa identificação. Trata- se não de uma determinação subjetiva, mas de uma sobredeterminação na qual a pluralidade compõe o sujeito (SILVA; GARCIA, 2011). 22 UNIDADE 1 — O PROCESSO DE ESCOLARIZAÇÃO E A SUBJETIVIDADE FIGURA 12 – FORMAÇÃO DA SUBJETIVIDADE FONTE: <https://shutr.bz/3F7BuG6>. Acesso em: 16 set. 2021. Não se trata, porém, de um determinismo social que produz um sujeito universal e destituído de sua relação consigo mesmo, mas um ser que se constituiu interna e externamente e que mesmo na sua tentativa de se tornar unidade não perde a sua dimensão social. Silva e Garcia (2011) salientam que o ser humano é dobra produzida numa torção dentro (sujeito) – fora (tessitura social). Acrescentam ainda que é ilusão pensar num sujeito desvinculado de suas dimensões sociais. FIGURA 13 – O SER FORMADO PELO SOCIAL FONTE: <https://www.shutterstock.com/pt/image-illustration/join-our-community-71223133>. Acesso em: 16 set. 2021. Silva e Garcia (2011, p. 5) ainda ressaltam que: Releituras mais estreitas de algumas obras, também homogeneizaram a complexidade heterogênea do social, seus impasses e conflitos e reduziram, tentando até mesmo anular, os movimentos singulares do sujeito. Portanto, tanto as leituras sociais que abordam um sujeito histórico, quanto as leituras psicanalíticas, que abordam a construção de um sujeito por um inconsciente não afetado pelo externo, levaram a reducionismos e indubitavelmente, não abriram o campo para se pensar a pluralidade na constituição subjetiva. TÓPICO 2 — PROCESSO DE CONSTRUÇÃO DA SUBJETIVIDADE E O SUJEITO NA PSICANÁLISE 23 Freud nos faz entender que todos os processos histórico-sociais e grupais acontecem no interior do sujeito e que na vida anímica, ou seja, na parte imaterial da alma humana, aparece sempre e efetivamente o outro. “Decorre daí uma construção do sujeito que é parte consciente e de outra parte inconsciente, reprimida e distanciada do consciente” (SILVA; GARCIA, 2011, p. 3). É preciso ampliar a concepção do humano que é por si só e dar espaço a uma nova subjetividade defendida pela psicanálise estruturada num sujeito, construído de modo plural, se manifestando no indivíduo de forma singular, particular e regida por uma construção social e histórica (SILVA; GARCIA, 2011, p. 5). FIGURA 14 – FATOR HUMANO NA CONSTRUÇÃO DA SUBJETIVIDADE FONTE: <https://shutr.bz/3uiNmQD>. Acesso em: 16 set. 2021. Foucault (2007) compactua com essa noção da subjetividade ampliada quando teoriza sobre as relações de poder e recorre a Peixoto Júnior (2004 apud SILVA; GARCIA, 2011), que nessa perspectiva, aponta que o poder não atua simplesmente oprimindo ou dominando as subjetividades, mas na sua própria construção, o que nos permite investigar aquilo que se encontra na base de sua formação. Cabe lembrar como a escola opera e contribui para a construção e formação das subjetividades de seus educandos nas suas mais diversas formas de opressão e dominação e que consequências isso pode ter na formação de cidadãos livres e críticos que se propõem formar. 4 DINÂMICAS E PROCESSOS SUBJETIVOS NA APRENDIZAGEM Aprender é uma atividade que implica na necessidade da vida humana sem ponto de chegada. Isso nos caracteriza enquanto indivíduos de forma bastante diferenciada em relação aos animais. “E se aprendemos no dia a dia nós o fazemos sempre nas relações sociais, com propostas e objetivos diferentes” (TACCA; REY, 2008, p. 2). 24 UNIDADE 1 — O PROCESSO DE ESCOLARIZAÇÃO E A SUBJETIVIDADE Os autores ainda destacam que além de aprender por uma necessidade de sobrevivência ou melhor viver, também aprenderemos para ser, pois essa atividade nos constitui enquanto pessoas nas nossas trocas constantes, ou seja, no âmago dos processos de socialização. FIGURA 15 – A APRENDIZAGEM COMO UMA NECESSIDADE HUMANA FONTE: <https://shutr.bz/3kJj9a8>. Acesso em: 16 set. 2021. Os mesmos autores pontuam também que, ao se pensar que todos precisam ter acesso a esse aprender tão importante, a escola não poderá e não deverá propor isso em modelos únicos, pois na democratização do saber não se concebe um saber padrão que só levaria ao sucesso de poucos, ou seja, daqueles para os quais o padrão melhor se adapta. Caso contrário, a escola incorrerá entre outros a pelo menos quatro equívocos a saber, segundo Tacca e Rey (2008): • fragmentar e padronizar o conhecimento; • padronizar as pessoas; • considerar a aprendizagem apenas na dimensão reprodutiva sem assumir a possibilidade de sua produção; • desconsiderar aprendizagem como função do sujeito, no âmago da configuração subjetiva e da produção do seu sentido subjetivo. Nesse sentido, “se aprendizagem é uma função do sujeito, ela se encontra fortemente impactada pelos entrelaçamentos da subjetividade individual e social e a escola precisa considerar a sua dimensão subjetiva para que todos consigam o acesso a esse aprender” (TACCA; REY, 2008, p. 23). Em psicanálise, para que haja aprendizagem, segundo Santos (2016), é necessário considerar as características individuais dos alunos e suas condições de vida e a fase de desenvolvimento em que se encontra. Para essa teoria, existem dois processos que interagem na atividade escolar: aprendizagem e desenvolvimento, que precisam ser considerados. TÓPICO 2 — PROCESSO DE CONSTRUÇÃO DA SUBJETIVIDADE E O SUJEITO NA PSICANÁLISE 25 Um dos objetivos da educação, segundo a autora supracitada, é ensinar a criança a dominar as suas pulsões já que é impossível ter liberdade para seguir todos os impulsos. Outro ponto relevante nessa teoria é compreender as questões subjetivas que envolvem a aprendizagem e a relação professor e aluno. Santos (2016) aponta ainda que existem conceitos e princípios importantespara que se entenda esses processos que acontecem na educação como: • Conceito de transferência: no contexto educacional, está relacionado à ligação emocional desenvolvida entre o professor e o aluno. Para a psicanálise, o aluno transfere sentimentos e emoções criadas e desenvolvidas com os pais, para a figura do educador. Assim, um docente que conhece o conceito de transferência pode compreender melhor, por exemplo, as atitudes agressivas ou excessivamente amorosas de um estudante com ele, facilitando sua aprendizagem. Ao mesmo tempo que, ao desconhecer, pode bloquear esse caminho da aprendizagem, podendo causar medo dele e, consequentemente, do conhecimento que transmite. • Conceito da projeção: pode ser descrito como algo indesejável de si que a pessoa projeta no mundo externo sem ter a percepção desse fato, ou seja, é um fenômeno tipicamente inconsciente. Da mesma forma que o conceito anterior, o aluno, ou mesmo o professor, pode inconscientemente projetar nos outros sentimentos e emoções próprias advindas de experiências frustrantes, prejudicando o processo de ensinar-aprender. Independente da teoria da aprendizagem em que se acredita, existem processos subjetivos no processo de aprendizagem e na forma como ela pode ocorrer (SANTOS, 2016, p. 38). Vejamos alguns exemplos: • Exemplo 1: Cecilia está estudando corte e costura e o desafio da última aula foi coser uma calça comprida. Tarefa não muito fácil. Ela prestou bastante atenção na explicação da professora, estudou o capítulo sobre o assunto e fez o primeiro molde. Após algumas tentativas, costura uma calça muito bonita que caiu como uma luva na sua irmã, recebendo muitos elogios de sua professora. • Exemplo 2: a mãe de Jurema é costureira e desde pequena ela observa os mais variados tipos de roupa sendo trabalhados. Certo dia ficou curiosa e resolveu costurar também. Foi experimentando a máquina de costura e outros instrumentos de trabalho de sua mãe, até que finalmente conseguiu fazer sua “A influência da psicanálise no pensamento educacional não ocorreu por meio da aplicação direta dos conceitos apresentados, mas pelo estudo do desenvolvimento humano das forças interiores e das inter-relações dos seres humanos” (SANTOS, 2016. p. 38). NOTA 26 UNIDADE 1 — O PROCESSO DE ESCOLARIZAÇÃO E A SUBJETIVIDADE primeira peça. A roupa mais recente que fez foi uma calça comprida que ficou muito bem no corpo de sua mãe. Jurema agora também é costureira e trabalha com a mãe, que dobrou a clientela. • Exemplo 3: Sandro nasceu no interior do estado e foi para a capital estudar enfermagem, pois sonhava em ser enfermeiro no hospital de sua cidade. A adaptação à cidade grande foi muito difícil, principalmente com relação às questões culturais. No início, ele chegou a sofrer bullying dos seus colegas por não falar direito as palavras, pois não empregava corretamente a concordância verbal, errava nos plurais e em outras regras do nosso idioma. O estudo teve que ser dobrado com conteúdo de enfermagem, além de regras gramaticais. Ele venceu e hoje é um conceituado enfermeiro que dá palestras em várias cidades. FIGURA 16 – COMO O SER HUMANO APRENDE FONTE: <https://shutr.bz/3uj2Zr9>. Acesso em: 16 set. 2021. Como se pode perceber, em todas as situações houve aprendizagem, mas com algumas caraterísticas diferentes no processo de aprender. Cada pessoa utiliza um modo, uma estratégia diferente de aprendizagem, porém, chegaram ao mesmo objetivo comum. Segundo Santos (2016, p. 39): 1. O processo de aprender ocorre a partir do processo de perceber, de analisar, de comparar, de testar, de repetir, de descobrir, entre outros. 2. A motivação para aprender pode ser espontânea como a de Jurema (curiosidade), ou induzida, como aconteceu com Cecilia, com base no desafio proposto pela professora. 3. Em todas as situações o aprendiz teve uma necessidade e um objetivo. 4. Para atingir o seu objetivo, o aprendiz muitas vezes enfrenta barreiras e as supera a partir de sua dedicação e preparação, estudando, lendo, testando, fazendo exercícios, pesquisando, praticando, repetindo ações etc. 5. A recompensa da aprendizagem pode ser intrínseca ou extrínseca. Uma recompensa intrínseca é o fato de aprender, como no caso de Jurema; já os elogios da professora configuram uma recompensa extrínseca. TÓPICO 2 — PROCESSO DE CONSTRUÇÃO DA SUBJETIVIDADE E O SUJEITO NA PSICANÁLISE 27 6. A aprendizagem não é somente mudança cognitiva. Sentimentos de curiosidade, entusiasmo, tensão, obstinação, frustração e outros também estão presentes no processo de aprender. 7. A aprendizagem abrange vários aspectos importantes: um novo conhecimento que é fixado na memória; habilidades e aspectos motores; confiança na própria capacidade de aprender; controle das emoções que contribuem para a aprendizagem. 8. O processo de aprender é integrado e envolve a pessoa de maneira orgânica, ou seja, como um todo: intelecto, afetividade, sistema muscular. 9. O resultado da aprendizagem é mantido ou repetido quando é recompensado, valorizado ou reforçado. 10. Existem diferenças individuais que contribuem para que o processo e o resultado da aprendizagem sejam individualizados e diversos. As questões culturais e ambientais resultam na facilidade ou na dificuldade em aprender. 11. Compreender o processo de aprendizagem é extremamente importante para o professor, pois será́ com base nessa compreensão que ele saberá́ como ensinar. Existem muitos fatores que interferem na aprendizagem e no modo das pessoas aprenderem. Diz-se que esses processos são subjetivos porque são intrínsecos, ou seja, estão presentes no interior de cada um. Um fator ou aspecto que é importante e pode prejudicar a aprendizagem de uma pessoa, pode ser irrelevante para a outra. Outro ponto importante é que cada pessoa utiliza de mecanismos, habilidades e sentidos diferentes na assimilação destes conhecimentos. Para alguns, como no Exemplo 1, a aluna utilizou a atenção e a experimentação. No Exemplo 2, a observação e a experimentação. E, no Exemplo 3, além do esforço dobrado para aprender os conhecimentos necessários, foi preciso utilizar as habilidades de enfrentamento diante dos conflitos, o que tornou mais difícil a aprendizagem. Existem muitos processos cognitivos envolvidos no processo de aprendizagem como a capacidade de análise, comparação, percepção entre outros, que podem se apresentar mais ou menos desenvolvidos, de pessoa para pessoa. As pessoas também são movidas pela motivação, curiosidade, necessidades e objetivos diferenciados. Para atingir esses objetivos e necessidades, as pessoas desenvolvem e utilizam habilidades diferentes também, como a pesquisa, a leitura, a prática, entre outras. Além disso, as pessoas, por vezes, são motivadas por recompensas que podem ser internas ou externas, como os elogios, essas recompensas podem servir para manter e reforçar a aprendizagem. Pode-se concluir ainda que a aprendizagem não é apenas um processo cognitivo, pois envolve também aspectos emocionais, como a frustração, o medo, a satisfação, o entusiasmo, entre outros sentimentos e emoções, além de aspectos motores. Por fim, ainda é necessário considerar as questões culturais e as dificuldades na aprendizagem, que também variam muito de pessoa para pessoa. 28 UNIDADE 1 — O PROCESSO DE ESCOLARIZAÇÃO E A SUBJETIVIDADE Todas essas questões precisam ser conhecidas pelo professor, uma vez que é ele quem fará a mediação desses processos em um universo de diversidades, expectativas e individualidades de seus educandos. Podemos sintetizar o processo de aprendizagem segundo a figura a seguir. FIGURA 17 – PROCESSO DE APRENDIZAGEM FONTE: <https://shutr.bz/3kNi4OI>. Acesso em: 16 set. 2021. Todas as pessoas possuem conhecimentos prévios a respeito de tudo que se quer aprender. Ninguém é uma mente vazia, no sentido de não saber nada sobre aquele assunto. Esses conhecimentos prévios são o ponto de partida para o trabalho do professor.No caminho da aprendizagem, podem surgir barreiras que exigirão esforço, dedicação e comprometimento por parte de alunos e docentes para atingirem tal objetivo. 29 RESUMO DO TÓPICO 2 Neste tópico, você aprendeu que: • A psicanálise trata da questão da subjetividade humana na construção de sua identidade pessoal e individual e quais mecanismos estão envolvidos. No caso da psicanálise, os processos conscientes e inconscientes e que existem também outros mecanismos que influenciam na aprendizagem como a transferência e a projeção. • No contexto escolar, fala-se de uma subjetividade coletiva, pois a escola se situa em um contexto social e exerce sobre as pessoas múltiplas influências na formação de suas subjetividades. Então, mesmo sem perder as características que lhe são próprias e individuais, as pessoas se constituem, também, por meio do outro, ou seja, ao mesmo tempo transforma e é transformado. • Estão envolvidos muitos processos subjetivos na aprendizagem, ou seja, existem formas de aprender bem diferenciadas e próprias de cada aprendiz. Nesse processo, estão envolvidos aspectos cognitivos, afetivos, motores e até culturais que modificam completamente o percurso que cada um irá utilizar até atingir a aprendizagem. Nesse caminho, poderão surgir barreiras e dificuldades das mais diversas e como cada um irá enfrentá-las é também individual e particular. 30 1 Segundo Guattari (1992 apud SOARES; MIRANDA, 2009, p. 9), “subjetividade é tudo que concorre para a produção de si mesmo, um modo de existir, um estilo de existência, mas também um modo de relacionar como mundo, com componentes heterogêneos, além de ser socialmente produzida”. Baseado nesse conceito, assinale a alternativa CORRETA: a) ( ) A subjetividade é única, individual e não pode ser modificada. b) ( ) A subjetividade possui valores universais para qualquer tempo e lugar. c) ( ) A subjetividade está inserida em um processo social em um processo de contínua formação e está sempre se transformando. d) ( ) A subjetividade se forma basicamente no sistema que Freud chama de consciência. 2 Para Freud, temos uma concepção de sujeito que se estrutura ao longo do percurso histórico no cotidiano e, por outro lado, outra concepção atrelada a um determinado momento histórico e social. Com base nessa afirmativa, assinale a alternativa CORRETA: a) ( ) As concepções de subjetividades anulam as noções de sujeito. b) ( ) Uma concepção não se mistura com a outra. c) ( ) Temos uma estruturação de um sujeito constituído a partir de outro, mas que também é único. d) ( ) O sujeito se constitui através de suas experiências pessoais. 3 Existem processos subjetivos de aprendizagem, ou seja, há modos próprios e individuais de aprender. Sobre esses processos subjetivos de aprendizagem, analise as afirmativas a seguir: I- A motivação de cada pessoa para aprender pode ser diferente, sendo espontânea ou induzida. II- Em todas as situações o aprendiz tem uma necessidade e um objetivo. III- A recompensa da aprendizagem pode ser intrínseca ou extrínseca. IV- A aprendizagem envolve processos apenas cognitivos. Assinale a alternativa CORRETA: a) ( ) As sentenças I, II e IV estão corretas. b) ( ) As sentenças I, II e III estão corretas. c) ( ) As sentenças I e II estão corretas. d) ( ) As sentenças II, III e IV estão corretas. 4 A formação da subjetividade é um processo complexo, multideterminado e que se transforma de tempos em tempos. Além disso, possui um caráter individual e outro social. Baseada nessas afirmativas, disserte a partir do texto estudado, como acontece esse processo considerando essa dinâmica individual-social. AUTOATIVIDADE 31 5 A escola enquanto instituição social é um lugar fundamental na construção das subjetividades. A partir dessa afirmativa, disserte de que forma acontece esse processo na escola e como ele é transformado. 32 33 TÓPICO 3 — UNIDADE 1 SUBJETIVIDADE ESCOLARIZADA 1 INTRODUÇÃO Neste tópico, estudaremos como a subjetividade é formada no contexto educacional-escolarizado e como a escola atua na formação das subjetividades e na formação cidadã. A partir desses conceitos, iremos refletir e contextualizar o processo de construção da cidadania que é um dos objetivos primordiais da escola e como este se apresenta em suas mais diversas formas de legitimação e de controle. Você vai perceber que a escola conta com vários dispositivos de controle que se aliam nessa missão de formar cidadãos livres e democráticos, como a mídia televisiva e as leis e decretos. Estudaremos ainda como a subjetividade pode ser modulada e quais os seus efeitos para a formação dessa subjetividade escolarizada e cidadã. Por fim, estudaremos sobre a pedagogia do controle, um termo fortemente conhecido como um mecanismo de controle que as escolas utilizam para manter e instaurar a ordem, a disciplina e toda forma de controle em nome da educação de qualidade. Você irá perceber que essa forma de educação produz efeitos sobre o trabalho do professor e sobre o comportamento dos alunos e se configura das mais diversas formas. 2 SUBJETIVIDADE ESCOLARIZADA CIDADÃ E OS PROCESSOS DE LEGITIMAÇÃO Retomando o conceito de subjetividade escolarizada apresentado por Favere (2016), a autora aponta a escola como um ambiente propício à escolarização: alunos, professores, diretores, pais. A escola constitui o indivíduo, constitui subjetividades escolarizadas. Na atualidade, a subjetividade escolarizada é marcada, segundo a autora, por diversidades e múltiplas identidades. Com a emergência do discurso da cidadania, na sociedade e na escola, os educandos são estimulados a aprender a ser cidadãos responsáveis, participativos, tolerantes. Tornamo-nos escolarizados. Escolares constituídos de subjetivações moduladas que acompanham o movimento da vida globalizada. 34 UNIDADE 1 — O PROCESSO DE ESCOLARIZAÇÃO E A SUBJETIVIDADE A pergunta que se faz aqui, segundo Favere (2016), é: de que forma subjetividades escolarizadas são criadas em cada criança, em cada professor, gestor, pedagogo, vigia, merendeira e todos os que trabalham na instituição escolar? De que forma foram definidas, modificadas e reelaboradas essas subjetividades? Percebemos que práticas e discursos circulam na escola como legítimas, muitas vezes sem nem mesmo questionar o seu aparecimento e a instauração de poder contidos nesses discursos. Quais interesses ou práticas são dissimuladas em nome da cidadania? Com a reatualização dos dispositivos de controle, apareceram disseminaram e se legitimaram novos discursos e um deles é a cidadania. FIGURA 18 – CIDADANIA, O QUE É? FONTE: <https://shutr.bz/2XVtc2Y>. Acesso em: 16 set. 2021. O que se percebe, segundo Favere (2016, p. 5), “é que esse discurso, da formação e prática da cidadania foi forçado a mudar a sua aparência, ajustar-se às práticas democráticas e participativas para envolver os indivíduos e estimulá- los a se engajarem em projetos sociais que geralmente vem prontos, oriundos do capitalismo”. Todo esse discurso tem efeitos sobre o modo da subjetividade. Produz-se certo modo de ser cidadão em geral e de ser cidadão escolar. Esse ser cidadão que estimula a participação aparece também na mídia televisiva com campanhas de participação popular e em sites sobre a temática educacional, muito citado por Favere (2016), reafirma-se a mobilização para a cidadania. Esse movimento é financiado exclusivamente pela iniciativa privada e congrega educadores e gestores públicos, segundo a autora. O movimento pretende atuar sobre o desejo de cada um em ser um cidadão escolar. Ele produz a sensação da escolarização como um bem para todos, uma melhoria para o futuro, pois o futuro depende das crianças, o futuro das crianças depende da educação e o futuro da educação depende de cada um de nós (JOHANNPETER, 2010 apud FAVERE, 2016, p. 8). TÓPICO 3 — SUBJETIVIDADE ESCOLARIZADA 35 Sabe-se, portanto, que a escolarização tem a sua intencionalidadee que nem sempre se traduz em um bem para todos, principalmente quando se fala em igualdade de oportunidades, considerando todo o arcabouço de desigualdades sociais, culturais e econômicas do nosso país. Também não garante melhorias para o futuro devido a todas essas questões, além do preconceito que está fortemente implícito e até explícito em muitas de nossas escolas. Essa educação de qualidade almejada por todos, tanto de direitos como de oportunidades, está muito além do nosso desejo e do nosso alcance. FIGURA 19 – INTENCIONALIDADE DA EDUCAÇÃO FONTE: <https://shutr.bz/3ody9z9>. Acesso em: 16 set. 2021. “Esse modo como se convocam os indivíduos a participarem das ações sociais é baseada numa prática de cidadania, por meio de um modo específico e subjetivo na atualidade e é disseminado nas práticas discursivas e nas práticas sociais” (FAVERE, 2016, p. 8). Então nos resta perguntar: com que objetivo o fazem? Qual é a verdadeira intenção? Qual é efetivamente essa participação da sociedade nessas políticas? O que favorece essa participação? Como ela acontece? FIGURA 20 – QUAL A INTENÇÃO DA ESCOLA? FONTE: <https://shutr.bz/3ufXutl>. Acesso em: 16 set. 2021. 36 UNIDADE 1 — O PROCESSO DE ESCOLARIZAÇÃO E A SUBJETIVIDADE A cidadania, contudo, não é uma palavra recente, mas o modo como é entendida e incentivada é bem específica nos tempos atuais e bem diferente do termo utilizado, por exemplo, na Grécia em tempos distantes. A cidadania, para os gregos, era representada por um engajamento político (CANIVEZ, 1999 apud FAVERE, 2016). Na atualidade, ela lembra o indivíduo que pertence a um estado, que têm direitos e deveres e que são importantes alguns requisitos na sua formação cidadã. Esses requisitos incluem, sobretudo, a gama de deveres a serem cumpridos, ou seja, entende-se que, para ser cidadão, precisa cumprir todos os deveres, deveres estes que lhe são cobrados inquestionavelmente, além disso, a cidadania da atualidade está longe de significar engajamento. Muito pelo contrário, muitas vezes significa alienação, quando está ligada à subjetividade escolarizada que muito tem a ver com sujeição e cumprimento de regras e valores, muito mais que uma política de direitos. Os efeitos do dispositivo do saber-poder da cidadania podem ser verificados em documentos como a Constituição Federal de 1988, intitulada Constituição Cidadã, e a LDB nº 9394/1996 – Lei de Diretrizes e Bases da Educação. Tais documentos enfatizam o cidadão, constituído de direitos e deveres e nesse sentido, aparece o direito à escolarização, instituída, naturalizada e vista como um bem para toda a sociedade, como um investimento na melhoria de vida, por meio dela (FAVERE, 2016, p. 5). Todos sabem que muitos direitos assegurados pela própria Constituição Federal (1988), mesmo em suas mais diversas atualizações e revogações, ainda não são direitos reais. Na prática, ficaram só no papel, por exemplo, o direito à escola de qualidade para todos, com igualdade de oportunidades. Inicialmente, não temos uma educação de qualidade e muito menos para todos. Ainda enfrentamos problemas até mesmo de acesso às escolas com a falta de vagas nas escolas públicas. E quando se fala em igualdade de oportunidades, fica ainda pior, pois as desigualdades são gigantescas e a inclusão, que também está prevista na constituição e na LDB, ainda não é uma realidade e está bem longe de se tornar, infelizmente. 3 CIDADANIA E OS EFEITOS DE MODULAÇÃO DA SUBJETIVIDADE Conforme o Portal Brasil, “ser cidadão é ser reconhecido, ter documentação legal, ser consumidor e ter direitos e deveres. Investe-se, assim, no cidadão de direitos e deveres, pois é seguindo regras e leis que se faz um bom cidadão” (FAVERE, 2016, p. 6). O tema cidadania, que está presente em movimentos sociais e em documentos oficiais, faz da escolarização um direito e um dever, pois é por meio dela, segundo a autora, que se aprende a ler, escrever, conteúdos curriculares legitimados, além de aprender a ser cidadão. “Todos esses aprendizados estão imbricados entre si e compõem a subjetividade escolarizada na contemporaneidade, apoiados na relação escolarização-cidadania” (FAVERE, 2016, p. 6). TÓPICO 3 — SUBJETIVIDADE ESCOLARIZADA 37 Os efeitos dessa subjetividade escolarizada, segundo esses autores, “produzem a sensação de que um indivíduo só é cidadão atuante e responsável se estiver escolarizado, segundo o modo de sujeição do regime escolar” (FAVERE, 2016, p. 9). Coloca-se ainda a ideia do cidadão escolarizado, aliada à ideia de competência, ou seja, para estar escolarizado precisa ser competente, o que implica em adquirir os conhecimentos, habilidades e atitudes, veiculados pela escola. Neste sentido, a escola dá pouca ênfase na questão das atitudes e valores, supervalorizando a aquisição dos conhecimentos e com pouco foco também para as habilidades práticas, com uma carga extensiva de conhecimentos teóricos que a sobrepõem. Se a escolarização está ligada à cidadania e à subjetividade que se pretende construir, é preciso se atentar para os efeitos dessa modulação. “A cidadania aqui não é o problema. O que se quer problematizar são os efeitos de subjetividade que os atuais discursos e práticas da cidadania produzem sobre a subjetividade escolarizada, com o enfoque na modulação da subjetividade escolarizada cidadã” (FAVERE, 2016, p. 6). Um jornal virtual apresenta um trecho do artigo Ser cidadão em tempos difíceis, do jornal A página da educação (PERES, 2006, s.p.): É ter direitos e deveres, é assumir as suas liberdades e responsabilidades no seio de uma comunidade democrática, justa, equitativa, solidária e intercultural [...] fundamentados em valores e princípios éticos, que requalifiquem a democracia com cidadãos participativos e comprometidos. Percebe-se que o discurso está muito mais voltado para o cumprimento de deveres do que de direitos, pautados na ética, responsabilidade, comprometimento e participação que é colocada também como um dever e não apenas um direito. A cidadania produz efeitos que atuam no indivíduo para uma vida obediente, modulada por supostos direitos e, principalmente, deveres. A questão que se coloca não é negar a importância da cidadania, muito menos mudar a sua forma do que seria ser cidadão, mas buscar entender as estratégias do saber-poder que atuam na ideia de cidadania e buscar perceber quais mecanismos de sujeição e submissão afirmam ser necessários para ser um bom cidadão (FAVERE, 2016). O que se percebe nesses discursos é que a cidadania produz efeitos de modulação sobre a subjetividade almejando a formação de um determinado tipo de um indivíduo para uma determinada sociedade, utilizando-se de estratégias de controle sobre a população, produzindo a sensação de responsabilidade e colaboração, o que na maioria das vezes está distante do cidadão, fora de seu alcance e de sua real participação. É o que chamamos de pedagogia do controle com o discurso da cidadania (FAVERE, 2016). 38 UNIDADE 1 — O PROCESSO DE ESCOLARIZAÇÃO E A SUBJETIVIDADE Contudo os discursos citados anteriormente, enfatizam a cidadania como um ideal e direito de todos, sem deixar transparecer as formas de sujeição operantes nesses dispositivos de controle. A subjetividade é assim modulada, pois submete cidadãos a regulações e controles a ela implícitas. Favere (2016, p. 10) pontua que: Com a disseminação da subjetividade escolarizada em todos os espaços presenciais e até virtuais da sociedade, as identidades do indivíduo também são ampliadas. Na categoria adjetivada de escolar a diversidade de características pode estar, ao mesmo tempo, no indivíduo: cidadão, normal, especial, prestativo, obediente, indisciplinado, responsável, cristão, competente, participativo, intolerante, homossexual. Cada escolar encontra-se regulado por diversas identidades. As subjetividades adjetivadas são múltiplas e moduláveis. A autora ainda acrescenta que a aprendizagem dos escolarizados também ultrapassam
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